INTRODUÇÃO
A cirurgia plástica é popularmente conhecida pela sua atuação na estética corporal.
Além disso, sua aérea engloba microcirurgias, tratamento de queimaduras, cirurgias
de mão e craniomaxilofacial.
Devido à diversidade de especialidades médicas, muitos dos procedimentos em que os
cirurgiões plásticos são capacitados, são também realizados por outros especialistas,
o que pode justificar desconhecimento da população em relação à rica atuação plástica.
A exemplo disso, se tem a rinoplastia com correção de desvio de septo, cirurgia que
é também realizada por otorrinolaringologistas. Uma vez que as áreas de atuação da
cirurgia plástica são pouco conhecidas pelo público em geral e também pelo público
médico, corre-se o risco de cirurgiões plásticos, qualificados em lidar com uma gama
enorme de problemas clínicos-cirúrgicos, sejam esquecidos e relevados em casos que
fogem da área estética, assim alienando profissionais competentes e sobrecarregando
profissionais de outras especialidades.
OBJETIVOS
Compreender o entendimento que os estudantes brasileiros de medicina de diferentes
anos e faculdades apresentam da abrangência clínica e das áreas de atuação da cirurgia
plástica.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo transversal, com aplicação de um questionário online construído
para avaliar o grau de conhecimento dos acadêmicos de medicina do Brasil a respeito
de aspectos relevantes acerca da especialidade de cirurgia plástica, que tem como
critérios de inclusão ser estudante de medicina e possuir mais de dezoito anos. O
questionário apresenta doze casos clínicos com cinco alternativas, em que não existe
uma resposta correta e sim qual daquelas alternativas melhor responde ao caso.
O procedimento para a realização da pesquisa foi dividido em duas partes: primeiramente
foi enviado o link do questionário para os participantes em que nele continha as intenções
do projeto e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), solicitando aos
estudantes que contribuíssem com a participação no nosso estudo e, logo em seguida,
iniciava o questionário com os casos clínicos. Ao final de 99 dias com o link sendo
divulgado, o questionário foi encerrado, as respostas foram verificadas na plataforma
Google Docs e contabilizadas. O questionário foi enviado pela primeira vez por meio das redes
sociais no dia 28/08/2019 e ficou circulando até o dia 05/01/2020, data em que iniciamos
a análise das respostas.
Toda pesquisa está de acordo com a Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016, promulgada
pelo Ministério da Saúde, que zela pela ética e pelo respeito à dignidade humana em
pesquisas científicas. Em conformidade com essa resolução, o trabalho foi submetido
e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de
Goiás, com o seguinte número 3.517.269.
RESULTADOS
Considerando as variáveis estudadas, 426 acadêmicos de medicina responderam ao questionário,
porém foram excluídos 02 participantes por não terem assinalado o campo de concordância
com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e 1 participante por ter idade
inferior a 18 anos. Portanto, a amostra foi composta com o total de 423 participantes,
sendo a maioria do sexo feminino (69,5%). A idade dos participantes variou amplamente
de 18 a 46 anos. A idade média foi de 22,23 anos, com desvio-padrão de 3,60. Quanto
à faixa etária, o intervalo entre 20 a 23 anos foi a predominante (60,3%).
Em relação à distribuição dos estudantes pelo território brasileiro, o presente estudo
contou com a participação de todos os estados brasileiros, exceto o Espírito Santo.
A região Centro-Oeste se destacou com 253 (59,8%), seguida das regiões Sudeste com
54 (12,7%) e região Norte com 55 (13%). O estado de Goiás foi o mais representativo
com a participação de 206 (48,7%).
A respeito do ano cursado pelos acadêmicos de medicina observou-se que o terceiro
ano compreendeu a maioria com 119 (28,1%) participantes. O segundo ano representou
21,5% e o quarto ano 19,8%. Ao agrupar os participantes por ciclos básico (primeiro
e segundo ano), clínico (terceiro e quarto ano) e internato (quinto e sexto ano),
observou-se que 203 (48%) pertenciam ao ciclo clínico, 130 (30,7%) ao ciclo básico
e 91 (21,5%) ao internato.
Além das questões que abordaram as áreas de atuação da cirurgia plástica foram elaboradas
outras perguntas abordando pancreatite aguda e trauma de abdômen, com o intuito de
desviar respostas tendenciosas.
A partir da análise dos casos clínicos, percebe-se que os estudantes estão familiarizados
com a ação dos cirurgiões plásticos no campo estético (como por exemplo, na resolução
do “envelhecimento facial”, “redução das mamas” e “orelhas de abano”). Na questão
que abordou o envelhecimento facial a dermatologia foi à área mais citada como apta
para a tal abordagem com 53,7%. A cirurgia plástica e a estética ocuparam o segundo
e terceiro lugar com 38,3% e 7,32%, respectivamente. Os cirurgiões plásticos foram
os profissionais mencionados por 372 (87,95%) estudantes como profissional capacitado
para realização de otoplastia, seguido de cirurgiões pediátricos (5,43%) e otorrinolaringologistas
(4,96%). Quanto à pergunta com o tema de mamoplastia redutora, a cirurgia plástica
foi mencionada por 349 (82,5%) dos participantes. A área de dermatologia foi lembrada
por 313 (74%) dos alunos como a especialidade médica mais indicada para a aplicação
de toxina botulínica com o objetivo de rejuvenescimento facial.
Na questão sobre tratamento de desvio de septo e correção estética do nariz houve
um predomínio dos otorrinolaringologistas (63,8%), seguido dos cirurgiões plásticos
(33,3%) como os mais indicados para abordagem do caso.
