INTRODUÇÃO
Em rinoplastias, o tratamento da ponta nasal e sua relação de proporção com o dorso
e columela, são importantes no efeito estético da face. A possibilidade de executar
rinoplastias abertas a partir de incisão transcolumelar e descolar toda a pele do
dorso através de incisão anterior às cartilagens alares como continuação da incisão
da columela, descrita inicialmente por Rheti1, em 1934, e no Brasil por Sperli2, em 1988, abriu novos caminhos para o tratamento estético e funcional do nariz. Inúmeras
maneiras de projetar mais a ponta nasal foram descritas, principalmente para pontas
bulbosas, pele grossa e ponta globosa mal definida3. Criar uma ponta nasal nova, esteticamente adequada, protegendo a função respiratória4,5 deve ser sempre uma preocupação do cirurgião.
Inúmeras táticas ou técnicas foram descritas, tais como, pontos entre os domus das
cartilagens alares6 e enxertos que camuflam a ponta adequada7,8. A rigidez9 da ponta nasal também é importante na queixa dos pacientes.
Para criar harmonia de proporções entre os vários segmentos nasais e faciais, pode-se
aumentar ou reduzir a ponta nasal10. No aumento da projeção são descritos vários procedimentos de estruturação da columela
com o uso do septo nasal11, ou enxertos de cartilagem costal12 em rinoplastias secundárias, quando o septo não está presente. As incisões, ressecções
ou enxertos cartilaginosos tem fundamental importância no resultado final de longo
prazo de rinoplastia13.
Em casos de necessidade da projeção da ponta nasal, onde não é preciso modificações
do ângulo columelolabial e o aumento da projeção da ponta nasal às vezes se faz necessário
para a obtenção de um resultado estético adequado, obtendo melhor proporção dorso
- ponta. É rotina o uso de enxertos cartilaginosos retirados do septo nasal, da concha
auricular ou utilizando sobras de cartilagens da própria rinoplastia. Em casos de
necessidade de maior projeção, pode-se obtê-los das cartilagens costais, principalmente
em nariz secundário. Diversas táticas foram propostas para esse aumento de projeção,
dependendo da necessidade de volume e extensão do enxerto.
Quando se faz necessário pequeno aumento da projeção da ponta, sem necessidade de
outros suportes estruturais, nos casos de rinoplastias abertas, observando as cruzes
laterais das cartilagens alares14, pode-se utilizar os excedentes de cartilagens alares, que são frequentemente removidos
e desprezados, em forma de "pseudo-retalhos" cruzados sobre a ponta para aumentar
sua projeção. Mesmo que se usem enxertos de estruturação da columela é possível cobrir
a extremidade anterior do mesmo com esse excedente.
OBJETIVO
O objetivo deste trabalho é apresentar uma técnica para tratamento da ponta nasal,
utilizando excedentes cefálicos laterais das cartilagens alares em forma de "pseudo-retalhos".
MÉTODOS
Trata-se de um trabalho retrospectivo analítico para apresentação de uma nova técnica
cirúrgica para aumento da projeção da ponta nasal.
Os pacientes participantes do estudo são provenientes de consultório privado, com
termo de consentimento informado e esclarecido. O presente trabalho seguiu os princípios
da Declaração de Helsinque.
Técnica cirúrgica
A técnica de acesso da rinoplastia deve ser sempre a aberta (exorrinoplastia), para
visualização e exposição adequada da ponta nasal e das cartilagens alares, com suas
formas, projeções, excedentes e eventuais assimetrias.
Infiltra-se solução anestésica contendo adrenalina na concentração de 1:80.000 em
todo nariz e septo. A incisão na columela, em V angulado em 90 graus, é realizada
na transição da sua porção piramidal da base com a quadrangular, mais ou menos na
metade da sua altura, e se prolonga por todo o bordo anterior das cartilagens alares,
acompanhando-as nas partes mediais e depois laterais, até próximo as bases das asas
nasais laterais (Figura 1).
