INTRODUÇÃO
A consolidação da era da informação, com seu aumento exponencial em novas e avançadas
tecnologias e sua sofisticação eletrônica, traz uma nova realidade também à área da
saúde1-4, com seu arsenal alcançando praticamente todos os processos envolvidos nessa área,
desde a gestão, passando ao próprio consultório médico - local antes salvaguardado,
quase inviolável, da relação médico-paciente - até o processo de ensino. Embora a
proliferação de tecnologias seja, ainda, criticada por ameaçar a relação médico-paciente
tradicional, os benefícios potenciais derivados dessa relevante matriz merecem consideração
por todos envolvidos nessa área1,2,5-8.
A telemedicina refere-se à prestação de serviços médicos pelo uso da tecnologia da
informação e comunicação entre pacientes e prestadores de serviços, separados por
distâncias geográficas1) que podem tornar impraticáveis os encontros pessoais. Dado o rápido desenvolvimento
das tecnologias de telecomunicações, o conceito de telemedicina cresceu para abranger
uma ampla gama de aplicações1. Estudos anteriores já demonstraram que a tecnologia de telessaúde melhora os resultados
em várias áreas, incluindo o gerenciamento de diabetes, hipertensão e doença pulmonar
obstrutiva crônica5,9,10. Há descrição de redução de taxas de admissão hospitalar em pacientes em uso de telemedicina11.
A cirurgia plástica é um campo especialmente favorável à aplicação da telemedicina,
dado que a inspeção visual do paciente nessa especialidade orienta grandemente tanto
o diagnóstico como o acompanhamento clínico do paciente2,6,12,13, de maneira que, embora as vantagens da telemedicina se apliquem amplamente a todos
profissionais, avanços recentes na acessibilidade, qualidade e transmissibilidade
da mídia de foto e vídeo são de particular relevância para cirurgiões plásticos, dada
a referida natureza altamente visual do seu trabalho14,15.
Como demonstrado nesta revisão, os novos artigos mostram que a telemedicina tem um
potencial especial no aumento da eficiência da avaliação e acompanhamento pós- operatório
em cirurgia plástica, tanto reparadora2, quanto estética7,8, melhorando a coordenação e facilitando a colaboração interprofissional no tempo
e no espaço1,2, eliminando um número significativo encaminhamentos desnecessários16) e conectando pacientes localizados longe dos grandes centros médicos a profissionais
experientes1,2,14, sem comprometer - e até mesmo melhorando7) - a qualidade ou precisão dos cuidados prestados1,2,17,18, além de ser aplicável a diversas áreas da cirurgia plástica, como feridas complexas18,19, queimaduras16,18) e suas sequelas18, fissuras labiopalatinas15) e cirurgia plástica pediátrica15. Não obstante, deve-se considerar que a implementação da telemedicina pode ser desafiadora
e onerosa20,21. Existem fatores que podem limitar a adoção mais ampla desses sistemas, como custo
das instalações iniciais de áudio, vídeo, rede e armazenamento, problemas de licenciamento
de fornecedores, sistemas eletrônicos não padronizados de registros médicos, ausência
ou cobertura deficiente por parte dos convênios e operadoras de saúde suplementar
e falta de regulamentação legislativa padronizada3.
É importante, ainda, que seja feita observação histórica ao período que esta revisão
foi elaborada. Não só fatores geográficos são motivo de implementação de sistemas
baseados em telemedicina. Em 30 de janeiro de 2020, a OMS declarou o surto de COVID-
19, uma emergência de saúde pública de interesse internacional e, em março de 2020,
passou a caracterizá-lo como uma pandemia, a fim de enfatizar a gravidade da situação
e exortar todos os países a agirem na detecção de infecção e prevenção da propagação22,23. Neste cenário, o novo coronavírus pode ter sido catalisador de um movimento em diversas
esferas de produtos e serviços, incluindo a área da saúde, rumo ao digital23.
Dado o ritmo acelerado do avanço tecnológico do século 21, associados aos possíveis
efeitos do isolamento social impostos pela pandemia pela COVID-1923,24, os autores julgaram pertinente publicar uma atualização de uma revisão por Vyas
et al. (2017) (4, de maneira a sintetizar as novas evidências disponíveis na literatura desde a sua
apresentação, em junho de 2016.
