

Original Article - Year 2024 - Volume 39 - Issue 4
Relação entre o padrão de força muscular, a classificação de rugas faciais e a dose de toxina botulínica sorotipo A
Relationship between Muscle Strength Pattern, Classification of Facial Wrinkles, and Dose of Botulinum Toxin Serotype A
RESUMO
Introdução A toxina botulínica A (BoNT-A) atua inibindo a liberação de acetilcolina do terminal présináptico, resultando em paralisia química reversível dos músculos. É um tratamento amplamente aceito para melhorar a aparência das linhas de expressão glabelares que se desenvolvem devido à contração muscular.
Materiais e Métodos Foram avaliados os padrões de forças glabelares; classificação de rugas faciais; e quantidade de unidades de BoNT-A utilizadas nos músculos corrugador e prócero.
Resultados A média total de unidades de BoNT-A utilizadas foi de 7,2 UI no músculo corrugador (mulheres 7,1 UI e homens 7,4 UI) e de 3,9 U no prócero (mulheres 3,9 UI e homens 4,1 UI), com correlação positiva entre o número de unidades utilizadas e a idade dos 58 participantes. Quanto ao padrão de forças, utilizou-se mais unidades no músculo corrugador com padrão forte e classificação de rugas faciais de 3 a 4, e moderado com a mesma classificação de rugas faciais (8 UI e 8,5 UI, respectivamente), no músculo prócero foram utilizadas mais unidades no padrão de força forte comrugas classificadas em 3 a 4 (5 UI). Sendo as rugas classificadas de 3 a 5 as que mais necessitaram de unidades de BoNT-A.
Conclusão A quantidade de unidades de BoNT-A utilizadas é diretamente proporcional ao padrão de força e classificação das rugas faciais, sendo necessária a utilização de mais unidades quando observado o padrão de força forte e classificação de rugas profundas.
Palavras-chave: dermatologia; envelhecimento da pele; músculos faciais; rosácea; toxinas botulínicas tipo A
ABSTRACT
Introduction The primary action of botulinum toxin type A (BoNT-A) is to inhibit acetylcholine release from the presynaptic terminal, resulting in reversible chemical muscle paralysis. It is a widely accepted treatment for improving the appearance of glabellar expression lines resulting from muscle contraction.
Materials and Methods We evaluated the glabellar force patterns, facial wrinkle classification, and the number of BoNT-A units used in the corrugator and procerus muscles.
Results Themean total BoNT-A units used were 7.2 IU in the corrugator muscle (7.1 IU in women and 7.4 IU in men) and 3.9 IU in the procerus muscle (3.9 IU in women and 4.1 IU in men), with a positive correlation between the number of units and the age of the 58 participants. Regardingmuscle strength pattern,more units were needed in the corrugator muscle with a strong or moderate pattern and facial wrinkle classification ranging from 3 to 4 (8 IU and 8.5 IU, respectively). The procerus muscle required more units in subjects with strong force patterns and wrinkles classified as 3 to 4 (5 IU). Wrinkles with a 3-to-5 classification required the highest number of BoNT-A units.
Conclusion The number of BoNT-A units used is directly proportional to the strength pattern and classification of facial wrinkles, with more units required for strong force patterns and deep wrinkle classifications.
