INTRODUÇÃO
O alívio da dor após a cirurgia continua sendo um dos desafios
médicos mais significativos, e o tratamento inadequado pode atrasar a alta
hospitalar e a recuperação do paciente. Além disso, a dor
pós-operatória é aguda e, quando conduzida de maneira
inadequada, pode levar ao desenvolvimento de dor crônica e maior uso de
analgésicos, incluindo opioides, e suas consequências1,2.
A infiltração das incisões cirúrgicas com
anestésicos locais (AL), principalmente os de longa duração,
tem sido cada vez mais utilizada em diversos tipos de cirurgias, e os resultados
descritos nos estudos são animadores1,2. Os efeitos desta
aplicação foram testados em diversos modelos experimentais3-7. No entanto, o impacto da infiltração de AL na
cicatrização da incisão cirúrgica ainda não foi
totalmente estabelecido.
As cirurgias estéticas por vezes são significativas e,
consequentemente, podem causar com dores intensas no pós-operatório. A
infiltração de AL poderia melhorar esta dor; entretanto, é
necessário avaliar se esta infiltração influencia na
cicatrização, o que poderia prejudicar o resultado final.
OBJETIVO
Este estudo teve como objetivo avaliar a interferência da
infiltração de AL de longa duração na incisão
cirúrgica no infiltrado inflamatório e nas áreas de cicatriz
fibrosa em ratos.
MÉTODOS
Este estudo foi realizado em um hospital público terciário (Hospital de
Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, Minas
Gerais, Brasil) de janeiro de 2018 a janeiro de 2020, aprovado pelo Comitê de
Ética no Uso de Animais sob o protocolo número 314. Todas as os
animais foram tratados seguindo as recomendações do Comitê
Institucional de Cuidado Animal.
Seguimos as recomendações do Comitê sobre ética no uso de
animais para cumprir o princípio dos 3R (redução, refinamento e
substituição). Nenhum cálculo amostral foi realizado. Quarenta
ratos Wistar, 20 machos e 20 fêmeas, foram divididos em quatro grupos de 10,
com o mesmo número de fêmeas e machos em cada grupo. Os animais
não apresentaram diferença no peso, com este variando entre 152 a 378
gramas, com média de 264 gramas (± 0,06).
Os ratos foram colocados em gaiolas com temperatura controlada (24 ± 1
° C) e em ciclos de 12 horas com luz-12 horas no escuro. Foram alimentados
com uma dieta padrão com água ad libitum por 12 horas
antes do protocolo experimental.
O procedimento cirúrgico foi realizado sob anestesia geral, induzida por
cloridrato de xilazina 2%, 5mg/kg, associado à cetamina, 70mg/kg,
administrada por via intraperitoneal. Confirmada a anestesia (perda do reflexo
caudal, patas e relaxamento muscular), a região dorsal do animal foi
tricotomizada, limpa com iodopovidona e seca com gaze estéril após 2
minutos. Duas incisões lineares de cerca de 2cm cada foram feitas na
região dorsal, simétricas em relação à linha
média, atingindo o tecido subcutâneo. A incisão esquerda foi
infiltrada com doses de 1,8ml de AL (Figura 1),
e a incisão direita não recebeu infiltração (grupo
controle). Outro grupo recebeu aplicação de 1,8ml de
solução salina (SS) 0,9% na incisão esquerda e nada na direita.
Foram feitos seis pontos de aplicação (0,3ml por ponto)
distribuídos ao longo da incisão de 2cm.
Os grupos foram nomeados de acordo com a substância aplicada na
incisão:
Figura 1 - Incisões cirúrgicas suturadas, simétricas em
relação à linha média, na área dorsal do
animal de teste.
Figura 1 - Incisões cirúrgicas suturadas, simétricas em
relação à linha média, na área dorsal do
animal de teste.
- Bupivacaína - infiltração de bupivacaína
0,25%;
- Levobupivacaína - infiltração de
levobupivacaína com excesso enantiomérico 0,25%;
- Ropivacaína - infiltração de ropivacaína
0,25%;
- Solução fisiológica - infiltração de
solução fisiológica 0,9%.
Não houve avaliação da equipotência anestésica.
Optamos por padronizar o volume e a quantidade de pontos de aplicação
nos grupos.
