INTRODUÇÃO
O tumor triquilemal proliferante é uma rara enfermidade que se desenvolve a partir
de lesões císticas foliculares. Ocorre em mais de 90% dos casos no couro cabeludo
e em mulheres idosas1. Muitos fatores podem estar envolvidos na fisiopatogenia da doença, como eventos
traumáticos, inflamatórios e infecções virais2,3.
Apresenta-se clinicamente por nódulo ou tumoração que pode alcançar grandes proporções,
de consistência cística, geralmente no couro cabeludo. Por ser uma lesão não tão comum,
acaba sendo pouco diagnosticada e pode ser confundida com cisto pilar simples devido
ao caráter insidioso.
O diagnóstico só é conclusivo após exame anatomopatológico. Ainda há discussão se
seria uma variante do carcinoma espinocelular ou uma lesão precursora deste4. Existem relatos de comportamento local agressivo, com recorrências e até metástases.
O tratamento é a completa excisão cirúrgica com amplas margens, radioterapia e quimioterapia
nos casos agressivos.
RELATO DE CASO
Paciente de 70 anos, do sexo feminino, habitante do Rio de Janeiro capital, trabalha
como maquiadora, fototipo IV, que apresentava há um ano, nódulo em couro cabeludo
de crescimento rápido em região occipital (Figura 1).
Figura 1 - Pré-operatório.
Figura 1 - Pré-operatório.
O presente relato de caso obedeceu a todos os critérios de ética e pesquisa em seres
humanos em conformidade com a declaração de Helsinki, Resolução no 466/2012 e Resolução no 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde.
Realizou consulta com primeiro dermatologista há 1 ano, que disse tratar se de cisto
sebáceo, realizando retirada parcial sem análise histopatológica. Refere retorno de
lesão em aproximadamente 3 meses com piora dos aspectos locais.
Procurou novo dermatologista por lesão apresentar crescimento rápido, recidiva e sinais
inflamatórios locais (eritema e dor), onde foi tratada clinicamente. Ao exame dermatológico
havia tumoração cística de três centímetros, hiperpigmentada e com hiperceratose.
Realizou-se biópsia incisional, na qual se obteve diagnóstico de tumor triquilemal
proliferante e encaminhado para cirurgião plástico para realização de ampla exérese
de lesão com pelo menos 1 cm de margem (Figura 2). Realizou-se exérese de lesão com margens amplas de 1 cm (Figura 3), seguido de congelação por patologista que confirmou margens livres (Figura 4).
Figura 2 - Pré-operatório: marcação e ressecção com margens de 1cm.
Figura 2 - Pré-operatório: marcação e ressecção com margens de 1cm.
Figura 3 - Peça cirúrgica.
Figura 3 - Peça cirúrgica.
Figura 4 - Área de defeito após ampliação de margem profunda.
Figura 4 - Área de defeito após ampliação de margem profunda.
Foi então decidido por retalho de couro cabeludo em rotação, em forma de S, bilateralmente
ao defeito, rodando em direção a parte central com bom resultado imediato, boa perfusão
e resolução do defeito (Figuras 5 e 6). A paciente continuará a ser acompanhada no consultório a longo prazo pela possibilidade
de comportamento agressivo desse tumor.
Figura 5 - Pós-operatório imediato.
Figura 5 - Pós-operatório imediato.
Figura 6 - Pós-operatório de 3 semanas.
Figura 6 - Pós-operatório de 3 semanas.
DISCUSSÃO
TTP é uma neoplasia anexial incomum, diferenciando-se na bainha epitelial externa
do folículo piloso. Ocorre em mais de 90% dos casos no couro cabeludo e em mulheres
idosas. Há relatos de lesões múltiplas, ulceração e sangramento. Há casos reportados
em indivíduos jovens. Outras localizações menos comuns incluem pescoço, tronco, axilas,
púbis, vulva, membros inferiores e superiores, lábio superior e região glútea.
O caso apresentado se encaixa dentro do perfil habitual de manifestação da doença.
Ainda há discussão se o tumor triquilemal proliferante seria uma variante do carcinoma
espinocelular ou uma lesão precursora em evolução a este. Acredita-se que surge a
partir de um cisto triquilemal (CT). O TTP e o CT possuem como marcador histológico
a presença de ceratinização triquilemal (abrupta transição de células nucleadas epiteliais
para células anucleadas, ceratinizadas, sem a formação de camada granulosa).
Eventos traumáticos poderiam ser fatores contribuintes em sua fisiopatogenia, bem
como alguns vírus, como HPV (papiloma vírus humano), mas essa relação causal ainda
não é muito estabelecida5,6.
Houve um estudo que aferiu a atividade de p53 e p27kip1 comparativamente entre o cisto
triquilemal, o tumor triquilemal proliferante e carcinoma espinocelular com diferenciação
triquilemal, demostrando que não houve diferença em relação à expressão de p53 entre
TTP e carcinoma espinocelular, sendo quase nula no cisto triquilemal. Isso reforça
a ideia de o TTP ser um carcinoma, porém, a expressão de p27kip1 é muito maior no
TTP em relação ao SCC, e esta proteína está relacionada a um efeito regulatório do
ciclo celular, o que o classificaria como uma neoplasia de grau intermediário em relação
à malignidade.