MÉTODOS
Analogamente à metodologia descrita na revisão de Vyas et al. (2017)4, foi realizada revisão integrativa nos artigos publicados em telemedicina em cirurgia
plástica na base de dados PubMed, utilizando os seguintes termos MeSH: “telemedicine” AND “plastic surgery”, em busca avançada. Das referências obtidas, foram excluídas pelo título aqueles
que não se relacionavam diretamente à cirurgia plástica ou não possuíam resumo disponível
na base de dados. Das restantes, foram excluídas pelos resumos os relatos de caso
ou série de caso com n<10, os textos que não se relacionavam às questões norteadoras
(telemedicina, cirurgia plástica e assistência), os estudos de revisão e as que foram
publicadas anteriormente a junho de 2016, data do envio da última revisão sistemática
sobre o tema à revista4, que foi publicada em junho de 2017, desde de que possuísse citação nas referências
deste último. Os autores extraíram dados sobre subespecialidade na cirurgia plástica,
finalidade, desenho do estudo, intervenção, resultados e conclusões. As referências
dos artigos incluídos foram digitalizadas para estudos adicionais.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram identificados 134 artigos, todos em inglês, na busca inicial no PubMed. Apesar
de não ter sido estipulado filtros linguísticos, todas as referências encontradas
traziam texto em língua inglesa. Foram excluídos 69 por não se relacionarem diretamente
à cirurgia plástica e telemedicina ou não possuírem resumo disponível na base de dados.
Dos 65 artigos remanescentes, 53 foram excluídos pela leitura dos resumos por se tratarem
de relatos de caso ou série de caso com n<10, possuírem textos que não se relacionam
às questões norteadoras (telemedicina e cirurgia plástica), serem estudos de revisão
ou terem sidos publicados anteriormente a junho 2016. Neste último quesito da data
de publicação, houve dois artigos com data de publicação anterior a junho de 2016,
porém, como não foi identificada suas inclusões na análise realizada em última revisão
do tema, enviada para publicação por Vyas et al., em 2016 e publicada em 20174, estes foram incluídos na presente revisão. Foram incluídos, portanto, 12 artigos
e revisados em detalhes. Os doze artigos focados em telemedicina em cirurgia plástica
incluíam: 2 em tratamento de feridas, 3 em tratamento de queimaduras e suas sequelas,
1 em trauma e emergências em cirurgia plástica, 1 em fenda labiopalatina, 1 em cirurgia
plástica pediátrica, 2 em cirurgia plástica estética e 2 em avaliação e acompanhamento
em cirurgia plástica reparadora (Figura 1).
Figura 1 - Diagrama de seleção de estudos.
Figura 1 - Diagrama de seleção de estudos.
Todos os doze artigos selecionados para esta revisão foram analisados em detalhes
e seus objetivos, métodos, resultados e conclusões estão descritos na Quadro 1.
Quadro 1 - Análise dos artigos selecionados.
Referência (Ano), País |
Objetivo Primário |
Métodos |
Resultados |
Conclusões |
Douglas et al.1 (2018), EUA
|
Revisar a experiência de teleconsulta por vídeo (CVT) no sistema de saúde de Connecticut
VA e pesquisar as atitudes dos pacientes em relação aos serviços de telemedicina nesse
contexto.
|
Estudo transversal através da aplicação de questionários qualitativos e quantitativos,
para avaliação da satisfação do paciente com o serviço médico.
|
Em escala de notas que vai até 10 pontos, os pacientes avaliaram positivamente a qualidade
geral da interação com seu médico (nota: 9,2), sua capacidade de se comunicar (nota:
9,3) e sua satisfação geral (nota: 9,2). Os pacientes classificaram a qualidade de
vídeo e som com notas 8,6 e 9,0, respectivamente. 83% afirmaram que prefeririam a
consulta de telessaúde a visitas pessoais para futuros problemas de cirurgia plástica,
e 7 pacientes (17%) disseram que prefeririam uma visita pessoal.
|
A consulta interativa por telemedicina, ao vivo, com um cirurgião plástico, no sistema
de assistência médica do VA resulta em uma satisfação substancial do paciente com
a conveniência de acessar atendimento médico em comunidades remotas.
|
Funderburk et al.2 (2019), Líbano
|
Desenvolver processo de aprimoramento de eficiência clínica e ofereça a satisfação
ideal do paciente, no cenário de pós-operatório, através de ferramenta de telessaúde.
|
Pacientes residentes em área pré-definida foram dados a opção de acompanhamento por
telessaúde e acompanhamento por 1 ano. As Cirurgias estéticas foram excluídas.
