INTRODUÇÃO
O câncer de mama é afecção de grande relevância para a saúde pública. Configura-se
como o câncer de maior prevalência no sexo feminino, desde que excluídos os cânceres
de pele do tipo não melanoma, além de representar a segunda causa de morte por
câncer em mulheres, estando atrás apenas do câncer de pulmão.
De acordo com a American Cancer Society, para o ano de 2017, eram
estimados 316.120 casos novos de câncer de mama nos Estados Unidos1. No Brasil, de acordo com dados do Instituto
Nacional do Câncer, foram estimados 57.960 novos casos no ano de 20162.
A taxa de mortalidade tem se mostrado estável em mulheres com menos de 50 anos,
todavia, vem caindo naquelas com mais idade; acredita-se que em função do maior
acesso à informação por parte da população, do diagnóstico mais precoce e da
melhoria nas modalidades de tratamento3.
A cirurgia de mastectomia é parte fundamental do tratamento e restaurar a mama por
meio de cirurgia plástica ajuda as mulheres acometidas a preservarem melhor sua
autoestima, além de ser um direito garantido por lei no Brasil desde 19994. A reconstrução mamária não atrapalha as
etapas sequenciais do tratamento e não compromete a detecção de recidivas
locais5. Diversas técnicas de reconstrução
mamária estão descritas na literatura, todavia, uma avaliação individualizada irá
definir a técnica melhor indicada para cada paciente.
A utilização do retalho miocutâneo do músculo grande dorsal (RMGD) para a cobertura
de defeitos causados pela mastectomia foi inicialmente descrita por Tansini, no ano
de 1906. Entretanto, apenas em 1978, com Bostwick, é que se utilizou este retalho
com a finalidade de se reconstruir a mama6.
Desde então, esta técnica vem sendo utilizada como um verdadeiro cavalo de batalha
na
cirurgia plástica. A utilização do implante mamário de silicone ajudou a restaurar
o
volume da neomama, uma vez que o retalho em si costuma não prover partes moles
suficientes para recriar o monte mamário. Como o músculo grande dorsal situa-se na
porção posterior do tronco, sua utilização para reconstrução mamária pode demandar
mudança de decúbito durante o procedimento, o que aumenta o tempo cirúrgico com suas
implicações.
A realização desta cirurgia em decúbito lateral tem a vantagem de dispensar a mudança
de decúbito, tornando o procedimento mais breve, porém exige familiarização
anatômica por parte do cirurgião, não só com relação às estruturas a serem
dissecadas, como também com relação à posição em que o retalho será suturado ao
sítio receptor e à adequação para melhor customização do envelope cutâneo mamário
remanescente.
A sistematização deste procedimento em decúbito lateral envolve elementos que vão
desde o posicionamento da paciente na mesa de cirurgia até a descrição dos detalhes
de dissecção e customização da ilha e do envelope cutâneos, configurando uma
sequência pré- determinada que, juntamente à falta de necessidade de mudança de
decúbito, tornam o ato cirúrgico mais breve e sem prejuízos ao resultado final.
OBJETIVO
O objetivo do estudo é apresentar tal sistematização com a exposição de uma série
de
casos.
MÉTODO
Trata-se de estudo primário retrospectivo realizado por meio de análise de
prontuários e documentação fotográfica de pacientes submetidas à reconstrução
mamária com utilização do retalho miocutâneo do músculo grande dorsal com implante
de silicone em decúbito lateral entre outubro de 2015 e abril de 2017, operadas pelo
autor, em clínica privada e dois serviços públicos nos quais atua como cirurgião
plástico (Hospital Napoleão Laureano-PB e Hospital das Clínicas-PE). Os princípios
da Declaração de Helsinki, revisada em 2000, e da Resolução 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde foram devidamente seguidos.
Critérios de inclusão
Pacientes mastectomizadas por câncer de mama submetidas à reconstrução mamária
imediata ou tardia através da utilização do retalho miocutâneo do músculo grande
dorsal com implante de silicone em decúbito único lateral entre outubro de 2015
e abril de 2017, operadas pelo autor.
