ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

Previous Article Next Article

Original Article - Year2022 - Volume37 - Issue 1

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2022RBCP0005

RESUMO

Introdução: A asa nasal sempre foi uma grande dificuldade reconstrutiva e, na busca de um retalho com características da pele semelhantes a esta, deparamos com o retalho nasogeniano de pedículo inferior. O objetivo do trabalho foi demonstrar a viabilidade do retalho proposto para reconstrução da asa nasal após a retirada de tumores cutâneos.
Métodos: Foram analisados 20 casos de retalho nasogeniano de pedículo inferior realizados com a mesma técnica cirúrgica no período entre 2008 e 2019 e acompanhados por um ano de pós-operatório.
Resultados: Dos 20 casos estudados, 13 (65%) não apresentaram complicações, sendo as mais relatadas: cobertura parcial do defeito e desaparecimento parcial do sulco nasogeniano.
Conclusão: O retalho nasogeniano de base inferior mostrou ser um retalho viável à reconstrução da asa nasal pela qualidade de pele, fácil execução e índices mínimos de complicações.

Palavras-chave: Neoplasias cutâneas; Carcinoma basocelular; Retalhos cirúrgicos; Procedimentos cirúrgicos nasais; Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos

ABSTRACT

Introduction: The nasal alar has always been a major reconstructive diflculty, and in the search for a flap with skin characteristics similar to this one, we came across the inferiorly based nasolabial flap. The objective of this study was to demonstrate the viability of the proposed flap for reconstruction of the nasal alar after removal of skin tumors.

Methods: This study analysed twenty cases of inferiorly based nasolabial flap performed with the same surgical technique in the period between 2008-2019 and followed up for one year of postoperative.

Results: Of the 20 studied cases, 13 (65%) did not present complications, being the most described: partial defect coverage and partial disappearance of the nasolabial sulcus.

Conclusion: The inferiorly based nasolabial flap proved to be a viable flap for nasal alar reconstruction due to the quality of the skin, easy execution, and minimal complication rates.

Keywords: Skin neoplasms; Carcinoma, basal cell; Surgical flaps; Nasal surgical procedures; Reconstructive surgical procedures.


INTRODUÇÃO

As primeiras descrições de retalhos na história da cirurgia plástica (século VI - AC) foram para reconstrução nasal na Índia antiga; a técnica ficou conhecida como retalho médio frontal ou método indiano. Gaspare Tagliacozzi, em 1597, descreveu uma nova opção de reconstrução do nariz: retalho cutâneo direto do membro superior, denominado método italiano1. Dieffenbach descreveu o retalho nasogeniano e Converse o retalho de escalpo baseado na artéria superficial temporal2-4.

A asa nasal sempre foi uma grande dificuldade reconstrutiva devido a sua pele fina que, após reconstruída, normalmente necessitava de refinamentos cirúrgicos para melhor aparência. Buscando uma alternativa para correção desses defeitos, em que a pele apresentaria características semelhantes da asa nasal e possibilitaria a reconstrução em tempo cirúrgico único, deparamos com o retalho nasogeniano de pedículo inferior.

OBJETIVO

Demonstrar a viabilidade do retalho nasogeniano de base inferior para reconstrução da asa nasal após retirada de tumores cutâneos.

MÉTODOS

O trabalho foi realizado com dados primários obtidos por estudo retrospectivo de 20 casos de reconstrução de asa nasal com utilização de retalho nasogeniano de pedículo inferior, após retirada de carcinoma basocelular, no período entre 2008 e 2019. Os pacientes foram operados no Hospital de Câncer de Campo Grande Alfredo Abrão, MS. Foram analisados os resultados do pós-operatório imediato, com sete, 30 e 90 dias de pós-operatório e após 1 ano e a ocorrência ou não de complicações.

Foram selecionados os casos de pacientes com tumor restrito à asa nasal, que tenham sido biopsiados anteriormente com diagnóstico positivo para carcinoma basocelular e que concordaram em assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital de Câncer de Campo Grande Alfredo Abrão (n.º 002.2021).

Técnica cirúrgica

Após demarcação do tumor com margens de segurança oncológicas com azul de metileno, a área tumoral foi anestesiada com solução de Klein modificada [100 ml de SF a 0,9% + 1 ampola de adrenalina (solução milesimal) + 20 ml de lidocaína a 2% (sem vasoconstritor) + 4 ml de bicarbonato de Na+ a 8,4%] + bloqueio do nervo infraorbitário associado a sedação com midazolan e fentanil feito pelo anestesista.

Após a vasoconstrição, o tumor foi ressecado e foi realizada hemostasia rigorosa da área excisada.

