ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Original Article - Year2011 - Volume26 - Issue 4

RESUMO

INTRODUÇÃO: O retalho de músculo grande dorsal (MGD) é uma das opções cirúrgicas mais usadas nas reconstruções mamárias. A cicatriz da área doadora no dorso, embora por vezes situada sob a alça do sutiã, frequentemente é extensa e pode ser de qualidade ruim (alargada ou hipertrófica). O objetivo deste trabalho é descrever a dissecção e rotação do MGD através de duas incisões reduzidas.
MÉTODO: No total, 12 pacientes do sexo feminino foram submetidas a reconstrução mamária unilateral com retalho de MGD isolado (sem pele). Dessas pacientes, 10 eram portadoras de síndrome de Poland e tiveram suas mamas reconstruídas com expansor tecidual num primeiro tempo, com posterior rotação do retalho de MGD para cobrir a prótese de silicone definitiva; e outras 2 pacientes tinham evoluído com diminuição do volume, irregularidades e retrações da mama após adenomastectomia, e tiveram sua prótese coberta pelo MGD. O procedimento cirúrgico consistiu de incisão longitudinal de 5 cm sobre a borda lateral do MGD e no sulco inframamário. Realizou-se dissecção, secção e rotação do músculo somente com a retração da pele.
RESULTADOS: Em seguimento ambulatorial, a extensão da cicatriz apresentou média de 6,2 cm. O tempo cirúrgico médio para rotação do retalho e síntese da área doadora foi de 80 minutos. Não foram observadas complicações pós-operatórias nesta série.
CONCLUSÕES: A incisão reduzida para dissecção do MGD nas reconstruções mamárias mostrou-se bastante factível e segura, com vantagem estética e sem aumento dos custos e do tempo cirúrgico.

Palavras-chave: Mama/cirurgia. Síndrome de Poland. Mamoplastia. Cirurgia plástica/métodos.

ABSTRACT

BACKGROUND: The latissimus dorsi muscle flap is one of the most commonly used surgical options for breast reconstruction. The donor area scar on the back, although sometimes hidden beneath the bra strap, is often extensive and enlarged or hypertrophic. The aim of this study is to describe the dissection and rotation of the latissimus dorsi muscle using 2 reduced vertical incisions.
METHODS: Twelve female patients underwent unilateral breast reconstruction with latissimus dorsi muscle flap. Ten patients had Poland's syndrome, and their breast reconstruction was performed with a tissue expander at the first instance, with subsequent latissimus dorsi muscle flap rotation to cover the silicone prosthesis. Two patients experienced volume decrease, irregularities, and breast retractions after adenomastectomy; their prosthesis were also covered by a latissimus dorsi muscle flap. The surgical procedure consisted of a 5-cm longitudinal incision on the lateral border of the latissimus dorsi muscle and another on the inframammary fold. Dissection, section, and rotation of the muscle were performed through skin retraction.
RESULTS: The final extension of the scar at follow-up averaged 6.2 cm. The mean surgical time for flap rotation and synthesis of the donor area was 80 minutes. No postoperative complications were observed in any of the cases.
CONCLUSIONS: The reduced incision for dissection of the latissimus dorsi flap for breast reconstruction proved to be feasible and safe; this method provides aesthetic advantages without increasing cost or surgical time.

Keywords: Breast/surgery. Poland syndrome. Mammaplasty. Plastic surgery/methods.


INTRODUÇÃO

O retalho de músculo grande dorsal (MGD) é uma das opções cirúrgicas mais usadas nas reconstruções mamárias. A cicatriz da área doadora no dorso, embora por vezes situada sob a alça do sutiã, frequentemente é extensa (15 cm a 25 cm) e pode ser de qualidade ruim, apresentando-se alargada ou hipertrófica. Assim, técnicas minimamente invasivas vêm sendo desenvolvidas e cada vez mais utilizadas.

Na reconstrução mamária, pode ser necessária a cobertura muscular exclusiva de uma prótese de silicone. Casos de adenomastectomias, manejadas anteriormente com a colocação direta de prótese abaixo dos músculos grande peitoral e serrátil anterior, podem ter cobertura cutânea muita fina, ficando a prótese palpável, sendo necessária sobreposição muscular do grande dorsal. Da mesma forma, em pacientes com síndrome de Poland, com agenesia dos músculos grande peitoral e pequeno peitoral, é imprescindível a reconstrução do pilar anterior da axila, que pode ser mais adequadamente obtida com a transposição do MGD1. A abordagem endoscópica, a despeito do custo do aparelho, geralmente utiliza três incisões: um portal de 1 cm a 2 cm ou uma incisão axilar (5 cm a 6 cm) e outras duas incisões portais.

