ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Articles - Year2002 - Volume17 - Issue 2

RESUMO

É relatado um caso pouco freqüente de lipoma mamário gigante, com evolução lenta desde a adolescência, em uma paciente adulta jovem, enfatizando-se os aspectos clínicos, patológicos, diagnósticos e terapêuticos.

Palavras-chave: Lipoma; mama; mamoplastia; reconstrução mamária; cirurgia

ABSTRACT

The manuscript describes a quite infrequent giant breast lipoma progressing slowly since adolescence, in a young female adult. Clinical, pathology, diagnosis and therapeutic aspects are emphasized.

Keywords: Lipoma; breast; mammaplasty; breast reconstruction; surgery


INTRODUÇÃO

Os lipomas são neoplasias benignas do tecido adiposo, sendo os tumores mesenquimais mais comuns(1). Mostram-se geralmente solitários, podendo ser múltiplos e finamente encapsulados, com incidência estimada de 10 % e apresentando crescimento insidioso e limitado, localizando-se sobretudo no tecido subcutâneo do pescoço, tronco, face, mãos e pés. Acometem também estruturas profundas, como o retroperitôneo, músculos esqueléticos, mediastino, trato gastrintestinal, rins, brônquios, fígado, miométrio, baço, coração, sistema nervoso central, glândulas salivares e mamárias(2). Estão presentes na mama como em qualquer outro local em que haja gordura(3,4). Quando crescem exageradamente, podem ser considerados gigantes. Para que sejam diagnosticados na mama é preciso que sejam palpáveis e que exibam cápsula e septos fibrosos.


OBJETIVO

Ressaltar os aspectos clínicos, patológicos, diagnósticos e terapêuticos dos lipomas gigantes, tendo como base a apresentação de um caso clínico pouco freqüente de lipoma mamário, com evolução lenta, desde a adolescência, em uma paciente adulta jovem.


RELATO DO CASO

ECM, 30 anos, sexo feminino, branca, casada, administradora de empresas, residente no município do Rio de Janeiro.

A paciente apresentava desde a adolescência tumoração palpável, móvel, de consistência firme-elástica, indolor, localizada no pólo inferior da mama esquerda, medindo aproximadamente 15 cm de maior eixo. O constante crescimento levou à assimetria importante (Figs.1a-c). O exame radiológico mamário revelou tumoração encapsulada, de contornos definidos e limites precisos, compatível com lipoma (Fig. 2). Foi feita a marcação em ambas as mamas segundo a técnica de mamoplastia de Pitanguy (Fig. 3). Indicada, foi realizada a ressecção do tumor, que à macroscopia consistia em tecido gorduroso, amarelado e brilhante, pesando 400 g e medindo 15 x 9,5 x 5 cm (Figs. 4a-e), tendo sido feita imediata reconstrução da mama esquerda, confeccionando-se retalho lateral de pedículo superior (Figs. 5a-b). A mama contralateral foi submetida à mamoplastia de equilíbrio (Fig. 6).


Fig. 1a - Pré-operatório; vista frontal.


Fig. 1b - Pré-operatório; vista lateral esquerda.


Fig. 1c - Pré-operatório; vista lateral direita.


Fig. 2 - Detalhe do exame radiológico exibindo rumoração encapsulada, de conrornos definidos e limires precisos, sugestivo de lipoma.


Fig. 3 - Marcação pré-operatória segundo a técnica demamoplastia de Pitanguy.


Fig. 4a - Intra-operatório; vista parcial do tumor.


Fig. 4b - Ressecção do tumor constituído por tecido gorduroso, amarelado e brilhante.


Fig. 4c - Ressecção do tumor constituído por tecido gorduroso, amarelado e brilhante.


Fig. 4d - Vista panorâmica demonstrando a retirada do extenso tumor.


Fig. 4e - Espaço resultante após a retirada do tumor.


Fig. 5a - Reconstrução da mama esquerda confeccionando-se retalho cirúrgico lateral de pedículo superior.


Fig. 5b - Reconstruçãoo da mama esquerda confeccionando-se retalho cirúrgico latcral de pedículo superior.


Fig. 6 - Pós-operatório imediato. Sutura final. A mama direita foi submetida à mamoplastia dc cquilíbrio.



