INTRODUÇÃO
As mamas, além do seu papel na fisiologia da lactação e amamentação, relacionam-se
à feminilidade, sensualidade e autoestima. Variações da normalidade, em forma, volume
ou posição afetam psicologicamente as mulheres e são importante causa de procura nos
consultórios de cirurgia plástica1.
O reconhecimento da importância da assimetria mamária data de 1968, onde o autor descreve
as modalidades de tratamento cirúrgico2. O interesse por criar uma classificação foi crescente e, em 1976, Elsahy2, propôs uma classificação morfológica das assimetrias mamárias, com o objetivo de
facilitar o planejamento pré-operatório. Mais tarde, Vandenbussche, em 19843, subdividiu-as quanto à etiologia em quatro tipos (1 - congênita, 2 - primária, 3
- secundária e 4 - terciária), concluindo a assimetria do tipo 2 como a mais frequente2. Outro grupo, no ano de 2006, analisou 177 pacientes com assimetrias mamárias para
propor uma classificação e seu respectivo tratamento4.
Esses trabalhos contribuíram para o entendimento das assimetrias mamárias e seu tratamento,
porém uma atualização mais simplificada e reprodutível para a prática clínica, agregada
às novas modalidades terapêuticas disponíveis, é uma necessidade médica ainda não
atendida. Anomalias grosseiras, como a síndrome de Poland são muito discutidas, mas
há evidente necessidade de pormenorizar o tipo 2 de Vandenbussche3, não somente pela incidência, mas também por ser o subtipo que mais remete ao caráter
estético das referidas anormalidades. Outro marco importante a ser considerado foi
a consagração da lipoenxertia dentro do arsenal terapêutico das cirurgias mamárias,
que teve sua fase de condenação, mas é amplamente aceita na atualidade, tanto nas
cirurgias reconstrutivas quanto estéticas5.
OBJETIVO
O presente trabalho propõe uma classificação prática e simplificada das assimetrias
mamárias de maior incidência nos consultórios de cirurgia plástica, e com um diagnóstico
mais preciso propõe nortear o tratamento cirúrgico.
MÉTODOS
Realizada busca textual no PubMed com os termos “breast” e “asymmetry” e foram considerados elegíveis os artigos que tinham a proposta de classificar as
assimetrias mamárias. Foram incluídos ainda os artigos que tratavam do assunto assimetria
mesmo não propondo uma classificação. Após conflitar as informações colhidas de classificação
e tratamento, procurou-se fazer uma classificação mais simplificada e reprodutível
na prática clínica, levando-se em conta, nesta nova classificação, o possível interesse
da paciente quanto ao volume final das mamas e a incorporação da lipoenxertia como
arsenal terapêutico. As assimetrias de caixa torácica, como descritas na classificação
de Vandenbussche, em 19843, apesar de elevada relevância e limitações para melhores resultados na correção das
assimetrias mamárias não foram incluídas na nova proposta de classificação, uma vez
que em sua maioria não são abordadas pelos cirurgiões plásticos.
RESULTADOS
Na Quadro 1, observamos os principais autores com sua respectiva proposta de classificação.
Quadro 1 - Classificações disponíveis na literatura para assimetria mamária.
Hueston (1968)1 (revisão)
|
1 - Aplasia unilateral; |
2- Hipoplasia unilateral; |
3-Hipertrofia; |
4-Destruição do complex areolopapilar (CAP); |
5-Mastectomia. |
Elsahy (1976)2 |
1-Hipertrofia unilateral; |
2-Hipotrofia unilateral ; |
3-Hipo e hipertrofia. |
4-Hipertrofia bilateral; |
5-Hipotrofia bilateral. |
Vandenbussche (1984)3 (150 pacientes)
|
1-Congênita; |
2-Primária; |
3-Secundária; |
4-Terciária. |
Araco et al. (2006)4 (177 pacientes)
|
1- Hipertrofia bilateral (n=30); |
2- Hipertrofia, normotrofia (n=15); |
3- Hipertrofia com amastia ou hipoplasia (n=10); |
4- Amastia ou hipoplasia, normal contralateral (n=5); |
5- Hipoplasia bilateral (n=81); |
6- Ptose unilateral (n=36). |
Quadro 1 - Classificações disponíveis na literatura para assimetria mamária.
Na classificação proposta neste trabalho (Figura 1), o primeiro grupo apresenta mamas hipotróficas com assimetria de volume (tipo 1),
o segundo grupo apresenta assimetria de volume e forma em mamas hipotróficas (tipo
2). As mamas normotróficas estão incluídas nos tipos 3 e 4, apresentam ptose mamária
e foram subdivididas naquelas que desejam manter o volume (tipo 3) e naquelas com
desejo de aumento volumétrico (tipo 4). E, finalmente, as mamas hipertróficas assimétricas
no tipo 5.
Figura 1 - Proposta de classificação simplificada para assimetrias mamárias.