Dois minutos após a infiltração, as incisões foram
suturadas com fio prolene 4.0. Houve um período de observação
de 2 horas após a aplicação do anestésico local. Os
animais receberam uma injeção intramuscular de tramadol (2mg/kg)
durante o período pós-operatório a cada 12 horas por
três dias. A ferida operatória foi tratada uma vez ao dia, e os
animais foram sacrificados ao final do sétimo dia.
Imediatamente após o sacrifício, amostras de tecido das duas
incisões com diâmetro médio de 2cm2 foram removidas
e fixadas em formaldeído tamponado a 4% por aproximadamente 4 horas.
Posteriormente, foram clivadas e amostras da cicatriz processadas e incluídas
em parafina para confecção de cortes histológicos de cerca de 5
micrômetros (µm) de espessura. A seguir, os cortes histológicos
foram corados pelas técnicas de hematoxilina-eosina (HE) para
avaliação do infiltrado inflamatório e de tricrômio de
Masson (MT) para avaliação da cicatriz fibrosa. As lâminas
foram analisadas em microscópio de luz comum (OLYMPUS® BX40) por um
único observador previamente treinado, que desconhecia o grupo ao qual cada
animal pertencia (cego).
Para realização da análise morfométrica da área do
infiltrado inflamatório (HE) e da cicatriz fibrosa (MT), foram selecionadas
as áreas com maior infiltrado inflamatório ao redor da cicatriz
cirúrgica (HE) e o foco com maior diâmetro cicatricial (MT),
respectivamente. Para determinar a área do infiltrado inflamatório e
da cicatriz, foi utilizado o sistema analisador de imagem semiautomático
Image J® 1.32j (National Institutes of Health, US), utilizando
µm como unidade de referência e o campo de
aumento 100X do microscópio óptico Olympus BX41 (Olympus®,
São Paulo, Brasil).
O programa Biostat®, versão 5.0, foi utilizado para a análise
estatística. As comparações entre os diferentes grupos foram
feitas por meio do teste ANOVA unilateral com pós-teste de Bonferroni e teste
de Kruskal-Wallis com pós-teste de Student-Newman-Keuls. Os resultados foram
considerados significativos quando a probabilidade de rejeição da
hipótese nula foi inferior a 5% (p <0,05).
RESULTADOS
Avaliando morfologicamente, o infiltrado inflamatório era predominantemente
mononuclear, permeado por ocasionais células polimorfonucleares,
principalmente neutrófilos. A Tabela 1
mostra os resultados da área do infiltrado inflamatório nos diferentes
grupos.
A área do infiltrado inflamatório foi significativamente maior nos
grupos bupivacaína, ropivacaína e levobupivacaína em
comparação com seus controles (incisões que não
receberam infiltração). Ao comparar os grupos entre si, o grupo
bupivacaína apresentou infiltrado inflamatório significativamente
maior do que os grupos levobupivacaína e ropivacaína. Além
disso, o grupo SS 0,9% apresentou área do infiltrado inflamatório
substancialmente maior do que o grupo controle. No entanto, nenhuma diferença
foi observada entre o grupo SS 0,9% e os grupos AL testados.
A Figura 2 ilustra a área do infiltrado
inflamatório em quatro animais diferentes. A Tabela 2 mostra os dados da avaliação da área da
cicatriz fibrosa.
Ao avaliar a área da cicatriz fibrosa, foi observada diferença
significativa entre os grupos levobupivacaína e ropivacaína e seus
controles. Além disso, a área da cicatriz fibrosa era maior quando
esses dois anestésicos foram aplicados. Porém, ao comparar os grupos
AL com o grupo SS 0,9%, não houve diferença.
A Figura 3 mostra a cicatriz fibrosa em quatro
animais diferentes.
DISCUSSÃO
A infiltração de AL na pele e tecido subcutâneo é
amplamente utilizada para fins analgésicos após correção
cirúrgica em diferentes tipos de cirurgia1,2. Os ALs de longa
duração, como bupivacaína, ropivacaína e a
levobupivacaína com excesso enantiomérico, que corresponde a 75% do
isômero levogiro e 25% do isômero dextrogiro, são usados
regularmente. Teoricamente, a infiltração destes anestésicos
é o método mais racional de analgesia, uma vez que bloqueiam as
aferências nociceptivas e, portanto, a dor e o estresse
secundário8-10.