A confirmação do diagnóstico se faz por meio de exame anatomopatológico. Caracteriza-se
por proliferação de células escamosas, com citoplasma eosinofílico abundante e queratinização
abrupta, que exclui a camada granulosa, formando queratina densa e homogeneizada que
preenche os espaços císticos. Pode haver áreas de queratinização epidermóide com formação
de pérolas córneas. Não há infiltração do estroma adjacente, o que ajuda na diferenciação
do carcinoma espinocelular.
Há relatos de comportamento local agressivo, com recidivas e até metástases7,8 com disseminação local ou linfonodal, mas raramente hematogênica. Em estudo com 94
casos de tumor triquilemal proliferante, houve relato de recidivas em torno de 1%
e de transformação maligna e metástase linfonodal por volta de 10%, porém, sem metástases
à distância. Outro estudo tentou correlacionar alterações anatomopatológicas com comportamento
biológico, e mostrou que, aparentemente, o acometimento fora do couro cabeludo, o
crescimento rápido, o tamanho maior que cinco centímetros e as atipias estariam relacionadas
a um pior prognóstico9.
O tratamento é a completa excisão cirúrgica com margens de 1cm, radioterapia e quimioterapia
nos casos agressivos. No caso exposto, realizamos excisão com margem de 1cm em região
occipital de couro cabeludo, com confirmação anatomopatológica de margens livres com
patologista em sala, seguido de rotação de retalho local.
CONCLUSÃO
O tumor triquilemal proliferante é uma neoplasia que pode ser de caráter agressivo
em alguns casos, especialmente quando ocorre fora do couro cabeludo, tem crescimento
rápido e infiltrativo, diâmetro maior que 5cm e atividade mitótica. Nesse caso, enfatizamos
a importância de sempre realizar biópsia em lesões suspeitas para confirmação diagnóstica,
a importância do patologista em sala para confirmação das margens livres, a ressecção
ampla e o acompanhamento contínuo pós-operatório10.
REFERÊNCIAS
1. Sau P, Graham JH, Helwig EB. Proliferating epithelial cysts. Clinicopathological analysis
of 96 cases. J Cutan Pathol. 1995 Out;22(5):394-406.
2. Rao S, Ramakrishanan R, Kamakshi D, Chakravarthi S, Sundaram S, Prathiba D. Malignant
proliferating trichilemmal tumour presenting early in life: an uncommon feature. J
Cutan Aesthet Surg. 2011 Jan/Abr;4(1):51-5.
3. Mones JM, Ackerman AB. Proliferating trichilemmal cyst is squamous cell carcinoma.
New Concept. 1998; [citado 2013 Mar 21]; 4:295-310. Disponível em: https://derm101.com/indexDPC
4. New Concept. 1998; [citado 2013 Mar 21]; 4:295-310. Disponível em: https://derm101.com/indexDPC
5. Fernández-Figueras MT, Casalots A, Puig L, Llatjós R, Ferrándiz C, Ariza A. Proliferating
trichilemmal tumour: p53 immunoreactivity in association with p27Kip1 over-expression
indicates a low-grade carcinoma profile. Histopathology. 2001 Mai;38(5):454-7.
6. Motegi S, Tamura A, Endo Y, Kato G, Takahashi A, Negishi I, et al. Malignant proliferating
trichilemmal tumour associated with human papillomavirus type 21 in epidermodysplasia
verruciformis. Br J Dermatol. 2003 Jan;148(1):180-2.
7. Erdem H, Yildirim U, Uzunlar AK, Sahiner C, Ozcelik D, Toplu G. Posttraumatic giant
proliferating trichilemmal cysts on the parietal region of the scalp. Indian J Dermatol
Venereol Leprol. 2011;77(6):707-9.
8. López-Rios F, Rodríguez-Peralto JL, Aguilar A, Hernández L, Gallego M. Proliferating
trichelemmal cyst with focal invasion: report of a case and a review of the literature.
Am J Dermatopathol. 2000 Abr;22(2):183-7.
9. Jung J, Cho SB, Yun M, Lee KH, Chung KY. Metastatic malignant proliferating trichilemmal
tumor detected by positron emission tomography. Dermatol Surg. 2003 Ago;29(8):872-4.
10. Folpe AL, Reisenauer AK, Mentzel T, Rütten A, Solomon AR. Proliferating trichilemmal
tumors: clinicopathologic evaluation is a guide to biologic behavior. J Cutan Pathol.
2003 Set;30(8):492-8.
1. Clínica Particular, Cirurgia Plástica, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
2. Clínica Particular, Dermatologia, Doenças do Couro Cabeludo, Rio de Janeiro, RJ,
Brasil.
3. Hospital Souza Aguiar, Cirurgia Plástica, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Autor correspondente: Tulio Martins Rua General Venâncio Flores, 305, Sala 611, Leblon, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP:
22441-090 E-mail: tu liomartins2@hotmail.com
Artigo submetido: 28/01/2020.
Artigo aceito: 15/07/2020.
Conflitos de interesse: não há.
COLABORAÇÕES
TM Análise e/ou interpretação dos dados, Análise estatística, Aprovação final do manuscrito,
Aquisição de financiamento, Coleta de Dados, Conceitualização, Concepção e desenho
do estudo, Gerenciamento de Recursos, Gerenciamento do Projeto, Investigação, Metodologia,
Realização das operações e/ou experimentos, Redação - Preparação do original, Redação
- Revisão e Edição, Software, Supervisão, Validação, Visualização
NLB Coleta de Dados, Investigação, Realização das operações e/ou experimentos
IDB Gerenciamento de Recursos, Supervisão, Visualização