INTRODUÇÃO
A lipoaspiração está entre os procedimentos estéticos mais realizados na cirurgia
plástica e está sendo cada vez mais combinada a outros procedimentos1,2. Apresentada por Illouz, no início dos anos 1980, a técnica de lipoaspiração passou
por uma grande transformação para chegar ao seu atual estado3. No Brasil, segundo dados da International Society of Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS)4, este é o procedimento cirúrgico estético mais realizado, totalizando 231.604 (15,5%)
dentre todos os procedimentos em 2019.
A adoção da lipoaspiração como procedimento único ou coadjuvante a outros procedimentos
cosméticos estimulou sua evolução técnica da simples aspiração de gordura para uma
modelagem corporal mais sofisticada5. De acordo com a demanda crescente nos padrões de segurança para tratamentos cosméticos,
as sociedades médicas têm desenvolvido diretrizes e consensos para orientar as decisões
e definir critérios de segurança nos procedimentos. Logo, a discussão sobre a lipoaspiração,
como um dos procedimentos mais realizados, está na vanguarda6,7.
Em relação aos fatores de risco que podem desencadear as complicações relacionadas
à lipoaspiração, observou-se que erros na seleção do paciente são fatores primordiais
no desfecho, apontando a avaliação prévia como um dos pilares do sucesso do procedimento,
contraindicando a lipoaspiração em pacientes com doença cardiovascular e pulmonar
grave, distúrbios de coagulação graves, incluindo trombofilias, e durante a gravidez,
além de pacientes com diabetes e tabagismo8,9.
No que concerne às complicações, a incidência após a lipoaspiração varia de 0% a 10%,
ainda com inconsistências de dados relatados entre diferentes especialidades, como
Cirurgia Plástica e Dermatologia, fazendo da avaliação precisa do perfil de risco
da lipoaspiração um desafio10. Em relação à mortalidade, um estudo de 25 anos de experiência com 26.259 pacientes11 observou uma taxa de 0,01%. Em consonância, a ISAPS publicou uma pesquisa na qual
foi relatada uma mortalidade de 19,1 para cada 100.000 lipoaspirações4.
De acordo com a demanda crescente nos padrões de segurança para tratamentos cosméticos,
as sociedades médicas têm desenvolvido diretrizes e consensos para orientar as decisões
e definir critérios de segurança nos procedimentos. Logo, este artigo aborda uma atualização
do conhecimento sobre a lipoaspiração e suas complicações, além da comparação com
a cirurgia combinada com outros procedimentos como abdominoplastia e lipoenxertia.
OBJETIVO
Esta revisão objetivou revisar sistematicamente os dados publicados nos últimos 5
anos em relação às complicações encontradas em lipoaspiração como procedimento único
e como procedimento combinado.
MÉTODO
Trata-se de uma revisão sistemática de literatura, descritiva, a partir da busca de
estudos acessíveis, fazendo uso do guideline PRISMA12, na qual adotou-se a seguinte estratégia: 1) elaboração de uma questão de pesquisa
orientadora da estratégia de busca; 2) variedade de fontes para a localização dos
estudos; 3) definição de critérios de inclusão e exclusão e 4) avaliação da qualidade
metodológica dos artigos incluídos.
O levantamento dos artigos foi realizado em maio de 2021, utilizando as bases de dados:
PubMed (US National Library of Medicine/ National Institute of Health), SciELO (Scientific
Electronic Library Online), LILACS (Centro Latino-Americano e do Caribe de informações
em Ciências da Saúde), Cochrane Library, SCOPUS, Web of Science e grey literature, publicados entre os anos de 2016 e 2021.