|
Pesquisas pré-operatórias revelaram que 73% dos pacientes preferia visitas de acompanhamento
presenciais, ao passo que a satisfação após o encontro por telessaúde foi 95%. 96%
dos pacientes disseram ter suas perguntas respondidas e 97% usariam o serviço novamente.
|
A telemedicina está associada a uma satisfação maior do paciente e a resultados clínicos
potencialmente aprimoráveis, sem prejuízo ao acompanhamento.
|
Pozza et al.7 (2017), EUA
|
Avaliar a eficácia de um programa de acompanhamento pós-operatório de cirurgia plástica
baseada em smartphone.
|
Revisados retrospectivamente, durante o período de 1 ano, os registros clínicos de
pacientes submetidos a cirurgias estéticas da face, bem como dados dos questionários
e fotografias de pós-operatório enviadas por smartphones dos pacientes.
|
50 (96,2%) pacientes relataram que o processo melhorou a qualidade de sua experiência
pós-operatória. O protocolo permitiu detectar complicações precoces em 3 casos, porém
as complicações foram detectadas fora do prazo estipulado para o envio precoce das
fotografias.
|
O cirurgião plástico pode fornecer virtualmente uma vigilância precoce do paciente
no pós-operatório. Apesar da fotografia precoce ter falhado em identificar as complicações,
estas foram detectadas por fotografias posteriores.
|
Westra et al.8 (2015), Holanda
|
Investigar se a consulta on-line é uma alternativa satisfatória à consulta presencial
tradicional em pós-operatório de cirurgias plásticas de face.
|
Ensaio clínico randomizado com inclusão de pacientes elegíveis em dois braços de avaliação
pós-operatória de 6 semanas: consulta presencial ou teleconsulta (em vídeo), com preenchimento
posterior de questionários validados cientificamente (PSQ-18, PEQ e TSQ) de satisfação
e avaliação de comunicação médico-paciente
|
31 pacientes participaram. A satisfação geral foi igual nos dois grupos, mas houve
uma diferença significativa nas dimensões "satisfação geral" (on-line grupo de consulta
mais satisfeito, P=0,02) e "acessibilidade e conveniência" (grupo de consulta on-line
menos satisfeito, P=0,01) no questionário PSQ-18.
|
Os pacientes estiveram igualmente satisfeitos com a consulta tradicional ou em vídeo
em tempo real na cirurgia plástica. A consulta online é considerada uma alternativa
que economiza tempo à consulta tradicional, apesar de poder ser percebida por alguns
pacientes como uma influência negativa na comunicação com o médico.
|
Rimal et al.14 (2017), Austrália
|
Compartilhar a experiência dos autores usando a telessaúde para a prestação de serviços
e prestação de cuidados em um ambiente geograficamente desafiador
|
Estudo retrospectivo de dados dos prontuários dos pacientes, por período de 1 ano,
incluindo todos os pacientes registrados no serviço de telessaúde de cirurgia plástica.
|
194 pacientes rurais (66 homens e 128 mulheres), 26 dos quais eram casos eletivos
e 358 consultas de acompanhamento em telessaúde. 10 pacientes foram tratados apenas
via telessaúde; 24 pacientes tiveram sua primeira revisão clínica presencial e acompanhamento
adicional via telessaúde, e 99 pacientes foram pós-operatórios. A etiologia de casos
variou de lacerações da pele a lesões complexas de tecidos moles e ossos, bem como
casos eletivos de acompanhamento pós-operatório craniofacial das mãos.
|
A telemedicina em cirurgia plástica pode ser usada também na população pediátrica,
principalmente em locais remotos, com mínimo acesso a especialistas.
|
Sood et al.17 (2016), França
|
Análise do sistema de tratamento de feridas por telemedicina. |
Revisão de dados da rede CICAT (Rede de Cicatrização de Hospitais Domésticos), incluindo
5.794 pacientes, entre janeiro de 2005 e outubro de 2015. A eficácia clínica e os
resultados médico-econômicos foram analisados.
|
Na experiência da rede de feridas do CICAT, os resultados demonstraram que 75% das
feridas melhoraram ou cicatrizaram, redução de 72% no número de hospitalizações e
redução de 56% nas transferências de ambulâncias para os centros de cicatrização.
|
A telemedicina pode ser benéfica no tratamento de feridas, embora seja importante
observar que em alguns países restrições legais podem tornar a telemedicina extremamente
complicada.
|
Rennekampff et al.19 (2015), Alemanha
|
Examinar a variabilidade intra e inter-examinadores da análise fotográfica remota
do fechamento de feridas, bem como a confiabilidade da análise fotográfica remota
de feridas com a avaliação clínica direta.
