ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Original Article - Year2008 - Volume23 - Issue 3

RESUMO

Introdução: Os pacientes que são submetidos a cirurgias bariátricas freqüentemente evoluem com hérnias de parede abdominal, sejam estas imperceptíveis ao exame físico ou mesmo grandes eventrações com perda de domicílio. Método: Neste artigo, os autores relatam suas experiências com o tratamento destas hérnias durante a abdominoplastia multifuncional, por meio do isolamento e redução do saco herniário e síntese primária da falha aponeurótica com posterior plicatura desta, sem o uso de materiais aloplásticos. Foi realizado um estudo retrospectivo abrangendo um total de 44 pacientes, num período de cinco anos e meio, onde a eficácia e segurança da técnica foram analisadas.

Palavras-chave: Hérnia ventral. Abdome/cirurgia. Cirurgia bariátrica/efeitos adversos. Gastroplastia/efeitos adversos. Obesidade mórbida/cirurgia.

ABSTRACT

Introduction: Abdominal wall hernias frequently occur after open bariatric surgical procedures, which may be imperceptible during physical examination or very remarkable as big eventrations with loss of domain. Methods: In this article, the authors report their experience with the treatment of these hernias during the multifunctional abdominoplasty, thru the isolation and reduction of the herniary sac, primary synthesis of the defect and plicature of the aponeurosis, without using aloplastic materials. The authors made a retrospective study with 44 patients, over five and a half year's period, where the effectiveness and safety of the technique were analized.

Keywords: Hernia, ventral. Abdomen/surgery. Bariatric surgery/adverse effects. Gastroplasty/adverse effects. Obesity, morbid/surgery.


INTRODUÇÃO

O aumento crescente do número de cirurgias bariátricas tem trazido ao cirurgião plástico o grande desafio de tratar um novo grupo de pacientes. São pacientes com deformidades ocasionadas pelo ganho ponderal demasiado, e exacerbadas por sua rápida perda ponderal. As seqüelas da perda ponderal incluem não apenas a redundância cutânea e flacidez fascial, particularmente no abdome1, como também a presença de cicatrizes na parede abdominal e hérnias ventrais (Figuras 1 a 3).


Figura 1 - Paciente do sexo feminino, 65 anos, tendo apresentado perda ponderal de 78 kg, pós-gastroplastia. A, B e C: pré-operatório, onde se observa, além do avental abdominal, hérnia incisional. D, E e F: pós-operatório de 165 dias, com correção do defeito da parede abdominal.


Figura 2 - Paciente do sexo masculino, 29 anos, com perda ponderal de 90 kg, pós-gastroplastia. A, B e C: pré-operatório, apresentando grande avental abdominal, e hérnia incisional epigástrica. D, E e F: pós-operatório de oito meses, onde se observa a manutenção do contorno corporal e a ausência de recidiva do defeito da parede abdominal.


Figura 3 - Paciente do sexo masculino, 24 anos, com perda ponderal de 115 kg, após cirurgia bariátrica. A, B e C: pré-operatório, onde se observam alterações cutâneas do "panicullus morbidus". D, E e F: pós-operatório de seis meses, com manutenção da correção do defeito da parede abdominal.



Sabe-se que a obesidade é fator de risco para hérnias incisionais, e que, o índice de hérnias incisionais após bypass gástrico via laparotomia gira em torno de 4 a 20%2-4. Desse modo, o cirurgião deve ter a correção cirúrgica das hérnias abdominais como parte integrante do tratamento das deformidades desses pacientes.

Esse trabalho visa à apresentação de nossa experiência no tratamento das hérnias abdominais em pacientes após grandes perdas ponderais, submetidos a abdominoplastia multifuncional.


MÉTODO

Foi realizado um estudo retrospectivo, no período de agosto de 2002 a janeiro de 2008, em 44 pacientes submetidos a abdominoplastia multifuncional, que apresentavam hérnias incisionais medianas de grande volume, diagnosticadas ao exame físico. A idade dos pacientes variou de 21 a 65 anos (média de 45 anos de idade), sendo 16 homens e 28 mulheres.

Estes pacientes foram acompanhados por um período médio de 1 ano e 8 meses. O peso dos pacientes no préoperatório variou de 77 a 115 kg (média ponderal de 90,4 kg) e a perda ponderal média foi de 65,92 kg entre os pacientes.