A busca de uma pele fina, semelhante à da asa nasal, levou-nos a utilizar a pele do dorso nasal lateral. Demarcamos o retalho a ser confeccionado, este estendendo-se da asa nasal ao canto interno do olho, preservando a área do ligamento cantal interno e do canal lacrimal. Em seguida, confeccionamos o retalho cutâneo nasogeniano de pedículo inferior (Figura 1A) e promovemos a rotação para o seu novo leito (Figura 1B), no qual este foi suturado com nylon 5.0. A área doadora do mesmo foi suturada, após leve descolamento e hemostasia, com vicryl 4.0 e nylon 5.0, gerando uma cicatriz sem tensão (Figura 1C).

Figura 1 - Sequência técnica de retalho de transposição. A: Excisão do tumor e confecção do retalho; B: Rotação do retalho; C: Pós-operatório imediato.

A tumoração excisada foi enviada para exame anatomopatológico para confirmação das margens de segurança.

RESULTADOS

Durante 11 anos, foram analisados e operados 20 casos de pacientes com necessidade de reconstrução de asa nasal após exérese de carcinoma basocelular, sendo 13 (65%) do sexo masculino e 7 (35%) do sexo feminino. A idade dos pacientes variou entre 45 e 80 anos, sendo que 50% ocupou a faixa etária de 61 a 70 anos. Todos os pacientes apresentaram Fitzpatrick entre I e III. Dos pacientes operados, apenas 7 (35%) necessitaram de refinamentos, sendo estes realizados em apenas um tempo cirúrgico adicional (Figura 2). No pós-operatório imediato, dois pacientes apresentaram cobertura parcial do defeito, outros dois pacientes apresentaram complicações, sendo uma infecção e outra coloração inestética do retalho.

Figura 2 - Distribuição dos pacientes pela necessidade de refinamento cirúrgico (N=20).

Na consulta após 60 dias, um paciente evoluiu com cicatriz inestética e dois tiveram desaparecimento parcial do sulco nasogeniano. No acompanhamento até um ano após as cirurgias, treze pacientes (65%) não apresentaram nenhum tipo de complicação e nenhum paciente evoluiu com necrose (Figura 3).

Figura 3 - Complicações nos retalhos no pós-operatório (N=20).

As Figuras 4 to 5 ilustram a técnica cirúrgica e as Figuras 6 to 7 ilustram o acompanhamento a longo prazo de alguns casos da casuística.

Figura 4 - A: Demarcação do retalho; B: Excisão do tumor e confecção do retalho; C: Pós-operatório imediato.

Figura 5 - A: Excisão do tumor e demarcação do retalho; B: Confecção e rotação do retalho; C: Pós-operatório imediato.

Figura 6 - A: Pós-operatório imediato; B: Sete dias de pós-operatório; C: 30 dias de pós-operatório.

Figura 7 - A: Pós-operatório de 90 dias; B: Pós-operatório de um ano.

DISCUSSÃO

Na literatura, existe um grande arsenal descrito para reconstrução do nariz. Entretanto, a asa nasal, devido ao seus limites e formato côncavo, representa um desafio ao cirurgião para preservar sua função aliada a um resultado estético satisfatório.

Alguns autores referiram como mais utilizado para esta subunidade nasal (asa nasal) o retalho bilobado (44%), seguido do retalho em V-Y e do retalho nasogeniano de pedículo superior5; outros autores relataram predomínio da utilização do retalho nasogeniano de pedículo superior (55,84%)6,7. No presente estudo, não encontramos, na literatura, casuística do retalho nasogeniano de pedículo inferior para servir de comparação com o nosso trabalho.

O retalho nasogeniano de pedículo inferior é baseado, no desenho, ao retalho romboide de Limberg. Este, que considera a área de ressecção como um losango, propõe a confecção do retalho paralelo a um dos quatro eixos da lesão, fazendo com que o “V” da área doadora se feche por aproximação ao rodar o retalho. O retalho nasogeniano de pedículo inferior, em sua essência, é o retalho de Limberg desenhado no eixo mais adequado para a correção do defeito da asa nasal.

A espessura da pele é um dos fatores limitantes para que a reconstrução fique esteticamente semelhante à da asa nasal. O retalho médio-frontal é uma opção para grandes reconstruções que englobam mais da metade do nariz, inclusive as asas nasais, sendo descrito como o mais adequado pela segurança, quantidade de pele obtida e semelhança nas características cutâneas8; entretanto, o mesmo exige várias cirurgias de refinamento em pacientes caucasianos para melhoria estética devido à espessura deste retalho. O retalho nasogeniano de pedículo inferior, apesar de possuir como limitação a sua área de cobertura, restringindo-se a defeitos na asa nasal, apresentou espessura de pele praticamente compatível à espessura anterior, não necessitando refinamentos para afinar o retalho em 70% dos casos realizados.