Figura 1 - Incisões, descolamento, exposição e marcações dos excedentes superiores laterais das
cartilagens alares.
Figura 1 - Incisões, descolamento, exposição e marcações dos excedentes superiores laterais das
cartilagens alares.
A pele do dorso nasal na região da ponta é descolada, indo lateralmente até sobre
os segmentos laterais das cartilagens alares (Figura 1). O dorso ósseo e cartilaginoso nasal superior é descolado somente o necessário para
tratá-lo conforme a necessidade de cada caso.
O espaço entre os domus das cartilagens alares é esvaziado dos tecidos moles, de baixo
para cima, ficando "pediculada" a esse domus de cada lado, ou apenas de um lado, ou
ainda pode ser removido. Os segmentos columelares das cartilagens alares (cruz medial)
são suturados entre si com fios finos inabsorvíveis, ou fios absorvíveis transfixantes,
nesse caso incluindo a pele e a pseudo-mucosa columelar de cada lado. O tecido mole
interdomal, se não for removido, agora sobre os domus, pode servir de acolchoamento
para receber os excessos de cartilagens alares.
Quando há columela pendente, um ponto de fio não absorvível 6.0 reduz a curvatura
aberta do domus das cartilagens alares de cada lado, transfixando-as e aproximando
o início da cruz medial e da cruz lateral, angulando-os com o cuidado de não transfixar
a mucosa nasal. Essa manobra já aumenta discretamente a projeção da ponta e corrige
a curvatura da columela, quando pendente.
Marca-se então a ressecção dos excessos das cartilagens alares (Figura 1). Inicia-se sua liberação de lateral para medial superior, até próximo ao domus,
descolando-as da mucosa nasal, ficando "pediculadas" na porção mais cranial dos domus
(Figura 2). Essa manobra é facilitada infiltrando solução anestésica entre as cartilagens e
a mucosa nasal com agulha hipodérmica.
Figura 2 - Os "pseudo-retalhos" obtidos.
Figura 2 - Os "pseudo-retalhos" obtidos.
Em seguida são dobradas para frente e suturadas cruzadas sobre o tecido mole interdomal
deixado ali, ou livremente se ele foi removido. Assim elas fazem duas alças, em "suspensório
de soldado francês" (Figuras 3 A, B, C e D). Outros pontos de reforço com fios não absorvíveis para adequação da projeção e
posição podem ser utilizados quando convenientes, para obter a forma desejada. As
cartilagens não devem ser desnudas de tecidos moles e pericôndrios, que servirão também
de suporte sob elas, quando dobram, para reforçar as alças e terem maior resistência
aos pontos. No final, o cruzamento e as suturas deixarão esses pseudo-retalhos vistos
de frente em forma quadrangular, conforme propôs Sheen7, em 1984.
Figuras 3 - A, B, C e D. Esquemas da obtenção dos "pseudo-retalhos".
Figuras 3 - A, B, C e D. Esquemas da obtenção dos "pseudo-retalhos".
Deve-se tomar muito cuidado para não transfixar as mucosas nasais e expor os fios
de suturas. Antes de suturar o domus, aproximando a parte lateral da medial, a infiltração
de anestésico local ou soro fisiológico entre a mucosa nasal e a cartilagem alar sob
a região onde será dado o ponto, é uma manobra útil para evitar essa transfixação.
Em casos que necessitam de enxerto estrutural na columela, removidos em geral do septo
cartilaginoso, sua extremidade que se projeta acima do domus das cartilagens alares
deve ser coberta com os "pseudo-retalhos", deixando a ponta nasal dele mais protegida
e mais natural (Figura 4).
Figura 4 - Os "pseudo-retalhos" suturados cruzados sobre a extremidade de um enxerto estrutural
columelar.
Figura 4 - Os "pseudo-retalhos" suturados cruzados sobre a extremidade de um enxerto estrutural
columelar.
