INTRODUÇÃO
A lipoaspiração é atualmente um dos principais procedimentos executados pelo cirurgião
plástico. Durante as décadas de uso, um número importante de inovações foi adicionado
à lipoaspiração tradicional, gerando maior conforto para o cirurgião e melhores resultados
obtidos1.
Historicamente, muitas abordagens têm sido utilizadas para retirada de tecido adiposo
durante a lipoaspiração2. Ao longo do processo natural de refinamento, melhorias foram conquistadas ao se
aperfeiçoar diversos aspectos do procedimento, como a técnica cirúrgica, as cânulas
empregadas e o uso de dispositivos adjuvantes.
Nesse aspecto, se trata de uma caminhada sem linha de chegada. Não existem objetivos
definitivos, apenas metas a serem superadas. A lipoaspiração tradicional ainda enfrenta
o fardo de se constituir em um procedimento, por muitas vezes, extenuantes e com restritas
variações táticas. Nesse sentindo, qualquer iniciativa capaz de gerar diminuição da
carga e estresse mecânico ou inovação que amplifique as variações de manuseio do tecido
celular subcutâneo são potenciais otimizadores de resultados3.
O uso do ultrassom em procedimentos cirúrgicos não é novidade. No fim dos anos 80
e início da década de 90, Zocchi, em 19954, foi pioneiro na aplicação do ultrassom na emulsificação seletiva de remoção de gordura
para o contorno corporal. A primeira geração de dispositivo na lipoaspiração ultrassônica
assistida foi desenvolvida pela SMEI Company na Itália. O aparelho da SMEI consistia
em probes sólidos de 4-6mm que emulsificavam a gordura em uma frequência de 20kHz.
Ainda nos anos 90 foram introduzidos dispositivos de segunda geração, como o Lysonix
2000 (Lysonix Inc. Carpenteria, CA). Nesse caso, emulsificação e aspiração ocorriam
simultaneamente através da cânula de "golf-tee" e "bullet-design" em uma frequência de 22.5kHz. Durante do mesmo período, a Mentor Corporation introduziu seus dispositivos de contorno corporal "Mentor Contour Genesis Devices". Com uma cânula oca de 3.0mm e 5.1mm em uma frequência de 27kHz. A transferência
excessiva de energia aos tecidos combinada à eliminação da solução de proteção devido
à aspiração simultânea resultou em complicações significativas5.
A popularidade da lipoaspiração ultrassônica assistida diminui ao final da década
de 90. Em 2001, a Sound Surgical Technologies introduziu o Vaser® (Vibration Amplification of Sound Energy at Resonance), um dispositivo de terceira geração que foi criado para melhorar a segurança ao
se reduzir a energia transferida aos tecidos com manutenção da eficácia6.
Possui um probe sólido que emulsifica a gordura eficientemente em ٣٦kHz, com importante preservação
dos tecidos em proximidade. A natureza sintonizável do sistema permite que quase todas
as áreas do corpo sejam tratadas de forma segura e eficaz. Atualmente a VASER® é considerado o "gold standard" em alta definição em contorno corporal6.
O conceito de ressonância VASER® é baseado em duas premissas básicas: a frequência de 36kHz, que é próxima a ressonância
da gordura. Por este motivo uma menor transferência de energia aos demais tecidos.
Ademais as células adiposas, muito maiores em tamanho comparativamente a outros tecidos
adjacentes (vasos sanguíneos, nervos e tecido conjuntivo), são mais suscetíveis a
energia ultrassônica7.
O aparelho utiliza sondas (probes) com 2.2-4.5mm de diâmetro, com sulcos próximos a ponta para aumentar a eficácia
de transmissão energética e fragmentação adiposa. Quanto maior o diâmetro do probe, maior a energia ultrassônica que pode ser dispersada. O aparelho possui também um
modo de ativação intermitente - pulsátil (pulsed ultrasonic energy delivery). Essa modalidade faz uso de altas frequências de vibração com ativação não contínua,
diminuindo a energia tecidual total aplicada, com manutenção da eficácia8.
OBJETIVO
Avaliar a segurança do emprego de dispositivo ultrassônico de terceira geração, VASER®, em cirurgias de lipoaspiração para melhora de contorno corporal. Os dados encontrados
foram comparados com a literatura médica.
MÉTODOS
O trabalho consistiu em estudo retrospectivo de revisão de prontuários médicos de
pacientes que foram submetidos ao procedimento de lipoaspiração com o auxílio do VASER®, no período de janeiro de 2015 a junho de 2017, no Centro Hospitalar Santa Mônica,
em Erechim, Rio Grande do Sul.
Os dados e a realização deste estudo foram aprovados pelo Comitê de ética do Hospital
Santa Monica, Erechim/RS, Brasil. Registro 002/2018.
