ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175
Perfil epidemiológico dos pacientes tratados com auxílio da oxigenioterapia hiperbárica no estado de mato grosso do sul de maio de 2007 a outubro de 2012
Epidemiological profile of patients treated with the aid of hyperbaric oxygen in the State of Mato Grosso do Sul from May 2007 to October 2012
Original Article -
Year2013 -
Volume28 -
Issue
4
Elson Taveira Adorno Filho1; Kleder Gomes De Almeida2; Gabriel Rahal Costa3; Gustavo De Sousa Marques Oliveira3; Liva Helena Ferreira Tuluche1; Aline Souza Kracik4
http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2013RBCP0651
RESUMO
INTRODUÇÃO: A oxigenoterapia hiperbárica - OHB é uma modalidade terapêutica não invasiva em que o paciente respira oxigênio a 100% (oxigênio puro), com o uso de máscaras, enquanto permanece em uma câmara pressurizada a uma pressão superior à atmosférica. Seu papel é atuar como um acelerador do processo de recuperação, por meio do aumento da saturação de oxigênio no organismo, que permite a aceleração nas cicatrizações e no combate a diversas infecções.
OBJETIVO Demostrar o perfil epidemiológico dos pacientes tratados com auxílio da oxigenioterapia hiperbárica no Estado de Mato Grosso do Sul, de maio 2007 a outubro 2012.
MÉTODO: Realizou-se estudo retrospectivo dos pacientes admitidos na Santa Casa de Campo Grande, que utilizaram oxigenioterapia hiperbárica, de maio de 2007 a outubro de 2012.
RESULTADOS: Dos 600 pacientes que se submeteram à OHB, predominou o sexo masculino (71% - 425 pacientes); A cirurgia plástica foi a especialidade que mais solicitou OHB associada ao tratamento convencional de seus pacientes (71% do total de pacientes), sendo destes a maioria devido à lesão por queimadura (82%). O intervalo de idade de maior prevalência foi dos 31 aos 60 anos. A média do número de sessões de hiperbárica, dentre os pacientes com queimadura, foi entre 6 e 10 (66,19% do total de queimados).
CONCLUSÕES: A maioria dos pacientes que necessitavam de oxigenioterapia hiperbárica era do sexo masculino devido a queimaduras moderadas a graves, sendo a Cirurgia Plástica a especialidade que mais utilizou esta ferramenta como tratamento adjuvante.
Palavras-chave:
Oxigenação Hiperbárica. Tratamento. Cicatrização.
ABSTRACT
BACKGROUND: The Hyperbaric Oxygen Therapy-HOT, is a non-invasive therapeutic method in which patient breaths 100% oxygen (pure oxygen) through masks, while remain in a pressurized chamber to a pressure higher than atmospheric. Its act as an accelerator of recovery process, by increasing the oxygen saturation in the body that allows to speed up cicatrization and engagement to infection. The aim of this study was to determine the epidemiological profile of hyperbaric oxygen therapy patient of Mato Grosso do Sul state.
OBJECTIVE: To demonstrate the Epidemiological Profile of patients treated with the aid of hyperbaric oxygen in the State of Mato Grosso do Sul May 2007 to October 2012.
METHODS: We conducted a restrospective study of HOT patients admitted to Santa Casa de Campo Grande Hospital from May 2007 to October 2012.
RESULTS: Among 600 patients who underwent HOT, there was a predominance for males (71% - 425 patients); Plastic surgery is the medical speciality which most request HOT associated with conventional treatment for their patients (71% of the total patients), and most of these are due to burn injury (82%). Most of the patients were aged between 31 and 60 years old. (the range with highest prevalence were 31 to 60 years). The mean number of hyperbaric sessions among the burn patients was between 6 and 10 sessions (66.19% of burn patients).
CONCLUSIONS: The majority of our service to patients requiring hyperbaric oxygen therapy was male because of moderate to severe burns, and the Plastic Surgery specialty that most used this tool as adjuvant treatment.
Keywords:
Hyperbaric Oxigenation. Therapeutics. Wound Healing.
INTRODUÇÃO
A Medicina Hiperbárica é uma área da Medicina que utiliza como tratamento a oxigenioterapia hiperbárica - OHB, uma modalidade terapêutica não invasiva em que o paciente respira oxigênio a 100%, enquanto permanece em uma câmara pressurizada a uma pressão superior à atmosférica1.