|
Análise cega por painel de avaliadores de imagens de alta resolução de dois estudos
clínicos randomizados. A validade da análise da imagem fotográfica foi correlacionada
com avaliações clínicas do tempo para recuperação.
|
O coeficiente de correlação intraclasse médio dos quatro examinadores foi excelente
(r = 0,79; intervalo de confiança de 95% (IC), 0,61, 1,00). O coeficiente de correlação
entre avaliadores foi bom (r = 0,67; IC 95%, 0,57, 1,00)). A concordância entre a
avaliação visual remota e a avaliação clínica no momento da cicatrização foi boa (r
= 0,64; IC 95%, 0,52, 0,76)).
|
A análise fotográfica remota de feridas cutâneas é um instrumento viável em estudos
clínicos para avaliar o tempo até o fechamento da ferida.
|
Hughes et al.15 (2017), EUA e Equador
|
Avaliar a confiabilidade do vídeo digital remoto no diagnóstico pré-operatório de
fissura lábio-palatina em ambientes com poucos recursos na zona rural do Equador,
assim como avaliar os possíveis ganhos econômicos gerados com a adoção dessa tecnologia.
|
Análise retrospectiva dos dados de vídeo durante as avaliações pré-operatórias por
um cirurgião craniofacial em pacientes em fevereiro de 2015, com classificação de
cada paciente com os mesmos critérios objetivos. Análise da porcentagem de concordância
entre os dois grupos e a confiabilidade entre avaliadores.
|
Foi encontrada uma concordância de 95,7% entre os observadores para fissura labial,
com confiabilidade substancial (k = 0,78, P< 0,01). Houve concordância de 82,6% entre
os observadores para fissura palatina, com confiabilidade moderada (k=0,55, P< 0,01).
Encontramos Concordância de 47,8% entre os observadores para fenda alveolar, com uma
concordância kappa fraca e não significativa.
|
As avaliações digitais remotas são uma maneira confiável de diagnosticar no pré-operatório
fenda labial e palatina no contexto de intervenções em cirurgias plásticas em países
de baixa e média renda.
|
Martinez et al.16 (2017), África do Sul
|
Avaliar a aplicação do WhatsApp para facilitar o tratamento de queimadura e a alocação
de recursos.
|
Revisão de todas as consultas que utilizaram o WhatsApp durante 18 meses, recebidas
por dois médicos seniores de um centro de queimaduras
|
Avaliadas 833 comunicações e 1562 dúvidas clínicas. 486 interações (58%) de dentro
do hospital. Não houve mudança no número de intervenções cirúrgicas, mas reduziram
as consultas ambulatoriais.
|
O WhatsApp contribuiu para a redução de encaminhamentos desnecessários e consultas
ambulatoriais.
|
Cai et al.18 (2016), Nepal e EUA
|
Testar a confiabilidade da Escala de Avaliação de Cicatrizes Pacientes e Observador
(POSAS) usando videoconferência.
|
Estudo prospectivo realizado com três observadores independentes. Avaliaram 85 cicatrizes
de queimadura de 17 indivíduos.
|
Confiabilidade para avaliador único foi aceitável (CCI> 0,70). A confiabilidade da
média dos três avaliadores foi aceitável (CCI> 0,70). No escore de opinião geral,
os pacientes relataram consistentemente pior opinião.
|
Avaliação de cicatrizes de queimaduras usando a escala POSAS pode ser realizada com
precisão por meio de videoconferência.
|
Boccara et al.26 (2018), França
|
Avaliar a qualidade de método para a realização de telemedicina. |
Estudo retrospectivo com 323 pacientes. O intuito do uso da telemedicina foi avaliar
a necessidade de cirurgia.
|
Diagnóstico inicial correto em 94,4% (305/323) dos casos. Onze pacientes (3,4%) foram
transferidos desnecessariamente e sete pacientes (2,2%) não foram transferidos, apesar
da necessidade de cirurgia.
|
Os resultados encorajam a desenvolver a telemedicina com base na fotografia digital,
embora nunca substitua o exame clínico.
|
Paik et al.25 (2016), EUA
|
Avaliar a resposta de telessaúde por meio de um aplicativo para consultas relacionadas
a cirurgias plásticas.
|
Estudo de Garantia/Melhoria de Qualidade de um centro de trauma. O estudo utilizou
aplicativo para enviar imagens e breve histórico para professores de Cirurgia Plástica.
|
42 consultas realizadas. A concordância entre professores e consultores foi de 85,7%
para consultas presenciais e 100% para consultas telefônicas. Em quatro casos de consultas
por telefone, os provedores do departamento de emergência colocaram talas incorretamente
nos pacientes feridos.
|
Os resultados mostram que consultas de telessaúde foram capazes de produzir respostas
oportunas e precisas em uma unidade de atendimento de emergência.
|
Quadro 1 - Análise dos artigos selecionados.