Keywords: botulinum toxins, type A; dermatology; facial muscles; rosacea; skin aging
Introdução
O primeiro relato na história da toxina botulínica (BoNT) foi descrito pelo médico alemão Justinus Kerner, que no século 18 descreveu o botulismo pela primeira vez, a partir da observação de mortes na Alemanha após ingestão de linguiças desangue, alimento emconservatradicional da região, as quais estavam contaminadas.1,2 Em 1897, Van Ermengem, através de cortes histológicos, isolou e descreveu a Clostridium botulinum, bactéria anaeróbica causadora do botulismo. A partir de então, foram conduzidas investigações para compreender a relação entre a doença e a toxina, bem como sua caracterização estrutural e mecanismo de ação.3,4
A molécula da BoNT é composta por uma cadeia leve (50 kDa) e uma cadeia pesada (100kDa) unidas pelas pontes de dissulfetos e envoltas por hemaglutininas.5,6 O mecanismo pelo qual a BoNT age levando à paralisia muscular se dá quando a hemaglutinina encosta no axônio terminal, fazendo com que a cadeia pesada seconecte com o receptor presente no axônio, assim a passagem é facilitada e a molécula consegue entrar no neurônio. As cadeias então desconectam-se, e a cadeia leve segue para executar a sua função de clivagem do complexo soluble N-ethylmaleimide sensitive factor attachment protein receptor (SNARE,eminglês) retirando parte desua estrutura, o soluble N-ethylmaleimide sensitive factor attachment protein-25 (SNAP-25, em inglês). Logo, o complexo SNARE, que seria responsável pela passagem da acetilcolina para a fenda sináptica, não consegue realizar sua função, impedindo a despolarização da membrana celular e o influxo de cálcio e efluxo de sódio, impossibilitando a contração muscular das fibras de actina e miosina.5,6,7
O oftalmologista Alan B. Scott, do Eye Research Institute, em São Francisco, Califórnia (1920), descreveu a utilização medicamentosa da BoNT em pacientes com desalinhamento ocular nos casos de estrabismo.3,4 A injeção dessa toxina proporcionou uma redução da atividade muscular através da denervação química.8 Desde então, foram aparecendo algumas outras indicações, incluindo tratamento de rugas dinâmicas, hiperidrose axilar, blefaroespasmo.9,10 Autilização da BoNT só foi aprovada em 1989 pelo Food and Drug Administration (FDA) como terapia para distúrbios musculares, e posteriormente em 2002, aprovado para fins estéticos.5,7
As evidências do envelhecimento através das linhas de expressão da região glabelar ocorrem por consequência da contração sinérgica do músculo corrugador, músculo depressor do supercílio e/ou músculo prócero, resultando em “sulcos frontais” particularmente entre as sobrancelhas. Devido à constante contração do complexo muscular glabelar formam-se as rugas dinâmicas que possuem evolução para as rugas estáticas, as quais são mais pronunciadas e perceptíveis ao repouso. A sua presença muitas vezes pode ser percebida como um sinal de envelhecimento e podem erroneamente dar a impressão de emoções como raiva ou tristeza.11
A toxina botulínica tipo A (BoNT-A) é um tratamento amplamente aceito para melhorar a aparência das linhas glabelares.12 Além disso, é um tratamento que gera uma grande satisfação do paciente já que a estética das linhas glabelares impacta no bem-estar psicológico, na autoconfiança e qualidade de vida13,14 mesmo que a BoNT-A possa ter algumas contraindicações como a presença de queloides, doenças neuromusculares, transtornos dismórficos corporal e alergia a algum componente da substância.14,15
Objetivo
Estabelecer a relação entre a força muscular, a classificação de rugas faciais e a quantidade de unidades de toxina botulínica do tipo A para obter resultados satisfatórios no tratamento das linhas de expressão glabelares.
Materiais e Métodos
O protocolo e o uso do material, e todos os procedimentos desta pesquisa foram submetidos e aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Saúde e Bem Estar da Mulher -ISBEM (CEP 6.849.192). Foram convidados, aleatoriamente, 58 pacientes para o estudo realizado na Clínica de Estética Pithon Napoli em São Paulo no período de dezembro 2023 a abril 2024. Todos receberam informações sobre os procedimentos e orientações quanto à esta pesquisa com os médicos da equipe. Após ciência e retirada de dúvidas, o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) foi assinado. Foram excluídos todos os pacientes que não concordaram com o desenvolvimento do estudo e se recusaram a assinar o TCLE, além dos pacientes vacinados com antitetânica ou qualquer peeling químico nos 6 meses anteriores ao convite, que passaram por procedimentos que pudessem afetar a testa e regiões glabelares nos últimos 12 meses, doença autoimune e/ou uso atual de medicamentos que atuam nas junções neuromusculares.