RESULTADOS

O pós-operatório transcorreu sem intercorrências, evoluindo com ótima cicatrização da ferida operatória, obtendo-se correção da assimetria mamária e proporcionando conforto e grande satisfação à paciente, dado o excelente resultado estético (Figs. 7a-c).


Fig. 7a - Pós-operatório de 1 ano; vista frontal. Ótima cicatrização da ferida operatória, com resultado satisfatório.


Fig. 7b - Pós-operatório; vista lateral direita.


Fig. 7c - Pós-operatório; vista lateral esquerda.



DISCUSSÃO

Os lipomas acometem principalmente as mulheres, com história familial positiva, sobretudo quando múltiplos, parecendo haver correlação entre o seu desenvolvimento e a obesidade. A maioria ocorre como tumor isolado ou em número limitado. Os lipomas subcutâneos freqüentemente são pequenos, medindo 1 a 4 cm de diâmetro, podendo ultrapassar 10 cm e pesando até 10 g(2). Em raros casos os lipomas podem crescer exageradamente, produzindo sintomas.

Em 1894, Brandler(5) descreveu o maior lipoma cutâneo, em um jovem adulto de 26 anos, localizado na região escapular esquerda, com 22,7 kg.

Não há normas para definir exatamente o tamanho do tumor para que possa ser considerado gigante. Apenas o peso não é suficiente para defini-lo, tendo em vista que a multiplicação das traves fibrosas em relação ao tecido adiposo aumenta a densidade do tumor, sem provocar mudanças sensíveis em seu tamanho(6). Uma revisão de literatura sugere que lipomas gigantes meçam no mínimo 10 cm de diâmetro ou pesem pelo menos 1000 g(2).

Considerado um dos mais inocentes tumores, raramente os lipomas causam sintomas. Entretanto, aqueles situados mais profundamente podem causar sintomas conseqüentes à pressão exercida em estruturas contíguas(7). Os lipomas internos podem crescer amplamente antes de produzir sintomas - os quais se manifestam posteriormente através de dor abdominal, falência renal ou outras complicações sistêmicas - e sofrer transformação sarcomatosa. Em contraste, dificilmente lipomas cutâneos tornam-se lipossarcomas(8).

Os lipomas cutâneos gigantes são primariamente problemas estéticos, que aparecem com maior freqüência na região cervical, tórax e membros inferiores (região inguinal e coxa). Podem ocasionalmente levar a limitações funcionais ou linfedema. Os sinais e sintomas derivam-se da proximidade com outras estruturas, como, por exemplo, nervos. Os lipomas raramente se calcificam e, quando isso ocorre, essa degeneração é conseqüência de infartos dos tumores de grande volume.

Não devem ser confundidos com as galactoceles ou com a esteatonecrose, que não apresentam septos fibrosos internos. O diagnóstico diferencial dos lipomas é realizado sobretudo com cistos (sebáceos, pilonidais e de inclusão), xantomas e lesões papulonodulares, como nódulos reumatóides e neuromas. Nos lipomas gigantes o principal diagnóstico diferencial é feito com tumores de partes moles (que acometem vasos, nervos, tendões e músculos), além de tumores ósseos.

A transformação maligna é rara, devendo ser suspeita em tumores com crescimento rápido, recorrentes e com ulcerações da pele(9). Quando há suspeita clínica de lipoma, exames de imagem auxiliam no diagnóstico, fornecendo informações adicionais. A ultra-sonografia, a mamografia, a tomografia computadorizada e a ressonância nuclear magnética revelam lesão compatível com lipoma(7).

Entretanto, apenas o diagnóstico histopatológico é definitivo. Macroscopicamente, consiste em um tecido gorduroso amarelado, brilhante, separado por delgadas trabéculas fibrosas. A microscopia revela tecido adiposo maduro, sem atipia celular; apenas adipócitos perfeitamente desenvolvidos estão presentes. As células adiposas mostram-se idênticas à gordura normal, podendo estar misturadas ao tecido fibroso. Os elementos mesenquimais são encontrados com freqüência. Áreas de infarto, necrose, calcificação, metaplasia óssea ou cartilaginosa, ulceração da superfície, infecção e gangrena são alterações secundárias possíveis(2).