O restante da rinoplastia é realizado conforme as necessidades de cada caso, tratamento
do dorso ósteocartilaginoso feito previamente e osteotomias quando necessárias. Para
concluir o tratamento, tampões, imobilização e curativo de rinoplastia.
RESULTADOS
Trinta e seis pacientes foram submetidos a rinoplastias com o uso da técnica de "pseudo-retalhos",
sendo todas rinoplastias primárias. Operados no período de 2002 a 2017, dos quais
35 eram do sexo feminino e 1 do sexo masculino, na faixa etária entre 25 e 45 anos.
O acompanhamento dos pacientes foi de 5 anos.
Todos os pacientes foram operados utilizando a técnica descrita, apenas um deles não
apresentou bom aumento da projeção da ponta nasal devido a formação de abscesso. Esse
paciente, do sexo masculino e 50 anos, foi submetido à drenagem do abscesso. Ao exame
especular endonasal apresentava o fio de nylon da sutura de angulação da extremidade
da cartilagem alar do lado direito, extruso na narina. O fio foi removido, prescrito
antibioticoterapia com resolução do abscesso. Porém, a projeção da ponta nasal não
foi adequada, permanecendo assimétrica, exigindo novo tratamento com outro enxerto
retirado da concha auricular, o qual foi reabsorvido.
Os demais casos obtiveram adequada projeção da ponta nasal e os pacientes ao serem
questionados durante consulta de pós-operatório, consideraram seus resultados esteticamente
satisfatórios (Figuras 5 A, B, C, D, E e F; Figuras 6 A, B, C e D; Figuras 7 A, B, C e D; Figuras 8 A, B, C, D, E e F).
Figura 5 - A. Pré-operatório. B. Pós-operatório. C. Pré-operatório. D. Pós-operatório. E. Pré-operatório. F. Pós-operatório.
Figura 5 - A. Pré-operatório. B. Pós-operatório. C. Pré-operatório. D. Pós-operatório. E. Pré-operatório. F. Pós-operatório.
Figura 6 - A. Pré-operatório. B. Pós-operatório. C. Pré-operatório. D. Pós-operatório.
Figura 6 - A. Pré-operatório. B. Pós-operatório. C. Pré-operatório. D. Pós-operatório.
Figura 7 - A. Pré-operatório. B. Pós-operatório. C. Pré-operatório.
Figura 7 - A. Pré-operatório. B. Pós-operatório. C. Pré-operatório.
Figura 8 - A. Pré-operatório. B. Pós-operatório. C. Pré-operatório. D. Pós-operatório. E. Pré-operatório. F. Pós-operatório.
Figura 8 - A. Pré-operatório. B. Pós-operatório. C. Pré-operatório. D. Pós-operatório. E. Pré-operatório. F. Pós-operatório.
Os resultados evidenciam narizes em pós-operatórios com bases mais estreitas, pontas
nasais afiladas e elevadas, e sem bulbosidade.
DISCUSSÃO
A posição adequada da ponta nasal é um dos muitos aspectos do nariz considerado esteticamente
agradável. Enquanto a ponta cefálica cria uma aparência jovem, a ponta caída é percebida
como uma senescência. Com o envelhecimento ocorre a perda da projeção da ponta nasal
e consequentemente o abaixamento da mesma, sendo este um fator motivador na procura
dos pacientes pela rinoplastia15.
A literatura define o ângulo nasolabial ideal entre 90 e 120 e várias são as técnicas
descritas para aumentar esse ângulo e consequentemente aumentar a projeção da ponta
nasal, desde modificação de ângulos e projeções dos domus das cartilagens alares por
meio de suturas, até a utilização de enxertos cartilaginosos, em vários volumes e
formas, obtidos de vários locais15. O uso de enxertos de cartilagem apresenta como principal desvantagem, comparado
com o método descrito quando utilizado isoladamente, a possibilidade de sofrer reabsorções,
deslocamentos e deformações estruturais, sem garantia de manutenção a longo prazo
do resultado obtido no pós-operatório imediato16.