A pandemia em andamento pelo novo SARS-CoV-2 tem acelerado a busca pela utilização
de serviços médicos à distância. Nesse cenário, é imperativo que se busque o que há
na literatura científica sobre avanços acerca da aplicação da telemedicina na cirurgia
plástica, a fim de promover melhorias, excluir falhas e implementar inovações, buscando
melhor resposta adaptativa ao desafio atual.
Vyas et al. construíram em 20174 uma excelente revisão de 23 artigos focados em telemedicina em cirurgia plástica.
Utilizaram os seguintes termos MeSH: “surgery, plastic; general surgery; surgical procedures, operative; surgery; burns;
wounds and injuries; soft tissue injuries; dermatology; teledermatology; teledermatological;
maxillofacial injuries; hand; hand injuries; microsurgery; breast; cell phones; orthopedics;
telesurgery; remote consultation”. Desde então, é notório os avanços nesta área, seja pela expansão exponencial da
tecnologia móvel, seja pela crescente familiaridade e acessibilidade ao consumidor
médio. Neste contexto novos artigos surgiram e não estão contemplados na revisão feita
por Vyas et al. (2017)4.
Os artigos encontrados nesta revisão demonstraram benefícios na utilização da telemedicina
aplicada à cirurgia plástica, de forma mais pronunciada no acompanhamento pós-operatório
dos pacientes2,7,8,14, redução ou extinção da necessidade de visitas presenciais1,14,16-19, satisfação dos pacientes nas consultas realizadas por telemedicina1,2,8, redução de custos financeiros1, redução de tempo de resposta para referências25, acurácia diagnóstica semelhante à avaliação presencial15,17-19,25,26) e melhoria ao acesso de cuidado especializado a lugares remotos, tanto geográfica
quanto socialmente desfavoráveis1,2,14,15,25. Apesar da imensa maioria dos trabalhos mostrarem uma significativa satisfação dos
pacientes, vale ressaltar o viés de seleção presente nestes estudos. O método de captação
de voluntários, disposto a ser consultado por telemedicina, favorece a seleção de
pacientes mais receptivos a esta abordagem1,2,8,25.
Westra e Niessen, em 20158, realizaram um ensaio clínico randomizado comparando a avaliação da satisfação dos
pacientes e do médico em consulta de acompanhamento pós-operatório por meio de uma
conexão de vídeo em tempo real e consulta pessoal tradicional, através de questionários
validados de medidas de diferentes aspectos dos cuidados à saúde, de comunicação médico-paciente
e de satisfação com a telemedicina. Os resultados mostraram que, no geral, os pacientes
estão igualmente satisfeitos com a consulta tradicional ou por vídeo conferência.
No entanto, a consulta on-line foi percebida por alguns pacientes como uma influência
negativa na relação médico-paciente. Ainda, mesmo se tratando de estudo com robustez
estatística mais elevada, observou-se um pequeno tamanho amostral, o que foi potencializado
pela perda de 30% da amostra inicial de pacientes elegíveis, o que pode ter gerado
viés de atrito.
Quatro artigos discutiram barreiras e limitações, observadas ou potenciais, ao uso
da telemedicina na cirurgia plástica, que foram: segurança dos dados, com necessidade
de soft e hardwares sofisticados e protegidos, para que o armazenamento dos dados dos pacientes possam
estar livres de fraudes1,7; regulamentação e legislação, tanto na esfera governamental quanto na esfera da saúde
privada, para adoção mais ampla da telemedicina no arsenal propedêutico1,17; custos financeiros iniciais, que podem ser altos, da instalação dos equipamentos
de áudio, vídeo, de transmissão e armazenamento de dados1, percepção de influência negativa na comunicação médico-paciente e a provável necessidade
de treinamento específico dedicado a médicos e demais profissionais da saúde na melhoria
de suas habilidades de comunicação on-line8.