Todas as hérnias foram reparadas no mesmo tempo cirúrgico da abdominoplastia, após ressecção do excesso cutâneo em monobloco, sem qualquer descolamento, como preconizado pela técnica5. Após a identificação, isolamento e redução do saco herniário, foi realizada rafia da falha aponeurótica, utilizando-se fio absorvível, multifilamentar, número 0. Seguiu- se à plicatura de toda a aponeurose dos músculos retos abdominais, também com fio multifilamentar absorvível número 0, com pontos separados em "X". Não foi colocada tela de polipropileno em nenhum dos pacientes operados (Figura 4).


Figura 4 - Seqüência de tratamento do defeito da parede abdominal. A: identificação do defeito; B: reparo dos bordos do defeito; C: síntese do anel herniário e plicatura da parede abdominal; D: aproximação dos retalhos abdominais sem o uso da tela de Marlex.



O peso médio da peça cirúrgica nesta série foi de 5.653 kg (menor peça com 2,75 kg e maior com 19,5 kg).

Drenos de sucção a vácuo são colocados e mantidos no pós-operatório até que a drenagem fosse inferior a 60 ml, em 24 horas. Curativo gessado foi mantido nas primeiras 24 horas, sendo então substituído por cinta compressiva. Deambulação foi realizada já nas primeiras 24 horas de pósoperatório. O tempo médio de internação hospitalar foi de 48 horas. Antibioticoterapia foi mantida por sete dias, com cefalosporinas de primeira geração.

Todos os procedimentos cirúrgicos foram realizados sob anestesia geral, tendo sido utilizado massageador pneumático de panturrilhas como profilaxia mecânica antitrombótica. Profilaxia medicamentosa só foi realizada em casos em que as condições clínicas do paciente assim exigissem, não tendo sido utilizada em nenhum dos pacientes desta série.

O controle pós-operatório variou de seis meses a cinco anos.


RESULTADOS

Dos 44 pacientes operados, todos apresentavam hérnias incisionais diagnosticadas ao exame físico, sendo tratadas no mesmo ato cirúrgico da abdominoplastia multifuncional com ráfia direta e plicatura, sem a colocação de tela de polipropileno. O tempo cirúrgico médio foi de 3 horas e 55 minutos.

Acompanhamento ambulatorial rigoroso foi realizado até o terceiro mês de pós-operatório, inicialmente com curativos diários na primeira semana, passando a dias alternados até o décimo quinto dia, e posteriormente a cada sete dias. Após esse período, acompanhamento semestral foi mantido com o objetivo de avaliar reganho de peso, manutenção de resultado e recidiva do defeito da parede abdominal.

O índice de complicações foi de 13%, incluindo cicatrizes hipertróficas, seroma e alargamento da cicatriz umbilical. Não tivemos nesta série nenhum caso de tromboembolismo pulmonar ou trombose venosa profunda, assim como nenhum paciente necessitou de transfusão sanguínea ou de internação em unidade de terapia intensiva. Não foi observado nenhum caso de recidiva do defeito na parede abdominal (Figura 5).


Figura 5 - Paciente do sexo feminino, 33 anos, com perda ponderal de 75 kg, pós-gastroplastia. A, B e C: Pré-operatório, evidenciando hérnia incisional. D, E e F: Pós-operatório de 4 anos, evidenciando a manutenção do resultado e ausência de recidiva no defeito da parede abdominal.



DISCUSSÃO

O crescente número de cirurgias bariátricas e dos pacientes que apresentam seqüelas corporais de grande perda ponderal trouxe ao cirurgião plástico a necessidade de adequar técnicas cirúrgicas descritas à nova realidade destes pacientes. As hérnias incisionais estão frequentemente presentes nos pacientes submetidos a bypass gástrico, sobretudo via lapatomia. Além disso, a associação a comorbidades comuns à obesidade, como o diabetes mellitus, aumenta o risco e a incidência desse tipo de defeito da parede abdominal. Neste contexto, as abdominoplastias vêm se adequando para suprir as necessidades dos ditos "ex-obesos", o que inclui, além da ressecção de grandes blocos cutâneos e do tratamento da flacidez músculo-aponeurótica, a associação com outras cirurgias, como a correção das hérnias incisionais.

