ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175
Resistência à Torção e à Flexão de Ossos Metacarpais Humanos: Estudo Experimental
Resistance to Torsion and Flexion of Human Metacarpal Bones: Experimental Study
Articles -
Year2000 -
Volume15 -
Issue
2
Ricardo Nogueira BezerraI, Fernando Antônio Gomes de AndradeII, Glauco MansoIII, Ronaldo Jorge AzzeIV, Cláudio CavalcantiV, Priscila Kuriki Vieira MotaVI, Regina Pacis Nogueira do NascimentoVI
RESUMO
Foram estudados 80 ossos metacarpais, do 2º ao 5º, de 20 mãos de cadáveres humanos formolizados, com média de idade de 44 anos, variando de 20 a 62 anos. Quarenta ossos metacarpais serviram para testes de torção e 40 outros, para teste de flexão em máquina universal de ensaios mecânicos. Objetivamos determinar a resistência dos ossos metacarpais e comparar a precisão dos ensaios de torção e de flexão. A resistência dos ossos metacarpais à flexão foi aproximadamente quatro vezes maior do que à torção. Os dois ensaios exibiram idêntica precisão estatística. O 2º e o 3º ossos metacarpais, em ambos os testes, foram cerca de duas vezes e meia mais resistentes que o 4º e o 5º.
Palavras-chave:
Mão; ossos metacarpais; estudo experimental
ABSTRACT
The authors studied 80 metacarpals II to V of 20 human cadaver hands with mean age of 44 years, ranging from 20 to 62 years old. 40 metacarpal bones were used in torsion tests and other 40 were used in flexion tests in mechanical universal testing machine. The authors' objective was to determine metacarpal bones resistance and to compare the accuracy of torsion and flexion testing. Resistance of metacarpal bones to flexion was approximately four times higher than to torsion. Both tests showed identical statistical accuracy. The II and m metacarpals were around 2.5 times more resistant than the IV and V ones.
Keywords:
Hand; metacarpal bones; experimental study
INTRODUÇÃO
Neste estudo objetivamos conhecer a resistência dos ossos metacarpais no intuito de obter elementos que auxiliarão no dimensionamento de seus materiais de osteossíntese, contribuindo assim para o aperfeiçoamento biomecânico desses materiais.
MATERIAL E MÉTODO
Foram utilizados 80 ossos metacarpais, do 2º ao 5º, de 10 pares de mãos de cadáveres humanos formolizados. Cinco pares de mãos prestaram-se a testes de torção e os 5 outros, aos testes de flexão. A idade dos cadáveres oscila de 20 a 62 anos, com média de 44 anos ± 13,50. Todas as mãos foram oriundas de cadáveres do sexo masculino. Os metacarpais foram medidos, pesados e inspecionados visual e radiograficamente, pré e pós-ensaios.
Todos os testes foram executados em máquina universal de ensaios mecânicos Kratos K5002, dotada de célula de carga eletrônica e registrador gráfico. Adotou-se a velocidade de aplicação de carga de 20mm/min.
Ensaios de torção
No ensaio de torção, empregou-se roda dentada e corrente. Uma garra especialmente desenvolvida foi acoplada à roda dentada axialmente, sendo aí fixada uma das extremidades do osso metacarpal. Em sistema telescópico solidário à base do dispositivo, foi montada concentricamente uma segunda garra, idêntica à anterior, o que permitiu a fixação da outra extremidade óssea, de acordo com o comprimento necessário à fixação. Tal sistema assegurou que as medidas de resistência e deformação angulares dos ossos metacarpais fossem obtidas por relações de resistência e deformação linear, conseguidas automaticamente pelo equipamento, o que autorizou inclusive o acompanhamento gráfico de todas as provas, através de registrador gráfico, obtendo-se assim os diagramas carga versus deformação de cada prova. A influência de cada peso da corrente e do atrito foi determinada em teste de calibração em vazio e deduzida nos valores finais.
Ensaios de flexão
Para os ensaios de flexão, optou-se pela flexão simples biapoiada. Esses testes foram realizados com cutelo centralizado. Os apoios foram fixados a uma morsa, que também permitia a regulagem do comprimento útil (comprimento do osso metacarpal entre apoios). Os ossos metacarpais foram apoiados em duas barras metálicas, com superfícies cilíndricas giratórias, distantes paralelamente. O cutelo metálico utilizado tem a forma semicilíndrica, com ângulo de abertura de 55 graus.
Momentos e deformações angulares
Obtivemos registros gráficos de carga (kgf) versus deformação (mm) em ambos os ensaios. A partir desses resultados, calculamos os momentos e as deformações angulares virtuais em função das seguintes relações:
√ Torção
√ Relações obtidas
Para cálculo dos esforços:
M = F.r, em que M = momento torcional (kgf x mm); F = força medida pela máquina (kfg); r = D/2 = 138/3 = 69 mm, braço de alavanca da roda dentada.
Para cálculo do momento torcional:
MT = M - M', em que MT é o momento torcional corrigido (kgf/mm); M = momento torcional obtido (kgf/mm); M' = momento torcional gerado pelo peso da corrente e pelo atrito.
Para cálculo da deformação angular torcional:
0 = d/K, em que 0 = deformação angular (em graus); d = deformação linear (mm), K = constante de proporcionalidade (graus/mm).
Flexão
O comprimento útil foi L/2, com os apoios posicionados em L/4 e 3L/4, da mesma maneira que nos ensaios de torção. O momento fletor foi calculado segundo a equação:
em que F foi obtido a partir dos diagramas e o comprimento útil, como nos ensaios de torção.
