INTRODUÇÃO
A endometriose é caracterizada pela presença de tecido endometrial fora da cavidade
uterina1. Acomete aproximadamente 12% das
mulheres em idade reprodutiva2, sendo os
principais locais de acometimento: ovários, fundo de saco, ligamento largo,
ligamentos uterossacros, útero, tubas uterinas, cólon sigmoide, apêndice e
ligamentos redondos1. A endometriose umbilical
representa apenas 0,5% a 1% de todos casos de endometriose2. Sua complicação maligna é rara, podendo acontecer em 1% dos
pacientes3.
Neste trabalho, apresentamos o caso de uma paciente com endometriose umbilical, seu
diagnóstico e tratamento realizado.
RELATO DO CASO
K.R.P., sexo feminino, 35 anos, foi encaminhada ao serviço de Cirurgia Plástica do
Hospital São Joaquim de Franca (SP) devido à presença de lesões vegetantes
umbilicais com surgimento há 6 meses. Ao exame, lesão grande, aparecimento mais
antigo, dolorosa à palpação, circundada por duas pequenas lesões, sendo todas
sangrantes e dolorosas no período menstrual (Figura 1). Foi realizada tomografia computadorizada de abdome, identificando
imagem de nódulo umbilical compatível com provável endometriose de umbigo (Figura 2).
Figura 1 - Paciente apresenta lesões vegetantes em umbigo. Cicatriz cirúrgica
devido ao uso anterior de "piercing".
Figura 1 - Paciente apresenta lesões vegetantes em umbigo. Cicatriz cirúrgica
devido ao uso anterior de "piercing".
Figura 2 - Tomografia computadorizada de abdome compatível com provável
endometriose de umbigo.
Figura 2 - Tomografia computadorizada de abdome compatível com provável
endometriose de umbigo.
O próximo passo foi a realização de biópsia da lesão maior, que evidenciou pele
associada a fragmentos de estroma e glândulas endometriais, sem sinais de
malignidade. Com os dados clínicos, análises tomográficas e o resultado da biópsia,
a hipótese de endometriose umbilical ficou evidente, sendo proposta a excisão da
lesão com margem de segurança (Figuras 3a,
3b e 3c), que foram enviadas à análise anatomopatológica, apresentando o
seguinte aspecto final após reconstrução de umbigo (Figura 3d e 3e).
Figura 3 - A: Incisão cirúrgica inicial; B: Retirada
das lesões com margens livres; C: Peça final retirada,
comparando-se ao tamanho do bisturi; D: Aspecto final após
reconstrução parcial de umbigo; E: Aspecto final, no pós
operatório, da reconstrução parcial de umbigo.
Figura 3 - A: Incisão cirúrgica inicial; B: Retirada
das lesões com margens livres; C: Peça final retirada,
comparando-se ao tamanho do bisturi; D: Aspecto final após
reconstrução parcial de umbigo; E: Aspecto final, no pós
operatório, da reconstrução parcial de umbigo.
DISCUSSÃO
A endometriose cutânea é uma entidade rara e na maioria dos casos está relacionada
a
procedimentos cirúrgicos prévios. Quando esta afecção ocorre espontaneamente, é
classificada como primária, como a do caso em questão. Dentre as manifestações
cutâneas, a localização umbilical é a mais prevalente, ocorrendo em 34% dos
casos1,4,5.
Há várias teorias que tentam explicar a fisiopatologia da endometriose umbilical
primária. A mais aceita nas mulheres que apresentam endometriose pélvica
concomitante é a que se refere à embolização de tecido endometrial por via
hematogênica ou linfática. Mas nas pacientes que apresentam apenas o tipo cutâneo,
a
teoria da metaplasia do remanescente do ducto de Müller é a mais provável; esta
ocorreria devido a estímulos inflamatórios, hormonais ou traumáticos2,4.
Essas lesões podem apresentar sintomatologia específica, como massa palpável de
coloração acastanhada, eritematosa ou violácea, que apresenta aumento de volume, dor
e sangramento cíclicos (durante o período menstrual) ou podem ser assintomáticas,
casos em que o diagnóstico é mais difícil2,4. No caso em questão
a paciente apresentou sinais e sintomas condizentes com dados da literatura, como:
massa acastanhada/violácea associada a dor e sangramento no período menstrual.