Na abdominoplastia multifuncional, como a ressecção da peça se faz em monobloco, há facilidade maior em identificar e isolar o saco herniário (Figura 6), com menor chance de injúria, já que a dissecção é realizada ao redor do mesmo. A plicatura da flacidez aponeurótica, realizada rotineiramente, é fundamental na obtenção de melhor contorno corporal, gerando resultados mais duradouros6,7.


Figura 6 - Seqüência intra-operatória. A: descolamento do retalho ao redor do anel herniário, com identificação de suas bordas; B: reparo das bordas da hérnia para sua posterior síntese.



Após a perda ponderal há importante redução do conteúdo abdominal que, muitas vezes, não é acompanhada do retorno do conteúdo herniário à cavidade. Considerando-se esta intensa redundância muscular, optamos por tratar as hérnias abdominais apenas com plicatura aponeurótica, uma vez que a relação conteúdo-continente destes pacientes encontra-se alterada, permitindo-se que se subtraia continente, sem que com isso se imprima uma tensão exagerada à parede abdominal. Isto torna desnecessário o uso de materiais aloplásticos, reduzindo, assim, o índice de complicações inerentes ao uso dos mesmos8.


CONCLUSÃO

A correção cirúrgica do abdome nos pacientes após grandes perdas ponderais deve abranger não apenas a paniculectomia, mas também o tratamento de todos os aspectos mórbidos que acompanham o paciente, exigindo do cirurgião um procedimento seguro, eficaz e global.

O tratamento cirúrgico de hérnias incisionais nestes pacientes foi adequadamente realizado com ráfia primária e plicatura da aponeurose abdominal, sem a necessidade da colocação de materiais aloplásticos, evitando-se as complicações inerentes a estes8. Isto se deve à perda significativa de conteúdo abdominal observada, permitindo que o tecido aponeurótico redundante seja suficiente para restaurar, sem tensão, a parede abdominal.


REFERÊNCIAS

1. Manahan MA, Shermak MA. Massive panniculectomy after massive weight loss. Plast Reconstr Surg. 2006;117(7):2191-9.

2. Borud LJ, Grunwaldt L, Janz B, Mun E, Slavin SA. Components separation combined with abdominal wall plication for repair of large abdominal wall hernias following bariatric surgery. Plast Reconstr Surg. 2007;119(6):1792-8.

3. Shermak MA. Hernia repair and abdominoplasty in gastric bypass patients. Plast Reconstr Surg. 2006;117(4):1145-52.

4. Arribas D, Elia M, Artigas C, Jimenez A, Aguilella V, Martinez M. Incidence of incisional hernia following vertical banded gastroplasty. Hérnia. 2004;8(2):135-7.

5. Roxo CDP, Junior EML, Alcântara BJC, Roxo ACW. Abdominoplastia en ancla. In: Coiffman F, editor. Cirugía plástica, reconstructiva y estética: Tomo IV, Primera parte. Colômbia:Amolca;2008. p.3338-47.

6. Nahas FX, Ferreira LM, Augusto SM, Ghelfond C. Long-term follow-up of correction of rectus diastasis. Plast Reconstr Surg. 2005;115(6):1736-43.

7. Nahas FX, Augusto SM, Ghelfond C. Nylon versus polydioxanone in the correction of rectus diastasis. Plast Reconstr Surg. 2001;107(3):700-6.

8. Burger JW, Luijendijk RW, Hop WC, Halm JA, Verdaasdonk EG, Jeekel J. Long-term follow-up of a randomized controlled trial of suture versus mesh repair of incisional hernia. Ann Surg. 2004;240(4):578-85.










I. Membro Titular da SBCP, Chefe do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Geral do Andaraí, Rio de Janeiro.
II. Médica Residente do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Pedro Ernesto, Universidade Estadual do Rio de Janeiro.
III. Médicos Residentes do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Geral do Andaraí, Rio de Janeiro.

Correspondência para:
Carlos Del Pino Roxo
Avenida Ayrton Senna, 1850 / 352
Barra da Tijuca. Rio de Janeiro. RJ
CEP 22775-000
E-mail: drcroxo@rjnet.com.br

Trabalho realizado no Hospital Geral do Andaraí e clínica particular do autor, Rio de Janeiro, RJ.

Artigo recebido: 30/06/2008 Artigo aceito: 15/09/2008

 

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