Critérios de exclusão
Pacientes tabagistas, com Índice de Massa Corporal maior ou igual a
30kg/m2 e/ou que perderam o seguimento mínimo de três meses de
pós-operatório.
Sistematização cirúrgica
A paciente deve ser posicionada em decúbito lateral, com o membro ipsilateral
abduzido a 90 graus e fixado a um arco revestido por tecido através de atadura.
Um pequeno coxim deve ficar abaixo do tórax, bem como entre os joelhos e
apoiando a cabeça. O quadril deve ficar estabilizado à mesa cirúrgica come
esparadrapo largo ou faixa apropriada para cirurgias em decúbito lateral. Mantas
térmicas e perneiras de compressão pneumática gradual são recomendadas. A ilha
de pele no dorso é marcada transversalmente, com seu eixo seguindo a projeção do
sulco inframamário correspondente, o que garante que a cicatriz final fique
escondida na alça posterior do sutiã (Figura 1).
Figura 1 - Posicionamento da paciente.
Figura 1 - Posicionamento da paciente.
Outras orientações da ilha de pele podem ser projetadas a depender da localização
do defeito no tórax anterior. As dimensões costumam medir 17x7 centímetros. Caso
a reconstrução seja tardia, inicia-se a cirurgia com a retirada da cicatriz
prévia de mastectomia e dissecção do sítio receptor em nível junto à fáscia do
músculo peitoral maior, inferiormente até a projeção do sulco inframamário
prévio, superiormente até cerca de 3cm da clavícula, medialmente até 1,5cm da
borda esternal e lateralmente até a projeção da linha axilar média.
Nos casos de reconstrução imediata a cirurgia inicia-se com a incisão da ilha de
pele, preservando um pouco da fáscia de Scarpa superiormente e inferiormente a
ela, passando então a dissecção ao plano rente ao músculo grande dorsal.
Medialmente, a dissecção deve estender-se até a palpação dos processos
transversos vertebrais, lateralmente até um pouco além do limite entre os
músculos grande dorsal e serrátil anterior, inferiormente até a identificação da
expansão aponeurótica do músculo grande dorsal junto à crista ilíaca.
A dissecção superior é realizada mais adiante. Com o auxílio de uma pinça de
Nelson e do bisturi elétrico, é possível liberar toda a inserção lateral do
músculo grande dorsal nos limites já dissecados, prosseguindo-se para a
liberação no limite inferior e, ao se erguer o músculo liberado, torna-se fácil
incisar sua origem junto à coluna vertebral. Neste momento o músculo mostra-se
plano, largo e com sua espessura mediana característica.
Ao ascender com a dissecção é importante identificar e preservar no sítio doador
estruturas que não são necessárias à reconstrução, a exemplo da fáscia gordurosa
subjacente ao músculo grande dorsal e a porção do músculo trapézio que se
sobrepõe medialmente (Figura 2).
Preservadas estas estruturas, a dissecção sobre o músculo grande dorsal deve ser
complementada até próximo de sua inserção no úmero, sendo a liberação da mesma
opcional, havendo risco de torção do pedículo em determinados casos; sua
vantagem, todavia, é diminuir o volume final de tecidos na região axilar.
Figura 2 - Fáscia gordurosa subjacente ao músculo grande dorsal.
Figura 2 - Fáscia gordurosa subjacente ao músculo grande dorsal.
Neste momento o músculo já deve estar completamente liberado em suas porções
inferior e medial, restando complementar a liberação lateral, que deve ser
cuidadosa junto à região axilar, uma vez que o pedículo com os vasos
toracodorsais encontra-se nesta região. O detalhe anatômico é que esta liberação
deve ocorrer por sobre o músculo, uma vez que o pedículo penetra o mesmo através
de sua superfície profunda, sendo que a dissecção neste plano profundo poderá se
estender até um pouco além do achado anatômico vascular denominado “pata de
ganso”, que contém ramos destinados ao músculo serrátil anterior e denota
proximidade ao pedículo toracodorsal (Figura 3).