Utilizando-se a estratégia PICO, que representa um acrônimo para Paciente, Intervenção,
Comparação e “Outcomes” (desfecho), foi elaborada a seguinte questão orientadora “Quais
as complicações do procedimento de lipoaspiração?”. Procedeu-se o cruzamento dos descritores
relacionados aos temas investigados após pesquisa de sinônimos utilizando as ferramentas
MeSH (Medical Subject Headings) e DeCS (Descritores em Ciências da Saúde), logo, os
descritores foram definidos: ((“Liposuction” OR “Lipectomies” OR “Aspiration Lipectomies”
OR “Lipectomies, Aspiration” OR “Lipectomy, Aspiration” OR “Aspiration Lipolysis”
OR “Lipolysis, Aspiration” OR “Lipectomies, Suction” OR “Lipectomy, Suction” OR “Suction
Lipectomies” OR “Lipolysis, Suction” OR “Liposuctions” OR “Lipoplasties” OR “lipectomy”
OR “Aspiration Lipectomy” OR “Suction Lipectomy” OR “Lipoplasty” OR “Suction Lipolysis”)
AND (“Postoperative Complications” OR “Complication, Postoperative” OR “Complications,
Postoperative” OR “Postoperative Complication” OR “Intraoperative Complications” OR
“Peroperative Complication” OR “Surgical Injury”)).
Neste momento da busca empregou-se de forma intencional termos mais amplos, com objetivo
de identificar uma maior quantidade de produções, evitando que algum estudo importante
fosse excluído no levantamento. Após isso, foram analisados o título e o resumo, respectivamente,
para selecionar estudos que avaliaram a população, a intervenção de interesse e pelo
menos um dos desfechos definidos. Foram removidos relatos de caso e série de casos,
por apresentarem baixo nível de evidência. Além destes, artigos duplicados também
foram excluídos, bem como os estudos que não foram redigidos em inglês, espanhol ou
português.
Por conseguinte, em relação à elegibilidade, realizou-se leitura na íntegra dos artigos
e foram excluídos estudo com alto risco de vieses metodológicos, utilizando-se a ferramenta
Risk Of Bias 2 (RoB 2), uma ferramenta revisada para avaliar o risco de viés em estudos randomizados.
Os desfechos definidos para esta pesquisa foram: Avaliar o grau de segurança através
da prevalência de complicações na lipoaspiração em procedimento único e combinado
com outros procedimentos como abdominoplastia e lipoenxertia (Figura 1).
Figura 1 - Fluxograma de seleção dos artigos.
Figura 1 - Fluxograma de seleção dos artigos.
RESULTADOS
Tipos de estudo
Foram encontrados 187 artigos nas bases de dados pesquisadas, dos quais 16 foram selecionados
para uso dos dados, com interpretação e sintetização dos mesmos. Dentre os 16 estudos,
cinco eram revisões de literatura, sete estudos coortes e quatro transversais.
Além disso, com relação ao desfecho dos artigos incluídos no estudo, quatro analisaram
as complicações da lipoaspiração como procedimento único, oito discorreram sobre as
complicações da lipoaspiração combinada com outros procedimentos como abdominoplastia
e lipoenxertia e quatro estudos desenvolveram uma comparação entre a segurança e o
nível de aparecimento de complicações na lipoaspiração isolada e combinada (Tabela 1).
Tabela 1 - Complicações da lipoaspiração isolada e combinada com outros procedimentos.
Complicações sistêmicas e locais em (%) |
Estudo |
Técnica |
N° de pacientes |
Mortalidade |
Tromboembolismo Venoso (TEV) |
Perda de Sangue |
Infecção do sítio cirúrgico |
Seroma |
Hiperpigmentação |
Contorno Irregular |
Hematoma |
Outros |
Xia et al., 20191 |
Lipoaspiração isolada e combinada |
14.061 |
- |
0,2 |
|
Infecção, deiscência de ferida e necrose de gordura: 5,6 |
4,1 |
|
0,7 |
0,8 |
|
Halk et al., 2019*6 |
Lipoaspiração isolada |
- |
até 0,05% a cada 1000 cirurgias |
- |
- |
- |
- |
- |
- |
- |
Procedimentos combinados tiveram um risco quase 5 vezes maior de sérios eventos adversos
do que procedimentos isolados, especialmente para TEV e infecção.
