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Enxerto de cartilagem em "feixe de gravetos" no aumento do dorso nasal
The bundle of twigs cartilage graft for augmentation of the nasal dorsum
RESUMO
INTRODUÇÃO: Os enxertos autólogos conquistaram importante papel na rinoplastia gerando sustentação com melhor resultado funcional e estético. Os enxertos cartilaginosos fragmentados surgiram como alternativa para evitar deformidades perceptíveis que ocorrem com enxertos esculpidos. O uso de enxertos em forma de filetes não fixados entre si demonstrou bons resultados. Este estudo objetiva divulgar nova técnica de preenchimento de dorso nasal utilizando filetes cartilaginosos amarrados em forma de "feixe de gravetos".
MÉTODO: Foram realizadas 28 rinoplastias abertas estruturadas de janeiro a junho de 2015 na Clínica de Cirurgia Plástica do Hospital Felício Rocho. Realizou-se incisão infracolumelar em V e dissecção em planos profundos. A principal área doadora de enxerto cartilaginoso foi o septo nasal. Os enxertos foram preparados com lâmina 11, em longas e finos filetes com espessura média de 1 mm. Com fio catgut simples 5-0, os enxertos foram agrupados em um feixe autossustentável.
RESULTADOS: Treze pacientes eram do gênero feminino e 15 do masculino. A idade média foi 34,8 anos. A técnica do feixe de gravetos demonstrou bons resultados no per e pósoperatório com manutenção do preenchimento e elevação do dorso nasal. O aumento da raiz e do dorso foi obtido em 100% dos casos, sem complicação local ou necessidade de revisão cirúrgica no seguimento atual.
CONCLUSÃO: O enxerto de cartilagem em feixe de gravetos mostrou-se eficiente e de fácil execução. Oferece boa forma no tratamento do dorso e raiz nasal em casos estéticos, funcionais e traumáticos.
Palavras-chave:
Cirurgia plástica; Rinoplastia; Nariz; Cartilagens nasais; Transplante autólogo.
ABSTRACT
INTRODUCTION: Autologous grafts play an important role in rhinoplasty, they provide support with improved functional and aesthetic results. Fragmented cartilaginous grafts are an alternative that help avoid the perceptible deformities that occur with sculpted grafts. Grafts in the form of unbound strips have also shown good results. This study demonstrated the effectiveness of a new technique, which involves filling of the nasal dorsum using cartilaginous strips bound in the form of a bundle of twigs.
METHOD: A total of 28 open structure rhinoplasties were performed from January to June 2015 at the Plastic Surgery Clinic of the Felício Rocho Hospital. V-shaped infracolumellar incisions were made by dissection of the deep planes. The nasal septum was the main donor area of the cartilage grafts. The grafts were prepared with a #11 scalpel blade into thin strips with an average thickness of 1 mm. Using simple 5-0 catgut wire, the grafts were bound into a self-contained bundle.
RESULTS: Thirteen patients were female and 15 male, with a mean age of 34.8 years. The "bundle of twigs" technique displayed good postoperative results, with maintenance of the filling and elevation of the nasal dorsum. Follow-up assessments confirmed the augmentation of the root and dorsum in 100% of the cases, without local complications or need for surgical revision.
CONCLUSION: The bundle of twigs technique was efficient and easily performed. It offers an attractive alternative for treatment of the nasal dorsum and root in aesthetic, functional, and traumatic cases.
Keywords:
Plastic surgery; Rhinoplasty; Nose; Nasal cartilages; Autologous transplantation.
INTRODUÇÃO
A importância funcional do nariz e seu local de destaque na face fazem da rinoplastia um procedimento desafiador na Cirurgia Plástica1,2. Este procedimento sofreu grandes transformações desde sua criação e nos últimos 15 anos houve uma mudança de princípios, abandonando-se procedimentos agressivos com redução excessiva e valorizando-se aumento e estruturação nasal3-5. O cirurgião plástico deve acompanhar a evolução das técnicas para oferecer ao paciente um melhor resultado estético e funcional.