Existem controvérsias sobre a interferência do AL na
cicatrização de feridas cirúrgicas. Os efeitos da
injeção ou aplicação tópica de AL têm sido
testados em vários modelos experimentais, utilizando tempo de
cicatrização, medidas de resistência à
tração, área de processo inflamatório,
regeneração, tecido de granulação e
angiogênese3-7. Esses estudos usaram roedores cuja
pele cicatriza rapidamente, menos suscetíveis a agentes inibitórios e
fatores sistêmicos que podem limitar a cicatrização3.
A cicatrização de feridas cirúrgicas ocorre quando o tecido no
local da lesão é substituído por tecido conjuntivo
vascularizado. A primeira etapa da cura é o início de uma
reação inflamatória que reabsorverá o sangue extravasado
e os produtos de degradação dos tecidos. Posteriormente, ocorre a
proliferação de capilares e fibroblastos que formarão o tecido
conjuntivo cicatricial. O volume final da cicatriz depende dos estímulos que
regulam a atividade das células produtoras da matriz extracelular e do
equilíbrio entre a síntese e a degradação da
matriz11. Existem
evidências de que a intensidade e o tipo do infiltrado inflamatório
definirão a extensão da cicatriz12. No presente estudo, a avaliação foi
realizada sete dias após a incisão. Neste momento, a cura
provavelmente está no estágio de
granulação/proliferação, que se caracteriza pela
migração de fibroblastos e produção de colágeno
em ratos13. Porém, mesmo
nessa fase, infiltrado inflamatório significativo ao redor da cicatriz foi
observado em todos os grupos.
Tabela 1 - Área de infiltrado inflamatório na ferida operatória
após aplicação de anestésico local e
solução salina nos diferentes grupos de animais.
Grupo
Animal
|
Área mediana (µm2)
|
Área Mínima (µm2)
|
Área Maxima (µm2)
|
Bupivacaína |
1595646,75a |
353178,5 |
3785935,5 |
Bupivacaína controle |
10301715 |
181919 |
2865686,5 |
Levobupivacaína |
975600b,e |
661763 |
1829388 |
Levobupivacaína controle |
762221,8 |
97105 |
971325 |
Ropivacaína |
1278801,3c,f |
379043,5 |
4122721,5 |
Ropivacaína controle |
340497 |
340497 |
565769 |
SS0,9% |
1440765,3d |
832288 |
1959811 |
SS 0,9% controle |
749901,3 |
74383 |
1054869 |
Tabela 1 - Área de infiltrado inflamatório na ferida operatória
após aplicação de anestésico local e
solução salina nos diferentes grupos de animais.
Figura 2 - Área de infiltrado inflamatório (setas) em quatro animais
diferentes. Observar que em A (bupivacaína) e B (ropivacaína)
a área é maior que em C (levobupivacaína) e em D (SS
0,9%) (hematoxilina-eosina, 100X). SS: Solução Salina
Figura 2 - Área de infiltrado inflamatório (setas) em quatro animais
diferentes. Observar que em A (bupivacaína) e B (ropivacaína)
a área é maior que em C (levobupivacaína) e em D (SS
0,9%) (hematoxilina-eosina, 100X). SS: Solução Salina
Figura 3 - Área da cicatriz fibrosa corada em vermelho (setas) em quatro
animais diferentes. Observe que a área é maior em A
(levobupivacaína) e B (ropivacaína) do que em C (SS 0,9%) e D
(Bupivacaína) (tricrômico de Masson, 100X). SS:
Solução Salina
Figura 3 - Área da cicatriz fibrosa corada em vermelho (setas) em quatro
animais diferentes. Observe que a área é maior em A
(levobupivacaína) e B (ropivacaína) do que em C (SS 0,9%) e D
(Bupivacaína) (tricrômico de Masson, 100X). SS:
Solução Salina
Tabela 2 - Área de cicatriz fibrosa na ferida operatória após
aplicação de anestésico local e solução
salina nos diferentes grupos de animais.