|
Wu et al., 2020*14 |
Lipoaspiração isolada e combinada |
- |
0,01 em 26.259 pacientes |
0,03% em 1.000 pacientes |
- |
- |
2% em 451 pacientes |
- |
9% em 11.016 pacientes |
- |
- |
Sozer et al., 201815 |
Lipoaspiração combinada |
1.000 |
0,01 |
1,5 |
- |
1,5 |
19 |
- |
- |
0,40 |
- |
Vieira et al., 201816 |
Lipoaspiração combinada |
9.638 |
0,06 |
0,46 |
0,24 |
1,83 |
3,6 |
- |
- |
0,84 |
- |
Montrief et al., 2020*17 |
Lipoaspiração isolada e combinada |
- |
- |
A incidência de trombose venosa profunda (TVP) e embolia pulmonar (EP) na lipoaspiração
é inferior a 1%,, porém, há um aumento acentuado na incidência de TVP quando a lipoaspiração
é combinada com abdominoplastia
|
- |
- |
- |
- |
- |
3- 15 |
perfuração visceral: 0,00014 |
Kaoutzanis et al., 201718 |
Lipoaspiração isolada e combinada |
31.010 Lipoaspiração isolada (11,490 - 37,1%) e combinada ( 19,520 -62.9%) |
|
0,06 isolada 0,6 combinada |
- |
0,1 isolada 0,7 combinada |
- |
- |
- |
0,15 isolada 0,60 combinada |
Disfunções pulmonares: 0,1 isolada 0,2 combinada |
Campos et al., 201819 |
Lipoaspiraçâo isolada e combinada |
30 |
- |
- |
queda de hemoglobina entre 2 - 6g/dl, sendo a média de 3,01 g/dl correspondendo a
22,16% do hematócrito pré-operatório
|
- |
- |
- |
- |
- |
50% apresentaram tontura, dispneia, taquicardia, hipotensão ortostática |
Vendramin et al., 201920 |
Lipoaspiraçâo combinada |
16 |
- |
- |
Valores de Hb pós cirúrgico entre 8,92 g / dL e 10,4 g / dL. A redução percentual
da Hb entre o início e o final da cirurgia foi em média de 19,7%
|
- |
- |
- |
- |
- |
- |
Restifo 201921 |
Lipoaspiraçâo combinada |
304 |
- |
- |
- |
4,27 |
14,38 |
- |
- |
0,9 |
5,92 dos pacientes apresentaram necrose gordurosa |
Al Dujaili et al., 201822 |
Lipoaspiraçâo isolada |
15.336 |
- |
0,34-0,6 |
- |
- |
0,17-1,6 |
0,02 |
0,26-2,1 |
- |
- |
Husain et al., 201923 |
Lipoaspiração isolada |
50 |
- |
- |
- |
- |
10 |
2 |
12 |
- |
- |
Gould et al., 201824 |
Lipoaspiraçâo combinada |
619 |
- |
- |
- |
- |
2.16 com dreno 9.17 sem dreno |
- |
- |
- |
- |
Massignan 201925 |
Lipoaspiraçâo combinada |
76 |
- |
- |
- |
- |
- |
2,67 |
- |
- |
- |
Weissler et al., 202126 |
Lipoaspiraçâo isolada |
120 |
- |
- |
- |
- |
- |
- |
- |
Os hematomas em pacientes que receberam ATX foram significativamente menores do que
os pacientes que não receberam (1,6/10 vs. 2,3 / 10)
|
- |
Bertheuil et al., 201727 |
Lipoaspiraçâo isolada |
25 |
- |
- |
- |
8 |
- |
- |
- |
- |
40% apresentaram deiscência da ferida cirúrgica e 8% algum grau de necrose de gordura |
Tabela 1 - Complicações da lipoaspiração isolada e combinada com outros procedimentos.
Fatores de risco
Em relação aos riscos do procedimento, pacientes com doenças cardiovasculares, pulmonares,
diabéticas e vasculares enfrentam um risco maior. Além dessas comorbidades, o tabagismo
é conhecidamente um fator de risco para complicações cirúrgicas13,14.