A rinoplastia aberta estruturada conquistou importante papel no contexto cirúrgico do nariz2, associando-se ao uso de enxertos para a sustentação e adequada funcionalidade2-4. Nos últimos anos, os enxertos autólogos tiveram maior divulgação, sendo considerados um dos melhores no tratamento das deformidades nasais pela alta biocompatibilidade e baixo risco de infecção e extrusão3. Hoje, esses enxertos são considerados parte essencial na rinoplastia3,6-8.
As fontes autólogas de cartilagem são diversas - septal, conchal, costal7 - porém, a cartilagem septal é considerada a melhor pela fácil obtenção, manipulação, bom suporte e estrutura mais retilínea3.
Os enxertos de cartilagem esculpidos em monobloco ou em camadas tiveram uso difundido por muitos anos, porém o adelgaçamento natural da pele pode resultar em deformidades palpáveis e perceptíveis no médio e longo prazo, representando queixa frequente e exigindo revisão cirúrgica1,6,8-10.
Como alternativa, surgiram os enxertos fragmentados, descritos em dois grupos2: macerados e picados - revestidos ou não com tecido autólogo, como fáscia temporal7,8 ou material sintético, como a tela absorvível de celulose oxidada3,6.
Os enxertos macerados também se mostraram perceptíveis a longo prazo1,2,5,6 e foram relacionados a maior fibrose e absorção local. Já os picados apresentaram maior estabilidade, preservando o volume adquirido2.
Por longo período, a preferência do autor sênior foi por enxertos picados não revestidos pela versatilidade e bons resultados. Porém, no dorso e raiz nasal, em alguns casos, notou-se alteração do volume látero-lateral, diminuindo o ganho inicial de altura e aumentando o diâmetro não desejado2. Buscouse, então, a melhoria da técnica prezando melhores resultados.
Souza et al.2 buscaram um enxerto particulado, pouco perceptível ou palpável, mas com um contorno regular e forma mais previsível. Um enxerto adequado ao aumento do eixo longitudinal do dorso nasal sem excessos no eixo transversal. Propuseram o uso de enxertos de cartilagem em forma de filetes, utilizados em várias unidades, com bons resultados no aumento do dorso e raiz nasal.
OBJETIVO
Este trabalho tem como objetivo demonstrar nova técnica de preenchimento do dorso nasal, utilizando filetes de cartilagem unidos entre si por meio de amarração com fio, gerando uma estrutura autossustentável, simulando um feixe de gravetos de madeira, com ganho nos resultados e previsão de menor distorção no longo prazo.
MÉTODOS
Foram realizadas 28 rinoplastias abertas estruturadas de janeiro a junho de 2015 no Hospital Felício Rocho, em Belo Horizonte, MG. Treze pacientes eram do gênero feminino e 15 do masculino. A idade dos pacientes variou de 16 a 64 anos, com média de 34,8 anos. Do total de rinoplastias, doze eram casos primários e 16 secundários.
Em 24 casos coexistiam distúrbios funcionais e, portanto, o tratamento cirúrgico foi realizado em conjunto com a equipe de Otorrinolaringologia.
Técnica cirúrgica
As rinoplastias foram realizadas sob anestesia geral. A técnica apresentada pode ser realizada com uso de exo ou endorrinoplastia. Os autores optaram, em todos os casos, pela rinoplastia aberta com incisão infracolumelar em V. A dissecção ocorreu em plano profundo mantendo o retalho espesso, a fim de evitar complicações isquêmicas. A dissecção do dorso nasal, em todos os casos, foi restrita, visando o melhor posicionamento dos enxertos, evitando a migração dos mesmos.
