ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Case Reports - Year2000 - Volume15 - Issue 3

RESUMO

Os autores descrevem um caso de hemangioma gigante na palma da mão de uma criança tratada cirurgicamente com bom resultado e discutem a freqüência deste tumor em crianças, assim como as condutas propostas por diferentes escolas.

Palavras-chave: Hemangioma gigante; mão; criança

ABSTRACT

The authors discuss a case of hand giant hemangioma in a child, surgically treated with success. The frequency of this type of tumor in children, and the therapeutic options recommended by diffirent authors are discussed.

Keywords: Giant hemangioma; hand; child


INTRODUÇÃO

Os tumores localizados na palma da mão representam um desafio para o cirurgião por vários motivos. A mão é uma estrutura altamente especializada que representa para o homem um instrumento de relacionamento com o meio ambiente e com as outras pessoas, participando praticamente de todas as atividades humanas. Sua anatomia é complexa pela presença de várias estruturas funcionais em uma área pequena (tendões, nervos e vasos sangüíneos). Em uma abordagem cirúrgica deve-se ter grande cuidado para não lesar essas estruturas, ainda mais em crianças, nas quais é difícil identificá-las, o que poderia provocar seqüelas de grande impacto na qualidade de vida do paciente.

Watson e Mc Carthy(1), em 1940, escreveram que os hemangiomas representam 1/4 de todos os tumores da mão. Kransdorf(2), em 1994, publicou um estudo sobre tumores benignos, em que os hemangiomas representavam 13% das tumorações da mão na faixa etária de zero a quinze anos de idade. Mendel e Louis(3), em 1996, realizaram um estudo de tumorações vasculares em membros superiores, demostrando que o hemangioma é a quarta tumoração vascular mais freqüente da mão.

Outros autores, como Palmierí(4), Glanz(5), Weisman(6) e Milner(7), publicaram estudos sobre o tratamento cirúrgico dos hemangiomas na mão. Em 1986, Milner e Sykes(7) publicaram um trabalho mostrando a abordagem cirúrgica de hemangiomas cavernosos difusos na mão, o de maior diâmetro medindo 6 x 7 cm.

No presente trabalho, os autores relatam um caso de uma paciente de dez anos de idade com um hemangioma gigante na palma da mão, com sua abordagem cirúrgica e evolução pós-operatória, e comparam seus resultados com os de outros autores.


CASO CLÍNICO

S.M.O., paciente de sexo feminino com 10 anos de idade, apresentava quadro clínico compatível com uma tumoração de partes moles, com forma aproximadamente circular, medindo 10 cm de diâmetro e uma altura variando de 4 a 5 cm, estendendo-se por toda a palma da mão esquerda e invadindo o segundo espaço interdigital. Segundo a mãe, a criança apresentava uma "pintinha" na palma da mão ao nascer (Figs. 1 e 2).


Fig. 1 - Pré-operatório.


Fig. 2 - Pré-operatório.



Ao exame físico, a paciente mostrava uma incapacidade de flexão das articulações metacarpofalangeanas do segundo ao quinto dedo e limitação da flexão das interfalangeanas proximais e distais do segundo ao quinto dedo.

O raio X mostrou displasia da cabeça do segundo ao quinto metacarpiano, subluxação da articulação metacarpofalangiana do segundo dedo por conta da invasão do tumor no segundo espaço interdigital, microcalcificações distróficas distribuídas por toda a área tumoral; a angiografia mostrou invasão uniforme em toda a palma da mão (Fig. 3).


Fig. 3 - Aspecto radiológico. Perfil.



O ato operatório foi realizado com a paciente sob anestesia geral. Primeiramente, foi realizado um garroteamento após isquemia, tendo sido aspirado o sangue residual com seringa. Após incisão da pele da palma da mão seguindo as linhas de força, expostos os planos superficiais e identificadas as estruturas da região, foi realizada a dissecção cuidadosa da massa de coloração marrom-escura, liberando tendões, nervos e visualizando a artéria ulnar (Fig. 4). O tumor foi ressecado integralmente. Foi constatada intra-operatoriamente uma hipotrofia da musculatura palmar interóssea. Colocado um dreno de Penrose e realizado fechamento com mononylon 5/0 e curativo compressivo com elevação da mão.


Fig. 4a - Intra-Operatório.


Fig. 4b - Dissecção do tumor.



No 1º dia de pós-operatório, foi constatado grande hematoma, tendo sido indicada sua drenagem e revisão da hemostasia (Fig. 5). No 2º pós-operatório, a paciente apresentava muita dor e edema local e, no 3º dia, surgiram flictenas na região. Foi dado início então à fisioterapia passiva. No 8º dia de pós-operatório houve grande diminuição do edema e foi iniciada a fisioterapia ativa.


Fig. 5 - Pós-operatório 1º dia.



No 10º dia pós-operatório a paciente recebeu alta hospitalar, apresentando boa função de flexão das articulações, exceto a da metacarpofalangena do segundo dedo por displasia cápsulo-ligamentar (Fig. 6). O resultado do exame anatomopatológico revelou Hemangioma Cavernoso da Mão.


Fig. 6 - Pós-operatório 10º dia.


Fig. 7 - Pós-operatório 60 dias.


Fig. 8 - Pós-operatório 60 dias.



DISCUSSÃO

Existem controvérsias no tratamento dos hemangiomas devido ao fato de que grande porcentagem apresenta regressão espontânea. A decisão do tempo para o tratamento às vezes é prorrogada na esperança de que o tumor regrida. Duncan(8), em 1888, foi um dos primeiros a relatar a regressão espontânea em mais da metade dos tipos mistos de hemangiomas.