Figura 3 - Retalho elevado demonstrando o achado anatômico conhecido por
“pata de ganso”.
Figura 3 - Retalho elevado demonstrando o achado anatômico conhecido por
“pata de ganso”.
Estando o músculo dissecado, deve-se confeccionar um túnel através da fáscia
axilar de cerca de 6cm de largura, aproximadamente na altura da linha de
implantação dos pelos axilares (Figura 4).
Com cuidado para não torcer o músculo, o mesmo é rotacionado para o sítio
receptor através de tração anterior com uma pinça Allis (Figura 5).
Figura 4 - Retalho dissecado, com pedículo preservado e túnel infra-axilar
na porção superior.
Figura 4 - Retalho dissecado, com pedículo preservado e túnel infra-axilar
na porção superior.
Figura 5 - Retalho rotacionado para o sítio receptor e pronto para ser
suturado, confeccionando uma loja para o implante de
silicone.
Figura 5 - Retalho rotacionado para o sítio receptor e pronto para ser
suturado, confeccionando uma loja para o implante de
silicone.
Neste momento pode-se proceder à síntese do sítio doador através da associação de
pontos de adesão com vicryl 2.0 e drenagem aspirativa com drenos de calibre 4.8.
Confecciona-se a bolsa para o implante mamário fixando-se o músculo aos limites
dissecados com uso de nylon 2.0.
O implante é banhado em solução antibiótica de cefazolina 1 grama e gentamicina
80 miligramas e então posicionado na bolsa, concluindo-se a sutura da mesma. A
ilha de pele e o envelope cutâneo mamário remanescente devem ser customizados
para que a neomama tenha uma leve ptose, o que confere maior naturalidade ao
resultado (Figura 6). O sítio receptor
também deve ser drenado, neste caso com dreno aspirativo de calibre 6.4. Os
drenos são removidos no pós-operatório ao atingirem débito diário inferior a 40
mililitros.
Figura 6 - Aspecto imediato após customização das peles do retalho e da
mastectomia.
Figura 6 - Aspecto imediato após customização das peles do retalho e da
mastectomia.
RESULTADOS
Foram operadas 29 pacientes no período do estudo, com acompanhamento pós-operatório
mínimo de três meses. A média de idade foi de 47,22 anos, sendo a mais jovem
paciente de 28 anos e a mais idosa de 76 anos (Tabela 1).
Tabela 1 - Distribuição com relação a idade e volume dos implantes mamários
Variável |
Maior valor |
Menor valor |
Média |
Idade |
76 anos |
28 anos |
47,22 anos |
Implante mamário |
390 cc |
280 cc |
318 cc |
Tabela 1 - Distribuição com relação a idade e volume dos implantes mamários
Não houve pacientes que se submeteram a quimioterapia neoadjuvante. Com relação às
comorbidades encontradas houve 3 casos de hipertensão arterial sistêmica e 1 caso
de
fibromialgia (Tabela 2).
Tabela 2 - Distribuição com relação às comorbidades
Variável |
Número absoluto |
Indice relativo |
Hipertensão arterial |
3 |
10,5% |
Fibromialgia |
1 |
3,556 |
Tabela 2 - Distribuição com relação às comorbidades
O momento da cirurgia reconstrutora foi decidido em conjunto com a equipe de
mastologistas, sendo 26 reconstruções imediatas e 3 reconstruções tardias. Não houve
reconstruções bilaterais. Os implantes mamários utilizados foram de formato redondo
em 28 casos e anatômico em 1. Os volumes variaram de 260cc a 390cc, com média de
318cc. O tempo médio de cirurgia foi de 1h45m (Tabela 1).
O período de internação hospitalar foi uniforme, com alta no segundo dia de
pós-operatório. Os drenos foram retirados quando o débito diário ficou abaixo de 40
mililitros, com média de 10 dias de pós-operatório, todavia, não ultrapassando 14
dias.