Seleção dos pacientes e critérios de inclusão e exclusão
Os pacientes incluídos no estudo foram homens ou mulheres, maiores de 18 anos, com
excesso localizado de gordura subcutânea. Os critérios de exclusão foram:
Pacientes com condição clínica limitante;
Mulheres no primeiro ano após o parto, grávidas ou lactantes;
Transtorno importante da imagem corporal;
Condições inflamatórias na pele em área alvo da terapia cirúrgica;
Obesidade (IMC > 30);
Cirurgia de abdominoplastia concomitantemente.
Dessa forma, a análise foi efetuada em 76 pacientes. O sexo feminino foi predominante,
com 74 pacientes, representando 97,36% da amostra. Dois pacientes (2,67%) do sexo
masculino foram submetidos a lipoaspiração com auxílio do VASER®. A idade média das mulheres no estudo foi de 39 anos (21 a 65 anos) e em homens foi
de 37 anos. O IMC médio geral da amostra foi de 24,64kg/m2(Tabela 1).
Tabela 1 - Procedimentos realizados.
Procedimento efetuado |
Número de pacientes |
Lipoaspiração em região abdominal, flancos e dorso. |
31 |
Lipoaspiração em região abdominal e dorso com colocação de implante mamário. |
20 |
Lipoaspiração em região abdominal, flancos e dorso com mastopexia. |
8 |
Lipoaspiração em região abdominal e mastopexia com colocação de implante. |
5 |
Lipoaspiração em região abdominal, flancos e dorso com mastopexia e colocação de implante. |
3 |
Lipoaspiração em região abdominal com colocação de implante mamário. |
3 |
Lipoaspiração em face lateral das coxas com colocação de implante mamário. |
2 |
Lipoaspiração em região abdominal. |
1 |
Lipoaspiração de região abdominal, flancos e dorso com correção de ginecomastia. |
2 |
Lipoaspiração face lateral das coxas. |
1 |
Tabela 1 - Procedimentos realizados.
Critérios de avaliação
Em se tratando de lipoaspiração, utilizamos os critérios rotineiros mencionados na
literatura vigente referente a complicações cirúrgicas. Estas podem ser classificadas
de acordo com o período de ocorrência (Tabela 2).
Tabela 2 - Complicações.
Complicações perioperatórias (0 - 48h)
|
Complicações em pós- operatório recente (1 - 7 dias) |
Complicações em pós-operatório tardio (1 semana - 3 meses)
|
Necrose cutânea |
Celulite |
Seroma |
Lesão pela cânula/portal/end-point |
Parestesia/Alteração de sensibilidade transitória permanente |
Edema prolongado |
Complicações anestésicas |
Hiperpigmentação |
Fibrose |
Hipopigmentação |
|
Avaliação pré-operatória
Todos os pacientes foram avaliados previamente ao ato cirúrgico pela equipe de Anestesiologia
do Centro Hospitalar Santa Mônica. Exames laboratoriais e complementares solicitados
de acordo com a idade e comorbidades. Os pacientes foram submetidos à anestesia geral.
Tecnologia VASER®
A tecnologia ultrassônica é produzida por uma conversão de energia elétrica em ondas
de vibração sonora através de um handpiece. Essa vibração se movimenta por uma sonda de titânio em uma frequência constante
de 36kHz. A interação dos designs da sonda com a reverberação sonora no tecido determina
a eficácia do sistema2.
O tecido celular subcutâneo que se encontra em ambiente úmido recebe a energia sonora
proveniente deste probe. Existem dois mecanismos de funcionamento. O primeiro - e menos frequente - rompe
a membrana celular por impacto direto. O segundo princípio chama-se cavitação, esse
fenômeno pode ser entendido através da frequência vibratória da onda sonora que produz
forças de compressão e rarefação (cavitação), às quais são emitidos pelos seus anéis
distais, formando pequenas bolhas de ar. Gradualmente estas bolhas aéreas vão aumentando
gradativamente seu diâmetro e - simultaneamente - envolvendo os adipócitos no seu
interior até romperem. A energia liberada pela ruptura das microbolhas aéreas desprende
os adipócitos da microarquitetura tecidual que estavam em suas proximidades8.
A cavitação e a ruptura mecânica do tecido adiposo é seletiva, ou seja, o diâmetro
da célula gordurosa é maior que a microarquitetura tecidual adjacente (vasos sanguíneos,
fibras musculares, tecidos conectivos), sendo assim, esse ambiente mantém-se intacto8.
O aparelho tem potência e precisão suficientes para tratar diferentes áreas corporais
sem a necessidade do emprego da força para vencer zonas de resistência tecidual6.