Assim, o objetivo deste trabalho é descrever a dissecção e a rotação do MGD através de duas incisões reduzidas e a mensuração da extensão da cicatriz torácica resultante.


MÉTODO

No total, 12 pacientes do sexo feminino foram submetidas a reconstrução mamária unilateral com retalho de MGD isolado (sem pele). Dessas pacientes, 10 eram portadoras de síndrome de Poland, cujas mamas foram reconstruídas com expansor tecidual num primeiro tempo, com posterior troca por prótese de silicone e retalho de MGD para sua cobertura. Outras 2 pacientes tinham evoluído com diminuição do volume, irregularidades e retrações da mama após adenomastectomia, necessitando de reparação cirúrgica. Assim, nessas pacientes foi realizado implante de silicone associado a retalho de MGD.

Procedimento Cirúrgico

O procedimento cirúrgico teve início com a paciente em decúbito lateral e consistiu numa incisão longitudinal de 5 cm sobre a borda lateral do MGD (Figura 1). Realizou-se dissecção, secção e rotação do músculo somente retraindo-se a pele com afastadores de superfície e tracionando-se o músculo na direção da incisão, sem nenhum auxílio endoscópico (Figura 2). Nos dois primeiros casos, foi utilizada outra incisão de mesma extensão na região axilar, a fim de auxiliar a dissecção do pedículo e a rotação do retalho. A dissecção teve início em plano entre o tecido subcutâneo e o MGD e, após, entre o gradil costal e o MGD. Após completa dissecção, realizou-se uma incisão inferior e medialmente, entre o MGD e o músculo trapézio. Para auxíliar no procedimento, foram utilizados somente os afastadores de Langenbeck.


Figura 1 - Incisão longitudinal de 5 cm sobre a borda lateral do músculo grande dorsal.


Figura 2 - Dissecção, secção e rotação do músculo somente retraindo-se a pele com afastadores de superfície e tracionando-se o músculo em direção à incisão cirúrgica.



Para moldagem da mama e transposição do retalho de MGD foi necessária uma nova incisão na área receptora. Todas as pacientes já apresentavam incisão anterior, ou pela adenomastectomia prévia ou pela colocação do expansor de pele. O retalho foi rodado anteriormente para o tórax. Pontos de fio absorvível foram dados no sítio doador, com a finalidade de reduzir o espaço morto e diminuir o risco de hematomas e seromas. Sistema de drenagem fechada a vácuo foi utilizado em todos os casos. Sutura da área doadora foi realizada e, após mudança para decúbito dorsal, procedeu-se também à síntese da área receptora.


RESULTADOS

Foram realizados 12 procedimentos cirúrgicos utilizando a transposição do MGD para reconstrução mamária. No período de acompanhamento, não foram observadas complicações, como hematomas, seromas, deiscência de ferida, comprometimento da viabilidade do retalho ou prejuízo estético da mama reconstruída.

Em seguimento ambulatorial, a extensão média da cicatriz foi de 6,2 cm, variando de 4,4 cm a 7 cm (Figura 3).


Figura 3 - Pacientes com síndrome de Poland, submetidas a reconstrução mamária com retalho de músculo grande dorsal com incisão reduzida. Em A, mensuração ambulatorial da extensão da cicatriz. Em B, observa-se a presença de cicatriz axilar, utilizada nos dois primeiros casos.



O tempo médio necessário para a realização de todo o procedimento cirúrgico, incluindo rotação do retalho e síntese das áreas doadora e receptora, foi de 80 minutos.

As Figuras 4 e 5 ilustram 2 casos de pacientes submetidas a reconstrução de mama usando o MGD.


Figura 4 - Paciente com síndrome de Poland. Em A, aspecto pré-operatório. Em B, aspecto pós-colocação do expansor. Em C, aspecto após reconstrução mamária.


Figura 5 - Paciente submetida a reconstrução mamária pós-adenomastectomia, com colocação de prótese mamária subpeitoral. Em A, aspecto pré-transposição do músculo grande dorsal. Em B, aspecto pós-transposição do músculo grande dorsal.