Com o osso metacarpal apoiado na sua superfície dorsal, posicionamos o cutelo sobre a superfície volar. O ângulo de flexão virtual foi calculado pela seguinte expressão: 0 = arctg (2d/Lútil), em que d = deformação ou flecha, verificada no comprimento útil, e Lútil = comprimento do osso metacarpal entre apoios.
Para análise estatística, adotou-se nível de significância de 5% (p = 0,05).
DISCUSSÃO
São raros os trabalhos sobre caracterização mecânica de ossos humanos na literatura. Não encontramos trabalhos especificamente a respeito de comparações entre testes de torção e de flexão em ossos metacarpais. Escolhemos proceder a esses ensaios porque a maioria das fraturas em ossos longos resulta de esforços de torção ou flexão.
Utilizamos ossos preservados em formol, porque levamos em conta, principalmente, a resistência à ruptura, que não sofre alteração significante nesse método de conservação(3). Verificamos que, do 2º ao 5º, os metacarpais apresentaram elasticidade semelhante. O ângulo médio de torção e de flexão não exibiu diferença estatisticamente significante.
Quanto à resistência, no ensaio de torção, constatou-se que o 2º e o 3º ossos metacarpais assemelharam-se entre si, sendo estatisticamente superiores ao 4º e ao 5º, também similares entre si.
Nos ensaios de flexão, quanto à resistência, o 2º e o 3º ossos metacarpais também se apresentaram semelhantes e superiores ao 4º e ao 5º. Da mesma maneira, o 4º e o 5º ossos metacarpais apresentaram resistências semelhantes.
Peters & Koebke(2) mediram a resistência à torção, do 2º ao 5º ossos metacarpais, em 50 pares de mãos humanas. Frisaram que em razão da posição específica do eixo radioulnal, através das cabeças dos ossos metacarpais, a mão pode ser dividida em três unidades funcionais: o polegar, o índice e o médio e o anular e mínimo. Mostraram que dentro dessa unidade funcional há duas intersecções separadas: uma para o 2º e o 3º ossos metacarpais e a outra para o 4º e o 5º, o que lhes permite terem comportamentos e resistências à torção, o que igualmente fora constatado nesta tese.
Bezerra(1), em dissertação de mestrado intitulada Resistência à Tração dos Tendões Flexores da Mão, concluiu que os tendões flexores superficiais e profundos do 2º e do 3º dedos são mais resistentes do que aqueles do 4º e do 5º.
Neste estudo, verificou-se que o 2º e o 3º ossos metacarpais apresentaram-se mais resistentes que o 4º e o 5º, provavelmente porque os primeiros são mais solicitados para funções que demandam maior esforço, como apreensão e sustentação de pesos. Já os ossos metacarpais 4º e 5º exercem mormente a função de apoio durante as variadas tarefas executadas pelas mãos. A comparação entre a referida dissertação e esta tese realçou a resistência dos respectivos tendões flexores.
Os ensaios de torção têm a mesma variação do que os de flexão. Assim, pode-se dizer que os ensaios, tanto de torção como de flexão, apresentam a mesma precisão ou repetibilidade.
Faz-se mister salientar que os ensaios de flexão foram de execução técnica mais simples, mais prática e mais rápida que os de torção.
A resistência dos ossos metacarpais à flexão foi muito maior que à torção.
No 2º e no 3º ossos metacarpais, foi maior cerca de três vezes e meia; até quase cinco vezes maior no 4º osso metacarpal e, no 5º, a diferença foi de aproximadamente quatro vezes.
Quanto à massa, comprimento e diâmetro médio dos ossos metacarpais, o 2º e o 3º equivalem-se; o 4º e o 5º também, formando assim dois grupos bem diferenciados.
O estudo das características mecânicas de resistência e elasticidade de ossos metacarpais de cadáveres humanos poderá fornecer elementos que auxiliem no dimensionamento mais adequado dos materiais de osteossíntese, o que possibilitará ao paciente melhor e mais conveniente reabilitação.
CONCLUSÕES
Os ossos metacarpais são, aproximadamente, quatro vezes mais resistentes à flexão que à torção.
Em ambos os ensaios, o 2º e o 3º ossos metacarpais mostram-se cerca de duas vezes e meia mais resistentes que o 4º e o 5º.
Os resultados dos ensaios de torção e de flexão revelam a mesma precisão.
BIBLIOGRAFIA
1. BEZERRA RN. Estudo experimental da resistência à tração dos tendões flexores da mão. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1991.
2. PETERS D, KOEBKE J. Torsion of metacarpals II to V. Functional and clinical significance. Handchir Mikrochir Plast Chir. 1990;22:191-195
3. ROSSI JDMBA, ODA A, MIRISOLA Jr WC. Alterações mecânicas de fêmures de rato submetidos a métodos de conservação. Rev Bras Ortop. 1986;21:111-114.
4. SELKER F, CARTER DR. Scaling of long bone fracture strength with animal mass. J Biomech.1989;22:1175-1183.
I. Professor Adjunto da Universidade Federal de Alagoas.
II. Professor Assistente da Universidade Federal de Alagoas. Chefe do Serviço de Cirurgia Plástica Reconstrutora do Hospital Universitário (UFAL). Membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
III. Chefe do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de Alagoas.
IV. Professor Titular da Universidade de São Paulo.
V. Professor Visitante da Universidade Federal de Alagoas .
VI. Estudantes de Medicina da Universidade Federal de Alagoas.
Endereço para correspondência:
Centro de Saúde (CSAU)
Campus Universit. A. C. Simões BR 101 Norte Km 14
Maceió - AL - 57081-000
Fone/fax: (82) 221-5081
Dept. Clínica Cirúrgica - Disciplina de Cirurgia Plástica Reconstrutora - Prof. Dr. Fernando Antônio Gomes de Andrade
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