ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Original Article - Year2008 - Volume23 - Issue 2

ABSTRACT

Background: The literature preconises that the acids burn must be irrigated with large amounts of water as soon as possible. The base utilization in the therapy of acids chemical burns is controversies, because of the occurancy of an exothermical reaction. A chemical concept says that when an acid has to be diluted, the acid must be added to a water container, and not the opposite, because of the exothermical liberation of energy. Method: 40 rats were utilized divided in two groups of 20 rats. In both groups all rats were exposed to 12 molar hydrochloric acid for 30 seconds. One group had all rats treated with water irrigation for 15 minutes. The other group had all rats treated with caustic soda. Results: The results of the treatments were observed micro and macroscopically, and they are very similar Conclusion: The results being similar, the irrigation with water is the best choice because is cheap and easier use.

Keywords: Burns. Burns, chemical. Sodium hydroxide. Rats.

RESUMO

Introdução: Na literatura é amplamente preconizada para queimaduras com ácidos, uma lavagem exaustiva com água corrente o mais precoce possível. A utilização de bases no intuito de neutralizar o ácido é polêmica, pois a reação de um ácido com uma base é exotérmica. Também é um conceito em química, que a diluição de um ácido com água causa também uma reação exotérmica. Método: Foram utilizados 40 ratos divididos em dois grupos de 20 ratos. Em ambos os grupos, todos os ratos foram expostos ao ácido clorídrico 12 molar por 30 segundos e, posteriormente, um grupo teve todos os ratos tratados imediatamente com lavagem exaustiva com água corrente por quinze minutos e o outro grupo todos os ratos foram submetidos imediatamente a neutralização do ácido com soda cáustica 1 molar. Resultados: Os resultados foram observados macroscopicamente e microscopicamente e em ambos os tratamentos foram muito semelhantes. Conclusão: Como os resultados de ambas as modalidades de tratamento foram muito semelhantes, lavar com água corrente ainda é a melhor alternativa pela facilidade de manipulação e o baixo custo.

Palavras-chave: Queimaduras. Queimaduras químicas. Hidróxido de sódio. Ratos.


INTRODUÇÃO

As queimaduras químicas ocorrem tanto no ambiente doméstico como no trabalho e, geralmente, por falta de cuidados básicos. Estas queimaduras ocorrem por ácidos, bases ou compostos orgânicos. Os ácidos são responsáveis por grande parte destas queimaduras, e o ácido clorídrico dentre eles é um dos mais comuns, sendo responsável por boa parte dos pacientes que necessitam internação devido a queimaduras por ácidos. O tratamento inicial precoce e adequado nestes pacientes é muito importante, resultando em grande diferença com relação aos pacientes que demoram a procurar um tratamento adequado1-7. Na literatura é quase unânime que se deve lavar abundantemente a área exposta a um ácido com água corrente. A utilização de bases no intuito de neutralizar ácidos é bastante controversa na literatura, pois a reação de ácidos com bases é exotérmica8,9. Por outro lado, reações químicas que utilizam bases fracas liberam menos calor do que as com bases fortes; jogar água num frasco com ácido também provoca uma reação exotérmica, por isso, no intuito de minimizar esta reação exotérmica, ao se realizar a diluição de um ácido, este deve ser despejado na água e não o contrário. Não foram encontrados na literatura trabalhos experimentais que demonstrassem a diferença de resultados entre distintos tratamentos iniciais precoces utilizando bases e ou lavando abundantemente com água para queimaduras por ácidos.

O objetivo do presente estudo é comparar macroscopicamente e histologicamente os resultados de diferentes tratamentos iniciais em exposições ao ácido clorídrico 12 molar, utilizando água corrente versus soda cáustica.


MÉTODO

O presente trabalho seguiu um rigoroso protocolo de manuseio dos animais, seguindo as normas preestabelecidas pelo Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA). O animal utilizado foi o rato Wistar (Rattus norvegicus albinus) adulto, por ser o mais freqüentemente utilizado, em virtude da facilidade de obtenção e baixo custo.

Todos os animais foram anestesiados conforme o protocolo de pesquisa. Os fármacos utilizados foram o cloridrato de ketamina (anestésico geral), na dose de 100 mg/kg, e o cloridrato de xilazina (relaxante muscular), na dose de 6 mg/kg. A via de administração foi intramuscular, na pata traseira direita dos animais. Em alguns ratos, foi necessário administrar empiricamente uma dose um pouco maior, conforme individualidade no efeito e na metabolização das drogas.