DISCUSSÃO

O retalho de MGD é versátil e pode ser empregado em uma variedade de situações para reconstrução de deformidades torácicas. A anatomia muscular é previsível e o músculo possui boa vascularização e flexibilidade para transposição para diversas localizações, baseada em seu arco de rotação. O retalho pode ser transferido com uma ilha de pele, possibilitando cobertura torácica duradoura, associado ou não a expansores e implantes mamários para as reconstruções2,3. Embora o retalho de MGD tenha todas essas vantagens técnicas, a chance de complicações menores gira em torno de 25%, como cicatriz hipertrófica, contraturas, seromas, hematomas e infecções4.

A principal indicação de emprego do retalho de MGD é a reconstrução de mama após câncer e defeitos congênitos da parede torácica, como a síndrome de Poland. O MGD é utilizado também em reconstruções de cabeça e pescoço (após traumas ou exérese de tumores), de membros inferiores e de outros defeitos adquiridos do tórax.

Com a evolução dos últimos anos, o diagnóstico de câncer de mama tornou-se cada vez mais precoce, possibilitando alternativas terapêuticas mais conservadoras e menos mutilantes5. O retalho de MGD foi utilizado pela primeira vez, em 1906, por Tanzini, para cobertura da área da mastectomia por câncer mamário. Mais tarde, na década de 1990, popularizou-se o uso tanto após as quadrantectomias como nas ressecções amplas6. A síndrome de Poland, por sua vez, possui um espectro de apresentação clínica que vai de hipomastia a amastia, com ausência da porção esternal e clavicular do MGD em quase todos os casos7. A reconstrução mamária pode ser simplesmente com implantes, em casos mais leves, mas nos casos mais graves há necessidade de prótese associada a retalho de MGD, para adequada cobertura do implante.

As técnicas minimamente invasivas se estendem a todos os campos da cirurgia. A cirurgia mamária, seja por tumor ou malformação, pode ser a área que mais se beneficiaria com esses conceitos, por suas características especiais, com redução da agressão cirúrgica e da cicatriz. Existem diversas técnicas para obtenção do retalho de MGD através de pequenas incisões, com a finalidade de utilizá-lo como retalho nas reconstruções mamárias. Embora a cicatriz do retalho de MGD seja facilmente ocultada pelas roupas, as pacientes se queixam de alteração da sensibilidade e retração da ferida.

A confecção do retalho de MGD por via endoscópica permite a visualização mais precisa do pedículo vascular e sua mobilização, assim como recuperação pós-operatória mais rápida1,5,8,9. A cirurgia é realizada com uma incisão lateral ou com múltiplos orifícios para os instrumentais, geralmente em número de 3. É necessária uma cavidade óptica para adequada visualização e um espaço para a dissecção cirúrgica. Afastadores manuais e dissecção por instrumentos foram inicialmente utilizados. Mais recentemente, uma cânula transparente (dissector óptico) foi utilizada para criar múltiplos túneis, que podem então ser interconectados com dissecção endoscópica, para obtenção da cavidade óptica. Outros autores desenvolveram um balão de dissecção nos planos fascial epimuscular e submuscular, criando a cavidade óptica, que, associado à insuflação de dióxido de carbono, facilita a coleta do MGD10. Com a evolução da via axilar para introdução de prótese mamária, a técnica endoscópica para obtenção do MGD também evoluiu e pode ser realizada de maneira semelhante. Entretanto, essa técnica é mais onerosa, mais demorada11, mais difícil tecnicamente e com necessidade de uso de materiais especiais para adequada realização da cirurgia.

Existem outras técnicas minimamente invasivas que se utilizam de três incisões: uma dorsal em forma de "S", uma axilar e uma anterior para reconstrução mamária na síndrome de Poland12. Os autores acreditam que essas incisões ficam bem posicionadas, com resultado estético favorável. Entretanto, outros autores utilizaram duas incisões, uma dorsal em forma de "S" e outra axilar, eliminando assim a anterior12. Em estudos mais conservadores, utilizou-se uma incisão axilar para remoção do tumor na mama e rotação do retalho de MGD, apresentando como vantagem a ausência da cicatriz visível na mama. Porém, do ponto de vista oncológico, esse procedimento ficaria restrito a casos em que a pele da mama seja poupada13.

Portanto, existem diversas opções terapêuticas para as deformidades torácicas utilizando o retalho de MGD. Muitas delas são, nos dias atuais, menos agressivas e com menores índices de complicações. A técnica com incisão vertical é umas das opções conservadoras que deve ser levada em conta no momento da indicação do tratamento, tendo em vista sua pequena morbidade, a facilidade técnica e o bom resultado estético.