Segundo Gokrem et al.9, o retalho miocutâneo V-Y de avançamento é uma opção para reconstrução nasal de pequenos e médios defeitos, evitando as desvantagens do retalho frontal e apresentando como vantagens a segurança e as características semelhantes entre a área doadora e receptora, podendo ser utilizado em várias regiões do nariz. Todavia, exige grande experiência do cirurgião para garantir a viabilidade deste retalho em razão do estreito pedículo. Em contraste, o retalho nasogeniano de pedículo inferior é de fácil confecção, não necessitando de grande experiência do cirurgião para executá-lo.

Segundo Laitano et al.5, o retalho bilobado apresenta a vantagem de ser um procedimento simples, realizado em um único estágio, com bons resultados estéticos e funcionais e alto grau de aceitação pelos pacientes, ao contrário do retalho nasogeniano de pedículo superior. O retalho bilobado para reconstrução da asa nasal apresentou as mesmas especificidades quando comparado ao retalho nasogeniano de pedículo inferior.

O retalho de interpolação para correção da asa nasal, citado por Sakai et al.10, promove a preservação do sulco nasogeniano, entretanto, quando o paciente é homem pode ocorrer transferência de folículos pilosos, o que não acontece com o retalho nasogeniano de pedículo inferior, devido sua pele não conter folículos pilosos.

CONCLUSÃO

O retalho nasogeniano de base inferior mostrou ser um retalho viável à reconstrução da asa nasal pela qualidade de pele, fácil execução e índices mínimos de complicações.

Colaborações
MR Aprovação final do manuscrito, Concepção e desenho do estudo, Metodologia, Realização das operações e/ou experimentos, Redação - Revisão e Edição, Supervisão
DNS Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Redação - Revisão e Edição
ALCL Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Visualização
ALCL Aprovação final do manuscrito, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição
ACR Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Redação - Revisão e Edição

REFERÊNCIAS

1. Mélega JM, Viterbo F, Mendes FH. Cirurgia plástica: os princípios e a atualidade. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011.

2. Ferreira LM. Cirurgia Plástica. Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar - Unifesp Escola Paulista de Medicina. São Paulo: Manole; 2007. p 3-11; 355-60; 663-83.

3. Herbert DC, Harrison RG. Nasolabial subcutaneous pedicle flaps. Br J Plast Surg. 1975;28(2):85-9.

4. Converse JM. Reconstruction of the nose by the scalping flap technique. Surg Clin North Am. 1959;39(2):335-65.

5. Laitano FF, Teixeira LF, Siqueira EJ, Alvarez GSe, Martins PDE, Oliveira MP. Uso de retalho cutâneo para reconstrução nasal após ressecção neoplásica. Rev Bras Cir Plást. 2012;27(2):217-22.

6. Souza Filho MV, Kobig RN, Barros PB, Dibe MJA, Leal PRA. Reconstrução nasal: análise de 253 casos realizados no Instituto Nacional de Câncer. Rev Bras Cancerol. 2002;48(2):239-45.

7. Moura BB, Signore FL, Buzzo TE, Watanabe LP, Fischler R, Freitas JOG. Reconstrução nasal: análise de série de casos. Rev Bras Cir Plást. 2016;31(3):368-72.

8. Cintra HPL, Bouchama A, Holanda T, Jaimovich CA, Pitanguy I. Uso do retalho médio-frontal na reconstrução do nariz.. Rev Bras Cir Plást. 2013;28(2):212-7.

9. Gokrem S, Tuncali D, Akbuga U, Terzioglu A, Aslan G. Reconstruction of small to medium defects in the soft tissues of the nose with nasalis musculocutaneous V-Y advancement flaps. Scand J Plast Reconstr Surg Hand Surg. 2006;40(3):140-7. DOI: 10.1080/02844310500491575

10. Sakai RL, Tavares LCV, Komatsu CA, Faiwichoq L. Retalho nasogeniano de interpolação na reconstrução da asa nasal após ressecção de tumores cutâneos. Rev Bras Cir Plást. 2018;33(2):217-21.











1. Hospital de Câncer de Campo Grande Alfredo Abrão, Serviço de Cirurgia Plástica, Campo Grande, MS, Brasil.
2. Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Cirurgia Plástica, Campo Grande, MS, Brasil.
3. Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, Medicina, Campo Grande, MS, Brasil.
4. Universidade Anhanguera-Uniderp, Medicina, Campo Grande, MS, Brasil.
5. Universidade de Marília, Medicina, Marília, SP, Brasil.

Autor correspondente: Marcelo Rosseto, Rua Raul Pires Barbosa, 1477, Chácara Cachoeira, Campo Grande, MS, Brasil., CEP: 79040- 150, E-mail: marcelorosseto@yahoo.com.br

Artigo submetido: 05/03/2021.
Artigo aceito: 14/07/2021.

Conflitos de interesse: não há.

 

Previous Article Back to Top Next Article

Indexers

Licença Creative Commons All scientific articles published at www.rbcp.org.br are licensed under a Creative Commons license