O septo nasal foi a área doadora de cartilagem em todos os casos, mas, em 12 casos, associou-se com cartilagem da concha auricular finamente picada para aumento e definição somente da ponta nasal.
Com a lâmina de bisturi 11, confeccionaramse os "gravetos" (longas tiras no maior diâmetro da cartilagem quadrangular de 1,0 mm de espessura). Estes, em número de 6 a 8 unidades, foram agrupados, amarrando-os com fio catgut 5.0, simulando um feixe de gravetos de madeira (Figuras 1A, 1B e 1C).
Figura 1. A: Os enxertos de cartilagem septal em filetes não unidos conforme proposto por Souza et al.
2, 2015. B: Filetes cartilaginosos unidos com uso de catgut 5-0 formando o enxerto em "feixe de gravetos". C: Demonstração de que o feixe autossustentável gera a possibilidade de alongamento do enxerto em comparação ao uso isolado de filetes. Neste caso, o ganho foi de 10 mm no comprimento final do enxerto.
Em todos os casos, foram utilizados "Strut" columelares também de cartilagem septal, com cerca de 0,3 x 2,5 cm. A fixação foi feita entre as "cruras" mediais das cartilagens alares com pontos de fio monofilamentar absorvível 5-0.
Após esta etapa, foi verificado o déficit de altura do dorso e raiz nasal a serem preenchidos e o feixe de gravetos foi inserido sob o "SMAS", do dorso até a raiz nasal, para preenchimento, sustentação e melhoria do perfil (Figuras 2A e 2B).
Figura 2. A: Colocação do enxerto em feixe de gravetos sobre o dorso nasal para simular o preenchimento do defeito. Em B, aspecto do dorso e raiz nasal após a enxertia do feixe de gravetos. Nota-se a retificação da linha do dorso.
Após a estruturação almejada, a pele foi suturada com fio mononylon 6.0. Nos casos em que se associou enxerto de cartilagem finamente picada para preenchimento de ponta, a injeção da cartilagem foi realizada em orifício da incisão na asa nasal, antes da completa sutura.
Splint septal bilateral foi fixado em todos os pacientes e foi mantido por cerca de 7 a 15 dias.
RESULTADOS
A técnica do feixe de gravetos vem demonstrando bons resultados no per e pós-operatório de curto prazo. O aumento da raiz e do dorso foi obtido em 100% dos casos, sem nenhuma complicação local. A associação com enxerto picado foi utilizada, principalmente para definição da ponta nasal, em 23 casos.
As áreas doadoras de cartilagem, conchal e septal, evoluíram sem intercorrências.
Nos pacientes com seis meses ou mais de acompanhamento (Figuras 3 a 5), o ganho de preenchimento e elevação do dorso nasal se mantiveram de forma satisfatória. Não foram verificados enxertos visíveis sob a pele e nenhuma revisão cirúrgica foi necessária no seguimento atual.
Figura 3. Pré (A) e pós operatório de 6 meses (B) demontrando o ganho de altura na raiz nasal, a retirada de giba dorsal e retificação obtida por meio do enxerto de feixe de gravetos.
Figura 4. Pré (A) e pós operatório de 6 meses (B) com retirada da giba de dorso nasal, manutenção da altura de raiz e dorso nasal com contorno hamornioso do perfil nasal.
Figura 5. Pré (A e B) e pós operatório de 6 meses (C e D) demontrando o ganho de altura na raiz, a retirada de giba dorsal e retificação obtida por meio do enxerto de feixe de gravetos associada a osteotomias laterais para tratamento da laterorrinia.
DISCUSSÃO
A rinoplastia é um procedimento de grande importância na cirurgia plástica pela posição central do nariz na face e pela importância funcional do mesmo2. A busca para um dorso e raiz nasal bem estruturados a longo prazo ainda é um desafio ao cirurgião plástico1,10.