Mortalidade
Dentre os estudos incluídos, no que tange à lipoaspiração como procedimento único,
a revisão de Wu et al., em 202014, apontou uma taxa de 0,01% de mortalidade em aproximadamente 26 mil pacientes. Em
outra revisão, Halk et al., em 20196, demonstraram uma variação de 0 a 0,55 mortes a cada 1000 procedimentos. Por outro
lado, quando observamos a lipoaspiração combinada com abdominoplastia, dois estudos
observacionais em 201815,16 indicaram 0,01% de mortes em 1.000 e 0,06% em 9.638 pacientes, respectivamente.
Tromboembolismo venoso (TEV)
Há uma concordância nos artigos publicados por Montrief et al.17 e Wu et al.14, de que o tromboembolismo venoso é a principal causa de morte após a lipoaspiração
combinada ou isolada, responsável por até 21% das mortes pós-operatórias17.
No procedimento de lipoaspiração combinada com outras técnicas, a chance média de
TEV foi de 0,56%, números que variaram desde 0,2% em 1.406 pacientes, encontrados
por Xia et al.1, e 0,46%, em 9.638 pacientes avaliados por Vieira et al.16, a 1,50% pacientes submetidos a abdominoplastia com lipoaspiração por Sozer et al.15. No que concerne à lipoaspiração como procedimento único, o número de pacientes com
TEV chega a ser cinco vezes menor, 0,06%, como indicado por Kaoutzanis et al.18, em 31.010 pacientes, dos quais 37,1% fizeram apenas lipoaspiração e 62,9% combinaram
com outros procedimentos.
Perda de sangue e anemia
Em um estudo prospectivo de 30 pacientes póscirúrgicos de lipoaspiração, dirigido
por Campos em 201819, observou-se queda de hemoglobina (Hb) entre 2 e 6g/dl, sendo a média de 3,01g/dl,
correspondendo a 22,16% do hematócrito pré-operatório, em que 15 pacientes queixaram-se
de sintomas como tontura, dispneia, taquicardia e hipotensão ortostática. Além deste
estudo, Vendramin et al.20 observaram em 16 pacientes a Hb ao final da cirurgia e na alta hospitalar, com valores
de 10,4g/ dl e 8,92g/dl, respectivamente. A redução percentual da Hb entre o início
e o final da cirurgia foi em média de 19,7%, e em nenhum dos casos observados os pacientes
necessitaram de transfusão sanguínea no pós-operatório.
Infecção do sitio cirúrgico
Restifo21 relatou infecção em 13 de 304 pacientes (4,27%) que associaram abdominoplastia com
lipoaspiração. Sozer et al.15 e Vieira et al.16 também analisaram os dois procedimentos associados e descreveram 1,5% de infecções
no sítio cirúrgico em 1.000 procedimentos e 1,83%, em 9.638 pacientes, respectivamente.
Kaoutzanis et al.18 apontaram resultados inferiores: em 19.520, apenas 0,7% dos pacientes apresentaram
esta complicação.
Em relação à lipoaspiração isolada, a revisão de literatura feita por Al Dujaili et
al.22 aponta valores que variam entre 0,34% e 0,6% em aproximadamente 15 mil procedimentos.
Além deste estudo, Kaoutzanis et al.18 compararam o lipoaspiração versus lipoabdominoplastia e referiram taxas de infecções de 0,1% em 11.490 e 0,7% em 19.520
procedimentos; por fim, Xia et al., em 20191, combinaram os resultados de infecção de ferida operatória, deiscência de ferida
e necrose de gordura, encontrando uma taxa de 5,6% em 14,61pacientes.
Seroma
Segundo Vieira et al.16, 3,6% de 9.638 pacientes apresentaram esta complicação quando submetidos a lipoabdominoplastia,
já Restifo, em 201921, encontrou 14,38%, em 723 pacientes submetidos a abdominoplastia associada a lipectomia
de sub-Scarpa. O estudo feito por Sozer et al.15 associou a abdominoplastia com lipoaspiração circunferencial e apontou que o seroma
foi apresentado por 190 em 1000 pacientes. A metanálise feita por Xia et al.1 mostrou a ocorrência de seroma em 4,1% em 14 mil pacientes submetidos a lipoabdominoplastia.