A pesquisa foi realizada com pacientes do sexo masculino e feminino que procuraram a clínica afirmando ter vontade em realizar o procedimento de preenchimento nas linhas glabelares com o uso da BoNT-A. Os participantes foram distribuídos em 2 grupos conforme a idade: entre 20 e 39 (36 participantes) e 40 e 60 anos (21 participantes), e foram avaliados segundo os parâmetros: descrição do padrão de forças glabelares, classificação de rugas faciais e quantidade de unidades de BoNT-A utilizadas nosmúsculos corrugador e prócero (desenho do estudo – ►Fig. 1).
Classificação de Força Muscular
A classificação de força muscular (músculos corrugador e prócero) foi realizada de acordo com a denominação dos autores. Foi solicitado ao participante realizar a mímica “cara de bravo” (►Fig. 2), que classificada em três níveis de força: padrão forte, no qual se observa os músculos corrugador e prócero bem delimitados com formação medial de fraturas dérmicas bem evidentes; padrão moderado, que apresenta músculos bem delimitados reproduzindo menos força central durante a mímica e consequentemente, fraturas dérmicas menos evidentes; e padrão fraco, no qual não observa-se os limites da musculatura glabelar, principalmente dos corrugadores, com menor formação de fraturas dérmicas intensas e linhas de expressão.
Classificação de Rugas faciais
As rugas foram determinadas segundo Lemperle,11 usando a escala de classificação fotonumérica de seis pontos, na qual o grau da ruga nas fotografias de referência foi comparado com a ruga no rosto do participante. Todos os participantes foram fotografados (iPhone12pro [AppleInc., Cupertino,CA,EUA] e câmera Quantificare [QUANTIFICARE S.A., Biot, França]) para foto-documentação e avaliação. A classificação segundo Lemperle está apresentada na ►Tabela 1.
Pontuação | Descrição |
---|---|
0 | Sem rugas |
1 | Rugas perceptíveis |
2 | Rugas rasas |
3 | Rugas moderadamente profundas |
4 | Rugas profundas |
5 | Rugas muito profundas |
Aplicação de BoNT-A
Para esse procedimento foi utilizado a toxina botulínica do tipo A - Botulift (Bergamo Farmacêutica - Medytox Inc, Cheongwongu, Coréia do Sul) que foi aplicada intramuscularmente com seringa BD pediátrica (Becton, Dickinson and Company, Franklin Lakes, NJ, EUA) 50 ou 30 unidades internacionais (UI), na região das linhas glabelares. Na ►Tabela 2 apresenta-se o número de unidades máxima que poderia ser aplicado da BoNT-A em cada músculo, sendo a ►Fig. 3 a representação visual de cada músculo. O número de unidades aplicada foi de acordo com a avaliação da classificação de forças e rugas faciais, sendo a Botulift aplicada no dia “0” com reavaliação de 15 a 30 dias após a aplicação. Para o procedimento não foi necessário o uso de anestésicos, o participante foi orientado pelo profissional a usar o medicamento analgésico - dipirona 1g ou paracetamol 725mg a cada 6h em caso de dor. Não indicamos uso de anti-inflamatórios ou corticoides em caso de desconforto/dor na região da aplicação. O efeito da Botulift se inicia cerca de 48 a 72 horas após a aplicação, e tem seu efeito máximo em torno de 1 a 4 semanas após a aplicação.Oefeitodaaplicação (relaxamento do músculo ediminuição dacontração excessiva) geralmente perdura por um período de 3 a 4 meses.