O tratamento cirúrgico dos lipomas em geral é realizado sob anestesia local ou geral. A dissecção do tumor é facilitada devido à pressão exercida pelos tecidos circundantes, formando uma pseudocápsula bem definida. Usualmente não há sinais de recorrência após a cirurgia(7).

O tratamento cirúrgico convencional é preferível, principalmente quando o lipoma infiltra o músculo ou envolve grandes vasos e nervos. Entretanto, a lipoaspiração tem sido relatada como outra forma de tratamento, removendo o tecido gorduroso. Grandes hematomas e recidivas causadas por remoção incompleta dos tumores são possíveis complicações de lipoaspiração(10).

No caso apresentado foram indicadas e realizadas a ressecção do tumor e a imediata reconstrução da mama esquerda, confeccionando-se retalho lateral de pedículo superior, efetuando-se uma correção estética com o emprego da técnica de mamoplastia de Pitanguy. Após a extirpação do tumor da mama esquerda, a mama contralateral foi submetida à mamoplastia de equilíbrio.

Em 1961, Pitanguy descreveu a técnica de mamoplastia que se tornou uma das mais conhecidas, e que foi utilizada na realização da reconstrução do caso exposto. A avaliação e delimitação da área a ser ressecada é realizada individualmente em cada mama separadamente e depende de diversos fatores, como consistência glandular, volume e elasticidade da pele. Essa técnica mostra-se capaz de evitar o descolamento pele-glândula porque as medidas justas previamente calculadas dos três pedículos (mediana, superior e lateral) permitem o ajuste espontâneo dos bordos das incisões iniciais às suas posições finais com a mama em forma cônica(11).


CONCLUSÃO

O lipoma gigante surge na mama do mesmo modo que pode aparecer em outros sítios do organismo, sendo considerado primariamente um problema estético e benigno. Em caso de suspeita clínica, exames radiológicos podem corroborar o diagnóstico. O tratamento cirúrgico é definitivo e satisfatório quando bem realizado.


BIBLIOGRAFIA

1. Mescon H. Lipoma in clinical dermatology. Clin Dermatol. 1991;4:1-2.

2. Juan R. Surgical Pathology. 1994;2:1573-79.

3. Bloom RA, Gomori JM, Feelds SI, Katz E. Abdominal wall lipoma - CT and MRI appearence. Compute Med Imaging Graf. 1991;15:37.

4. Ryndholm A, Berg Ho. Size, site and clinical incidence of lipoma. Acta Orthop Scand. 1983;54:929-34.

5. Brandler TI. Large Fibrolipoma. Br Med J. 1894;1:574.

6. Sanchez MR. Giant lipoma - case report and review of the literature. J Am Acad Dermatol. 1993;28:266-8.

7. Eli KH, et al. Giant lipomas. Plast Reconstr Surg. 1994;94:369-71.

8. Enzinger FM, Weiss SW. Soft tissue tumors. St. Louis: CV Mosby. 1988:341-45.

9. Fleegler EJ. Tumors of the Upper Extremity. WC Grabb and JW Smith (Eds). Plast Surg. Boston:Little Brown; 1991. p. 983-4.

10. Lewis CM. Treatment of large lipoma of the back. Hetter GP ed. Lipoplasty: the theory and practice of blunt suction lipectomy. Boston:Little Brown; 1984. p. 128-41.

11. Pitanguy I. Mammaplastic, Estudo de 245 casos consecutivos de mamoplastia e apresentação de técnica pessoal. Rev Bras Cir. 1961;42:201-20.










I. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Professor Assistente da Disciplina de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Pedro Ernesto - UERJ.
II. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Professora Assistente da Disciplina de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Pedro Ernesto - UERJ.
III. Membro Aspirante da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Médico Residente da Disciplina de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Pedro Ernesto - UERJ.

Endereço para correspondência:
José Horácio Costa Aboudib Júnior
Av. Ataulfo de Paiva, 341, sls. 801/802
Rio de Janeiro - RJ - 22440-030
Fone: (21) 2511-3669
e-mail: aboudib@mtecnet.com.br

 

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