O VASER® é composto por um sistema integrado, formado por um display (ultrassom), handpiece, probes (hastes atraumáticas especiais), torre de aspiração pelo sistema Ventx (sistema ventilado de aspiração), sistema integrado de irrigação e pedais de acionamento.
Este equipamento completo reúne todos os aparatos necessários para a realização da
cirurgia de lipoaspiração de maneira organizada, oferecendo ao cirurgião segurança,
conforto e praticidade8 (Figura 1).
Figura 1 - Sistema VASER® (Vibration Amplification of Sound Energy at Resonance).Fonte: Autor do trabalho (2018).
Figura 1 - Sistema VASER® (Vibration Amplification of Sound Energy at Resonance).Fonte: Autor do trabalho (2018).
Portais de Proteção ("Skin Ports")
Peças utilizadas nos acessos cirúrgicos com finalidade de proteção, os quais rotineiramente
são inseridos em sulco glúteo, topografias axilares anteriores e posteriores, região
púbica, cicatriz umbilical e sulco infra mamário. Vale ressaltar que eles previnem
e protegem essas áreas de lesões térmicas emitidas das vibrações ultrassônicas e do
traumatismo de movimentos repetitivos (Figura 2).
Figura 2 - Portais com design adequados para as variações de diâmetros dos probe ultrassônicos. Fonte: Autor do trabalho (2018).
Figura 2 - Portais com design adequados para as variações de diâmetros dos probe ultrassônicos. Fonte: Autor do trabalho (2018).
"Handpiece"
Instrumento de condução do impulso sonoro ligado diretamente ao ultrassom com encaixes
para os probes a serem utilizados. Necessitam de contínua revisão de encaixe com "chave de boca"
para dissipar a onda sonora no sentido vertical (Figura 3).
Figura 3 - Handpiece com probes e "chave de boca". Fonte: Autor do trabalho (2018).
Figura 3 - Handpiece com probes e "chave de boca". Fonte: Autor do trabalho (2018).
Cânulas
Sistema atraumático de cânulas para coleta de tecidos emulsificados. Possuem amplitudes
e conFigurações para unidades anatômicas variáveis6 (Figura 4).
Figura 4 - Conjunto de cânulas do sistema Ventx®, na sequência de cima para baixo: Manopla de adaptação, cânula 3.0mm de infiltração,
cânulas de lipoaspiração 3.0mm, 3.7mm, 4.6mm curta, 4.6mm longa, 5.0mm cânula basket, cânula 4.6mm curva, cânula "baby" para axila, cânula 3.0mm toledo, cânula 3.0mm membros inferiores e cânula 4.0mm
para lipoenxertia. Fonte: Autor do trabalho (2018).
Figura 4 - Conjunto de cânulas do sistema Ventx®, na sequência de cima para baixo: Manopla de adaptação, cânula 3.0mm de infiltração,
cânulas de lipoaspiração 3.0mm, 3.7mm, 4.6mm curta, 4.6mm longa, 5.0mm cânula basket, cânula 4.6mm curva, cânula "baby" para axila, cânula 3.0mm toledo, cânula 3.0mm membros inferiores e cânula 4.0mm
para lipoenxertia. Fonte: Autor do trabalho (2018).
"Probes"
O equipamento possui sondas de diferentes diâmetros com sulcos próximos a ponta para
transmitir energia. Quanto maior o diâmetro do probe, maior a energia dissipada. Possuem formatação para todas as unidades anatômicas7 (Figura 5).
Figura 5 - VASER®
probes ultrassônicos. Da esquerda para direita: 4.5mm probe, 3.7mm probe/2 anéis, 3.7mm probe/3 anéis, arrow probe e 2.9mm probe/3 anéis e Saturno probe. Fonte: Autor do trabalho (2018).
Figura 5 - VASER®
probes ultrassônicos. Da esquerda para direita: 4.5mm probe, 3.7mm probe/2 anéis, 3.7mm probe/3 anéis, arrow probe e 2.9mm probe/3 anéis e Saturno probe. Fonte: Autor do trabalho (2018).
Marcação pré-cirúrgica
Durante a avaliação física, uma análise da distribuição do tecido adiposo pelas diferentes
unidades corporais é estabelecida, incluindo documentação da espessura da gordura
abdominal e tronco, bem como massa muscular.
Para procedimentos de lipoaspiração em contorno corporal, utilizamos o VASER® de rotina, uma vez que as indicações cirúrgicas protocolares são idênticas, não existindo
exceções.