Linhas glabelares | Ângulo, plano da agulha, e unidades de Botulift |
---|---|
Cabeça do corrugador | Aplicação … 90°, plano profundo, 1–5 unidades |
Corpo do corrugador | Aplicação … 45°, plano m‚dio, 0–5 unidades |
Calda do corrugador | Aplicação … 45°, plano m‚dio, 1–5 unidades |
Prócero | Aplicação … 90°, plano profundo, 1–5 unidades |
Depressor do supercílio | Aplicação … 90° em direção a região medial da glabela (supraperiostal), plano profundo, 1–3 unidades |
Análise dos Dados
As variáveis categóricas foram expressas em contagem absoluta e proporções que foram comparadas por meio do teste do qui-quadrado (x2). As variáveis contínuas foram apresentadas como medianas e intervalos interquartis e comparadas entre os grupos por meio dos testes de Mann-Whitney. Utilizamos a correlação de Pearson para investigar as relações entre os músculos frontais (corrugador e prócero) e as doses administradas de toxina botulínica A (BoNT-A). As análises foram realizadas no software do programa estatístico IBM SPSS Statistics for Windows, versão 21.0 (IMB Corp., Armonk, NY, EUA). Foram considerados valores estatisticamente significantes quando p ≤ 0,05. Os valores form expressos como média ± DP.
Resultados
Em média, a idade com a qual as pessoas fizeram a primeira aplicação foi 35 anos para homens e mulheres, 28% dos participantes eram do sexo masculino e 72% do sexo feminino, e a média da idade geral entre eles foi de 38 anos. Entre os homens, a média foi de 36 anos (27-54), sendo que cerca de 80% dos pacientes tinham menos de 40 anos. Entre as mulheres, a média de idade foi de 38 anos (23-68) e 70% tinham menos de 40 anos.
A média de unidades de BoNT-A utilizadas no geral foi de 7,2 no corrugador e de 3,9 no prócero. Quando separado por sexo, a média no corrugador foi 7,1 para o sexo feminino e 7,4 para o sexo masculino. No prócero a média foi de 3,9 para o sexo feminino e 4,1 para o masculino. A partir de regressões lineares, pudemos observar que existe uma associação positiva entre o número de unidades utilizadas e a idade dos pacientes, tanto no corrugador (r2 = 0,30; p < 0,05; ►Fig. 4A) quanto no prócero (r2 = 0,30; p < 0,05; ►Fig. 4B); isso sugere que quanto mais alto o grau de classificação de rugas faciais, maior é a necessidade de unidades para maior paralisação e, consequentemente, melhor resultado.
Quando analisada a quantidade de unidades de BoNT-A aplicadas em relação ao sexo dos participantes, não observamos diferença entre homens e mulheres nem no corruga-dor (p = 0,42; ►Fig. 4C) nem no prócero (p = 0,51; ►Fig. 4D).
Quando o grau de força no corrugador foi fraco, com classificação de rugas faciais entre 1 e 2, foram necessários, em média 6 UI nos músculos. Sendo, em média, 3,5 UI na cabeça, 0,5 UI no corpo e 2 UI na cauda do corrugador. Quando o padrão de força no corrugador foi moderado, com classificação de rugas faciais entre 0 e 2,, foramnecessárioscercade7UInos músculos. Sendo, em média, 3,75 UI na cabeça, 0,9 UI no corpo e 2,3 UI na cauda do corrugador. Ainda com o padrão de força moderado, porém com classificação de rugas faciais entre 3 e 4, a média foi de 8 UI. Destes, em média, 4,7 UI foram aplicadas na cabeça, 1 UI no corpo e 2,33 UI na cauda do corrugador. O padrão de força forte do corrugador, com classificação de rugas faciais entre 1 e 2, demandou em média 7,2 UI. Sendo que, em média, 4 UI foram aplicadas na cabeça, 1,1 UI no corpo e 2,1 UI na cauda do corrugador. Ainda com o padrão de força forte, porém com classificação de rugas faciais entre 3 e 4, foram necessárias, em média, 8,5 UI. Destas, em média 4,5 UI foram aplicadas na cabeça, 0,75 UI no corpo e 3,25 UI na cauda do corrugador. Quando o padrão de força no prócero foi fraco, com classificação de rugas faciais entre 0 e 2, foram necessárias, em média, 3,37 UI. Ainda com padrão de força fraco, porém com classificação de rugas faciais de 3, foi necessária a aplicação de 4UI. Quando o padrão de força foi moderado, com classificação de rugas faciais entre 0 e 2, foram necessários em média 3,5 UI nos músculos. Ainda com padrão moderado, mas com classificação de rugas faciais entre3 e 4, foi necessária a aplicação de 4,25 UI em média. O padrão de força forte do prócero, com classificação de rugas faciais entre 1 e 2, demandou em média 4,9UI. Rugas faciais com classificação entre 3 e 5 demandaram, em média, 5 UI nos músculos.