Tipo 1 |
Mamas hipotróficas com assimetria de volume |
|
Tipo 2 |
Mamas hipotróficas com assimetria de volume e contorno |
|
Tipo 3 |
Mamas normotróficas, com ptose, sem desejo de aumento volumétrico |
|
Tipo 4 |
Mamas normotróficas, com ptose, e desejo de aumento volumétrico |
|
Tipo 5 |
Mamas assimétricas hipertróficas |
|
Figura 1 - Proposta de classificação simplificada para assimetrias mamárias.
Após a classificação descrita na Figura 1 e baseando-se nos tratamentos preconizados
pela literatura médica, foi criado e utilizado o protocolo de planejamento cirúrgico
para a decisão terapêutica conforme a Figura 2.
Figura 2 - Protocolo de planejamento cirúrgico para correção das assimetrias mamárias.
Figura 2 - Protocolo de planejamento cirúrgico para correção das assimetrias mamárias.
No tipo 1, as mamas são hipotróficas e mantém contorno semelhante. A simples colocação
de próteses de volumes diferentes é suficiente. Atenção especial deve ser dada na
mensuração do volume mamário e estimativa de qual diferença de volume e/ou perfil
utilizar. Na maior parte das vezes a experiência do cirurgião associado ou não ao
uso de moldes é suficiente. Técnicas que utilizam a lei de Arquimedes para mensuração
de volume acabam sendo de difícil aplicabilidade clínica6 e softwares de escaneamento tridimensional ainda estão pouco acessíveis à maioria
dos cirurgiões.
No tipo 2, a simples colocação de implantes diferentes não é suficiente. Algumas áreas
da mama, após a colocação das próteses, merecem análise minuciosa com a maca em posição
de cabeceira elevada e as áreas para lipoenxertia demarcadas. Nesta situação podemos
ter déficit volumétrico em qualquer um dos polos mamários ou em toda a mama. A técnica
de preparo da gordura vai desde a simples decantação7 até a técnica de Coleman (1995)8 e a infiltração da gordura realizada com cânulas de 1.8mm no plano subcutâneo e intramamário4,8.
No tipo 3, a paciente apresenta ptose e se mostra satisfeita com o volume das mamas
e/ou não deseja o uso de implantes. Neste caso, realiza-se a mastopexia simples, com
a técnica de experiência individual do cirurgião, ressecando-se o parênquima mamário
da maior mama de maneira suficiente para a simetrização volumétrica9,10.
O tipo 4 também apresenta ptose e se difere do tipo 3 apenas pelo desejo da paciente
em aumento de volume final e, por isso, lança-se mão dos implantes mamários durante
a mastopexia. Prioriza-se implantes idênticos e a simetrização é feita através da
manipulação do parênquima mamário. Neste grupo, refinamentos com lipoenxertia também
podem ser de grande valia.
No tipo 5 há assimetria com evidente hipertrofia mamária e, neste caso, há indicação
de simetrização através da mamoplastia redutora com técnicas reconhecidas10,11 como Pitanguy, em 196712 e Silveira Neto, em 197613.
RESULTADOS
Na Figura 3A observa-se uma assimetria mamária do tipo 1, cujo tratamento foi realizado com prótese
de mama (plano subfascial) texturizada Mentor 300ml à direita e 275ml à esquerda,
ambas de perfil alto.
Figura 3 - Casos clínicos de assimetria mamária com sua classificação e tratamento cirúrgico.
Figura 3 - Casos clínicos de assimetria mamária com sua classificação e tratamento cirúrgico.
Na Figura 3B temos uma assimetria de volume e de contorno, configurando o tipo 2. À esquerda demonstra-se
a marcação cirúrgica e a área de lipoaspiração em região das axilas. Neste caso, as
próteses (plano subfascial) utilizadas foram bastante diferentes: texturizada Silimed
230ml modelo alto à direita e 305ml extra alto à esquerda, além de lipoenxertia global
à esquerda e em polo medial à direita. Em detalhes a marcação cirúrgica e área de
lipoaspiração.
Na Figura 3C nota-se outro exemplo de assimetria do tipo 2, porém a assimetria predominava em
contorno e sulco. Neste caso optou-se por manter próteses iguais texturizadas, 330ml
extra alto Silimed (plano subfascial), abaixamento do sulco mamário e lipoenxertia
de polos inferiores de ambas mamas.
Na Figura 3D tem-se um caso de assimetria do tipo 3, onde há ptose mamária e desejo da paciente
em manter o volume da mama menor. Realizado mastopexia com técnica de Pigossi, cicatriz
resultante em T invertido.
Em outro caso de assimetria tipo 4 (Figura 3E), a paciente apresenta ptose, porém deseja aumento do volume das mamas. Indicado
mastopexia com prótese, marcação proposta por Pitanguy 196712, com utilização de prótese de 200ml no plano subglandular.