Iniciamos com o paciente em posição ortostática e os primeiros marcos anatômicos delimitados
são as áreas nas quais planeja-se a retirada de 100% da camada lamelar do tecido celular
subcutâneo. Em seguida, identificam-se -se os músculos retos abdominais, as cristas
ilíacas anterossuperiores e os ligamentos inguinais. Não menos importante, na anatomia
lateral e posterior, são delimitados a topografia dos músculos glúteos máximos, a
concavidade sacral e a transição entre o dorso superior e inferior seguindo a sintopia
da fáscia lombossacra (Figura 6).
Figura 6 - Azul: delimitação da extração profunda. Preto: delimitação de pontos anatômicos estratégicos.
Lilás: áreas de transição do relevo superficial. Verde: região de extração total de
camada lamelar e extração parcial de compartimento areolar. Vermelho: área de alerta
para evitar ressecção em excesso. Fonte: Autor do trabalho (2018).
Figura 6 - Azul: delimitação da extração profunda. Preto: delimitação de pontos anatômicos estratégicos.
Lilás: áreas de transição do relevo superficial. Verde: região de extração total de
camada lamelar e extração parcial de compartimento areolar. Vermelho: área de alerta
para evitar ressecção em excesso. Fonte: Autor do trabalho (2018).
Técnica operatória
O preparo do paciente em centro cirúrgico inicia-se pelo ato anestésico, no qual temos
a preferência pela anestesia geral. Em sequência prepara-se para a sondagem vesical
de demora, meias e equipamentos de compressão venosa intermitentes em membros inferiores,
sistema de aquecimento corporal.
Padronizamos o ato operatório em três etapas: infiltração, emulsificação e aspiração.
Posicionamento
Inicia-se pela posição do paciente em decúbito ventral com exposição ampla das unidades
anatômicas e, após o término desta etapa, realiza-se mudança para decúbito dorsal.
Em ambas as posições, confeccionamos portais estratégicos em áreas de camuflagem (dorso:
sulco interglúteo e em topografia prega axilar posterior. Abdômen: em região púbica,
cicatriz umbilical, topografia inframamárias e em topografia axilar anterior). Estes
acessos recebem, após a infiltração, protetores ("skin-ports") para o deslizamento dos probes, evitando-se lesões térmica adjacentes (Figura 7).
Figura 7 - Paciente em decúbito dorsal com portais de segurança em região púbica, borda superior
de cicatriz umbilical e sulcos infra mamários (proanéis). Fonte: Autor do trabalho
(2018).
Figura 7 - Paciente em decúbito dorsal com portais de segurança em região púbica, borda superior
de cicatriz umbilical e sulcos infra mamários (proanéis). Fonte: Autor do trabalho
(2018).
Infiltração
Utilizamos a técnica super úmida de infiltração, tanto para região superficial como
para profunda. O volume utilizado de rotina é (1:1 volume infiltrado/volume aspirado),
com solução de soro fisiológico aquecido e epinefrina - 1 ampola para cada 1000ml
de soro fisiológico. A solução é inserida através dos portais previamente confeccionados.
Destaca-se também a necessidade de manter a região adjacente umedecida durante as
etapas cirúrgicas, com solução fisiológica para melhor dissipação da energia térmica
gerada pelo dispositivo e pelo atrito.
Emulsificação
A introdução dos probes segue o movimento laboral praticado na lipoaspiração tradicional, isto é, movimento
de excursão "vai e vem", sem imprimir força, sentindo o aparelho cruzar pelos tecidos.
Este processo inicia-se pela camada lamelar e finaliza-se no compartimento areolar.
A duração preconizada do VASER®, conforme orientação do fabricante, é de cerca de 1 minuto por cada 100ml de solução
infiltrada, gerando a sensação de "perda da resistência". Áreas de maior conteúdo
adiposo podem ser abordadas com probe de maior diâmetro e com potência do aparelho em até 80%, em modo contínuo. Já, em
áreas menos espessas, como a cintura, preconiza-se probes menores, 2,9mm, com 3 anéis (maior dispersão lateral da energia) e potência do aparelho
em até 60%, em modo pulsátil.
O uso superficial do VASER® é realizado com probe de 2,9mm, 3 anéis e sempre em modo pulsátil. Essa etapa é a responsável pela retração
da pele, compensando em áreas de flacidez miofascial, especialmente o hipogástrio.
A duração da etapa de emulsificação tem tempo de aproximadamente 30-45min em cada
decúbito em nosso dia a dia (Tabela 3).
Tabela 3 - Probes do sistema VASER®.
