INTRODUÇÃO
A pressão positiva contínua nas vias aéreas nasais (CPAP) é uma forma não invasiva
de ventilação utilizada como método de suporte respiratório no recém-nascido prematuro
em unidades de terapia intensiva como alternativa à intubação endotraqueal e à traqueostomia1-6. Porém, devido à imaturidade, o nariz destes pacientes pode ser facilmente acometido6. A lesão nasal é uma consequência relativamente comum secundária ao CPAP, com incidência
em torno de 13,2% a 50%1,5, e pode variar desde edema e eritema até laceração e necrose columelar3,5. Menos de 1% desses pacientes evoluem com isquemia irreversível e necrose, resultando
em um espectro de desfiguração nasal2.
Pacientes com comprometimento funcional e/ou estético da columela após o uso do CPAP
podem necessitar de intervenção2. Para a reconstrução columelar, tamanho, simetria, correspondência de cores, textura
da pele, condição do tecido circundante e área doadora devem ser considerados7. Diversas técnicas têm sido descritas e elas incluem enxertos de pele, enxertos compostos,
retalhos locais e retalhos livres7. Dentre estes vários procedimentos, o enxerto composto condrocutâneo auricular é
um dos métodos mais vantajosos, pois possibilita a reconstrução da cartilagem estrutural
juntamente com a pele, em um único tempo cirúrgico, além da orelha ser consideravelmente
semelhante em forma, curva, cor e textura da columela1,7.
O objetivo deste trabalho é relatar um caso de enxerto composto condrocutâneo auricular
para reconstrução columelar após necrose pelo uso de CPAP.
RELATO DO CASO
Paciente do sexo feminino, 4 anos, parda, com história de prematuridade (idade gestacional
31 semanas e 4 dias) e sofrimento fetal por descolamento prematuro de placenta, evoluiu
com síndrome da membrana hialina, necessitando de ventilação mecânica por 16 dias
e pressão positiva contínua nas vias aéreas nasais por mais 8 dias. Em decorrência
do uso do CPAP, apresentou lesão de columela com necrose local. Ao exame físico, paciente
com ausência de columela, com consequente queda da ponta do nariz (Figura 1). Para reconstrução foi optado pela enxertia composta condrocutânea auricular posterior.
Figura 1 - Pré-operatório.
Figura 1 - Pré-operatório.
Paciente em decúbito dorsal, sob anestesia geral. Realizada demarcação cirúrgica1 (Figura 2) no defeito columelar, com linhas transversais nas bordas superior e inferior, unidas
por uma linha vertical mediana, bem como da área doadora na região posterior da orelha
esquerda com uma elipse (Figura 3). Incisão sobre a marcação auricular, seguida de retirada de enxerto composto contendo
pele, tecido celular subcutâneo e cartilagem. Realizada incisão sobre a marcação nasal,
com confecção de dois retalhos laterais. Posicionamento do enxerto, com encaixe da
cartilagem na base da columela, seguido de sutura do mesmo aos retalhos (Figuras 4 e 5). Curativo compressivo elaborado com gaze.
Figura 2 - Esquema da marcação cirúrgica.
Figura 2 - Esquema da marcação cirúrgica.
Figura 3 - Marcação cirúrgica.
Figura 3 - Marcação cirúrgica.
Figura 4 - Enxertia composta condrocutânea auricular posterior.
Figura 4 - Enxertia composta condrocutânea auricular posterior.
Figura 5 - Pós-operatório imediato.
Figura 5 - Pós-operatório imediato.
A paciente não apresentou intercorrências, recebendo alta hospitalar no 1º dia de
pós-operatório. A ferida operatória mostrava-se sem sinais de complicação, com bom
aspecto. A paciente retornou para seguimento ambulatorial e o enxerto apresentava-se
com 100% de vitalidade (Figura 6). Ela permanecerá em acompanhamento até a adolescência, para avaliar a necessidade
de reabordagem para refinamento estético.
Figura 6 - Pós-operatório tardio.