Quando comparada a quantidade de unidades de BoNT-A necessária nos músculos corrugador e prócero, encontramos diferença significativa sendo que no corrugador foram necessárias mais unidades do que no prócero (p < 0,01; ►Fig. 5).
No corrugador, quando comparadas as unidades utilizadas nos grupos com diferentes padrões de força, observamos diferença significativa entre eles (F2,42 = 4,11; p = 0,02). Após o teste de Tukey, observamos que há diferença significativa apenas entre os grupos “forte” e “fraco”, sendo que no grupo “forte” foram necessárias mais unidades (p < 0,05; ►Fig. 6A). Também observamos diferenças significativas no prócero quando os grupos foram comparados em conjunto (X2 = 20,04; grau de liberdade [gl] = 2; p < 0,05; ►Fig. 6B). Já separadamente, o grupo “forte” difere tanto do grupo com padrão de força “fraco” quanto do grupo com padrão “Mmoderado” (p < 0,05).
Observamos diferença significativa entre os grupos com classificação de rugas faciais de0a2ede3a5 com relação às unidades de BoNT-A utilizadas nos dois músculos. Em ambos os músculos, o grupo com classificação de rugas faciais de 3 a 5 necessitou de mais unidades de BoNT-A quando comparado ao grupo com classificação de rugas faciais de 0 a 2 (corrugador: t = –2,72; gl = 42; p < 0,05; ►Fig. 7A; prócero: p < 0,05; ►Fig. 7B).
Discussão
A idade da primeira aplicação de BoNT-A foi equivalente para homens e mulheres (35 anos), sendo que as mulheres procuram o procedimento duas vezes mais do que os homens; porém, de modo geral, necessitam de menos unidades de BoNT-A que os homens. A quantidade de unidades utilizadas no músculo corrugador é maior que a observada no músculo prócero, sendo que estas quantidades nos dois músculos aumentam proporcionalmente comparadas com a idade dos participantes. A avaliação do “padrão forte” de força no músculo corrugador e prócero foi a mais evidenciada, com a necessidade de utilização de mais unidades de BoNT-A. Por fim, as classificações das rugas faciais que mais necessitaram de unidades de BoNT-A nos músculos corrugador e prócero foram as de 3 a 5.
A glabela é a primeira área a ser notada na expressão facial. Sua contração está associada com emoções negativas, como impaciência, raiva, e cansaço, que o indivíduo muitas vezes expressa de maneira indesejada.16 Os principais músculos que formam o complexo glabelar incluem os corrugadores e orbiculares da pálpebra (aproximam e deprimem as sobrancelhas), prócero e depressores da sobrancelha (deprimem) e as fibras inferiores do frontal (elevam as sobrancelhas). A atividade muscular causa linhas hipercinéticas perpendiculares à direção da contração muscular, formando rugas horizontais, verticais e oblíquas indesejadas.17
Alguns estudos consideram que as linhas glabelares agem de forma semelhante na maioria dos indivíduos, com algumas diferenças entre os sexos18,19,20 (músculos mais pesados e pele mais espessa nos homens), idade, etnia,21,22 exposição solar e diferenças relacionadas à atividade física.23,24 Em nosso estudo, observamos procura maior pelo procedimento dentre as mulheres, com grande variação de idade, desde as mais jovens até as consideradas idosas com idade superior a 60 anos. Os participantes mais jovens são incentivados ao uso da BoNT-A de maneira preventiva, enquanto os participantes mais velhos utilizam com o intuito de correção e/ou manutenção das feições adquiridas com o tempo. Devido ao período de paralização e relaxamento muscular, a pele (epiderme e derme) se regenera, trazendo um aspecto melhor do que antes da aplicação fazendo com que haja a redução e reeducação muscular progressiva, melhorando a textura da pele a longo prazo.