Densidade |
Volume |
Probe |
Modelo |
Frequência |
Suave |
Médio/Grande |
3.7mm (3 grooves) |
Contínuo |
70-80 |
Suave |
Pequeno |
2.9mm (3 grooves) ou 3.7mm (2 grooves) |
Contínuo ou pulsátil |
70-80 |
Levemente fibroso |
Médio/Grande |
3.7mm (2 grooves) |
Contínuo |
80-90 |
Levemente fibroso |
Pequeno |
2.9mm (3 grooves) ou 3.7mm (1 grooves) |
Contínuo |
80-90 |
Muito fibroso |
Médio/Grande |
3.7mm (2 grooves) ou 3.7mm (1 groove) |
Contínuo |
80-90 |
Muito fibroso |
Pequeno |
2.9mm (3 grooves) |
Contínuo |
80-90 |
Tabela 3 - Probes do sistema VASER®.
LIPOASPIRAÇÃO
Camada lamelar
A aspiração da gordura, segue a técnica convencional de coleta tecidual, isto é, "em
leque" e com a "mão espalmada" sentindo o movimento da cânula. As resistências teciduais
são mínimas, haja vista que a densidade do tecido está sensivelmente diminuída pela
emulsificação. As cânulas utilizadas possuíam diâmetro de 3.0mm, 3.7mm e 4.0mm. A
aspiração do tecido adiposo é sempre iniciada pela camada profunda, com cânulas de
maior diâmetro (3.7mm e 4.0 mm).
Camada areolar
A emulsificação e lipoaspiração superficiais são realizadas seletivamente sobre os
bordos dos agrupamentos musculares (linha alba e ligamento inguinal). Cânulas mais
delgadas são fundamentais.
Transição
Essa fase é utilizada para atenuar a transição entre os grupos musculares e os bordos
acentuados na lipoaspiração superficial, promovendo retirada do excedente adiposo
muscular, com melhora da definição dos marcos anatômicos superficialmente. O objetivo
é a demarcação dos bordos laterais dos agrupamentos musculares, com a manutenção de
um ("pinch test") em torno de 1cm.
Lipoaspiração superficial subdérmica
Consiste em aspirar gordura superficial subdérmica através de cânulas finas 3.0mm
e 2.0 mm. Essa redução de gordura logo abaixo da pele torna possível a obtenção de
uma efetiva retração cutânea. O sistema Ventx existente na torre do equipamento, permite que não haja uma contínua pressão negativa
na cânula de lipoaspiração. Consequentemente, a agressão da cânula ao deslizar pelo
tecido, em especial ao plexo subdérmico, não o traumatiza (Figura 8).
Figura 8 - Exemplo de lipoaspiração com abordagens dos diversos níveis do relevo anatômico gordura
lamelar, adelgaçamento conjunto de tecido celular subcutâneo, em áreas de encontros
tendinosos e as transições anatômicas adjacentes.
Figura 8 - Exemplo de lipoaspiração com abordagens dos diversos níveis do relevo anatômico gordura
lamelar, adelgaçamento conjunto de tecido celular subcutâneo, em áreas de encontros
tendinosos e as transições anatômicas adjacentes.
Após o término da etapa de lipoaspiração, introduzimos dreno de aspiração contínua
(PortoVac) em região lombossacra e em região suprapúbica.
Manejo pós-operatório
Os pacientes fazem uso de malha modeladora compressiva e bomba de retorno venoso durante
toda a internação. No segundo dia pós-operatório, os pacientes são submetidos à drenagem
linfática diária pós-operatória na própria instituição por período mínimo de 10 dias.
RESULTADOS
Nesse estudo retrospectivo, efetuamos análise de prontuários médicos em pacientes
submetidos à lipoaspiração com auxílio do VASER® para analisar as complicações cirúrgicas encontradas, realizando-se, então, a comparação
com a literatura médica disponível.
A ênfase principal foi a avaliação o dispositivo VASER® com relação à sua segurança. Dados como volume da solução infiltrada e aspirada,
o modo da energia usada (pulsátil ou contínua), o tempo de aplicação do ultrassom
também foram coletados, alguns resultados serão mencionados em termos gerais.
O máximo de volume não excedeu 4.000ml em nenhum paciente. Em todos os casos, o sobrenadante
de gordura excedeu 80% do total do volume aspirado (Figura 9). Em alguns casos esse índice foi acima de 93%.
Figura 9 - Documentação da gordura emulsificada. Em nossa casuística, a gordura sobrenadante
excede 80% do total do volume lipoaspirado. Fonte: Autor do trabalho (2018).
Figura 9 - Documentação da gordura emulsificada. Em nossa casuística, a gordura sobrenadante
excede 80% do total do volume lipoaspirado. Fonte: Autor do trabalho (2018).
Entre os pacientes analisados no estudo, 71 (93,42%) não apresentaram eventos indesejados
pós-cirúrgicos referentes à lipoaspiração com o auxílio do VASER®. Cinco casos (6,57%) apresentaram os desfechos (Tabela 4).
Tabela 4 - Complicações pós-operatórias.
