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Case Report - Year2021 - Volume36 - Issue 1

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2021RBCP0016

RESUMO

Tromboses e tromboflebites superficiais de membros superiores são doenças frequentes e muitas vezes pouco valorizadas. Relatamos três pacientes no pós-operatório de cirurgias plásticas mamárias estéticas que apresentaram tromboflebite em membros superiores e que evoluíram com tromboembolismo pulmonar. Todas as pacientes apresentaram quadro clínico típico, com comprovação pelo Doppler ultrassonografia de trombose/flebite superficial de membros superiores e ausência de lesões em membros inferiores, bem como aumento de dímero-D e comprovação da embolia pulmonar por tomografia computadorizada ou cintilografia pulmonar. Os três casos evoluíram com melhora após anticoagulação e sem sequelas.

Palavras-chave: Tromboflebite; Trombose; Embolia pulmonar; Mamoplastia de aumento; Complicações pós-operatórias; Tromboembolia; Tromboembolia venosa

ABSTRACT

Superficial thrombosis and thrombophlebitis of the upper limbs are frequent and often underestimated diseases. We report three patients in the postoperative cosmetic breast plastic surgery period who presented thrombophlebitis in the upper limbs and who evolved with pulmonary thromboembolism. All patients had a typical clinical picture, with Doppler ultrasound evidence of thrombosis/superficial phlebitis of the upper limbs and absence of lesions in the lower limbs and an increase in D-dimer and evidence of pulmonary embolism by computed tomography or pulmonary scintigraphy. The three cases evolved with improvement after anticoagulation and without sequelae.

Keywords: Thrombophlebitis; Thrombosis; Pulmonary embolism; Augmentation mammoplasty; Postoperative complications; Thromboembolism; Venous thromboembolism


INTRODUÇÃO

Fenômenos tromboembólicos podem decorrer de tromboses e/ou tromboflebites venosas superficiais (TVS) de membros superiores1. A maioria das tromboses superficiais concorre também com flebite, ao contrário da trombose venosa profunda (TVP), onde a flebite pode estar ausente2. O tromboembolismo pulmonar (TEP) pode raramente estar relacionado a TVS de membros inferiores (MMII)1. Existem poucos relatos de TVS de membros superiores (MMSS) levando a TEP3-7 e não há casos descritos relacionados a cirurgias estéticas.

Neste artigo, relatamos 3 casos de pacientes submetidas à cirurgia plástica mamária estética que apresentaram TVS de MMSS confirmadas e que evoluíram com TEP.

RELATO DE CASO

Conferir Quadro 1.