A OHB é utilizada em afecções inflamatórias, infecciosas e isquêmicas há mais de 50 anos no mundo, e reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina. É utilizada como tratamento para diversas situações clínicas, dentre elas, queimaduras. Entretanto, até hoje há controvérsias sobre como deve ser empregada e em quais pacientes seu uso pode ser benéfico2. Seu papel é atuar como um acelerador do processo de recuperação, por meio do aumento da saturação de oxigênio no organismo, que permite a aceleração nas cicatrizações e no combate a diversas infecções.
As câmaras hiperbáricas permitem elevar gradualmente a pressão ambiente e mantê-la sem variações em níveis hiperbáricos pelo período de tempo desejado (Figuras 1 e 2). Há dois tipos de câmeras: as multipacientes, que comportam vários pacientes simultaneamente; são pressurizadas com ar até que se atinja o nível de pressão pré-fixado e então o paciente passa a respirar oxigênio puro com o uso de máscara bem adaptada ou de um capuz sem vazamentos. O segundo tipo consiste nas câmaras monopacientes, que permitem tratar apenas um paciente por vez. São pressurizadas diretamente com oxigênio e o paciente respira livremente, sem necessidades de máscaras ou outros dispositivos1.
Figura 1 - Câmara hiperbárica permite elevar gradualmente a pressão ambiente e mantê-la sem variações em níveis hiperbáricos pelo período de tempo desejado.
Figura 2 - Vista frontal da câmara hiperbárica.
Na Europa, em 1662, surgiu a Medicina Hiperbárica, por meio das observações do padre inglês Henshaw, que exercia a Medicina. Observou que as pessoas que habitavam regiões montanhosas apresentavam significativas melhoras em suas feridas, ao permanecerem em tratamento em regiões litorâneas, levantou a hipótese de que tal melhora teria como razão a diferença de pressão atmosférica. Para comprovar tais observações, construiu um "domicilium" - um vaso de pressão - onde começou a aplicar "banhos de ar comprimido" em pessoas com afecções agudas. Os resultados obtidos, por estes "banhos de pressão" mais elevada que a pressão atmosférica, foram positivos e a fundamentação da Medicina Hiperbárica foi iniciada3,4.
Na década de 30 do século XX, estudos sugeriram que a utilização de oxigênio podia desempenhar um papel importante no tratamento das doenças descompressivas, relacionadas ao mergulho. Entretanto, como o oxigênio é altamente comburente, foram necessárias três décadas para que um equipamento fosse desenvolvido de forma a manipular de maneira segura sua administração. A partir deste, surgiram estudos confirmando as vantagens da OHB, descobriu-se que a inalação de oxigênio puro, dentro de câmaras hiperbáricas, aumentava as taxas de oxigenação do sangue e de todos os tecidos do corpo. Concluiu-se, daí, que tal aumento propiciava o combate a infecções, acelerava os processos de cicatrização e potencializava o uso de antibióticos.
OBJETIVOS
Demonstrar o perfil epidemiológico dos pacientes tratados com auxílio da oxigenioterapia hiperbárica no Estado de Mato Grosso do Sul de maio 2007 a outubro 2012.
MÉTODO
Realizou-se estudo Retrospectivo, de maio de 2007 a outubro de 2012, por meio de revisão de prontuários do setor de arquivos da Santa Casa Misericórdia de Campo Grande, sendo incluídos 600 pacientes que realizaram OHB no Estado de Mato Grosso do Sul. As especialidades que solicitaram OHB para os pacientes foram: Ortopedia, Cirurgia Plástica, Cirurgia Vascular, Cirurgia Cardíaca, Cirurgia Torácica, Cirurgia Geral e Clínica Médica. Todos os pacientes submetidos à OHB tinham o pro-pósito de realizar o número mínimo de sessões de câmara hiperbárica, ou seja, dez sessões, com o acréscimo de mais sessões a critério do médico assistente. Os pacientes não realizavam a OHB caso houvesse algum comprometimento hemodinâmico.