Na revisão de Wu et al.14, observouse prevalência de 2% de seroma nas lipoaspirações; já o coorte de Husain
et al.23, com 50 pacientes, inferiu uma taxa de 10% de aparecimento de seroma nos pacientes
submetidos a lipoaspiração. Gould et al., em 201824, indicaram em 619 lipoabdominoplastias o aparecimento de 2,16% de seromas em procedimentos
com o uso de dreno e 9,17% quando não houve o uso de dreno na cirurgia.
Hiperpigmentação
Complicação descrita em apenas dois artigos analisados. A revisão de Al Dujaili et
al.22 encontrou 0,02% com esta queixa, em aproximadamente 15.000 pacientes que fizeram
lipoaspiração como procedimento único; já em um estudo prospectivo de Massignan25, em que foi realizada a lipoaspiração associada com VASER (Vibration Amplification of Sound Energy at Resonance) em 76 pacientes, dois (2,67%) apresentaram hiperpigmentação da pele, e um (1,31%)
apresentou uma lesão térmica no local de inserção do aparelho.
Contorno irregular
O contorno irregular foi descrito por três revisões de literatura. Wu et al.14 apontaram que a complicação mais comum da lipoaspiração é a irregularidade do contorno.
Até 9% dos pacientes podem relatar depressões ou elevações nos tecidos moles, panículo
cutâneo, dobras ou rugas. Em consonância, Husain et al.23 indicam que a complicação menos grave e mais prevalente foi o contorno irregular,
sendo observado em 12% de 50 pacientes submetidos a lipoaspiração com desenho de abdome
“tanquinho” (“abdominal etching”).
A revisão de Al Dujaili et al.22 não indica números de pacientes com esta complicação, porém, demonstra que irregularidades
de superfície, tais como depressões ou ondulações da pele, podem ser causadas por
lipoaspiração excessiva, sucção superficial, aderências preexistentes, pele redundante
ou compressão inadequada. Pacientes com celulite preexistente com pouca elasticidade
da pele e cicatrizes têm maior probabilidade de apresentar irregularidades superficiais.
Medidas preventivas incluem definir a pressão de vácuo máxima de 250 a 400mmHg e aspirar
a camada superficial sob baixa pressão21.
Hematoma
O hematoma foi uma das complicações mais encontradas na literatura relacionada com
lipoaspiração e suas combinações. A coorte feita por Kaoutzanis et al., em 201718, com 31 mil pacientes, comparou os procedimentos únicos e combinados, encontrando
uma prevalência de 0,15% em 11.490 lipoaspirações, e 0,60% em 19.520 lipoaspirações
combinadas com outros procedimentos.
O hematoma como complicação da lipoabdominoplastia foi descrita por Sozer et al.15, Vieira et al.16 e Xia et al.1, resultando em 0,40% em 1.000, 0,90% em 1.500 e 0,8% em 14.000 procedimentos, respectivamente.
Além disto, no trabalho de Weissler et al., em 202126, com 120 pacientes, separados em dois grupos iguais, houve uma chance de hematomas
de 2,3/10 entre os pacientes que não utilizaram infiltração de ácido tranexâmico durante
o procedimento, e de 1,6/10 nos quais houve a infiltração, apresentando uma diferença
estatisticamente significante. Na revisão de literatura de Montrief et al.17, observou-se uma variação de 3 a 15% de prevalência desta complicação na lipoabdominoplastia.
Outras complicações
Bertheuil et al.27 indicaram que em 25 procedimentos de lipo body-lift houve 10 casos de deiscência da ferida cirúrgica, tratados com cicatrização por segunda
intenção e duas necroses de gordura. O estudo realizado por Restifo21 avaliou 304 lipectomias sub-Scarpa que apontaram aproximadamente 5% de casos de necrose
gordurosa. A revisão de literatura de Montrief et al.17 apontou como segunda causa mais comum de mortalidade após lipoaspiração a perfuração
visceral, sendo a perfuração ileal o local mais comum, seguida por perfuração do jejuno,
baço, ceco, cólon transverso e sigmoide. É importante ressaltar que são fatores de
risco de perfuração visceral durante a lipoaspiração: a obesidade mórbida, cicatrizes
cirúrgicas anteriores e hérnias da parede abdominal.