Para o diagnóstico, é utilizado o quadro clínico compatível associado a exames
complementares. A ultrassonografia pode ser realizada, revelando um aspecto cístico.
A tomografia computadorizada e a ressonância magnética são melhores para delimitação
da lesão, assim como para o diagnóstico diferencial1,2.
Mesmo com vários métodos possíveis para o diagnóstico, o mais confiável e de certeza
é a biópsia da lesão. Este estudo histopatológico revela a presença de tecido
endometrial, com glândulas endometriais revestidas por epitélio colunar
pseudoestratificado que podem apresentar secreção ativa ou, também, presença de
eritrócitos livres. A imunohistoquímica pode ser utilizada para pesquisar a presença
de receptores de estrogênio e progesterona, o que confirma ainda mais o
diagnóstico2,4.
Deve ser realizado diagnóstico diferencial com afecções benignas e malignas, como:
hérnias, aprisionamento dos nervos ilioinguinal ou iliohipogástrico, pólipo
umbilical, nevo melanocítico, granuloma de sutura, hemangiomas, onfalites, melanoma,
adenocarcinomas, carcinoma escamoso e carcinoma de células basais1,2,5.
O tratamento de escolha é cirúrgico com excisão total da lesão e reconstrução
umbilical, se necessária. É importante a retirada do nódulo com margens de segurança
para evitar a recidiva da lesão. Após o procedimento, pode ser realizado o
tratamento clínico com o uso de anticoncepcionais orais ou outros medicamentos de
ação hormonal para evitar recorrência1,2,4.
Na maioria dos casos a evolução é benigna, mas em raros relatos há transformação
carcinomatosa, o que torna necessária a avaliação frequente4.
CONCLUSÃO
A alteração descrita possui excelente prognóstico e baixo risco de malignização. Esta
evolução favorável é dependente de um manejo adequado da paciente; neste processo,
a
exclusão de diagnósticos diferenciais, sejam estes benignos ou malignos, é uma etapa
mandatória para a definição de um diagnóstico correto e a adoção de um tratamento
adequado.
COLABORAÇÕES
CBM
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Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
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AMG
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Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
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ACV
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Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
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ARM
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Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
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BAA
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Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
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ADBM
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Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
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ABFB
|
Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
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AAR
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Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
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GNM
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Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
realização das operações e/ou experimentos; redação do manuscrito ou
revisão crítica de seu conteúdo.
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REFERÊNCIAS
1. Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia
(FEBRASGO). Manual de endometriose. São Paulo: FEBRASGO; 2015.
2. Jaime TJ, Jaime TJ, Ormiga P, Leal F, Nogueira OM, Rodrigues N.
Endometriose umbilical: relato de um caso e seus achados dermatoscópicos. An
Bras Dermatol. 2013;88(1):121-4. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0365-05962013000100019
3. Pramanik SR, Mondal S, Paul S, Joycerani D. Primary umbilical
endometriosis: A rarity. J Hum Reprod Sci. 2014;7(4):269-71. DOI: http://dx.doi.org/10.4103/0974-1208.147495
4. Fancellu A, Pinna A, Manca A, Capobianco G, Porcu A. Primary
umbilical endometriosis. Case report and discussion on management options. Int J
Surg Case Rep. 2013;4(12):1145-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.ijscr.2013.11.001
5. Garcia AMC, Silveira PS Jr, Garcia BGBC, Assis MG. Endometriose
cutânea umbilical: Relato de caso e revisão da literatura. ACM Arq Catarin Med.
2009;38(Supl. 1):254-6.
1. Acadêmica em Medicina, Universidade de Franca,
Franca, SP, Brasil.
2. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São
Paulo, SP, Brasil.
3. Associação Médica Brasileira, São Paulo, SP,
Brasil.
Autor correspondente: Carla Batista
Moisés, Rua João da Silva Ranhel, 1850, Apt. 304, Bloco 1 - Nucleo
Agricola Alpha - Franca, SP, Brasil. CEP 14403-175. E-mail:
carlabmoises@live.com
Artigo submetido: 23/11/2017.
Artigo aceito: 22/06/2018.
Conflitos de interesse: não há.