INTRODUÇÃO
As mamas e o abdômen passam por grandes modificações morfológicas com variações de
peso1.Em perdas ponderais maciças, a lipodistrofia abdominal vem acompanhada de pequeno
volume mamário, associado ou não à ptose2.
A mamoplastia de aumento com ou sem mastopexia ocupa a posição de um dos procedimentos
mais realizados na cirurgia plástica. O implante mamário ainda é o método mais simples
e seguro de melhorar a forma e o tamanho das mamas3,4.Porém, complicações como contratura capsular, ondulações, palpabilidade, ruptura
da prótese e perda de sensibilidade local tornam o aumento com tecido autólogo uma
alternativa viável3-6.
Em contrapartida, a abdominoplastia reversa tem sido pouco descrita na literatura,
tanto devido ao pequeno número de pacientes que se beneficiam dela, como pela não
aceitação da cicatriz no abdômen superior3.Entretanto, quando o excesso de pele e a gordura residual localizam-se, principalmente
na região epigástrica, ela se torna uma ótima alternativa, já que frente a essa situação,
nem sempre as técnicas clássicas de abdominoplastia são resolutivas7.
Em pacientes com flacidez abdominal superior que desejam o aumento mamário, a mamoplastia
de aumento por meio da abdominoplastia reversa (augmentation mammaplasty by reverse abdominoplasty - AMBRA) ganha destaque. É uma técnica que utiliza os retalhos dermogordurosos do abdômen
como implante mamário, abordando ambas as regiões simultaneamente3.
O objetivo deste trabalho é relatar um caso de mamoplastia de aumento e mastopexia
a partir de retalho dermogorduroso em cambalhota proveniente de abdominoplastia reversa.
RELATO DE CASO
Paciente do sexo feminino, 47 anos, parda, com história de obesidade mórbida (IMC
53,15kg/m2) e perda ponderal de 59kg em 6 anos, evoluiu no pós-operatório tardio de abdominoplastia
e mamoplastia redutora prévias com ptose mamária e lipodistrofia em região epigástrica.
Quanto às comorbidades, relatou apenas hipertensão arterial sistêmica em tratamento
e negou tabagismo. Ao exame físico, paciente com 59kg, 1,49m e IMC 26,58kg/m2. As mamas continham cicatriz em T invertido e eram pouco volumosas, principalmente
em polo superior, ptosadas e com substituição gordurosa, sendo classificadas como
grau II de Regnault (Figura 1). O abdômen apresentava cicatriz horizontal inferior, com aumento de volume da região
supraumbilical (Figura 1). Para correção simultânea da ptose mamária e da lipodistrofia epigástrica, foi optado
pela realização de mamoplastia de aumento e mastopexia com retalho em cambalhota a
partir de abdominoplastia reversa.
Figura 1 - Pré-operatório.
Figura 1 - Pré-operatório.
Com a paciente em posição ortostática, foi realizada demarcação cirúrgica (Figura 2). Determinada linha média iniciando na fúrcula, passando pelo apêndice xifoide e
terminando na cicatriz umbilical. Identificado o ponto A através de manobra bidigital
como projeção do sulco inframamário sobre o polo superior da mama, coincidindo também
com a linha média umeral. A partir do ponto A, traçou-se a marcação com distância
igual ao diâmetro areolar até borda inferior do complexo areolopapilar (CAP) e, a
partir dele, fuso englobando a cicatriz prévia. Marcados sulcos inframamários, com
linha de quebra de cicatriz em região mediana, ficando pré-determinada uma distância
de 8cm de cada lado a partir da linha média para encontro da cicatriz da mastopexia.
Traçada linha paralela a dos sulcos em abdômen superior identificada através de pinçamento,
sendo os limites laterais as linhas axilares anteriores.
Figura 2 - Marcação cirúrgica.
Figura 2 - Marcação cirúrgica.
Paciente em decúbito dorsal, sob anestesia geral e peridural. Realizada incisão sobre
as marcações prévias, seguida de desepitelização periareolar e abdominal (Figura 3). Após descolamento e secção mediana dos retalhos dermogordurosos a partir do abdômen
superior (Figura 3), foram confeccionadas lojas subglandulares nas mamas (Figura 4). Os retalhos foram reparados e, após rotação em cambalhota, fixados na fáscia do
músculo peitoral maior, na altura do 3º arco costal (Figura 4). Realizado descolamento craniocaudal do abdômen até cicatriz umbilical. Com intuito
de diminuir espaço morto e tensão do fechamento, optou-se pela realização de pontos
de Baroudi em toda área dissecada, até o periósteo do 6º arco costal, para formação
do novo sulco inframamário (Figura 5). Concluída montagem e simetrização das mamas, com posicionamento do CAP (Figura 5). Realizado fechamento por planos (Figura 6). Curativo elaborado com gaze e micropore estéreis.
Figura 3 - Desepitelização, descolamento e secção dos retalhos.
Figura 3 - Desepitelização, descolamento e secção dos retalhos.
Figura 5 - Pontos de Baroudi e montagem das mamas.
Figura 5 - Pontos de Baroudi e montagem das mamas.
Figura 6 - Pós-operatório imediato e 6º dia pós-operatório.
Figura 6 - Pós-operatório imediato e 6º dia pós-operatório.
A paciente não apresentou intercorrências, recebendo alta hospitalar no 1º dia de
pós-operatório. A ferida operatória apresentava-se em bom aspecto, sem sinais flogísticos
ou de outras complicações. A paciente retornou para seguimento ambulatorial, não sendo
evidenciados seroma, hematoma, deiscência, epiteliólise ou necrose do retalho (Figuras 6, 7 e 8).