Com relação às complicações, houve um caso de seroma no sítio receptor (3,5%), que
cursou também com infecção local sem sucesso à antibioticoterapia, resultando em
extrusão do implante mamário.
Uma paciente (3,5%) teve necrose parcial da ilha de pele do retalho e celulite local,
com resolução após desbridamento, antibioticoterapia e curativos. A causa da necrose
pode ser atribuída ao pequeno segmento cutâneo descolado do músculo para melhor se
adaptar ao defeito no sítio receptor. Duas pacientes (7,0%) tiveram sofrimento do
envelope cutâneo remanescente da mama, sem maiores repercussões clínicas. Nestes
três casos as medidas conservadoras foram suficientes, uma vez que o implante
mamário, nesta técnica, fica completamente coberto pelo músculo grande dorsal,
fornecendo proteção em casos de necrose cutânea e evitando contaminação externa.
Uma paciente (3,5%) teve extensa recidiva local e seu implante foi retirado por
solicitação da equipe de radioterapia em função de protocolo terapêutico de resgate.
Uma paciente (3,5%) submetida à radioterapia adjuvante cursou com contratura
capsular do tipo Baker III após 18 meses da reconstrução mamária.
Quatro pacientes (14%) foram submetidas a revisões de suas cicatrizes.
Ao exame clínico, uma paciente (3,5%) cursou com seroma no dorso, tendo se resolvido
com punções aspirativas. Exames de imagem não foram solicitados rotineiramente para
avaliar esta condição.
Três pacientes (10,5%) ficaram com limitação funcional à abdução na articulação do
ombro ipsilateral, sendo uma delas diagnosticada com escápula alada; as mesmas foram
encaminhadas para acompanhamento com fisioterapeuta (Tabela 3).
Tabela 3 - Distribuição com relação às complicações
Variável |
Número absoluto |
Indice relativo |
Infecção |
2 |
7,0% |
Necrose cutânea |
3 |
10,5% |
Extrusão do implante |
1 |
3,5% |
Remoção do implante |
1 |
3,5% |
Seroma no sitio receptor |
1 |
3,5% |
Seroma no sitio doador |
1 |
3,5% |
Contratura capsular |
1 |
3,5% |
Revisão de cicatriz |
4 |
14% |
Déficit articular funcional |
3 |
10,5% |
Tabela 3 - Distribuição com relação às complicações
Resultados pós-operatórios podem ser vistos nas Figuras de 7 a 9.
Figura 7 - Pré-operatório e sexto mês de pós-operatório. Reconstrução
tardia.
Figura 7 - Pré-operatório e sexto mês de pós-operatório. Reconstrução
tardia.
Figura 8 - Pré-operatório e terceiro mês de pós-operatório. Reconstrução
imediata.
Figura 8 - Pré-operatório e terceiro mês de pós-operatório. Reconstrução
imediata.
Figura 9 - Pacientes no sexto mês de pós-operatório.
Figura 9 - Pacientes no sexto mês de pós-operatório.
DISCUSSÃO
O tratamento cirúrgico do câncer de mama evoluiu ao longo do tempo. Em 1894, Halsted
descreveu o primeiro tratamento eficaz para o câncer de mama com a mastectomia
radical clássica. No ano de 1948, Patey, por meio de estudos comparativos, notou que
a preservação do músculo peitoral maior não comprometia o controle local do tumor,
surgindo então o termo mastectomia radical modificada.
À medida que o tratamento sistêmico adjuvante ganhou importância, houve a
possibilidade de cirurgias conservadoras da mama, preservando linfonodos e até mesmo
segmentos do parênquima mamário6. Assim também
ocorreu com a reconstrução mamária. Apesar de descrito em 1906, por Tansini, apenas
na década de 1970 que cirurgiões como Schneider e Bostwick descreveram o retalho
miocutâneo do músculo grande dorsal com a finalidade de reconstruir a mama.
