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Ideas and Innovation - Year2019 - Volume34 - Issue 3

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2019RBCP0211

RESUMO

Realizamos uma análise de quais são os elementos responsáveis pelo sustento e formato abdominal, determinando assim, que é devido a uma excessiva flacidez musculoaponeurótica de origem primária, à qual promove uma incapacidade do suporte da parede abdominal e pode estar relacionada a fatores predisponentes. Para esses casos específicos, desenvolvemos um tratamento propondo a colocação da tela e apresentando nossa experiência. Apresentamos esta série de casos de experiência em 26 anos. Onde 15 pacientes foram tratados com abdominoplastia primária e secundária. O reforço da parede abdominal foi realizado através da colocação de tela de polipropileno no plano submuscular com pontos em U na fáscia transversalis, buscando-se fortalecer o músculo e a fáscia transversa. Os resultados foram satisfatórios a longo prazo. Obtendo resolução das protuberâncias abdominais e restaurando a harmonia dos músculos. Apenas duas complicações ocorreram, que foram a presença de dor crônica localizada no abdome tratada com infiltrações de esteroides e fístula umbilical precoce de resolução rápida espontânea, independente da proposta.

Palavras-chave: Abdominoplastia; Diástase muscular; Atrofia muscular; Tratamento secundário; Tela subcutânea

ABSTRACT

We investigated the causative factors of abdominal support and shape and found that excessive musculoskeletal flaccidity of primary origin causes an inability to support the abdominal wall and may be associated with the predisposing factors. For such cases, we developed a treatment consisting of the placement of a subcutaneous mesh. Here, we present our experience with this treatment. We present a case series of 15 patients in our 26 years of experience who were treated with primary and secondary abdominoplasties. The abdominal wall was reinforced by placing a polypropylene mesh in the submuscular plane with U-stitches in the transversalis fascia, aiming at strengthening the muscle and transverse fascia. The results were satisfactory in the long term. Abdominal bulges were repaired, and muscle harmony was restored. Only two complications occurred: chronic pain localized in the abdomen, which was treated with steroid infiltrations, and an early umbilical fistula with spontaneous and rapid resolution, regardless of the proposal.

Keywords: Abdominoplasty; Muscular diastasis; Muscular atrophy; Secondary treatment; Subcutaneous mesh.


INTRODUÇÃO

A abdominoplastia é um dos procedimentos cirúrgicos mais populares, pois a região abdominal é uma importante unidade estética funcional que define o contorno corporal. Em nossa experiência, observamos alguns pacientes com abaulamento abdominal proeminente de difícil tratamento, apresentando resultados insatisfatórios ou com recidiva aos tratamentos convencionais1,2.

Esse abaulamento que é a principal queixa na maioria dos pacientes que procuram a abdominoplastia, é na maioria dos casos devido à diástase do reto e que também pode estar associado a uma flacidez músculo aponeurótica, ou uma incompetência fisiológica que pode ter fatores predisponentes e agravantes como: idade, multiparidade, perda de peso significativa em obesos, cesariana.

A parede abdominal anterior tem maior ou menor competência, dependendo do equilíbrio entre a pressão intra-abdominal, os movimentos das vísceras e do diafragma, as tensões musculares e aponeuróticas, determinando a presença de protuberâncias abdominais3,4.

Acreditamos que as protuberâncias se devam à diástase dos retos e à flacidez músculo aponeurótica da parede abdominal. Assim, consideramos a fáscia transversalis e o músculo transverso, como os mais importantes detentores do abdome (Figura 1). Iniciamos nosso estudo em 1993, propondo o tratamento através do reforço dessas estruturas com tela de polipropileno1,5,6.

Figura 1 - Vista frontal da distribuição muscular e da linha arqueada. Se apresenta inferiormente à linha arqueada, as aponeuroses do musculo obliquo interno e transverso do abdome as quais se fundem e passam superficialmente ao mm. Rectus Abdominis.

MÉTODOS

Em 32 anos de prática profissional, foram tratados 925 pacientes submetidos à cirurgia de contorno corporal, nesse período observamos pacientes com abdome proeminente, apresentando resultados insatisfatórios ou com recorrências.

Foram tratados 15 pacientes (Tabela 1), 7 com abdominoplastia primária e 8 com abdominoplastia secundária, os quais mesmo após a abdominoplastia ainda apresentava abaulamento abdominal e, portanto, insatisfação com o resultado1,5.