Na escolha pelo tratamento expectante, corre-se o risco de complicações, como ulceração, necrose, infecção secundária e hemorragia. Nos casos localizados na mão, o crescimento do tumor pode levar a seqüelas funcionais e, em casos extremos, à amputação do membro. Curado(9), em várias publicações, relata uma experiência de praticamente 100% de involução espontânea dos hemangiomas do tipo fragiformes, o que acontece poucas vezes nos hemangiomas cavernosos. Weisman(6), em 1959, determinou que lugar, tamanho e presença ou não ao nascimento não têm significância relacionada à involução do hemangioma.

Vários tratamentos foram sugeridos no passado, incluindo crioterapia, injeção intralesional de agentes esclerosantes e radiação; sendo também usados combinados com vários graus de sucesso. O uso de agentes esclerosantes na mão pode produzir fibrose, não sendo a radiação e a crioterapia tratamentos efetivos para esse tipo de lesões, devido ao seu efeito limitado e possível transformação maligna. Glanz(5), em 1969, relatou que as técnicas não cirúrgicas têm pouco espaço no tratamento de hemangiomas cavernosos, sendo a excisão cirúrgica o tipo de tratamento que produz melhores resultados.

O hemangioma cavernoso da mão geralmente é maior do que aparenta, isto porque tem a tendência de infiltrar profundamente as estruturas. Dificuldades no manejo deste tipo de malformações vasculares difusas têm sido extensamente reportadas, e sua ressecção cirúrgica requer uma cuidadosa dissecção. Sérias complicações não são incomuns, como as produzidas pela embolização pré-operatória, preconizada por alguns autores para diminuir o sangramento no momento da excisão. A alta taxa de recorrência, reportada por alguns autores, faz com que o tratamento cirúrgico deva ser considerado para situações específicas, como grandes massas tumorais ou quando existir limitação funcional. Weisman e Milner(6) promovem a ressecção parcial para alívio dos sintomas e um balanço entre ressecção cirúrgica agressiva e a prevenção das partes funcionais envolvidas.

No caso apresentado, devido à grande deformidade palmar e à limitação funcional da mão esquerda causada por um progressivo crescimento da massa tumoral, foi decidida a realização de uma ressecção cirúrgica cautelosa, pois, tratando-se da mão de uma criança, as estruturas anatômicas são menores e localizadas numa área limitada. Foram tomadas as precauções necessárias para a preservação das estruturas vitais, com resultados estéticos e funcionais satisfatórios.

Autores como Caroli e Zanasi(10)(1991) descreveram o tratamento cirúrgico como procedimento de eleição nos casos de grandes hemangiomas da mão, partindo de uma dissecção cuidadosa e preservando as estruturas vitais, mostrando uma baixa porcentagem de recidiva.

No pós-operatório, foi importante o acompanhamento diário para precocemente identificar e tratar as complicações. No 3º dia pós-operatório foi notado sofrimento da pele à custa de um hematoma que foi resolvido satisfatoriamente com drenagem cirúrgica.

Concluímos que é possível o tratamento cirúrgico de grandes hemangiomas da região palmar em crianças com bons resultados, apesar de ser um desafio cirúrgico.

No pós-operatório, o cirurgião não deve se entusiasmar em reintervir, para evitar necroses teciduais. Acreditamos que o tratamento cirúrgico é o mais indicado nos casos de pacientes com grandes sintomas e limitações funcionais, em que o rápido crescimento do tumor pode levar a seqüelas permanentes e até a amputação.


BIBLIOGRAFIA

1. WATSON WL, Mc CARTHY WD. Blood and lymph vessel tumors. Surgery, Gynecology and Obstetrics. 1940;71:569-572.

2. KRANSDORF MJ, JELINEK S, MOSER P. Soft-tissue masses: diagnosis using MR imaging. AJR. 1989;153:541-547.

3. MENDEL T, LOUIS D, ARBOR A. Major vascular malformations of the upper extremity: Long-term observation. J. Hand Surg. 1997;22A:302-306.

4. PALMIERI TJ. Subcutaneous hemangiomas of the hand. J. Hand Surg. 1985;10A:135-139.

5. GLANZ S. The surgical treatment of cavernous hemangiomas of the hand British J. of Plast. Surg. 1969;22:293.

6. WEISMAN P. Blood vessel tumors of the hand. Plast Reconstr. Surg. 1959;23:175-186.

7. MILNER RH, SYKES PJ. Diffuse cavernous haemangiomas of the upper limb. J. Hand Surg. 1987;12B:199-202.

8. DUNCAN J. Angioma and other papers. Edinburgh : Oliver & Boyd, 1900. p 13-4. Edited by James Hodson.

9. CURADO JH. Tratamento dos hemangiomas e linfangiomas. In: Mélega, Zanini, Psillakis. Cirurgia Plástica. São Paulo : Medsi, 1992. p. 177-89.

10. CAROLI A, ZANASI S, MARCUZZI M. Gli emangiomi della mano. Chir. Organi Mov. 1991(76);317-25.









I. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia.
II. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e Assistente do Instituto de Cirurgia Plástica Santa Cruz.
III. Membro Aspirante da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e Residente do Instituto de Cirurgia Plástica Santa Cruz.
IV. Membro Aspirante da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e Residente do Instituto de Cirurgia Plástica Santa Cruz.

Endereço para correspondência:
Jason César A. de Figueiredo
R. Santa Cruz, 398
São Paulo - SP - 04122-000
Fone/fax: (11) 575-9863

Trabalho realizado no Instituto de Cirurgia Plástica Santa Cruz, São Paulo - SP

 

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