Grupo
Animal
|
Área mediana (µm2)
|
Área Mínima (µm2)
|
Área Maxima (µm2)
|
Bupivacaína |
449402 |
146280 |
2016103,5 |
Controle de bupivacaína |
605389,5 |
47813,5 |
1251420,5 |
Levobupivacaína |
818835,5a,c |
346804 |
4741842 |
Levobupivacaína ao controle |
450434,0 |
116934 |
779886 |
Ropivacaína |
885409b,d |
295817 |
2599696 |
Controle de ropivacaína |
321682 |
207731 |
725589 |
SS
0,9%
|
530607,8 |
235281,5 |
1997949 |
SS 0,9% de controle |
501198,5 |
140366 |
1089956 |
Tabela 2 - Área de cicatriz fibrosa na ferida operatória após
aplicação de anestésico local e solução
salina nos diferentes grupos de animais.
A levobupivacaína foi associada à menor área de infiltrado
inflamatório e a uma das maiores áreas de cicatriz fibrosa. Essa
observação contradiz a concepção de que a intensidade do
infiltrado inflamatório define a extensão da formação da
cicatriz12. É
possível que o tipo de infiltrado inflamatório, mais do que sua
intensidade, esteja associado a uma área de cicatriz fibrosa maior ou menor,
o que não foi avaliado no presente estudo. A presença de infiltrado
inflamatório interfere diretamente na formação da cicatriz;
entretanto, diferentes tipos de células inflamatórias podem estar
presentes, e essas células podem, ou não, estimular a
produção de matriz extracelular. Outra possibilidade seria que o
volume ou trauma da aplicação, e não o AL em si, interferisse
no infiltrado inflamatório e na cicatriz fibrosa11, uma vez que não houve diferença
entre o grupo LA e o grupo que recebeu SS, uma solução aparentemente
inerte.
A aplicação de AL de longa duração na incisão para
analgesia pós-operatória tem sido associada à
redução das alterações induzidas por citocinas e,
além disso, minimiza a hiperalgesia14. Embora alguns estudos sugiram que essas drogas
também tenham propriedades antiinflamatórias15, nossos resultados demonstram que a
bupivacaína e a ropivacaína, principalmente a última,
estão associadas a um infiltrado inflamatório maior. Além
disso, a bupivacaína foi associada a uma área de
infiltração significativamente maior do que seu isômero
levogiro, a levobupivacaína.
Um estudo com ratos para avaliar processos inflamatórios e cicatriciais da
ferida após infiltração de AL de longa duração,
avaliando histologia e resistência à tração no terceiro
e décimo quarto dias, observou que, no terceiro dia, houve um aumento
significativo de macrófagos no grupo que recebeu bupivacaína.
Também foi observado que a concentração de colágeno
estava aumentada nos animais infiltrados com bupivacaína em
comparação com ropivacaína e SS. Não houve
diferença na resposta inflamatória da cicatriz, presença de
colágeno e resistência à tração no décimo
quarto dia. Os autores concluíram que as alterações causadas
pela infiltração do AL não se estendem além do terceiro
dia e, portanto, não prejudicam o processo de cicatrização de
feridas em ratos5. Nossos
resultados contradizem essa suposição.
Outro estudo sobre os efeitos da infiltração de AL no oitavo dia de
cicatrização em ratos demonstrou que tanto a bupivacaína quanto
a lidocaína reduziram a produção de colágeno e a
resistência à ruptura da cicatriz, causando edema,
vascularização e inflamação significativos quando
comparados aos controles4. Da mesma
forma, no presente estudo, observamos que a bupivacaína foi associada
à maior área de infiltrado inflamatório. Em
relação à cicatriz fibrosa, a bupivacaína parece
não interferir na cicatriz fibrosa. Por outro lado, seu isômero
levogiro, a levobupivacaína e a ropivacaína foram associados a
áreas maiores de cicatriz fibrosa.
Um estudo avaliando o efeito da lidocaína e da bupivacaína na
cicatrização de feridas em ratos sugeriu que, embora esses
anestésicos influenciassem a inflamação local e fatores
proteolíticos, nenhum efeito na cicatrização de feridas foi
observado16. Esses achados
concordam parcialmente com os nossos.