Quanto à questão que abordou a temática sobre reconstrução mamária após o câncer de
mama, 373 (88,2%) dos participantes apontaram o cirurgião plástico como profissional
apto para realizar o procedimento. Sendo a mastologia e a cirurgia oncológica apontada
por 37 (8,74%) e 13 (3,07%) dos estudantes, respectivamente.
Na questão sobre carcinoma basocelular foi observada uma divisão das respostas quanto
às especialidades médicas indicadas para o tratamento, sendo a dermatologia (46,8%),
cirurgia oncológica (37,1%) e a cirurgia plástica (7,8%) como as mais apontadas pelos
participantes da pesquisa.
Em relação à avaliação da participação da cirurgia plástica como área também indicada
para o tratamento de fraturas no complexo craniomaxilofacial, esta foi citada por
46 (10,9%) dos alunos, sendo o cirurgião bucomaxilofacial como o mais lembrado por
342 (80,8%) dos acadêmicos. Quanto à questão que abordou o profissional de saúde mais
apto para intervir em casos de laceração dos tendões palmares, o ortopedista com 273
(64,5%) das respostas foi o mais mencionado pelos participantes. Em seguida, foram
citados os cirurgiões gerais (15,1%) e os cirurgiões plásticos (11,1%).
A avaliação da participação da cirurgia plástica como área indicada no tratamento
reparador após queimaduras foi feita através da questão sobre grande perda de tecidos
moles após acidente com alta tensão elétrica. Os estudantes apontaram os cirurgiães
plásticos como os mais indicados por 260 participantes (61,4%), seguido dos ortopedistas
com 23,4% e cirurgiões vasculares com 7,8%.
Relacionando as questões com temáticas que abordam as áreas da cirurgia plástica que
não são vinculadas ao campo estético, como a área craniomaxilofacial, e o ciclo os
quais os participantes foram agrupados, foi possível observar que entre os 294 alunos
do ciclo básico apenas 8 (2,72%) mencionaram os cirurgiões plásticos como indicados
para intervir. Dentre os 203 alunos do ciclo clínico, 29 (14,3%) apontaram a cirurgia
plástica como especialidade apta na abordagem do caso e 9 (9,9%) do total de 91 alunos
do internato mencionaram os cirurgiões plásticos. Outra área da cirurgia plástica
com pouco conhecimento sobre possibilidade de atuação é a microcirurgia. No presente
estudo, 29 (22,3%) dos estudantes do ciclo básico indicaram o cirurgião plástico para
o tratamento de laceração dos tendões palmares, seguido de 11,8% dos alunos do ciclo
clínico e 3,3% dos acadêmicos do internato.
DISCUSSÃO
De acordo com dados da “Demografia Médica 2018”, existem no Brasil 6.304 cirurgiões
plásticos e 2% dos recém-formados tem como primeira opção a cirurgia plástica como
residência médica1. Dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), o Brasil disputa com
os Estados Unidos da América a primeira posição no ranking em número de profissionais.
Tais dados reforçam o interesse dos acadêmicos de graduação em medicina pela especialidade2. Todavia, o fato de as universidades brasileiras concentrarem suas grades curriculares
em especialidades gerais clínicas, como ginecologia, pediatria e cirurgia geral, pode
ser uma justificativa para o desconhecimento acerca das áreas de atuação do cirurgião
plástico pelos acadêmicos.
Segundo a SBCP, cirurgia plástica é a especialidade cirúrgica encarregada de reconstruir
estruturas corporais que apresentem alteração em sua forma ou função. No entanto,
para a população leiga o conhecimento acerca dessa especialidade é restrito à sua
aplicação estética. Este fato pode ser reforçado a partir da análise midiática envolvida
com a cirurgia plástica: 68,94% foram classificadas como estéticas; 21,33% como reparadoras;
e, 9,73% como não classificáveis3.
Esperava-se que os estudantes de medicina, ao contrário da população leiga, possuíssem
um conhecimento mais profundo acerca dessa especialidade. No entanto, a partir da
análise do questionário, percebe-se que os estudantes de medicina brasileiros também
associam a atuação do cirurgião plástico principalmente à área estética.
CONCLUSÃO
O trabalho demonstrou que os estudantes apresentam um nível de conhecimento adequado
no tocante à ação dos cirurgiões plásticos no campo estético. Porém, nas situações
consideradas mais complexas esses profissionais são pouco lembrados pelos acadêmicos.
Além disso, observou-se que os estudantes em estágios mais avançados no curso de medicina
não representam maior conhecimento sobre os campos de atuação da cirurgia plástica.
REFERÊNCIAS
1. Scheffer M, Cassenote A, Guilloux AGA, Biancarelli A, Miotto BA, Mainardi GM. Demografia
médica no Brasil 2018. São Paulo (SP): Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade
de Medicina da USP (FMUSP)/Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP)/Conselho
Federal de Medicina (CFM); 2018.
2. Fernandes JW. O ensino da cirurgia plástica na graduação em medicina no contexto da
realidade brasileira. Rev Bras Educ Méd. 2016;40(2):286-94.
3. Lima DSC, Mata FSR, Oliveira FCC, Zenaide PV, Ziomkowski AA, Meneses JVL. A cirurgia
plástica na mídia: o conceito da especialidade veiculado pelos meios de comunicação
impressos no Brasil. Rev Bras Cir Plást. 2015;30(1):93-100.
1. Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Departamento de Medicina, Goiânia, GO,
Brasil.
2. Universidade de Rio Verde, Departamento de Medicina, Aparecida de Goiânia, GO,
Brasil.
Autor correspondente: Pedro Freire Guerra Boldrin, Rua Pedro Rattes Fernandes, 168, Setor Central, Rio Verde, GO, Brasil CEP: 75901-280.
E-mail: pedrofbguerra@gmail.com
Artigo submetido: 10/05/2020.
Artigo aceito: 19/07/2020.
Conflitos de interesse: não há.