Complicações |
número de pacientes |
% |
Edema prolongado |
1 |
1,31 |
Lesão térmica em portal de inserção |
1 |
1,31 |
Hiperpigmentação |
2 |
2,67 |
Lesão epidérmica |
1 |
1,31 |
Celulite |
0 |
0,00 |
Complicações anestésicas |
0 |
0,00 |
Fibrose |
0 |
0,00 |
Alteração de sensibilidade |
0 |
0,00 |
Seroma |
0 |
0,00 |
Total |
5 |
6,57 |
Tabela 4 - Complicações pós-operatórias.
Os eventos de hiperpigmentação e lesão térmica no portal de inserção ocorreram na
mesma paciente. O restante das complicações acometeu pacientes distintos. A transmissão
da energia ultrassônica aos tecidos pode ocasionar lesão no local de inserção dos
portais ou dano terminal, em função da manutenção estática demasiadamente prolongada
dos probes9 ou como em nossa casuística um desgaste do ("skin port"). Realizado exérese e sutura.
Houve também a ocorrência de lesão epidérmica em flanco após uso do VASER®. Paciente apresentou melhora progressiva com cuidados intensos em relação ao curativo
da área acometida. A discromia (hipo ou hiperpigmentação da pele) com o uso de dispositivos
ultrassônicos tem relatos na literatura9,10. A hiperpigmentação pode ocorrer em decorrência da liberação de hemossiderina e seu
depósito, gerando alteração na coloração, ou uso de modeladores que comprimem inadequadamente,
os tecidos; estado possivelmente associado, a fisiopatologia desta complicação11. Os dois pacientes acometidos em nossa casuística tiveram remissão completa após
alívio de compressão.
Não ocorreram seromas em nosso estudo. Apenas um caso de edema prolongado (1,31%)
que foi resolvido com intensificação da terapêutica conservadora. Creditamos os baixos
índices encontrados em nossa casuística à padronização de drenagens linfáticas e uso
sistemático de drenos a vácuo (Figura 10).
Figura 10 - A e C. Documentação fotográfica pré-operatória de homem, 38 anos, com ginecomastia. B e D. Documentação fotográfica pós-operatória com 8 semanas de tratamento cirúrgico de
lipoaspiração ultrassônica assistida por VASER® Infiltração de 300ml de solução salina por lado, utilizado probe de 2.9mm por 3 minutos e 7 segundos à direita e por 3 minutos e 20 segundos à esquerda.
Utilizou-se potência de 70% em modo pulsátil. Volume total aspirado de 520ml (90%
de tecido gorduroso emulsificado).
Figura 10 - A e C. Documentação fotográfica pré-operatória de homem, 38 anos, com ginecomastia. B e D. Documentação fotográfica pós-operatória com 8 semanas de tratamento cirúrgico de
lipoaspiração ultrassônica assistida por VASER® Infiltração de 300ml de solução salina por lado, utilizado probe de 2.9mm por 3 minutos e 7 segundos à direita e por 3 minutos e 20 segundos à esquerda.
Utilizou-se potência de 70% em modo pulsátil. Volume total aspirado de 520ml (90%
de tecido gorduroso emulsificado).
DISCUSSÃO
No estudo realizado, 76 pacientes foram submetidos à lipoaspiração ultrassônica assistida
por VASER® para tratamento de lipodistrofias. Os resultados indicaram que a emulsificação do
tecido celular subcutâneo através do modo pulsátil e contínuo do ultrassom mostrou-se
eficiente e seguro. O material aspirado continha mais de 80% de gordura sobrenadante,
chegando a 93% em alguns casos. As perdas sanguíneas não foram relevantes, haja vista
que as características dos líquidos infranadantes aspirados foram diminutas e, por
associação, nenhum manejo clínico por depleção foi realizado. Estes achados vão de
encontro ao estudo comparativo realizado por Garcia Junior e Nathan, em 200812, que concluiu que o uso de dispositivos ultrassônicos de terceira geração geram 20%
a menos de perdas sanguíneas quando comparados a outras técnicas12.
Jewell, Fodor, Pinto e Al Shammari, em 20028, realizaram uma revisão da literatura com análise estatística de complicações cirúrgicas
relacionadas à lipoaspiração. Foram selecionados 93 artigos, sendo possível realizar
avaliação estatística em 14 destes. Foi obtida uma média de 13,5% de eventos indesejados
na literatura estudada. Em nossa casuística obtivemos 6,57% de complicações pós-operatórias
avalizando, dessa forma, a segurança desta tecnologia.