Finalmente um caso de assimetria mamária tipo 5 (Figura 3F), no qual há franca hipertrofia mamária com mamas densas e ptóticas. Optou-se pela
técnica de mamoplastia redutora com pedículo superomedial, técnica de Silveira Neto
(1976)13.
DISCUSSÃO
Por se tratar de patologia frequente e de importância ímpar na autoestima e bem-estar
das mulheres, a assimetria mamária é motivo de grande procura em consultórios de cirurgia
plástica. O respeito a essa patologia inicia-se por adequada avaliação clínica da
paciente, em todos seus aspectos como: volume, contorno, consistência e presença de
ptose. A criação de sistemas de classificação facilita a linguagem entre especialistas
e protocolos norteiam as formas de tratamento.
Obviamente cada paciente é singular e deve ser avaliada individualmente, uma vez que
a assimetria mamária é considerada a regra e não a exceção. Vários estudos de morfometria
procuraram estabelecer pontos fixos para melhor avaliação das mamas, porém apresentaram
limitações tanto in vivo, quanto através de fotografias, pois se tratavam de medidas lineares14. Apesar destas limitações, vários desses parâmetros ainda têm sido utilizados desde
a sua publicação, em 1986, como distância entre a fúrcula esternal e a papila, e a
distância entre a papila e o sulco mamário15. A simetria mamária perfeita, ainda segundo os estudos de morfometria, é algo praticamente
inexistente no pré ou pós-operatório, porém se trata de uma realidade e não uma distorção
da autoimagem da paciente, merecendo, portanto, seu devido respeito. Brown et al.,
em 199916, demonstraram que o achado de assimetria é mais frequentemente relatado nas pacientes
que procuram por mamoplastia redutora em comparação às pacientes que procuram por
mamoplastia de aumento.
Classificações favorecem diagnósticos mais certeiros e, quando associados aos protocolos
de tratamento, minimizam as chances de erros por condutas inapropriadas. Exemplo disso
é a elevada incidência de assimetria mamária pós-operatória demonstrada em estudo
retrospectivo pós-cirurgia de mamoplastia de aumento, concluindo-se que sistematizações
pré-operatórias são importantes para minimizar os erros de conduta17.
O trabalho de Stark, em 199118, demonstra como classificações traduzem uma linguagem universal entre cirurgiões.
Sua análise pré-operatória foi feita baseada nas classificações de Elsahy (1976)2 e Vandenbussche (1984)3 e o objetivo do trabalho foi propor uma avaliação objetiva das mamas assimétricas
no pós-operatório através de medidas padronizadas18. A classificação de Vandenbussche (1984)3 leva em consideração apenas a etiologia da assimetria (congênita, primária, secundária
ou terciária) o que é de grande valia para as cirurgias reconstrutivas, mas um tanto
quanto limitada para a condução de casos estéticos, uma vez que a grande maioria se
enquadraria nas etiologias congênitas e primárias. A classificação de Elsahy (1976)2, ao contrário, avalia de forma pormenorizada as assimetrias mamárias do ponto de
vista clínico e morfológico, subdividindo-as em 5 grupos principais. Sua limitação
está na complexidade da análise, com múltiplas associações possíveis envolvendo o
trofismo mamário, além de não avaliar o desejo da paciente em relação à mudança do
seu volume mamário.
Araco et al., em 20064, constataram a evidente necessidade de uma nova classificação e baseando-se em sua
casuística de 177 pacientes, subdividiu as assimetrias em 6 categorias e propôs o
respectivo tratamento a cada uma delas. No trabalho, no entanto, não há menção à lipoenxertia
em seu algoritmo de tratamento como valiosa terapia adjuvante e não cita o atual e
relevante desejo da paciente quanto ao volume final das mamas consideradas normotróficas4. Enfatizando a necessidade de tais classificações para uma melhor compreensão, análise
clínica e comunicação entre os profissionais, Roxo et al., em 200919, propuseram uma classificação e tratamento de mamoplastias, porém a classificação
se limita a pacientes pós-perda ponderal maciça.
Uma linguagem padronizada, indubitavelmente, facilita a discussão de casos e a troca
de experiências, norteando a conduta dos menos experientes, além de tornar mais claro
o diálogo com a paciente na consulta médica pré-operatória.
CONCLUSÃO
A ampla revisão da literatura permitiu a criação de uma classificação mais simples
e reprodutível das assimetrias mamárias e aos protocolos de tratamento já estabelecidos
foram acrescidas, neste trabalho, a lipoenxertia como adjuvante no tratamento das
assimetrias, bem como o desejo da paciente quanto ao volume final de suas mamas.
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Autor correspondente: Gladstone Eustáquio de Lima Faria, Rua Alves Guimarães, 462, Sala 31, São Paulo, SP, Brasil. CEP: 05410-000. E-mail:
gladstonefaria@hotmail.com
Artigo submetido: 24/07/2019.
Artigo aceito: 29/02/2020.
Conflitos de interesse: não há.