Após a anestesia, foi depilada uma janela de 4x4 cm no dorso dos animais. Os ratos foram divididos em dois grupos de 20 ratos. Os procedimentos realizados foram:

- Grupo 1: Exposição ao ácido clorídrico 12 molar por 30 segundos, seguida de neutralização com soda cáustica 1 molar;

- Grupo 2: Exposição ao ácido clorídrico 12 molar por 30 segundos, seguida de lavagem copiosa com água corrente por 15 minutos.

Dez ratos de cada grupo foram sacrificados uma hora após a exposição; os 20 ratos restantes foram sacrificados 24 horas após terem sido expostos ao ácido clorídrico.

Para realizar as queimaduras, foi modificado o método publicado por Kim et al.2, em 1994. Foi utilizado um cilindro de vidro temperado de trinta centímetros de comprimento por 3,5 cm de largura (Figura 1A). Este cilindro era colocado no dorso dos animais sobre a área depilada, exercendo manualmente uma fraca pressão do vidro sobre a pele do animal, no intuito de não deixar vazar líquido. Então eram colocados 20 ml de ácido clorídrico 12 molar (Figura 1B), deixando em contato com a pele por 30 segundos em todos os ratos, em ambos os grupos. Optou-se por colocar 20 ml de ácido, porque esta quantidade cria uma coluna líquida de dois centímetros dentro do cilindro, cobrindo assim toda superfície de pele localizada dentro deste perímetro.


Figura 1 - Esquema do cilindro de vidro temperado colocado no dorso dos animais



No grupo de ratos em que o ácido clorídrico foi neutralizado por soda cáustica, após 30 segundos de exposição ao ácido clorídrico, eram colocados 240 ml de soda cáustica dentro do cilindro (Figura 1C), para reagir com o ácido clorídrico, por mais 30 segundos; nestes casos, como marcador de neutralização de pH foi utilizada a fenolftaleína.

No outro grupo, após 30 segundos de exposição ao ácido clorídrico 12 molar, retirava-se o cilindro do dorso do animal e era utilizada uma torneira comum aberta com água corrente volumosa e constante sobre a área exposta, por quinze minutos.

Para avaliação estatística foram utilizados o teste de Kolmogorov-Smirnov.


RESULTADOS

A variável estudada foi a profundidade da queimadura. Para facilitar o entendimento, a profundidade da queimadura foi graduada em cruzes (Tabela 1):




- Sem lesão (0): um rato de cada grupo;

- Lesão da epiderme (+): sete ratos do grupo 1 e oito ratos do grupo 2 (Figura 2);


Figura 2 - Lesão da epiderme (Grupo 1/soda). Ambos os grupos apresentaram lesões predominantemente superficiais



- Lesão da derme papilar (++): sete ratos do grupo 1 e quatro do grupo 2 (Figura 3);


Figura 3 - Lesão da derme papilar (Grupo 1/soda). Ambosos grupos apresentaram resultados semelhantes



- Lesão da derme reticular (+++): três do grupo 1 e quatro do grupo 2;

- Lesão da derme profunda (++++): um do grupo 1 e dois do grupo 2 (Figura 4);


Figura 4 - Lesão da derme profunda (Grupo 2/água). Poucos ratos em ambos os grupos apresentaram lesões profundas



- Lesão da hipoderme (+++++): um rato de cada grupo.

Não foi observada diferença estatística significativa entre os tratamentos estudados (Figura 5 e Tabela 1).


Figura 5 - Proporção acumulada X profundidade da queimadura



Em ambos os grupos, foi observado que os ratos apresentavam poucas lesões e estas eram de extensões milimétricas ou puntiformes, mesmo nos ratos que apresentaram lesões mais profundas (Figura 6).


Figura 6 - Lesão pequena em extensão. Em ambos os grupos (1 e 2), predominaram lesões de pequena extensão



DISCUSSÃO

Previamente à execução deste trabalho, foi realizado um projeto piloto utilizando 12 ratos Wistar divididos em seis pares10. Em metodologia semelhante, todos os ratos foram expostos ao ácido clorídrico 12 molar por 30 segundos. Cada par de ratos foi submetido a um procedimento diferente, utilizando água corrente e bases no intuito de minimizar a lesão pelo ácido. Os melhores resultados foram nos pares que tiveram o ácido neutralizado com soda cáustica 1 molar e nos que foram lavados exaustivamente com água corrente por quinze minutos, tendo sido muito semelhantes os resultados entre estes dois pares. Um par de ratos foi mantido sem tratamento após a exposição ao ácido clorídrico e evoluiu com lesão de terceiro grau extensa (Figuras 7 e 8).