Alguns trabalhos mostram que a tecnologia presente nos atuais smartphones é suficiente para permitir uma avaliação precisa de diversas patologias do campo
da cirurgia plástica2,7,8,16,17,25,26. Até mesmo aplicativos de uso rotineiro pode ser utilizado como demonstrou Martinez
et al., em 201816, que usaram o aplicativo WhatsApp para comunicação entre vários níveis de tratamento do paciente com queimadura. Já
Pozza et al., em 20177, utilizando smartphones, preferiu empregar uma rede muito específica e protegida para transmissão de dados
denominada HIPPA. Esta é uma rede sofisticada e com grande segurança nos dados. A
utilização de smartphones reduz o custo para implementação do sistema, além de facilitar a comunicação em tempo
real com especialistas7,16,25. Especificamente no trabalho de Paik et al., em 201725, foi mensurado o tempo de resposta presencial e o tempo de resposta por meio de comunicação
virtual entre emergencista e especialista, encontrando uma significativa diferença
de tempo, com larga vantagem para a consulta virtual. A economia de tempo e custo
é fundamental para a satisfação do paciente e o financiamento do hospital.
Douglas et al. (2018)1, Sood et al. (2016)17) e Rennekampff et al. (2015)19, por outro lado, utilizaram complexas redes de comunicação associadas e tecnologias
próprias com softwares específicos no desenvolvimento da telemedicina nos seus trabalhos. Estes autores
conseguiram encontrar excelentes resultados quanto a confiabilidade do método, fidedignidade
das informações, julgamento clínico satisfatório, abrangência da população e redução
dos custos com internação e transporte. Seriam necessários novos estudos, a fim de
determinar qual a melhor ferramenta para realizar a telemedicina, se através de smartphones ou alguma outra tecnologia específica com esta finalidade.
CONCLUSÃO
Os estudos analisados demonstram o ganho expressivo nos conhecimentos acerca da telemedicina
aplicada à cirurgia plástica nos últimos anos. A incorporação tecnológica tem a potência
de reduzir distâncias, facilitar a interação do binômio médico-paciente sem prejuízo
para o cuidado, mesmo em áreas onde a interação é tão fundamental como o setor saúde.
O foco não é ter estas tecnologias enquanto substitutivas do cuidado presencial, mas
como ferramentas para ampliar e melhorar os cuidados aos pacientes que necessitam
de avaliação com o cirurgião plástico.
Tais ferramentas tornaram-se mais relevantes no cenário de pandemia pela COVID-19,
onde o distanciamento social se mostrou a medida mais efetiva para desacelerar o contágio,
pelo seu potencial de prevenir contatos físicos direto, fornecer atendimento contínuo
à comunidade e, possivelmente, reduzir a morbimortalidade pela doença27.
Muito do que vem sendo desenvolvido em estudos ainda não está plenamente implantado
nos diversos sistemas de saúde. Persiste o desafio de um desenvolvimento tecnológico
não excludente, que esteja acessível a qualquer pessoa que necessite desse cuidado.
Espera-se que nas adversidades causadas pelo coronavírus seja possível aprimorar a
capacidade de cuidar, seja presencialmente ou mediado por tecnologias.
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1. Universidade Federal de Sergipe, Programa de Pós-Graduação de Gestão e Inovação
em Saúde, Aracaju, SE, Brasil.
2. Universidade Federal de Sergipe, Programa de Pós-Graduação de Ciências da Saúde,
Aracaju, SE, Brasil.
Autor correspondente:
Kênya de Souza Borges Avenida Doutor José Machado de Souza, 220, Sala 304, Ed. Neo Office, Jardins, Aracaju,
SE, Brasil. CEP: 49025-740. E-mail: kenyaborges08@yahoo.com.br
Artigo submetido: 25/08/2020.
Artigo aceito: 10/11/2021.
Conflitos de interesse: não há.
COLABORAÇÕES
KSB Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados,
Conceitualização, Concepção e desenho do estudo, Gerenciamento do Projeto, Metodologia,
Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição
VOBO Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados,
Concepção e desenho do estudo, Gerenciamento do Projeto, Metodologia, Redação - Preparação
do original, Redação - Revisão e Edição
JBCF Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados,
Concepção e desenho do estudo, Gerenciamento do Projeto, Metodologia, Redação - Preparação
do original, Redação - Revisão e Edição
SMS Aprovação final do manuscrito, Concepção e desenho do estudo, Supervisão
AAO Aprovação final do manuscrito, Concepção e desenho do estudo, Supervisão
CAL Aprovação final do manuscrito, Concepção e desenho do estudo, Supervisão