Neste meio tempo o retalho foi utilizado para a cobertura de defeitos na parede
torácica, seja para cobrir defeitos da extirpação cirúrgica da mama, seja para
tratar sequelas causadas pela radioterapia. O advento dos implantes mamários entre
as décadas de 60 e 70 ajudou a recuperar o volume mamário perdido quando associado
ao RMGD. Técnicas que se valem exclusivamente de tecidos autólogos, a exemplo do uso
do retalho transverso do músculo reto abdominal (TRAM) e retalhos microcirúrgicos,
bem como outras que usam apenas o material aloplástico posicionado por baixo dos
músculos da região torácica anterior, foram descritas por cirurgiões que visavam
alternativas que pudessem se adaptar a cada caso.
O RMGD não só resistiu ao longo do tempo, como também ganhou popularidade e é
utilizado como um verdadeiro cavalo de batalha por um grande número de cirurgiões
plásticos. A anatomia tem poucas variações descritas, com pedículo de calibre
confiável e largura muscular ampla, que permite total cobertura de implantes
mamários, mesmo que volumosos. Além disso, a morbidade na área doadora é pequena,
como déficit funcional na articulação do ombro, seromas ou dor persistente no
dorso.
A aplicabilidade do RMGD é vasta; situações como cobertura fina de partes moles na
região da mama, parede torácica anterior irradiada, ressecção prévia do peitoral
maior, mama contralateral ptótica ou de tamanho pequeno a moderado, reconstrução
prévia sem sucesso com implante mamário exclusivo, cirurgias prévias no abdome ou
falta de experiência em técnicas microcirúrgicas são situações em que o RMGD pode
ser utilizado.
A ilha de pele no dorso pode ser ampla, todavia, para fechamento primário a largura
pode chegar até 9cm e comprimento de 18cm. Retalhos de 17x7cm costumam ser
suficientes. Compartimentos gordurosos no dorso foram descritos na década de 90 por
Delay et al.7, com o objetivo de incorporar
maior quantidade de fáscia gordurosa ao retalho e reconstruir mamas de tamanho
pequeno a médio sem a necessidade de implantes, todavia, defeitos de contorno e
formação de seroma na área doadora fizeram diminuir o interesse por esta
técnica8.
Quantidades moderadas desta fáscia gordurosa podem ser mobilizadas com o RMGD com
o
objetivo de melhorar a consistência e o contorno da neomama, permitindo uma
transição mais suave e menos marcada em seu polo superior, conforme descrito por
Tavares-Filho et al.9. Novas gerações de
implantes mamários, com gel de alta coesividade, conferem maior estabilidade ao
formato mamário e melhor consistência ao toque, acarretando bom resultado estético
à
reconstrução associada ao RMGD, mesmo sem coleta excessiva de fáscia gordurosa10.
A reconstrução mamária com o RMGD pode ser feita tanto de forma tardia quanto
imediata (no mesmo momento da mastectomia). O decúbito para esta cirurgia pode
variar. Para os cirurgiões que optam por realizar colher o RMGD em decúbito ventral,
há a necessidade de mudar a posição da paciente pelo menos uma vez em casos de
reconstrução tardia ou mesmo duas vezes nos casos de reconstrução imediata.
Ao optar pelo decúbito lateral, esta mudança ocorre apenas uma vez nas reconstruções
imediatas e torna-se desnecessária nas reconstruções tardias. Mudanças de decúbito
trazem o risco de lesões articulares, ligamentares ou mesmo nervosas; além disso,
demandam maior quantidade de material cirúrgico (novos campos estéreis) e aumentam
o
tempo total da cirurgia, com todas as suas potenciais implicações mórbidas
(infecção, eventos tromboembólicos, hipotermia, etc) e financeiras (tempo de sala
cirúrgica e medicações anestésicas, por exemplo), sendo necessários estudos
específicos para quantificar tais variáveis.