RESULTADOS
Entre os 600 pacientes que foram submetidos à OHB, entre os anos de 2007 e 2012, predominou o sexo masculino, com aproximadamente 71% (425 pacientes) . A Cirurgia Plástica foi a especialidade que mais solicitou à OHB associada ao tratamento convencional de seus pacientes, correspondendo a (71%) do total de pacientes do estudo. Nas demais especialidades, Cirurgia Vascular responde por 17% dos pacientes, a Ortopedia por 5,3%, a Cirurgia Cardíaca por 3%, a Cirurgia Torácica por 2%, a Clínica Médica por 1% e a Cirurgia Geral por 0,7% . O número total e a média de sessões de OHB realizadas neste período foram 5.712 e 9,52 sessões, respectivamente. O número total de OHB por especialidade foi, respectivamente: Cirurgia Plástica: 3.977 sessões; Cirurgia Vascular: 911 sessões; Ortopedia: 468 sessões; Cirurgia Cardíaca: 190 sessões; Cirurgia Torácica: 82 sessões; Clínica Médica: 45 sessões e Cirurgia Geral: 39 sessões . A lesão por queimadura de pele foi a maior causa de utilização da OHB como tratamento auxiliar ao convencional: dos 428 pacientes da Cirurgia Plástica que realizaram OHB, 349 eram pacientes vítimas de queimaduras.
DISCUSSÃO
A OHB é um tratamento complementar, utilizado como terapia coadjuvante em diversas afecções agudas ou crônicas, sejam elas de natureza isquêmica, infecciosa, traumática ou inflamatória. Geralmente, é aplicada em casos graves e resistentes aos tratamentos convencionais e que, na maior parte do tempo, implicam em custos elevados e prognósticos desfavoráveis à integridade física do paciente. Sua aplicação vem se expandindo no mundo todo devido à constatação de que ela atinge dois dos mais desejados benefícios da medicina contemporânea: a redução dos custos e a rápida eficácia do tratamento. A diminuição do tempo de resposta melhora os resultados do processo de cicatrização, diminuindo, assim, os índices de sequelas, cirurgias, mutilações, rejeições de enxertos, cicatrizações deformantes de queimaduras, medicamentos e longas internações hospitalares.
A oxigenioterapia hiperbárica - OHB - apresenta como benefícios:
Vasoconstrição - favorável em casos de edema;Efeito antimicrobiano e antibacteriano - facilitando a atuação dos leucócitos e diminuindo a produção de substâncias tóxicas;Potencialização dos efeitos de vários medicamentos;Aumento da oxigenação do sangue - pelo acréscimo de oxigênio dissolvido no plasma;Crescimento de novos leitos capilares ou neovascularização;Restabelecimento da oxigenação dos tecidos - no caso de intoxicação por monóxido de carbono;Eliminação de embolias gasosas - no caso de acidentes de mergulho.
O número e a periodicidade das sessões são sempre indicados pelo médico hiperbárico ou assistente, dependendo da enfermidade apresentada pelo paciente, mas pode-se dizer que, na maior parte dos casos, o tratamento é realizado diariamente. As sessões duram entre 90 e 120 minutos e são acompanhadas por um profissional responsável, que se mantém todo o tempo junto aos pacientes. Caso haja necessidade de se submeter a infusões venosas, transfusões ou drenagens de feridas ou cavidades durante a realização da sessão, o profissional responsável realizará o procedimento.
No Brasil, o Conselho Federal de Medicina, em consonância com o preconizado pela Sociedade Brasileira de Medicina Hiperbárica e a Undersea & Hyperbaric Medical Society (EUA), editou, em 1995, a Resolução nº 1457, disciplinando a aplicação do tratamento.
Principais indicações:
Embolia gasosa;Doença descompressiva;Embolia traumática pelo ar;Envenenamento por monóxido de carbono ou inalação de fumaça;Envenenamento por cianeto ou derivados cianídricos;Gangrena gasosa;Síndrome de Fournier;Infecções necrotizantes de tecidos moles: celulites, fasciites, miosites;Isquemias agudas traumáticas: lesão por esmagamento, síndrome compartimental, reimplantação de extremidades amputadas e outras;Vasculites agudas de etiologia alérgica, medicamentosa ou por toxinas biológicas (aracnídeos, ofídios e insetos);Queimaduras térmicas e elétricas;Lesões refratárias: úlceras de pele, lesões do pé diabético, escaras de decúbito, úlcera por vasculites autoimunes, deiscências de suturas;
Muitos estudos comparativos têm demonstrado, sistematicamente, que o acréscimo da OHB ao tratamento convencional, sempre reduz o custo final, uma vez que diminui o tempo de internação, o número de curativos, cirurgias e o uso de medicamentos5. Quando há a real necessidade de cirurgias mutiladoras, tem sua intensidade e extensão diminuídas. Além da questão de custo, devese considerar, ainda, que o resultado final relacionado à estética. Com a utilização apenas do tratamento convencional, há a existência de perdas teciduais ocorridas por necroses e ressecções, e a cicatrização com deformações, com prejuízos tanto estéticos quanto funcionais6.
