INTRODUÇÃO
A abdominoplastia ou dermolipectomia abdominal é um dos procedimentos cirúrgicos mais
executados na Cirurgia Plástica e foi descrita há mais de um século por Kelly1, em 1899.
A lipoaspiração foi associada à dermolipectomia abdominal por Avelar², em 1998, e
posteriormente associada definitivamente como rotina por outros autores3-6.
Apesar da evolução das diversas técnicas e adaptações neste procedimento, ainda não
se conseguiu uma unanimidade na confecção da cicatriz umbilical, continuando a ser
um dos maiores desafios na harmonia da plástica abdominal.
Historicamente, a cicatriz umbilical divide o corpo humano exatamente ao meio,
conforme Marcus Vitruvius7, arquiteto romano,
que teve seu desenho aperfeiçoado por Leonardo da Vinci, em 1490. O desenvolvimento
da onfaloplastia iniciou-se em 1924, quando Frist8 realizou a primeira transposição de umbigo. Muitas formas, a partir
daí, foram utilizadas na tentativa de melhor se assemelhar a onfaloplastia à
cicatriz original.
Na década de 70, Baroud9 e Regnaut7 usaram incisões horizontais no retalho
abdominal, enquanto Avelar10, em 1978, a
incisão em estrela.
Várias técnicas foram descritas: Juri et al.11
defendiam incisão em forma de V, Massiha et al.12 adicionaram uma incisão umbilical circular e uma triangular no
retalho abdominal, Malic et al.13 já
utilizavam uma incisão em U invertido no retalho e, ainda, a de Castillo et al.14, que utilizavam retalhos de pele
desepitelizados em forma de Y.
Vários autores2,7,8,9,13,15 dispuseram das mais diversas formas geométricas (estrela de
“Mercedes”, losangos, elipses, cruzes, retângulos, forma de escudo, infinito, forma
de Y) na tentativa de obtenção de um resultado mais natural na confecção da cicatriz
umbilical, sem que haja ainda um consenso da melhor técnica.
OBJETIVO
Demonstrar a aplicabilidade e satisfação com a onfaloplastia em triangulo isósceles
com dupla fixação na abdominoplastia clássica.
MÉTODOS
Foram selecionadas 97 pacientes do gênero feminino, com idade média de 45 anos, (25
anos a 65 anos), no período de janeiro de 2014 a dezembro de 2015.
As cirurgias foram executadas no STK-Núcleo de Cirurgia Plástica em Belo Horizonte,
MG, pelo mesmo cirurgião.
Todas as pacientes se submeteram aos mesmos cuidados no pré, trans e
pós-operatórios.
Na execução deste trabalho foram seguidas as orientações dos princípios de
Helsinque.
Técnica cirúrgica
Promove-se liberação do umbigo do retalho abdominal através de uma incisão
triangular, de forma isósceles, com base superior medindo 2 cm e arestas medindo
2,5 cm (Figura 1A e B).
Figura 1 - A: Demarcação da cicatriz umbilical, ainda aderida
no retalho abdominal; B: Cicatriz umbilical base
superior medindo 2cm e arestas medindo 2,5cm.
Figura 1 - A: Demarcação da cicatriz umbilical, ainda aderida
no retalho abdominal; B: Cicatriz umbilical base
superior medindo 2cm e arestas medindo 2,5cm.
O retalho abdominal foi fixado provisoriamente na região suprapúbica (Figura 2).
Figura 2 - Fixação provisória do retalho dermogorduroso na região
púbica.
Figura 2 - Fixação provisória do retalho dermogorduroso na região
púbica.
A demarcação do novo sítio de implantação do umbigo iniciou-se com uma incisão
retilínea, horizontal, de 2 cm no retalho abdominal, no local de projeção da
cicatriz umbilical original na pele (Figura 3).
Figura 3 - Incisão retilínea, horizontal de 2cm, no retalho abdominal ao
nível da projeção da cicatriz umbilical original na pele.
Figura 3 - Incisão retilínea, horizontal de 2cm, no retalho abdominal ao
nível da projeção da cicatriz umbilical original na pele.
Retira-se, então, um triângulo de aproximadamente 0,5 cm do terço médio da borda
inferior desta incisão (Figura 4 A e B).
Figura 4 - A e B: Retirada de um triângulo de
aproximadamente 0,5cm do terço médio da borda inferior desta
incisão.
Figura 4 - A e B: Retirada de um triângulo de
aproximadamente 0,5cm do terço médio da borda inferior desta
incisão.
Uma vez feita a incisão na pele para o novo sítio umbilical, soltou-se o ponto de
fixação do retalho à região suprapúbica. Este retalho foi levantado com a
exposição da área de descolamento e do umbigo. Efetuou-se a fixação com nylon
monofilamentar 3-0, entre a região mediana da derme da borda superior da nova
incisão umbilical com a aponeurose dos retos abdominais na base superior do
pedículo umbilical (Figuras 5 e 6).
Figura 5 - Ponto de fixação, com nylon monofilamentar 3-0 entre a região
mediana da derme na porção superior da incisão do umbigo com a
aponeurose dos retos abdominais.