Rohrich et al., em 19989, buscaram avaliar a experiência com o uso de dispositivos ultrassônicos em lipoaspiração,
114 pacientes consecutivos foram analisados. Em sua amostra, cinco complicações foram
encontradas: um caso de disestesia, que o autor acredita ter sido em decorrência do
uso excessivamente prolongado do aparelho, três casos de seromas abdominais (com necessidade
de aspiração e compressão) e um caso de lesão térmica no portal de inserção da cânula,
em provável decorrência de condução técnica inadequada. O autor enfatiza a necessidade
de manutenção de ambiente úmido e constante movimento da cânula. Estatísticas positivas,
também, se compararmos ao contexto tradicional. O autor relaciona as complicações
com a curva de aprendizado.
Dixit e Wagh, em 201311, em revisão literária ampla sobre problemas pós-operatórios em lipoaspiração mostraram
uma taxa de 18,7% de hiperpigmentação cutânea em áreas manipuladas. Afirmam que a
causa principal seria a abordagem inadequada da camada areolar com consequente lesão
do plexo subdérmico. Em nosso estudo, encontramos 2,67% de eventos desta natureza.
A baixa incidência deste percalço é um ponto importante de análise, pois nestas cirurgias
abordamos em 92,1% dos casos, no mínimo, em uma unidade anatômica a camada areolar
com emulsificação adiposa e lipoaspiração subsequente. A pequena quantidade de eventos
negativos em lipoaspirações superficiais é o achado que mais chama atenção em termos
de segurança10; já que a lipoaspiração convencional tem como alicerces técnicos consagrados a manipulação
profunda do tecido gorduroso em ambiente úmido, deixando como proteção sugerida uma
espessura de aproximadamente um centímetro de tecido para evitar-se irregularidades
de contorno e/ou desvitalização de superfície3.
Nagy e Vanek Junior, em 201213, fizeram um estudo multicêntrico e randomizado comparando a lipoaspiração tradicional
e o método ultrassônico em regiões anatômicas contralaterais de mesmo paciente. Pacientes
femininas de 20 a 48 anos.
Ocorreram aumento da retração tecidual em 53% por cc aspirado quando usado o VASER®. Estudo com índice de significância estatística e clinicamente relevante14.
Baseando-se nestas premissas de retração cutânea superior e a manipulação da camada
areolar sem desvitalização tecidual, torna-se possível uma maior definição muscular
em pacientes com características físicas propícias6.
Concordamos com essa premissa apesar de ter uma contextualização subjetiva. Importante
salientar que ao executar técnicas que visam maior definição dos compartimentos que
os passos cirúrgicos, neste contexto, aumentam e, simultaneamente, os preceitos de
segurança básicos como a utilização de probes adequados, seleção da dispersão energética pulsátil ou intermitente, infiltração
super úmida em superfície e profundidade, e aspiração lamelar com posterior coleta
areolar são fundamentais6 (Figura 11).
Figura 11 - A. Documentação fotográfica em pós-operatório imediato de mulher, 32 anos submetida
à lipoaspiração assistida por VASER® em região abdominal, flancos e dorso com abordagem profunda em toda a circunferência,
e manipulação superficial e profunda em áreas de intersecções musculares. B, C e D. "Pinch test" com diferentes espessuras de acordo com planejamento cirúrgico.
Figura 11 - A. Documentação fotográfica em pós-operatório imediato de mulher, 32 anos submetida
à lipoaspiração assistida por VASER® em região abdominal, flancos e dorso com abordagem profunda em toda a circunferência,
e manipulação superficial e profunda em áreas de intersecções musculares. B, C e D. "Pinch test" com diferentes espessuras de acordo com planejamento cirúrgico.
Hoyos e Millard, em 20072, afirmam que a tecnologia VASER® torna o cirurgião apto a indicar técnicas de lipoplastia superficiais. Os dispositivos
ultrassônicos de primeira e segundas gerações associaram-se a severas queimaduras
e necroses quando dispersavam sua energia na superfície, rotina que praticamente se
anulou com o advento da terceira geração tecnológica15,16,17,18, conceito que se mostrou evidente em nosso estudo.
CONCLUSÃO
A literatura médica, bem como a nossa análise, demonstra que o emprego do VASER® em procedimentos de lipoaspiração para melhora de contorno corporal se apresenta
com uma abordagem segura e com índices baixos de complicações.
Os percalços potenciais do emprego de um dispositivo ultrassônico, como o superaquecimento
levando a isquemia/necrose tecidual, são majoritariamente acreditados ao uso inadequado
do dispositivo. Faz-se de fundamental importância a padronização dos cuidados em relação
aos portais de inserção, emprego de quantidade adequada de solução infiltrante e uso
do dispositivo pelo tempo e área adequados.
Portanto o VASER® é uma ferramenta em potencial e segura para a desenvoltura técnica do cirurgião em
cirurgias de contorno corporal.