A sistematização da técnica cirúrgica permite ao cirurgião seguir uma sequência
determinada que resulta em minimização da perda de tempo. A mesma inicia-se com a
orientação e treinamento dos auxiliares de enfermagem que irão posicionar a
paciente, tornando este momento dinâmico, breve e seguro. O ato cirúrgico segue o
passo-a-passo descrito, de modo que o cirurgião auxiliar e o instrumentador sabem
exatamente a sequência de apresentações e instrumentais utilizados.
Como desvantagem, é possível citar que alguns cirurgiões podem demorar a se
familiarizar com a dissecção em posicionamento diferente do habitual decúbito
dorsal, além de dificuldades em customizar adequadamente a ilha de pele e o envelope
cutâneo mamário remanescente, que se apresentam levemente pendentes para medial. O
resultado final pode ser uma neomama de volume satisfatório, todavia, com ptose
excessiva e/ou posicionamento acentuadamente excêntrico da ilha de pele.
A literatura mostra que o índice de complicações para esta cirurgia é baixo. Seroma
no sítio doador costuma ser complicação razoavelmente comum, com trabalhos mostrando
índices que variam de 16% a 79%11. A
associação de pontos de adesão e drenos aspirativos pode ter justificado o baixo
índice de seroma observado, o que corrobora os dados apresentados por Cammarota et
al. em sua publicação de 201612.
Outras complicações são descritas com índices menores: 3,3% de infecções cutâneas,
1,3% de necrose do retalho, 0,6% de deiscência da ferida operatória e 3,2% de
complicações clínicas12. Uma casuística maior
poderia mostrar melhor aproximação do índice de complicações observado àqueles
publicados na literatura.
Os índices de contratura capsular são variáveis, oscilando de 6% até 68%13,14. Seguimento mais prolongado é necessário para que a amostra
apresentada tenha seu real índice de contratura avaliado. A radioterapia adjuvante
sabidamente está associada a aumento nos índices desta complicação, configurando a
chamada contratura capsular actínica15.
Uma alternativa para as pacientes que sabidamente necessitarão radioterapia adjuvante
é a associação do RMGD com expansor tecidual mamário, havendo a troca para implante
de silicone apenas após plena expansão tecidual e conclusão do tratamento
radioterápico, momento em que é possível ajustar o formato da neomama e tratar com
capsulotomia ou capsulectomia possíveis estigmas de contratura16,17.
A cirurgia plástica tem evoluído no sentido da utilização de opções com menos
morbidade aos pacientes. A utilização de retalhos microcirúrgicos ou de implantes
mamários associados a matrizes dérmicas têm despontado nos últimos anos nas
publicações especializadas como alternativas de baixa morbidade e bons
resultados4,18.
Todavia, os primeiros demandam treinamento cirúrgico específico prolongado, já as
segundas ainda são pouco factíveis no Brasil em virtude do alto custo do material.
Desta forma, o RMGD associado a implantes de silicone continua sendo uma excelente
opção aos cirurgiões plásticos.
CONCLUSÃO
A sistematização da reconstrução mamária utilizando RMGD associado a implantes
mamários de silicone em decúbito lateral mostra-se como uma alternativa não apenas
segura ao cirurgião plástico, mas também rápida e de resultados consistentes. A
familiarização com a cirurgia neste posicionamento é necessária para a plena
obtenção destas vantagens.
COLABORAÇÕES
ICGL
|
Análise e interpretação dos dados; concepção e desenho do estudo;
realização das operações; redação do manuscrito.
|
REFERÊNCIAS
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1. Hospital Napoleão Laureano, João Pessoa, PB,
Brasil
2. Hospital das Clínicas, Recife, PE,
Brasil.
3. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São
Paulo, SP, Brasil.
Autor correspondente: Igor Chaves Gomes Luna, Rua Reinaldo Tavares
de Melo, 142 - Manaíra - João Pessoa, PB, Brasil. CEP 58038-300. E-mail:
igorluna_med@hotmail.com
Artigo submetido: 10/6/2017.
Artigo aceito: 18/9/2017.
Conflitos de interesse: não há.