A BoNT-A é administrada em UI. A dose letal média é estimada entre 2.500 e 3.000 UI para uma pessoa adulta de 70 kg. Embora a dose exata da toxina conhecida por causar toxicidade seja desconhecida, é geralmente aceito que doses únicas de BoNT-A não devem exceder 500 UI.25 A quantidades de pontos e unidades são variáveis de acordo com a necessidade de cada paciente. Sugere-se que para maior duração e alta satisfação do paciente quanto aos resultados do tratamento da face superior, o plano padrão e ideal de aplicação de toxina botulínica seja utilizar o total de 64 UI, combinando: tratamento padrão da glabela em “U” (variando de 12-40 UI), tratamento muscular frontal - padrão total (variando de 8-25 UI) e linhas periorbitais (variando de 6-15 UI por lado). Embora essa dosagem padrão ainda seja comumente usada e possa servir como um guia para o injetor novato, muitos médicos passaram a adaptar para cada indivíduo os pontos de injeçãoeadosagem, quedevelevaremconsideraçãoa força muscular,aanatomia (padrãoderítides),asassimetrias basais, bem como os desejos do paciente.26
De acordo com alguns estudos, as linhas de expressão glabelares devem ser tratadas com múltiplas injeções de altas doses com baixos volumes de BoNT-A, o que permite a colocação precisa da toxina com pouca propagação para áreas não-alvo. Dois estudos duplo-cegos, multicêntricos e controlados utilizaram 4 UI de BoNT-A em 5 pontos de injeção:1 no prócero e2emcada corrugador, bilateralmente. Essas injeções demonstraram resultados adequados na esmagadora maioria dos pacientes, enquanto os efeitos adversos transitórios foram raros.27,28,29 Nosso estudo, assim como a literatura, demonstra que o músculo que requer o uso de mais unidades é o corrugador, e através de nossa metodologia constatamos também que estas quantidades são dependentes da classificação de força e das rugas faciais. Pacientes com maior grau de força demonstraram maiores linhas frontais frente à movimentação muscular da região, assim como maior aprofundamento das mesmas linhas. Isso faz com que haja a necessidade de abordarmos as regiões com maior número de unidadesepontosdedistribuição para o efeito de paralização total ou parcial, a fim de se obter um efeito natural na região alvo. Nossa equipe sugere que a diluição da BoNT-A seja molhada, ou seja, uma toxina de 200 UI seja diluída para 4mL de solução fisiológica. Dessa forma, é possível distribuir a solução em mais pontos, influenciando de maneira mais eficiente os vetores de forças que comtemplam a região da fronte orbital.
Tratamentos com abordagens mais individualizados têm sido publicados mais recentemente.DeSanctis Pecoraet al.30 realizaram um estudo cego para avaliar 130 mulheres com rugas glabelares moderadas ougraves, utilizando tratamento padrão com 5 pontos de injeção (4 UI por ponto) e o tratamento One21 com abordagem individualizada e customizada quanto à distribuição e dosagem nos pontos. Eles observaram que a incobotulinumtoxin-A reduziu efetivamente as linhas dinâmicas glabelares em todos os participantes. Notavelmente, a avaliação individualizada e o tratamento com a técnica One21 resultaram em melhor desempenho, alcançando taxas de eficácia significativamente mais altas do que o tratamento padrão de 5 pontos, no tratamento das rugas glabelares leves, moderadas e graves, especialmente para linhas assimétricas da glabela ou do envolvimento de outros grupos musculares além do prócero e do corrugador.30 Em nossa experiência individualizada, observamos que mais pontos distribuídos e quantidades menores de BoNT-A por ponto pode trazer resultados mais naturais, o que mantém a movimentação, mas evita o aparecimento das linhas, sem perder o tempo de ação da BoNT-A nas regiões. Nossos pacientes relatam resultados satisfatórios e duradouros após 4 meses com a aplicação com essa técnica.