Quadro 1 - Detalhes dos casos.
Tipo Caso 1 Caso 2 Caso 3
Cirurgia realizada Mastopexia de aumento retromuscular (dual plane) e abdominoplastia Mamoplastia de aumento retro
Muscular (dual plane)
Mamoplastia de aumento retro Muscular (dual plane)
Data cirurgia 19/12/2013 16/02/2016 Dia 09/8/2017
Local da cirurgia Hospital Metropolitano de Sarndi (PR) - Privado Hospital do Câncer - Maringá (PR) - Privado Hospital do Câncer - Maringá (PR) - Privado
Duração da cirurgia 5 horas e 30 min. 1h20 min. 1 hora
Tipo e Duração da anestesia Peridural e Geral 06h30min h Geral 1 h 50 min. Geral 1 h 30 min.
Uso de ACO Suspenso por 1 mês pré Operatório e após cirurgia Suspenso apenas após cirurgia Não usava
Quimio profilaxia Feito heparina no intraoperatorio e mantido por 4 dias de pos operatorio não realizada não realizada
Local de punção venosa membro superior DIREITO membro superior DIREITO membro superior ESQUERDO
Ultrassom de membros superirores tromboflebite de veias basílicas e braquiais BILATERALMENTE tromboflebite de basílica ESQUERDA a nível de cotovelo presença de imagem sugestiva de resíduos trombóticos oclusivos em veia mediana do cotovelo DIREITO
Ultrassom de membros inferiores ausência de trombos em vasos profundos e superficiais ausência de lesões em veias superficiais e profundas ausência de lesões em veias superficiais e profundas
Dímero D
*ref. positivo = ou > 500 ng/ml)
*FEU unidades equivalentes de fibrinogenio)
2110,00 ng/ml 810,0 ng/ml 4110 ng/ml
Tomografia pulmonar Sinais de Tromboembolismo pulmonar no terço distal da artéria pulmonar esquerda. Possíveis pequenos coágulos embolizando o segmento posterior do lobo inferior à direita Discretas opacidades basais bilaterais, podendo corresponder à opacidade de decúbito Sinais de TEP no segmento posteior do lobo inferior direito
Cintilografia pulomnar Não realizada 1. Presença de áreas focais, com diminuição da perfusão sanguínea, de padrão subsegmentar dispersas no segmento posterior do lobo superior direito, superior do lobo inferior direito, lateral do lobo médio e lateral do lobo inferior esquedro, de padrão subsegmentar, discordantes do padrão inalatório. Alta probabilidade de tromboembolismo pumonar. Não realizada
2 . Presença de áreas focais de hipocaptação do radiotraçador localizadas nas porções mais basais do pulmão direito, sugerindo processo parenquimatoso (atelectasia?)
Investigação para trombofilia Negativa POSITIVA, com diagnóstico de síndrome de anticorpo antifosfolípide (mutação pontual C677T : Mutado heterozigoto), anticorpos IgM Cardiolipina 64,0 MPL-U  e após 6 meses 57,0 MPL-U  (Positivo superior a 40) Negativa
Outros exames  - Ecocardiograma normal  -

ACO - Anticoncepcional Oral. FEU - Unidades equivalentes de fibrinogenio. TEP - Tromboembolismo Pulmonar.

Quadro 1 - Detalhes dos casos.

Caso 1. Paciente feminina 31 anos, sem comorbidades, submetida à mastopexia de aumento retromuscular e abdominoplastia sem lipoaspiração. Usou meias elásticas durante o procedimento e por mais 1 semana, dispositivo antitrombo por 24 horas, heparinização subcutânea no intra e pós-operatório por 4 dias (heparina de 10 a 15 mil U/dia) e contracepção suspensa por 30 dias previamente à cirurgia. Após 15 dias apresentou dor em membros superiores e no 18º dia dispneia súbita com diagnóstico de TEP (Figuras 1 e 2). Internada por 7 dias, 5 deles em unidade de terapia intensiva, para suplementação de oxigênio (sem intubação orotraqueal), observação e anticoagulação. Evoluiu sem sequelas.

Figura 1 - Caso 1: Tomografia Computadorizada Pulmonar: Seta indicando falha de enchimento em artéria pulmonar esquerda

Figura 2 - Caso 1: Tomografia Computadorizada Pulmonar: Seta indicando derrame pleural em lobo inferior esquerdo

Caso 2. Paciente feminina 35 anos, sem comorbidades, submetida à mamoplastia de aumento retromuscular. Sem queixas até o 10º dia de pós-operatório, apresentou quadro súbito dispneico, confirmando-se TEP (Figura 3). Internada por 3 dias para observação, suplementação de oxigênio (sem intubação orotraqueal) e anticoagulação. Evoluiu sem sequelas. Suspensão do anticoncepcional (ACO) apenas após a cirurgia.

Figura 3 - Caso 2: Cintilografia Pulmonar: Presença de áreas focais, com diminuição da perfusão sanguínea, de padrão subsegmentar dispersas no segmento posterior do lobo superior direito, superior do lobo inferior direito, lateral do lobo médio e lateral do lobo inferior esquerdo, de padrão subsegmentar, discordantes do padrão inalatório.