CONCLUSÕES

A incisão reduzida para dissecção do MGD nas reconstruções mamárias mostrou-se bastante factível e segura. Além da vantagem estética na área doadora, esse detalhe técnico não aumentou os custos e o tempo cirúrgico.


REFERÊNCIAS

1. da Silva Freitas R, Tolazzi ARD, Santos ALR, Graf RM, Cruz GAO. Poland syndrome. In: Shiffman MA, ed. Breast augmentation: principles and practice. Vol. 1. Berlin: Springer-Verlag; 2008. p. 345-57.

2. Moelleken BR, Mathes SA, Chang N. Latissimus dorsi muscle-musculocutaneous flap in chest-wall reconstruction. Surg Clin North Am. 1989;69(5):977-90.

3. Hammond DC. Latissimus dorsi flap breast reconstruction. Clin Plast Surg. 2007;34(1):75-82.

4. Lin CH, Wei FC, Levin LS, Chen MC. Donor-site morbidity comparison between endoscopically assisted and traditional harvest of free latissimus dorsi muscle flap. Plast Reconstr Surg. 1999;104(4):1070-7.

5. Guemes A, Sousa R, Cachón R, Valcarreres P, Rufas M, Gonzalo A, et al. Cirugía mamaria mínimamente invasiva: reconstrucción mamaria mediante colgajo muscular puro del gran dorsal. Cir Es. 2008;83(1):85-8.

6. Dixon JM, Venizelos B, Chan P. Latissimus dorsi mini-flap: a technique for extending breast conservation. Breast. 2002;11(1):58-65.

7. Freitas RS, Tolazzi AR, Martins VD, Knop BA, Graf RM, Cruz GA. Poland's syndrome: different clinical presentations and surgical reconstructions in 18 cases. Aesthetic Plast Surg. 2007;31(2):140-6.

8. Missana MC, Pomel C. Endoscopic latissimus dorsi flap harvesting. Am J Surg. 2007;194(2):164-9.

9. Martinez-Ferro M, Fraire C, Saldaña L, Reussmann A, Dogliotti P. Complete videoendoscopic harvest and transposition of latissimus dorsi muscle for the treatment of Poland syndrome: a first report. J Laparoendosc Adv Surg Tech A. 2007;17(1):108-13.

10. Van Buskirk ER, Rehnke RD, Montgomery RL, Eubanks S, Ferraro FJ, Levin LS. Endoscopic harvest of the latissimus dorsi muscle using the balloon dissection technique. Plast Reconstr Surg. 1997;99(3):899-903.

11. Pomel C, Missana MC, Atallah D, Lasser P. Endoscopic muscular latissimus dorsi flap harvesting for immediate breast reconstruction after skin sparing mastectomy. Eur J Surg Oncol. 2003;29(2):127-31.

12. Santi P, Berrino P, Galli A. Poland's syndrome: correction of thoracic anomaly through minimal incisions. Plast Reconstr Surg. 1985;76(4):639-41.

13. Shrotria S. Single axillary incision for quadrantectomy, axillary clearance and immediate reconstruction with latissimus dorsi. Br J Plast Surg. 2001;54(2):128-31.










1. Médica residente do Serviço de Cirurgia Plástica e Reparadora do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil.
2. Professor adjunto IV do Serviço de Cirurgia Plástica e Reparadora do Hospital de Clínicas da UFPR, cirurgião plástico do Centro de Assistência ao Fissurado Labiopalatal (CAIF), membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), coordenador do Departamento de Cirurgia Plástica e Reparadora da UFPR, Curitiba, PR, Brasil.
3. Membro titular da SBCP, cirurgião plástico do Serviço de Cirurgia Plástica e Reparadora do Hospital de Clínicas da UFPR, Curitiba, PR, Brasil.
4. Estudante de medicina na UFPR, Curitiba, PR, Brasil.

Correspondência para:
Renato da Silva Freitas
Rua General Carneiro, 180 - 9º andar
Curitiba, PR, Brasil - CEP 80060-900
E-mail: dr.renato.freitas@gmail.com

Artigo submetido pelo SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBCP.
Artigo recebido: 16/10/2011
Artigo aceito: 8/12/2011

Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia Plástica e Reparadora do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil.

 

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