O conhecimento da anatomia regional alvo, seguido de uma técnica de injeção precisa que envolva dose e profundidade de injeção adequadas, é essencial não apenas para melhorar os resultados, mas também para evitar complicações.30 A injeção da BoNT-A requer um entendimento adequado da forma anatômica e da inserção dos músculos faciais para orientar uma identificação muscular objetiva, resultando em uma abordagem mais eficaz. Nossa equipe passa por atualizações constantes e dedica-se aos estudos científicos para trazer o que há de mais moderno e eficaz no aprimoramento das técnicas para entregar os melhores resultados aos nossos pacientes.
Nossos resultados reforçam a importância de uma avaliação individualizada com metodologias eficientes para alcançar o melhor resultado durante a injeção da BoNT-A para o tratamento das rugas glabelares. Observamos como uma limitação no presente estudo, o uso reduzido de tecnologia. Hoje o mercado oferece câmeras com softwares com tecnologia 3D que possibilitam uma avaliação mais qualificada das imagens, o que aperfeiçoaria a avaliação da relação e direção dos vetores de forças musculares, antes e depois da aplicação de BoNT-A. Para nossos próximos estudos já teremos esta avaliação mais objetiva das imagens.
Conclusão
A quantidade de unidades de toxina botulínica A utilizadas é diretamente proporcional ao padrão de força e classificação das rugas faciais, sendo necessária a utilização de mais unidades de BoNT-A quando observado o padrão de força forte e classificação de rugas profundas, garantindo a satisfação do cliente com a metodologia empregada. A BoNT-A é um excelente aliado no tratamento de rugas, e é um ótimo tratamento para evitar a evolução das rugas rasas para profundaseestáticas, além da prevençãodo envelhecimento.
Referências
1. Guerra Neto P. Toxina botulínica tipo A: ações farmacológicas e riscos do uso nos procedimentos estéticos faciais. Recife: Instituto Nacional de Ensino Superior e Pesquisa, Centro de Capacitação Educaional; 2016
2. Colhado OC, Boeing M, Ortega LB. Botulinum toxin in pain treatment. Rev Bras Anestesiol 2009;59(03):366–381
3. Costa FHR. A toxina botulínica: histórico, fisiopatologia e indicações. Rio de Janeiro2020
4. Dressler D, Roggenkaemper P. A brief history of neurological botulinum toxin therapy in Germany. J Neural Transm (Vienna) 2017;124(10):1217–1221
5. de Oliveira CCA, Fernandes EC, Medeiros KDO, Maia MCB, Seabra EJG, Santos PC. Toxina botulínica: contexto histórico, molecular e de aplicação prática na área da saúde. Revista Brasileira De Educação E Saúde 2020;10:1–10
6. Drinovac-Vlah V, Bach-Rojecky L. Botulinum toxin type A: Basic pharmacological profile and therapeutic application. Arh Farm (Belgr) 2020;70:10–19
7. Sposito MMdM. Toxina Botulínica doTipo A: mecanismo de ação. Acta Fisiatr 2009;16:25–37
8. Gouveia BN, Ferreira LdLP, Rocha Sobrinho HM. O uso da toxina botulínica em procedimentos estéticos. REVISTA BRASILEIRA MILITAR DE CIÊNCIAS 2020;6:56–66
9. Costa, Adilson,Talarico Filho S, Arruda LH, de Sanctis-Pecora, Carla, et al. Estudo clínico multicêntrico, prospectivo, comparativo, randomizado e duplo cego, entre duas formulações de toxina botulínica tipo A registradas no Brasil para otratamento das rugas da glabela. Surg Cosmet Dermatol 2016;8:33–40
10. Gimenez R. Pinto. Análise retrospectiva das alterações da dinâmica facial após aplicações seriadas de toxina botulínica tipo A. São Paulo: Universidade São Paulo; 2007
11. Lemperle G, Holmes RE, Cohen SR, Lemperle SM. A classification of facial wrinkles. Plast Reconstr Surg 2001;108(06):1735–1750, discussion 1751–1752