Outro estudo, com metodologia semelhante à nossa, comparou a quantidade de
colágeno e o número de mastócitos por morfometria em ratos
após injeção de lidocaína com adrenalina ou
tampão. Os autores concluíram que a lidocaína interfere no
colágeno e reduz a quantidade inicial de mastócitos na ferida
operatória17.
Dois estudos experimentais em ratos associando infiltração de
levobupivacaína com ibuprofeno e norepinefrina mostraram maior
regeneração da derme e epiderme, tecido de granulação e
angiogênese do que no grupo controle, sugerindo um aumento no processo
regenerativo/cicatrizante6 e aumento da angiogênese e
resistência à tração da cicatriz7. No entanto, ao contrário do
nosso estudo, a levobupivacaína foi associada a um anti-inflamatório
não hormonal e um vasopressor, o que poderia interferir na
cicatrização.
Em coelhos com infiltração de lidocaína e bupivacaína,
outros autores não encontraram diferença histopatológica quando
esses ALs foram comparados com solução salina e sugeriram que esses
ALs não afetam a cicatrização18.
Os ALs atuam inibindo diretamente as fibras nociceptivas da pele. Essas fibras,
juntamente com os melanócitos, neuropeptídeos e interleucinas, fazem
parte do sistema neuroendócrino cutâneo que, entre outras
funções, modulam a cicatrização cirúrgica,
principalmente a inflamação. Os ALs bloqueiam os impulsos neurais
temporariamente ao inibir a resposta neuroendócrina aos estímulos de
cicatrização de feridas e às sinalizações
relacionadas, interferindo negativamente na cicatrização de feridas.
Um dos neuropeptídeos que desempenha papel fundamental no sistema
neuroendócrino é a substância P, que controla a
degranulação dos mastócitos e a liberação de
proteínas inflamatórias no sítio cirúrgico. Essas
células atuam na cicatrização de feridas, promovendo resposta
inflamatória, angiogênese e reabsorção da matriz
extracelular. Além disso, eles regulam fatores de crescimento e
interleucinas, essenciais para a inflamação e para a fase
proliferativa da cicatrização de feridas19,20
Entre as diferentes proteínas de cicatrização de feridas, o
colágeno se correlaciona mais intimamente com a resistência do tecido
cicatricial. A quantidade de colágeno no local da cicatriz depende do
processo cicatricial e pode sofrer interferência do AL devido à
inibição durante a fase inflamatória
neurogênica21.
Como a infiltração de SS 0,9% foi associada a uma maior área de
infiltrado inflamatório e cicatriz fibrosa, questionamos se, além da
ação do AL ou do SS 0,9% no local da cicatriz, o efeito
mecânico (distensão) provocado pela infiltração
interfere na cicatrização da ferida, possibilidade já
descrita11.
Ao comparar a bupivacaína com seu isômero, a levobupivacaína, a
primeira foi associada à maior área de infiltrado e a última
às maiores áreas de cicatriz fibrosa e menor área de
infiltrado. Assim, essa modificação na molécula da
bupivacaína poderia ser responsável pela menor
inflamação e maior cicatriz fibrosa observada na ferida infiltrada com
levobupivacaína.
CONCLUSÃO
Os resultados do presente estudo indicam que o volume aplicado ou o trauma da
infiltração podem ter sido responsáveis pela maior área
de infiltrado e cicatriz fibrosa, e não o próprio AL. Estudos
complementares, incluindo estudos em humanos, avaliando a equipotência entre
o AL e a variação do volume aplicado, são necessários
para melhor compreender os mecanismos associados, principalmente na
avaliação da área de infiltrado inflamatório e fibrose
em diferentes estágios (dias) de cicatrização, o tipo de
infiltrado inflamatório e as citocinas envolvidas.
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1. Universidade Federal do Triângulo
Mineiro, Uberaba, MG, Brasil.
2. Universidade de Uberaba, Uberaba, MG,
Brasil.
Autor correspondente: Renata Margarida
Etchebehere, Rua Getúlio Guaritá 140, Bairro Abadia,
Uberaba, MG, Brasil, CEP 38025-440, E-mail:
renata.etchebehere@uftm.edu.br
Artigo submetido: 17/02/2021.
Artigo aceito: 19/04/2021.
Conflitos de interesse: não há.
Instituição: Hospital de Clínicas, Universidade Federal
do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG, Brasil..