Figura 6 - Pós-operatório tardio.
DISCUSSÃO
Embora as iniciativas de enfermagem tenham procurado diminuir a incidência, a lesão
nasal continua sendo um problema comum em recém-nascidos pré-termo que recebem suporte
respiratório não invasivo, principalmente em prematuros nascidos com menos de 30 semanas
de gestação2,3,5,6. A necrose columelar associada ao uso do CPAP pode ser estética e funcionalmente
debilitante, e representa um desafio reconstrutivo2. As opções para obter resultados funcionais e cosméticos aceitáveis são limitadas
na reconstrução desta delicada subunidade, mas o uso de enxertos compostos é consistente
com muitos fundamentos da cirurgia plástica8.
A reconstrução nasal requer o manejo de várias camadas simultaneamente em uma forma
tridimensional7,8. A prática vem apresentando avanços, desde que os cirurgiões Burget e Menick, em
19859, propuseram o princípio das subunidades do nariz10. A columela nasal tem sido tradicionalmente uma subunidade difícil de reparar devido
a seus contornos únicos, disponibilidade limitada da pele adjacente e vascularização
tênue10. A simplicidade e a elegância do uso de enxertos de orelha compostos para o reparo
de tais defeitos já foram reconhecidas em 18968. O procedimento é tecnicamente simples, utiliza tecidos doadores estruturalmente
semelhantes, não provoca cicatrizes adicionais no nariz, é realizado em um tempo cirúrgico
e geralmente tem um resultado muito satisfatório8.
A enxertia composta auricular posterior para reconstrução de columela se mostrou segura
e com pouca dificuldade técnica para reparação da lesão descrita. O resultado estético
e funcional foi satisfatório, com mínima morbidade da área doadora.
REFERÊNCIAS
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nasal continuous positive airway pressure injury. Plast Reconstr Surg. 2018 Jan;141(1):99e-102e.
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4. Yong SC, Chen SJ, Boo NY. Incidence of nasal trauma associated with nasal prong versus
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infants: a randomised control study. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 2005 Nov;90(6):F480-3.
5. Li Y, Sepulveda A, Buchanan EP. Late presenting nasal deformities after nasal continuous
positive airway pressure injury: 33-year experience. J Plast Reconstr Aesthet Surg.
2015 Mar;68(3):339-43.
6. Imbulana DI, Manley BJ, Dawson JA, Davis PG, Owen LS. Nasal injury in preterm infants
receiving noninvasive respiratory support: a systematic review. Arch Dis Child Fetal
Neonatal Ed. 2018 Jan;103(1):F29-35.
7. Son D, Kwak M, Yun S, Yeo H, Kim J, Han K. Large auricular chondrocutaneous composite
graft for nasal alar and columellar reconstruction. Arch Plast Surg. 2012 Jul;39(4):323-8.
8. Teltzrow T, Arens A, Schwipper V. One-stage reconstruction of nasal defects: evaluation
of the use of modified auricular composite grafts. Facial Plast Surg. 2011 Jun;27(3):243-8.
9. Burget GC, Menick FJ. The subunit principle in nasal reconstruction. Plast Reconstr
Surg. 1985 Ago;76(2):239-47.
10. Sherris DA, Fuerstenberg J, Danahey D, Hilger PA. Reconstruction of the nasal columella.
Arch Facial Plast Surg. 2002 Jan/Mar;4(1):42-6.
1. Irmandade da Santa Casa da Misericórdia de Santos, Serviço de Cirurgia Plástica
e Queimados, Santos, SP, Brasil.
Autor correspondente: Giovanna Calil Vicente Franco de Souza, Rua Alferes Ângelo Sampaio, 967, Apart. 801, Bairro Água Verde, Curitiba, PR, Brasil.
CEP: 80250-120. E-mail: giovannacvfsouza@hotmail.com
Artigo submetido: 29/04/2019.
Artigo aceito: 08/07/2019.
Conflitos de interesse: não há.