Figura 5 - Ponto de fixação, com nylon monofilamentar 3-0 entre a região
mediana da derme na porção superior da incisão do umbigo com a
aponeurose dos retos abdominais.
Figura 6 - Fixação do retalho abdominal superior à base cefálica do coto
umbilical.
Figura 6 - Fixação do retalho abdominal superior à base cefálica do coto
umbilical.
A seguir, uniu-se com um ponto em U, transcutâneo, a porção superior da nova
incisão umbilical à porção superior do umbigo (Figura 7), com o nó para dentro do umbigo.
Figura 7 - Ponto em U, transcutâneo, unindo-se à porção central da base do
umbigo na região subdérmica da porção superior incisão do
umbigo.
Figura 7 - Ponto em U, transcutâneo, unindo-se à porção central da base do
umbigo na região subdérmica da porção superior incisão do
umbigo.
Transfere se o umbigo através da incisão no retalho abdominal (Figura 8)
Figura 8 - Transferência do umbigo através da incisão do retalho
abdominal.
Figura 8 - Transferência do umbigo através da incisão do retalho
abdominal.
Fixam-se os ângulos do triângulo umbilical aos ângulos correspondentes da incisão
no retalho com nylon monofilamentar 4-0 (Figura 9).
Figura 9 - Fixação dos ângulos do triângulo umbilical aos ângulos da incisão
cutânea.
Figura 9 - Fixação dos ângulos do triângulo umbilical aos ângulos da incisão
cutânea.
Concluiu-se a sutura da cicatriz umbilical em seu novo sítio, com pontos
separados em U, utilizando-se nylon monofilamentar 4-0 com os nós para dentro da
cicatriz umbilical (Figura 10).
Figura 10 - Sutura da cicatriz umbilical em seu novo leito com pontos
separados em U.
Figura 10 - Sutura da cicatriz umbilical em seu novo leito com pontos
separados em U.
Para finalizar, fixa-se a porção inferior da nova incisão umbilical no retalho
abdominal à aponeurose dos retos abdominais na porção caudal do pedículo
umbilical, evitando-se o deslocamento do umbigo no pós-operatório e minimizando
a tração sobre a cicatriz umbilical (Figura 11).
Figura 11 - Fixação da porção infraumbilical do retalho abdominal às
aponeuroses dos retos abdominais na porção caudal do coto
umbilical.
Figura 11 - Fixação da porção infraumbilical do retalho abdominal às
aponeuroses dos retos abdominais na porção caudal do coto
umbilical.
O retalho abdominal foi então tracionado até a linha suprapubiana para sua
fixação definitiva. Foi utilizada órtese umbilical de silicone em todas as
pacientes.
RESULTADOS
As 97 pacientes submetidas à dermolipectomia abdominal clássica, com onfaloplastia
em
triângulo isósceles com dupla fixação, foram acompanhadas pelo período de até 12
meses. A avaliação foi feitas pelas próprias pacientes, por meio de um questionário
(Tabela 1), entregue às mesmas no término
de um ano, em que foi relacionado o grau de satisfação da cicatriz da
abdominoplastia, umbilical e se indicariam a cirurgia a uma amiga; também foram
estimuladas a anotarem alguma observação relativas à cirurgia em questão.
Tabela 1 - Descrição dos resultados obtidos em número e correspondente porcentagem
do grau de satisfação das pacientes e se indicariam ou não a cirurgia para
outras amigas.
|
Muito Satisfeita |
% |
Satisfeita |
% |
Pouco Satisfeita |
% |
Sim |
% |
Não |
% |
Como você classificaria a cicatriz do abdômen? |
83 |
85,5 |
08 |
8,2 |
06 |
6,1 |
|
|
|
|
Como você classificaria a cicatriz do umbigo? |
80 |
82,5 |
10 |
10,3 |
07 |
7,2 |
|
|
|
|
Você indicaria a cirurgia a uma amiga? |
|
|
|
|
|
|
92 |
94,8 |
05 |
5,1 |
Coloque alguma observação que achar pertinente |
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
Tabela 1 - Descrição dos resultados obtidos em número e correspondente porcentagem
do grau de satisfação das pacientes e se indicariam ou não a cirurgia para
outras amigas.
Obtivemos 85,5% das pacientes muito satisfeitas com o resultado final do
procedimento, 8,2% satisfeitas e 6,1% pouco satisfeitas. Com relação à cicatriz
umbilical, 82,5% se sentiram muito satisfeitas, 10,3% satisfeitas e 7,2% pouco
satisfeitas.
No quadro de alguma observação, apenas 11 pacientes relataram sobre o tamanho da
cicatriz da abdominoplastia e 18 queixaram da dor acentuada no pós-operatório.
O cirurgião acompanhou o pós-operatório aos 90, 180 e 360 dias, sendo que, após um
ano, avaliou a cicatriz umbilical com relação à posição no abdômen, tipos de
cicatrizes (atróficas, hipertróficas, estenoses) e profundidade, sendo que o
resultado geral se mostrou bastante satisfatório, com baixo índice de complicações,
nestas 97 pacientes submetidas à abdominoplastia (Figuras 12, 13, 14, 15).