12. Kaufman-Janette J, Cox SE, Dayan S, Joseph J. Botulinum Toxin Type A for Glabellar Frown Lines: What Impact of Higher Doses on Outcomes? Toxins (Basel) 2021;13(07):494
13. Benedetto AV. The cosmetic uses of Botulinum toxin type A. Int J Dermatol 1999;38(09):641–655
14. Allergan-BOTOX. Bula paciente. 2023. Available from: https://www.allerganaesthetics.com.br/marcas/botox
15. Small R. Botulinum toxin injection for facial wrinkles. Am Fam Physician 2014;90(03):168–175
16. Lewis MB, Bowler PJ. Botulinum toxin cosmetic therapy correlates with a more positive mood. J Cosmet Dermatol 2009;8(01): 24–26
17. Borba A, Matayoshi S, Rodrigues M. Avoiding Complications on the Upper Face Treatment With Botulinum Toxin: A Practical Guide. Aesthetic Plast Surg 2022;46(01):385–394
18. Carruthers J, Fagien S, Matarasso SL, Group BCBotox Consensus Group. Consensus recommendations on the use of botulinum toxin type a in facial aesthetics. Plast Reconstr Surg 2004;114; (6, Suppl)1S–22S
19. Draelos ZD. The shrinking world: skin considerations in a global community. J Cosmet Dermatol 2006;5(01):1–2
20. Flynn TC. Botox in men. Dermatol Ther 2007;20(06):407–413
21. Porter JP, Lee JI. Facial analysis: maintaining ethnic balance. Facial Plast Surg Clin North Am 2002;10(04):343–349
22. Monheit G, Carruthers A, Brandt F, Rand R. A randomized, doubleblind, placebo-controlled study of botulinum toxin type A for the treatment of glabellar lines: determination of optimal dose. Dermatol Surg 2007;33(1 Spec No.):S51–S59
23. Rexbye H, Petersen I, Johansens M, Klitkou L, Jeune B, Christensen K. Influence of environmental factors on facial ageing. Age Ageing 2006;35(02):110–115
24. de Almeida AR, da Costa Marques ER, Banegas R, Kadunc BV. Glabellar contraction patterns: a tool tooptimize botulinum toxin treatment. Dermatol Surg 2012;38(09):1506–1515
25. Sorensen EP, Urman C. Cosmetic complications: rare and serious events following botulinum toxin and soft tissue filler administration. J Drugs Dermatol 2015;14(05):486–491
26. Borba A, Matayoshi S. Facial rejuvenation techniques: botulinum toxin and MD Codes TM. 1st ed. São Paulo - Brasil: Buzz Editor Ltda; 2018
27. Carruthers A, Carruthers J. Botulinum toxin type A: history and current cosmetic use in the upper face. Semin Cutan Med Surg 2001;20(02):71–84
28. Carruthers JD, Lowe NJ, Menter MA, Gibson J, Eadie N, Group BGLISBotox Glabellar Lines II StudyGroup. Double-blind, placebo-controlled studyof the safetyand efficacyof botulinum toxintype A for patients with glabellar lines. Plast Reconstr Surg 2003;112 (04):1089–1098
29. Carruthers JA, Lowe NJ, Menter MA, et al; BOTOX Glabellar Lines I Study Group. A multicenter, double-blind, randomized, placebo-controlled studyof the efficacy andsafetyof botulinum toxin type A in the treatment of glabellar lines. J Am Acad Dermatol 2002;46 (06):840–849
30. de Sanctis Pecora C, Pinheiro MVB, Ventura Ferreira K,Jacobino de Barros Nunes G, Miot HA. The One21 Technique: An Individualized Treatment for Glabellar Lines Based on Clinical and Anatomical Landmarks. Clin Cosmet Investig Dermatol 2021;14:97–105
1. Clínica de Estética Pithon Napoli, São Paulo,
SP, Brasil
Endereço para correspondência João Vitor Moraes Pithon-Napoli, Clínica de Estética Pithon Napoli, São Paulo, São Paulo, Brasil (e-mail: joaovitorpithon@gmail.com; francinealmeida@alumni.usp.br).
Artigo submetido: 07/06/2024.
Artigo aceito: 16/11/2024.
Conflito de Interesses
Os autores não têm conflito de interesses a declarar.