*Felipe Massignan e seus colaboradores não recebem nenhuma compensação financeira
ou benefício da empresa responsável pelo aparelho mencionado neste artigo.
COLABORAÇÕES
FM
|
Análise e/ou interpretação dos dados, Análise estatística, Coleta de Dados,
Conceitualização, Concepção e desenho do estudo, Gerenciamento de Recursos, Gerenciamento
do Projeto, Investigação, Metodologia, Realização das operações e/ou experimentos,
Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Supervisão, Validação,
Visualização
|
REFERÊNCIAS
1. Fodor PB, Cimino WW, Watson JP, Tahernia A. Suction-assisted lipoplasty: physics,
optimization, and clinical verification. Aesthetic Surg J. 2005 May;25(3):234-246.
2. Hoyos AE, Millard JA. VASER-assisted high-definition liposculpture. Aesthetic Surg
J. 2007 Nov/Dec;27(6):594-604.
3. Markman B, Barton Junior FE. Anatomy of the subcutaneous tissue of the trunk and lower
extremity. Plast Reconstr Surg. 1987 Aug;80(2):248-254.
4. Zocchi ML. Ultrasound-assisted lipoplasty. Adv Plast Reconstr Surg. 1995;11:197-221.
5. Scuderi N, Paolini G, Grippaudo FR, Tenna S. Comparative evaluation of traditional,
ultrasonic, and pneumatic assisted lipoplasty: analysis of local and systemic effects,
efficacy, and costs of the methods. Aesthetic Plast Surg. 2000 Nov/Dec;24(6):395-400.
6. Hoyos AE. High definition liposculpture. Presented in the XIII International Course
of Plastic Surgery. Bucaramanga, Colombia; 2003.
7. Cimino WW. Ultrasonic surgery: power quantification and efficiency optimization. Aesthetic
Surg J. 2001 May;21(3):233-41.
8. Jewell ML, Fodor PB, Pinto EBS, Al Shammari MA. Clinical application of VASER-assisted
lipoplasty: a pilot clinical study. Aesthetic Surg J. 2002 Mar;22(2):131-46.
9. Rohrich RJ, Beran SJ, Kenkel JM, Adams Junior WP Jr, DiSpaltro F. Extending the role
of liposuction in body contouring with ultrasound-assisted liposuction. Plast Reconstr
Surg. 1998 Apr;101(4):1090-102;discussion:1117-9.
10. Rocha RP, Rocha ELP, Pinto EBS, Sementilli A, Nakanishi CP. Cutis marmorata resemblance
after liposuction. Aesthetic Plast Surg. 2005 Jul/Aug;29(4):310-2.
11. Dixit VV, Wagh MS. Unfavorable outcomes of liposuction and their management. Indian
J Plastic Surg. 2013 May/Aug;46(2):377-92.
12. Garcia Junior O, Nathan N. Comparative analysis of blood loss in suction-assisted
lipoplasty and third-generation internal ultrasound-assisted lipoplasty. Aesthetic
Surg J. 2008 Jul/Aug;28(4):430-5.
13. Nagy MW, Vanek Junior PF. A multicenter, prospective, randomized, single-blind, controlled
clinical trial comparing VASER-assisted Lipoplasty and suction-assisted Lipoplasty.
Plast Reconstr Surg. 2012 Apr;129(4):681-9e.
14. Rocha RP, Pinto EBS, Cardoso RA, Nardino EP, Rodrigues L, Tonetti RL. Morphological
aspects of dorsum and sacrum skin as related to liposuction. Aesthetic Surg J. 2000
May/Jun;24(3):171-8.
15. Zucowski ML, Ash K. Ultrasound-assisted lipoplasty learning curve. Aesthetic Surg
J. 1998 Mar;18(2):104-10.
16. Troillius C. Ultrasound-assisted lipoplasty: is it really safe?. Aesthetic Plast Surg.
1999;23:307-311.
17. Scheflan M, Tazi H. Ultrasonically assisted body contouring. Aesthetic Surg J. 1996
Jun;16(2):117-122.
18. Grolleau JL, Rougé D, Chavoin JP, Costagliola M. Severe cutaneous necrosis after ultrasound
lipolysis. Medicolegal aspects and review. Ann Chir Plast Esthet. 1997;42(1):31-36.
1. Centro Hospitalar Santa Mônica, Centro Hospitalar, Erechim, RS, Brasil.
Autor correspondente: Felipe Massignan Rua Itália, 878, Sala 105, Espírito Santo, Erechim, RS, Brasil. CEP: 99711-010. E-mail:
felipemassignan@me.com
Artigo submetido: 4/4/2019.
Artigo aceito: 20/10/2019.
Conflitos de interesse: não há.