Tabela 1 - Pacientes com tratamento de malha de polipropileno.
  Paciente Idade Procedimento Primário Procedimento Secundário Complicações Resultados ¥
1 C.S.M.A.T. 52 Abdominoplastia + plicatura de retos + retalho de oblíquo externo + lipoaspiração Após 2 anos: Abdominoplastia com tela de polipropileno Nenhum Satisfatório
2 M.E.B.P." 42 Abdominoplastia + plicatura de retos + retalho de oblíquo externo + lipoaspiração Após 14 anos: Abdominoplastia com tela de polipropileno Nenhum Satisfatório
3 M.G.E. 41 Miniabdominoplastia + plicatura de retos + retalho de oblíquo externo + lipoaspiração Após 6 anos: Abdominoplastia com tela de polipropileno Nenhum Satisfatório
4 R.C.M.A. 40 Miniabdominoplastia + plicatura de retos + retalho de oblíquo externo + lipoaspiração Após 1 ano: Abdominoplastia com tela de polipropileno Nenhum Satisfatório
5 T.M.A.B. 52 Abdominoplastia + plicatura de retos + retalho de oblíquo externo + lipoaspiração Após 15 anos: Abdominoplastia com tela de polipropileno Dor crônica Satisfatório
6 T.J. 70 Abdominoplastia + tela de polipropileno+ lipoaspiração - Dor crônica Satisfatório
7 C.X.* 34 Abdominoplastia em Fleur de Lis + tela de polipropileno+ plicatura de retos + lipoaspiração - Nenhum Satisfatório
8 A.M.N. 55 Abdominoplastia + tela de polipropileno + lipoaspiração - Nenhum Satisfatório
9 L.E.M.C.B. 51 Abdominoplastia + tela de polipropileno + plicatura de retos + lipoaspiração - Nenhum Satisfatório
10 A.I. 46 Abdominoplastia + tela de polipropileno + plicatura de retos + lipoaspiração - Nenhum Satisfatório
11 O.A.P.* 40 Abdominoplastia em ancora + tela de polipropileno + plicatura de retos + lipoaspiração - Nenhum Satisfatório
12 R.F.S. 31 Abdominoplastia + tela de polipropileno + plicatura de retos + retalho de oblíquo externo + lipoaspiração - Fístula umbilical Satisfatório
13 R.S.C. 25 Miniabdominoplastia + plicatura de retos + lipoaspiração Após 3 anos: Miniabdominoplastia + tela de polipropileno Nenhum Satisfatório
14 E.C.G. 30 Abdominoplastia vertical + tela de polipropileno+ lipoaspiração - Nenhum Satisfatório
15 V.C.H.R. 53 Abdominoplastia + plicatura de retos abdominais + lipoaspiraçao Após 20 anos, Abdominoplastia com tela de poplipropileno Nenhum Satisfatório
Tabela 1 - Pacientes com tratamento de malha de polipropileno.

Esses pacientes foram submetidos à abdominoplastia, realizando-se uma incisão supra púbica, descrevendo uma linha curva de concavidade superior de acordo com a cicatriz preexistente. Em seguida, procedeu-se à dissecção do retalho subcutâneo, ao processo xifoide e incisão da Linha Alba, para dissecção do músculo reto abdominal da camada aponeurótica posterior e da fáscia transversal, atingindo a borda externa do reto abdominal em ambos os lados (Figura 2). Aplicamos a tela de polipropileno em contato direto com a lâmina aponeurótica profunda e a fáscia transversal, fixando-a na direção cranial até o processo xifóide e caudalmente no púbis na origem do músculo piramidal, lateralmente ao complexo muscular aponeurótico do oblíquo e músculos transversos (Figuras 3A, 3B e 3C). A tela foi suturada com Prolene 0, com pontos em U, distendida sobre a fáscia transversal e a bainha posterior do músculo reto abdominal, ressecando seu excesso6,7. Posteriormente, continuamos com a sutura do músculo reto abdominal (Figuras 4A, 4B e 4C). Deixamos drenagem por sucção sob o retalho dermogorduroso e fechamos em três planos.

Figura 2 - Posição da tela de polipropileno no plano submuscular. A: A imagem mostra a posição submuscular da tela de polipropileno fixada anteriormente à fascia transversalis, com pontos em U e plicatura dos mm. Rectus Abdominis; B: A aproximação e reposicionamento dos conteúdos intra-abdominais e vetores de tração também são observados.
Figura 3A - Paciente submetido a reforço com tela de polipropileno. A e B: Paciente no pré-operatório apresentando abaulamento abdominal.
Figura 3B - Paciente submetido a reforço com tela de polipropileno. C e D: Pós-operatório de 3 anos de abdominoplastia, com queixa de abaulamento abdominal recorrente no baixo ventre.
Figura 3C - Paciente submetido a reforço com tela de polipropileno. E e F: Pós-operatório de 5 anos de abdominoplastia secundária com tela de polipropileno, podemos observar a melhora do abaulamento infra-umbilical após a colocação da tela.
Figura 4A - Outro paciente submetido a reforço com tela de polipropileno. A e B: Paciente com abdominoplastia insatisfatória, feita por outro cirurgião, com abaulamento inferior e supraumbilical.
Figura 4B - Outro paciente submetido a reforço com tela de polipropileno. C e D: Pós-operatório de abdominoplastia secundária após 14 anos observando aumento da cicatriz umbilical e abaulamento do abdome supraumbilical.
Figura 4C - Outro paciente submetido a reforço com tela de polipropileno. E e F: Pós-operatório de abdominoplastia com tela de polipropileno após 1 ano mostrando melhora da cicatriz umbilical, observamos melhora da parede abdominal com discreta concavidade.