Figura 7 - Pós-operatório tardio.
Figura 7 - Pós-operatório tardio.
Figura 8 - Pós-operatório tardio.
Figura 8 - Pós-operatório tardio.
DISCUSSÃO
Durante o ganho de peso, as alterações anatômicas dos tecidos moles e o padrão de
deposição de gordura são determinados pelo sexo, idade, ingestão calórica, atividade
física e predisposição genética do paciente. Da mesma forma, as mudanças na forma
e no contorno corporal que ocorrem após perda ponderal maciça também são influenciadas
por estes fatores, bem como pelo peso perdido2.Com estas consequentes deformidades funcionais e estéticas, o número de cirurgias
que visam repará-las vem aumentando, exigindo a expertise dos cirurgiões plásticos6.
Após grandes perdas ponderais, as mamas perdem forma, projeção e elasticidade8.Devido à ptose significativa e pele redundante secundária à atrofia de gordura após
efeito expansor da obesidade, a mastopexia isolada nem sempre tem resultado satisfatório,
sendo necessário aumento simultâneo6.Esta remodelação mamária é difícil e pode exigir a utilização de tecidos adjacentes8.)Na década de 50, Longacre descreveu técnica de aumento e reconstrução mamária utilizando
retalhos dermogordurosos com pedículo superior que são dobrados sob eles mesmos em
cambalhota e fixados na fáscia peitoral9-11.
O abdômen, por sua vez, é uma das regiões que mais apresentam variações com a perda
de peso e resolver as deformidades adquiridas nem sempre é fácil12.A abdominoplastia convencional é a técnica mais consagrada para o rejuvenescimento
do tronco; entretanto, quando a flacidez atinge principalmente o abdômen superior,
a abdominoplastia reversa torna- se uma opção3.Ela foi descrita pela primeira vez em 1972, por Rebello e Franco13.Em 1979, Baroudi et al.1 associaram a técnica à mamoplastia redutora, e ressaltaram a importância da fixação
dos retalhos das mamas e do abdômen ao novo sulco mamário.Posteriormente, em 2009,
Deos et al.12 propuseram a abdominoplastia reversa tensionada, com tração do retalho e sua fixação
à aponeurose abdominal, permitindo assim melhora da qualidade da cicatriz por ser
livre de tensão e diminuição do índice de seroma e necrose pela redução do espaço
morto.Yacoub et al., em 201214, publicaram a abdominoplastia reversa estendida, com ampla dissecção até o púbis
e possibilitando a combinação com outras cirurgias.Após, em 2014, Saldanha et al.15 detalharam o uso do retalho remanescente da abdominoplastia reversa para reconstruções
de mama.
Em casos em que o desejo de mamoplastia de aumento se associa ao excesso de volume
supraumbilical, deve-se considerar a mamoplastia de aumento por meio da abdominoplastia
reversa (AMBRA). Ela utiliza os retalhos excedentes do abdômen como próteses mamárias.
Eles são desepitelizados, dobrados e posicionados no plano subglandular das mamas,
permanecendo ligados aos seus pedículos vasculares superiores. Tendo em vista a combinação
dos procedimentos, a cicatriz, apesar de extensa, não é fator impeditivo. Além disso,
uma vez que o tecido é autólogo, o resultado fica mais natural e não existe o risco
de ocorrer contratura capsular, nem perda de sensibilidade3.
CONCLUSÃO
A abdominoplastia reversa tem recebido pouca atenção na literatura médica, fato oposto
ao que ocorre com a mamoplastia de aumento, que é uma das intervenções mais realizadas
pelos cirurgiões plásticos atualmente. Todavia, estas duas técnicas podem ser combinadas,
visando abordar pacientes que apresentam lipodistrofia abdominal superior associada
a pequeno volume mamário isolado ou com graus variados de ptose. A mamoplastia de
aumento por meio da abdominoplastia reversa (augmentation mammaplasty by reverse abdominoplasty - AMBRA) revelou-se como um procedimento viável e eficaz, desde que bem indicado. Apesar
da extensa cicatriz resultante, as vantagens de se utilizar tecido autólogo como implante
e o ótimo resultado final se sobressaíram.
REFERÊNCIAS
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12. Deos MF, Arnt RA, Gus EI. Tensioned reverse abdominoplasty. Plast Reconstr Surg. 2009
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13. Rebello C, Franco T. Abdominoplastia por incisão submamária. Rev Bras Cir. 1972;62:249-52.
14. Yacoub CD, Baroudi R, Yacoub MB. Abdominoplastia reversa estendida. Rev Bras Cir Plást.
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15. Saldanha OR, Urdaneta FV, Llaverias F, Saldanha Filho OR, Saldanha CB. Reconstrução
de mama com retalho excedente de abdominoplastia reversa. Rev Bras Cir Plást. 2014;29(2):297-302.
1. Irmandade da Santa Casa da Misericórdia de Santos, Serviço de Cirurgia Plástica
e Queimados, Santos, SP, Brasil.
Autor correspondente: Giovanna Calil Vicente Franco de Souza, Rua Alferes Ângelo Sampaio, 967, Apto. 801, Água Verde, Curitiba, PR, Brasil. CEP:
80250120. E-mail: giovannacvfsouza@hotmail.com
Artigo submetido: 01/05/2019.
Artigo aceito: 21/10/2019.
Conflitos de interesse: não há.