Toda evolução técnica no sentido de melhorar os resultados deve ser incentivada e acompanhada pelos cirurgiões. A rinoplastia aberta estruturada tem se tornado técnica de escolha de diversos autores1,2,5 porém, independentemente da via de acesso, os enxertos são ferramentas essenciais para estruturação nasal3,6,10.
O uso de cartilagem picada foi subutilizado por longo período, porém, há alguns anos, após bons resultados publicados por Erol6, o uso deste tipo de enxerto voltou a apresentar destaque. Vários estudos demonstraram excelentes resultados com a cartilagem finamente picada, envelopados ou não3,4,6-8. Porém, intercorrências pós-operatórias, como visualização de enxertos sob a pele delgada, palpação dos mesmos e ganho indesejado de dimensão transversal do dorso nasal, nos levaram a procurar uma maneira de minimizar estes efeitos2.
Os enxertos em forma de filetes, com dimensão longitudinal dominante, tornam-se mais objetivos no preenchimento da raiz e do dorso nasal. São capazes de definir o dorso, como uma consequência natural da sua forma, mas se fazem praticamente imperceptíveis à palpação por serem finamente particulados, flexíveis, sem memória ou força elástica que vença a fibrose e a pressão do revestimento cutâneo ao seu redor. Acreditase também que sofra menos absorção ou perda em relação ao enxerto picado, por preservar mais unidades de condrócitos com matriz cartilaginosa íntegra ao longo do seu eixo2.
Unindo os enxertos longitudinais (filetes) em uma amarração de "feixe de gravetos", semelhante a um feixe de madeira fina e irregular, este estudo demonstrou a manutenção do ganho representado pelo enxerto de filetes separados proposto por Souza et al.2, acrescentando a possibilidade de alongamento do enxerto e o aumento da resistência promissora para manter os resultados. Ao que sugere, a análise de longo prazo corroborará as atuais observações.
A manipulação do enxerto em "feixe de gravetos", para pequenos ajustes, pode ser realizada com sucesso nos primeiros 15 dias quando se fizer necessária. Essa manipulação de fragmentos já foi demonstrada em outras técnicas de enxertos em rinoplastia6,8. Como vantagem, o feixe de enxertos em gravetos é estrutural, o que supre a desvantagem do uso de cartilagem picada que não possui esta função8.
O uso de enxerto cartilaginoso em forma de "feixe de gravetos" vem demonstrando maior ganho nos resultados, mantendo a forma desejada e com previsão de menor distorção no longo prazo. Por gerar aumento das dimensões possíveis para o enxerto, podem ser confeccionadas de fragmentos menores de cartilagem. O uso da cartilagem septal somente pode apresentar como desvantagem a quantidade limitada disponível em alguns pacientes3, principalmente em abordagens secundárias. Os autores utilizaram em todos os casos a cartilagem septal, mas acreditam que os conceitos da técnica podem ser estendidos ao uso de gravetos confeccionados de cartilagem conchal e costal, aumentando a reprodutibilidade da técnica.
CONCLUSÃO
O enxerto de cartilagem em "feixe de gravetos" mostrou-se eficiente e de fácil execução. Oferece bom efeito no tratamento do dorso e raiz nasal em casos estéticos, funcionais e traumáticos, primários ou secundários. Apresenta-se como tática promissora nos enxertos em rinoplastia, pois associa os princípios do enxerto em filetes à elevada resistência gerada quando se unem em um feixe.
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1. Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil
2. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São Paulo, SP, Brasil
3. Associação Brasileira de Cirurgia de Crânio-Maxilo-Facial, São Paulo, SP, Brasil
Instituição: Clínica de Cirurgia Plástica do Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Autor correspondente:
Sérgio Moreira da Costa
Rua Timbiras, 3642, Barro Preto
Belo Horizonte, MG, Brasil CEP 30140-062
E-mail: sergio.plastica@bol.com.br
Artigo submetido: 1/8/2015.
Artigo aceito: 17/11/2015.
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