O tratamento com OHB tem dois princípios: a ação mecânica exercida pela pressão habitualmente acima de 2 ATM e a hiperoxigenação decorrente da utilização de oxigênio a 100%, o que acarreta elevação da pressão parcial de oxigênio nos tecidos. Com o tratamento da OHB adjuvante, observa-se redução no tempo de cicatrização e melhor aspecto das lesões; mantendo a integridade microvascular, minimizando o edema e promovendo essencial substrato necessário à vitalidade dos tecidos7.
Quando a OHB não é usada em fases iniciais do tratamento das queimaduras, ainda sim pode haver indicação para seu emprego mais tardio em pacientes que estejam evoluindo desfavoravelmente. Nesses casos, a indicação mais frequente é para tratamento de infecções secundárias, tanto de áreas queimadas quanto de áreas doadoras, ou já enxertadas. O efeito que deseja é o controle da infecção e a restauração tecidual, como se obtém em infecções de outras natureza8.
Entretanto, o uso da OHB deve ser reservado àqueles casos nos quais algum benefício possa ser efetivamente esperado; além disso, nunca deve ser encarado como um modo de substituir algum ou todos os cuidados que a boa técnica do tratamento de queimaduras preconiza.
Alguns conceitos já estão estabelecidos: 1. Os tecidos normais e com oxigenação adequada não ficarão "mais normais" com OHB; 2. A OHB não promove reversão de lesões definitivas (necrose, degeneração); 3. A OHB pode e deve ser associada aos tratamentos convencionais; 4. Os tratamentos convencionais aplicados em associação com OHB necessitarão sofrer modificações em quantidade e intensidade8.
CONCLUSÃO
Concluímos que, no nosso serviço, a maioria dos pacientes que necessitavam de oxigenioterapia hiperbárica era do sexo masculino, devido a queimaduras moderadas a graves, sendo a Cirurgia Plástica a especialidade que mais utilizou esta ferramenta como tratamento adjuvante. Os benefícios da OHB como terapia coadjuvante, quando bem indicada, têm sido demonstrados.
REFERÊNCIAS
1- Tibbles PM, Edelsberg JS. Hyperbaric-oxygen therapy. N Engl J Med. 1996;334(25):1642-8.
2- Boerema I, Meyne NG, Brummelkamp WK, Bouma S, Mensch MH, Kamermans F, et al. Life without a blood: a study of the influence of high atmospheric pressure and hypothermia on dilution of blood. J Cardiovasc Surg. 1959;13:133-46.
3- Cianci P, Lueders HW, Lee H, Shapiro RL, Sexton J, Williams C, et al. Adjunctive hyperbaric oxygen therapy reduces length of hospitalization in thermal burns. J Burn Care Rehabil. 1989;10(5):432-5.
4- Nasi LA. Rotinas em Pronto Socorro. Porto Alegre: Artes Médicas; 1994.
5- Mélega JM, Zanini SA, Psillakis JM. Cirurgia plástica reparadora e estética. 2a ed. Rio de Janeiro: Medsi; 1992.
6- Hunt TK. The physiology of wound healing. Ann Emerg Med. 1988;17(12):1265-73.
7- Hart GB, O'Reilly RR, Broussard ND, Cave RH, Goodman DB, Yanda RL. Treatment of burns with hyperbaric oxygen. Surg Gynecol Obstet. 1974;139(5):693-6.
8- Ely JF. Cirurgia Plástica. 2a ed. Rio de Janeiro: Koogan; 1980.
1. Cirurgia Geral. Médico Residente (R2) do Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Campo Grande, MS, Brasil
2. Médico preceptor do Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Campo Grande, MS, Brasil. Titular pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e Sociedade Brasileira de Medicina Hiperbárica. Cirurgia Plástica
3. Cirurgia Geral. Médico Residente (R3) do Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Campo Grande, MS, Brasil
4. Cirurgia Geral. Médico Residente (R1) do Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Campo Grande, MS, Brasil
Elson Taveira Adorno Filho
E-mail: elsonadorno@hotmail.com.br
Artigo recebido:05/10/2013
Artigo aceito:05/11/2013
Trabalho realizado na Santa Casa de Campo Grande. Campo Grande, MS, Brasil.
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