DISCUSSÃO
De acordo com os resultados obtidos, encontramos indícios de que a lipoaspiração como
procedimento isolado tende a demonstrar uma chance menor de complicações quando comparada
com procedimentos combinados entre lipoaspiração e abdominoplastia ou lipoescultura.
Além disso, as evidências encontradas demonstraram que as complicações com maiores
taxas de incidência, como hematomas, seromas e irregularidades de contorno, têm repercussões
menos graves aos pacientes. Por outro lado, complicações mais graves que necessitam
de hospitalização para o tratamento, por exemplo, TEV, perfuração visceral e infecções
do sítio cirúrgico, são menos comuns.
De igual modo, uma revisão realizada em 2016 por Almutairi et al.28 mostrou as mesmas complicações precoces encontradas no presente estudo, também com
baixo percentual de prevalência (5-15%), com destaque à deiscência de ferida operatória
e à cicatrização tardia da ferida, como as mais comuns, seguidas de formação de seromas,
hematomas e infecção de ferida. Tal achado sugere não haver grandes variações das
complicações da lipoaspiração nos últimos 10 anos, pelo contrário, mantendo a segurança
e otimizando os resultados ao paciente.
Algumas limitações devem ser consideradas. Nem todos os fatores sobre a segurança
da lipoaspiração foram revisados, por exemplo, o tipo de anestesia utilizada, o acompanhamento
no pós-operatório imediato por uma equipe multiprofissional, a composição ideal da
solução umectante, o tempo antes de iniciar a lipoaspiração, detalhes sobre as técnicas
como o tipo exato de cânula, profundidade e localização corporal da lipoaspiração
e critérios de seleção de pacientes. Além disso, a metanálise não pôde ser conduzida
devido à heterogeneidade entre os estudos para atender a todos os critérios de interesse.
Certos pontos sobre a lipoaspiração combinada ou não ainda necessitam de maiores esclarecimentos,
como a quantidade de conteúdo lipoaspirado e suas possíveis relações com complicações
mais graves nos pacientes, além disso, entender qual a importância da equipe multidisciplinar
no pós-operatório imediato e seu impacto no aparecimento das complicações intra e
pós-operatórias.
CONCLUSÃO
A lipoaspiração é um procedimento seguro, com baixo índice de complicações. A lipoaspiração
como cirurgia única apresenta índices menores de complicações que a lipoaspiração
combinada a outros procedimentos, como lipoabdominoplastia e a lipoenxertia. A vasta
gama de métodos disponíveis para aspirar a gordura subcutânea permite um plano de
tratamento individual ideal, tendo em conta as indicações corretas. Um treinamento
completo do cirurgião e um conhecimento profundo sobre as possíveis complicações são
essenciais, pois, embora a lipoaspiração seja frequentemente oferecida como uma cirurgia
menor e inofensiva, é um procedimento complexo. Por conseguinte, mais estudos a longo
prazo devem ser realizados visando consolidar ainda mais o entendimento e segurança
do procedimento.
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1. Universidade Do Estado do Pará, Departamento de Cirurgia, Belém, Pará, Brasil
2. Universidade Federal do Amapá, Departamento de Cirurgia, Macapá, Amapá, Brasil
3. Centro Universitário Metropolitano da Amazônia, Departamento de Cirurgia, Belém,
Pará, Brasil
4. Universidade Federal do Pará, Departamento de Cirurgia, Belém, Pará, Brasil
Autor correspondente: Luiz Fernando Lima Barros Rua Municipalidade 985, sala 2005. Ed Mirai Office, Umarizal, Belém, PA, Brasil.
CEP: 66055-200 E-mail: lfbcirurgiaplastica@gmail.com
Artigo submetido: 07/10/2021.
Artigo aceito: 13/09/2022.
Conflitos de interesse: não há.