Figura 12 - A: pré-operatório; B: Pós-operatório
imediato.
Figura 12 - A: pré-operatório; B: Pós-operatório
imediato.
Figura 13 - A: pré-operatório; B: Pós-operatório de 3
meses.
Figura 13 - A: pré-operatório; B: Pós-operatório de 3
meses.
Figura 14 - A: pré-operatório; B: Pós-operatório de 6
meses.
Figura 14 - A: pré-operatório; B: Pós-operatório de 6
meses.
Figura 15 - A: pré-operatório; B: Pós-operatório de 12
meses.
Figura 15 - A: pré-operatório; B: Pós-operatório de 12
meses.
As complicações encontradas estão no Tabela 2.
Tabela 2 - Complicações.
Complicações |
Quantidade |
Percentual |
Estenoses |
03 |
3,09% |
Cicatrizes Hipertróficas |
02 |
2,06% |
Cicatrizes Atróficas |
02 |
2,06% |
Necrose |
00 |
0% |
DISCUSSÃO
O grau de satisfação nos resultados das abdominoplastias geralmente é alto e ocorre
pela melhora observada quando se compara o resultado ao estado pré-operatório,
comprometido pela multiparidade e variações acentuadas de peso corporal.
Uma cicatriz umbilical de má qualidade compromete a satisfação da paciente pela
abdominoplastia, o que se torna um desafio para o cirurgião plástico a escolha de
uma técnica adequada, dentre as diversas já descritas na literatura médica.
Nesta técnica, acreditamos que os pontos de fixação do retalho abdominal à aponeurose
dos retos abdominais, superior e inferiormente ao umbigo evita a tração sobre a
cicatriz umbilical, favorecendo o processo cicatricial e promovendo uma evolução de
modo natural, com resultados bastante aceitáveis e muito semelhantes a uma cicatriz
umbilical ideal.
As sete pacientes que relataram pouca satisfação com relação à cicatriz umbilical
tiveram as mesmas refinadas cirurgicamente em um segundo tempo operatório. Neste
grupo, incluiu-se as duas pacientes com cicatriz alargada, duas pacientes com
cicatriz hipertrófica e três pacientes com estenoses. Outra paciente com estenose
não relatou descontentamento (avaliação feita somente pelo cirurgião). Todas as
outras pacientes relataram estar satisfeitas ou muito satisfeitas com a cicatriz
umbilical.
As cinco pacientes que relataram não indicar a cirurgia a outras amigas especificaram
que, mesmo orientadas no pré-operatório, acreditavam que a cicatriz ficaria menor.
Elas fizeram parte das oito pacientes com pouca satisfação com a cicatriz
abdominal.
Com relação a alguma observação, somente 11 pacientes relataram que, mesmo sendo
orientadas sobre as cicatrizes, elas imaginavam que ficariam diferentes. Outras 18
relataram sobre a dor pós-operatória.
CONCLUSÃO
A onfaloplastia em triângulo isósceles e com dupla fixação mostrou-se de fácil
execução, atingindo resultados mais naturais, anatômicos e satisfazendo as
pacientes.
COLABORAÇÕES
RC
|
Análise e/ou interpretação dos dados; análise estatística; aprovação
final do manuscrito; concepção e desenho do estudo; realização das
operações e/ou experimentos; redação do manuscrito ou revisão crítica de
seu conteúdo.
|
BVBLC
|
Análise e/ou interpretação dos dados; análise estatística; redação do
manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
|
REFERÊNCIAS
1. Kelly HA. Report of gynecological cases (excessive growth of fat).
Johns Hopkins Med J. 1899;10:197-201.
2. Avelar JM. Uma nova técnica de abdominoplastia: sistema vascular
fechado de retalho subdérmico dobrado sobre si mesmo, combinado com
lipoaspiração. Rev Bras Cir. 1999;88/89(1/6):3-20.
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aspiration. Chir Esthetic. 1982;59(2):73-8.
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lidocaine doses of 35 mg/kg for liposuction. J Dermatol Surg Oncol.
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8. Castro DPR, Saldanha OR, Pinto EBS, Albuquerque FM, Moia SMS.
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Bras Cir Plást. 2014;29(2):248-52
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13. Malic CC, Spyrou GE, Hough M, Fourie L. Patient satisfaction with
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14. Castillo PF, Sepúlveda CA, Prado AC, Troncoso AL, Villamán JJ.
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uma simples técnica retangular. Rev Bras Cir Plást.
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1. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São
Paulo, SP, Brasil
2. Universidade Estadual de Montes Claros, Montes
Claros, MG, Brasil
3. Faculdade de Medicina de Petrópolis, Faculdade
Arthur Sá Earp Neto, Petrópolis, RJ, Brasil.
Autor correspondente: Roney Campos Av
João César de Oliveira, nº 1298, sala 605 - Eldorado, Contagem, MG, Brazil CEP
32310-000 E-mail: roneycampos66@hotmail.com
Artigo submetido: 6/4/2017.
Artigo aceito: 27/11/2018.
Conflitos de interesse: não há.