Caso 3. Paciente feminina 17 anos, sem comorbidades, submetida à mamoplastia de aumento retromuscular. Sem queixas até o 6º dia de pós-operatório, quando apresentou dispneia súbita, confirmando-se TEP (Figura 4). Esteve internada por 5 dias, dois em unidade de terapia intensiva, para observação, suplementação de oxigênio (sem intubação orotraqueal) e anticoagulação. Evoluiu sem sequelas. História familiar de embolia pós-operatória em avô e tio.

Figura 4 - Caso 3: Tomografia Computadorizada Pulmonar: Setas indicando falhas de enchimento em artérias segmentares de lobo inferior direito.

DISCUSSÃO

TEP é especialmente temido pós-cirurgias estéticas. Nos casos descritos, surpreende o fato da fonte embólica ser de MMSS (Figura 5).

Figura 5 - Representação esquemática das veias superficiais e profundas do membro superior

A TVS é doença frequente, geralmente identificando-se cordão palpável (melhor sinal com valor preditivo positivo), hiperemiado, doloroso e quente no trajeto da veia superficial1. Em casos mais graves de MMSS, pode estender-se até veias axilares. No caso 1 a trombose alcançou veias braquiais.

TEP secundário à TVS de membros superiores é raro na ausência de TVP4. A TVS provavelmente é pouco detectada e é pelo menos 2 a 3 vezes mais frequente que a profunda. Usualmente resolve-se de maneira espontânea. Em MMII as TVS evoluem em 20 a 33% para TEP assintomático e em 2 a 13% para sintomático. Não existem dados para MMSS.

Nos casos 1 e 3 a tomografia computadorizada (TC) foi compatível e no caso 2 a cintilografia pulmonar confirmou o diagnóstico de TEP (TC inconclusiva). A Doppler ultrassonografia de MMSS alterada associou-se à ausência de trombos em MMII. Confirmaram-se, portanto, TEPs decorrentes de TVS de membro superior (clínica compatível, dímero-D positivo e TC ou cintilografia pulmonar comprovando TEP)8. Ademais, as pacientes melhoraram após anticoagulação.

Como causa de fenômenos tromboembólicos de MMSS encontra-se especialmente o uso de cateteres venosos centrais (quimioterapia, antibioticoterapia prolongada ou nutrição parenteral) e também os cateteres venosos periféricos (muitas vezes “banalizados” na medicina convencional)9. Chama a atenção, nos casos 2 e 3, que a TVS foi contralateral ao membro puncionado, e no caso 1, bilateral.

Vários trabalhos sugerem escore preditivo de parâmetros de segurança em cirurgia plástica10,11. Entretanto, apenas no caso 1 a cirurgia teve duração de mais de 4 horas e nos demais foram próximo a 1 hora. Apesar das medidas preventivas para tromboembolismo, a paciente 1 apresentou TVS de MMSS bilateral que se estendeu para profunda, provavelmente pela imobilização prolongada e demora no diagnóstico.

A pesquisa de trombofilia pré-operatória é questionável (raridade destas situações e excessivo custo). Deve apenas ser realizada no caso de fenômenos tromboembólicos inexplicados9,12.

Trombofilia hereditária (Quadro 2) e uso de contraceptivos orais tem um risco maior de tromboembolismo, cerca de 2 a 20 vezes12. O caso 2 apresentava trombofilia adquirida (sem diagnóstico prévio) e uso de contracepção oral.

Quadro 2 - Classificação das trombofilias.
Classificação das trombofilias13
Hereditárias
Deficiência da antitrombina deficiência da proteína C Deficiência da proteína S deficiência de proteína Z
resistência APC (APCR)
Mutação fator V Leiden (R506Q)
Mutação do gene da protrombina G20210A
Mutação da MTHFR (variantes 677C>T e 1298A>C)
Mutação PAI-1 675G>A (4G/5G) e 844A>G
Disfibrinogenémias Fator IX elevado
Fator XI elevado
Adquiridas
Síndrome de anticorpos antifosfolípidos (SAAF)
Mistas/combinadas
Hiperhomocisteínemia atividade elevada do fator VIII aumento do fibrinogénio
Outras trombofilias
ACE Ins/del fibrinogénio (455G>A)
fator XIII (Val34Leu)
APOE (Cys112Arg e Arg158Cys)
EPCR (4678G/C)

APCR - Resitência à Proteina C ativada. ACE Ins/Del - Gene da enzima Conversora de Angiotensina inserção/deleção. MTHFR - Mutação da metilenotetrahidrofolato redutase.  PAI - inibidor do ativador do plasminogénio. APOE - Gene da apolipoproteina E. EPCR - Gene receptor da proteina C do endotélio.