Figura 7 - Lesão de 3º grau extensa; projeto piloto ácido clorídrico sem tratamento realça os resultados dos tratamentos utilizados no presente trabalho


Figura 8 - Lesão de 3º grau extensa; projeto piloto de ácido clorídrico sem tratamento



Diante dos excelentes resultados obtidos no projeto piloto nos pares de ratos tratados com neutralização com soda cáustica e lavados exaustivamente com água corrente por 15 minutos, os autores deram continuidade ao presente trabalho, com o intuito de obter dados estatisticamente significativos relacionados a estes dois tipos de tratamentos.


CONCLUSÃO

No presente trabalho, não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos 1 e 2 na avaliação do resultado do tratamento de áreas expostas ao ácido clorídrico 12 molar. A neutralização com soda cáustica se mostrou eficaz, minimizando a queimadura, o que diverge da literatura. Lavar com água corrente imediatamente a área exposta também foi eficaz, minimizando a queimadura, o que está de acordo com a literatura. A água é amplamente disponível, e lavar com água corrente é fácil, prático, barato e não necessita de cálculos ou estimativas. Portanto, lavar imediatamente com água corrente uma área exposta ao ácido clorídrico ainda parece ser a melhor alternativa de tratamento inicial. Pelo projeto piloto foi observado que áreas expostas ao ácido clorídrico 12 molar e não submetidas a tratamento podem evoluir com queimaduras de terceiro grau bastante extensas, o que realça os resultados obtidos com os tratamentos selecionados para realização deste trabalho. O presente trabalho busca novas alternativas para melhorar o tratamento dos pacientes queimados por ácidos, como também aumentar o arsenal terapêutico do profissional de saúde.


AGRADECIMENTOS

Prof. Dra. Eliana Aparecida de Rezende Duek, do Departamento de Bioquímica e Química da PUC-SP, e aos demais funcionários do Departamento de Bioquímica e Química, do Departamento de Patologia e do Biotério da PUC-SP.


REFERÊNCIAS

1. Leonard LG, Scheulen JJ, Munster AM. Chemical burns: effect of prompt first aid. J Trauma. 1982;22(5):420-3.

2. Kim J, Weibel TJ, Carter EJ, Calobrace MB, Foldi JF, Zawacki BE. A standard experimental "chemical burn". Burns. 1994;20(3):200-1.

3. Yano K, Hosokawa K, Kakibuchi M, Hikasa H, Hata Y. Effects of washing acid injuries to the skin with water: an experimental study using rats. Burns. 1995;21(7):500-2.

4. Mozingo DW, Smith AA, McManus WF, Pruitt BA Jr, Mason AD Jr. Chemical burns. J Trauma. 1988;28(5):642-7.

5. Curreri PW, Asch MJ, Pruitt BA. The treatment of chemical burns: specialized diagnostic, therapeutic, and prognostic considerations. J Trauma. 1970;10(8):634-42.

6. van Rensburg L. An experimental study of chemical burns. S Afr Med J. 1962;36:754-9.

7. Gruber RL, Laub DR, Vistnes LM. The effect of hydrotherapy on the clinical course and pH of experimental cutaneous chemical burns. Plast Reconstr Surg. 1975;55(2):200-4.

8. Mahan M. Química um curso universitário. 2ª ed. São Paulo:Edgar Blücher;1991. p.156-9.

9. Masterton W, Slowinski E. Princípios de química. 6ª ed. Rio de Janeiro:Guanabara;1990. p.418-9.

10. Lyra MC, Orgaes FAFS, Marques BPA, Quevedo FC, Duek ear, Gonella HA. Nota prévia: diferentes tratamentos iniciais para queimaduras com ácido clorídrico ácido clorídrico em modelo experimental. Rev Fac Ciências Médicas Sorocaba (no prelo).














1. Residente do Serviço de Cirurgia Plástica Linneu Matos Silveira / PUC-SP.
2. Professor de Patologia da PUC-SP.
3. Regente do Serviço de Cirurgia Plástica Linneu Matos Silveira / PUC-SP.

* Trabalho vencedor do Prêmio Raul Couto Sucena-2007.
Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia Plástica Linneu Matos Silveira da Pontifícia Universidade Católica (PUC), SP. Prêmio Raul Couto Sucena - 2007.

Correspondência para:
Hamilton Aleardo Gonella
Rua Afonso Cavalline, 142
Sorocaba - SP
Tel: (15) 3231-2205
E.mail: hagonella@hotmail.com

Artigo recebido: 06/01/2008
Artigo aceito: 10/03/2008

 

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