Entretanto, mesmo com a variedade de recursos disponíveis, apresenta-se neste trabalho
uma nova tática, que pode ser usada como procedimento único de projeção da ponta,
ou associado a outros procedimentos que não alcançaram a projeção completa, conforme
desejado ou planejado17.
A perda de projeção da ponta nasal, rotação e comprimento do nariz podem ser secundárias
à perda do suporte adequado das cartilagens nasais. Irregularidades da ponta nasal,
do contorno dorsal e retração alar são frequentemente causadas por perda da dinâmica
das cartilagens17.
Quando a ponta não tem projeção e forma adequadas e as cartilagens alares são largas,
com tecidos moles em excesso, esses quase sempre são removidos e desprezados. Em rinoplastia
aberta, a reutilização desses excessos, sem removê-los do local torna a cirurgia mais
simples. A utilização dos excedentes dessas cartilagens não deve desfazer a superposição
delas com as triangulares (segundas valvas), usando somente o excedente que se projeta
acima do dorso do septo tratado. Consegue-se com esta metodologia projetar a ponta
nasal dependente da largura, extensão e espessura dos excessos laterais das cartilagens
alares.
Caso haja necessidade de maiores projeções da ponta e ou projeção da base da columela,
às vezes com ângulo columelolabial inadequado, um enxerto estruturado retirado, preferencialmente,
do septo nasal livre através de septoplastia pode ser utilizado. E a projeção dele
acima dos domus das cartilagens alares é recoberta pelos "pseudo-retalhos" (Figura 4).
O termo "pseudo-retalhos" foi utilizado porque retalhos são segmentos de tecidos vascularizados
com pedículo axial definido ou ao acaso. E nesse caso o segmento de cartilagem não
tem vascularização. Somente um "pseudo-pedículo"18.
A técnica de "pseudo-retalhos" de cartilagem alar, apresenta as vantagens de utilizar
tecido local e, principalmente, com boa manutenção da forma e da projeção a longo
prazo. A simplicidade da técnica permite bastante flexibilidade e criatividade do
cirurgião que, ao obter os "pseudo-retalhos", poderá rodá-los e fixá-los na cartilagem
contralateral de acordo com a necessidade de cada caso, estruturando a ponta nasal
e melhorando sua projeção. O trabalho relata técnica simples, de fácil execução e
confiável, que produz aspecto natural ao nariz com manutenção da projeção da ponta
a longo prazo.
CONCLUSÃO
A técnica descrita no trabalho mostrou-se bastante efetiva na projeção da ponta nasal.
O aumento moderado da projeção da ponta nasal pôde ser realizado, com os excedentes
das porções laterais das cartilagens alares, que normalmente seriam retiradas e desprezadas,
obtendo-se resultados satisfatórios com evidente eficiência quanto à projeção da ponta
nasal.
A técnica é um recurso de execução simples, sem grandes complicações e recurso técnico
viável para projeção da ponta nasal, em casos selecionados que não necessitem de grandes
aumentos de volume ou, nos que necessitam de volumes maiores, pode ser somada a outros
procedimentos habituais com bons resultados.
COLABORAÇÕES
ARB
|
Análise e/ou interpretação dos dados, Coleta de Dados, Conceitualização, Gerenciamento
do Projeto, Investigação, Metodologia, Realização das operações e/ou experimentos,
Redação - Preparação do original, Supervisão
|
ACB
|
Aprovação final do manuscrito, Realização das operações e/ou experimentos
|
CGS
|
Análise e/ou interpretação dos dados, Redação - Revisão e Edição, Visualização
|
REFERÊNCIAS
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1. Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, Hospital de Base, São José do Rio
Preto, SP, Brasil.
Autor correspondente: Antônio Roberto Bozola Avenida José Munia, 7075, São José do Rio Preto, SP, Brasil. CEP: 15085-893. E-mail:
ceplastica@hotmail.com
Artigo submetido: 23/10/2018.
Artigo aceito: 20/10/2019.
Conflitos de interesse: não há.