Quadro 2 - Classificação das trombofilias.

Na literatura há descrição de caso de TEP por TVS em paciente usando hormonioterapia apenas4. Hormonioterapia ou contracepção oral aumenta em até quatro vezes a chance de tromboembolismo. Destarte a importância da suspensão hormonal, mesmo em casos de menor risco10.

A quimioprofilaxia mais importante na trombose venosa seria com agentes fibrinolíticos (heparina ou heparina de baixo peso molecular), enquanto na arterial se baseia no uso de antiagregantes plaquetários10.

A profilaxia mecânica (meias elásticas, aparelhos pneumáticos intermitentes) diminui a estase e distensão venosa. O aparelho pneumático tem pequena atividade fibrinolítica10. Indica-se iniciá-lo 30 minutos antes da indução anestésica até a alta do paciente, em cirurgias maiores que 1 hora10.

Não existem relatos de TEP pós-cirurgia plástica proveniente de TVS de MMSS, provavelmente porque em geral são casos leves ou assintomáticos. Entretanto, vários fatores poderiam justificar essas complicações:

    inadequada posição dos MMSS durante o intraoperatório;

    imobilização pós-operatória, especialmente em casos de implante mamário retromuscular (pós-operatório geralmente mais doloroso);

    imobilização exagerada dos membros e/ou flexão inapropriada dos mesmos, por exemplo, pelo tempo excessivo de dispositivos eletrônicos (aparelhos celulares ou computadores), levando a uma postura inadequada para a drenagem e consequente estase local. Nestes casos utilizou-se faixa elástica (para não deslocamento) acima das próteses.

CONCLUSÃO

A cirurgia estética de aumento mamário com implantes, embora usualmente não seja uma cirurgia longa, também pode levar a complicações não locais. A tromboflebite superficial, desencadeada pelo repouso em excesso e/ou pela punção venosa, muitas vezes é menosprezada e pode evoluir com trombose de vasos maiores ou mesmo TEP.

No pré-operatório, sugere-se seguir os protocolos de profilaxia para tromboembolismo. No intraoperatório, recomenda-se que a posição dos braços deva ser constantemente monitorizada, bem como o uso de meias elásticas, aparelho pneumático nos MMII e quimioprofilaxia. Sugere-se também no pós-operatório vigilância dos MMSS, para evitar o edema excessivo, e pesquisa ativa para tromboflebites.

REFERÊNCIAS

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12. Lima J, Borges A. Rastreio de trombofilias. Bol SPHM. 2012 Dez;27(4):5-11.











1. Clínica Dra.Márcia Balbina L. Hoyos, Cirurgia Plástica, Maringá, PR, Brasil.

Instituição: Rede de Assistência à Saude Metropolitana de Sarandi, Sarandi, PR, Brasil.

COLABORAÇÕES

MBLH Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados, Conceitualização, Concepção e desenho do estudo, Gerenciamento do Projeto, Investigação, Metodologia, Realização das operações e/ou experimentos, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Software, Supervisão, Validação, Visualização

Autor correspondente: Márcia Balbina Lorenzo Hoyos, Avenida Doutor Luiz Teixeira Mendes, 2418, Zona 05, Maringá, PR, Brasil. CEP: 87015-001. E-mail: mblhoyos@gmail.com

Artigo submetido: 20/11/2019.
Artigo aceito: 15/07/2020.

Conflitos de interesse: não há.

 

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