Todos os pacientes foram acompanhados nos primeiros 5 anos de pós-operatório com exames de ultrassom anuais da parede abdominal.

RESULTADOS

Durante nossa observação, os resultados estéticos e a integridade da parede abdominal foram mantidos a longo prazo e sem recidiva.

Por exemplo, apresentamos um caso representativo, paciente de 42 anos, previamente submetida à abdominoplastia por outro cirurgião com resultados insatisfatórios após avaliação, foi realizada uma abdominoplastia secundária com plicatura do músculo reto abdominal e retalho da aponeurose do obliquo externo8, observando melhoria, mas persistiu uma leve projeção abdominal superior. Ela retornou 14 anos depois reclamando do aumento da projeção abdominal superior. Nós indicamos a abdominoplastia com reforço da parede abdominal e tela de polipropileno, corrigindo totalmente a projeção abdominal, que se mantém mesmo em posição sentada.

Em todos os nossos casos, tivemos três complicações, dois pacientes apresentaram dor crônica intermitente localizada (laparodinias) melhorando com anti-inflamatórios convencionais e tratado com infiltrações de corticosteroides. Outra complicação apresentada foi fístula umbilical precoce de resolução rápida espontânea, independente da proposta.

As avaliações de satisfação foram obtidas usando Body-QoL®, que é uma ferramenta estruturada em 5 domínios com 20 questões no total. As perguntas são declarações do tipo Likert em que o paciente deve expressar seu grau de concordância com a afirmação declarada9. Aplicamos este instrumento aos pacientes no período pós-operatório de 6 meses e 5 anos, considerando os questionários finais aplicados como resultado final.

DISCUSSÃO

Conclui-se que não pode ser indicado como tratamento de primeira linha, pois muitos dos pacientes que apresentaram flacidez abdominal músculo aponeurótica obtiveram resultados satisfatórios com o tratamento convencional e, portanto, não foi necessário o reforço com tela de polipropileno. É necessário fazer uma boa avaliação dos fatores recorrentes, pois este tratamento é uma intervenção agressiva que só indicamos para alguns casos específicos.

Consideramos que o cirurgião deve conhecer e levar em conta o mio-dinamismo e a importância das camadas musculares na manifestação das protuberâncias abdominais, sendo o elemento mais importante o músculo abdominal transverso10. Sabemos que o músculo oblíquo externo determina uma tração lateral para cima e o oblíquo interno descendente age como duas forças antagônicas iguais, essas forças atuam de maneira harmônica. Por outro lado, sabemos também que a posição longitudinal do músculo reto abdominal ajuda a abordagem do tórax como antagonista dos músculos espinhais3,4,10. Da mesma forma, o músculo transverso permite contrair e expandir a parede abdominal, mantendo as vísceras na posição correta, trazendo os músculos anterolaterais contra a poderosa coluna4. Essas forças de tração fazem da linha Alba um ponto de suporte neutro. Permitindo que o conteúdo intra-abdominal esteja em perfeito equilíbrio, beneficiando uma função normal no diafragma superior, o que facilita a ventilação pulmonar e a dinâmica do complexo mesentérico. A ruptura desse equilíbrio pode levar a consequências como diástase dos retos, aumento real do continente abdominal, alteração no centro de gravidade, alteração da coluna lombar, lombalgia, queda de cúpulas diafragmáticas com diminuição da ventilação pulmonar e alterações digestivas decorrentes de luxações viscerais4. Baseamos nossa proposta na dinâmica abdominal, reforçando a parede muscular aponeurótica e, portanto, restaurando o equilíbrio abdominal.

Em nossa proposta, a tela é colocada acima da fáscia transversal e posterior ao reto abdominal, evitando a sensação de corpo estranho e proporcionando proteção adicional e diminuindo a possibilidade de infecção11.

CONCLUSÃO

Uma das desvantagens que encontramos ao longo de nossa experiência são os episódios de dor localizada intermitente (laparodinias). Devemos entender que a dor é uma complicação subjetiva e a melhora com o tratamento anti-inflamatório tem que ser levada em conta, além de refletir se é correto fazer uso da tela de polipropileno. Provavelmente, novos materiais como ADM e ULTRAPRO poderão ser incorporados na evolução de técnica, pois oferecem mais segurança devido ao menor número de reações relatadas em outros procedimentos11.

COLABORAÇÕES

AMLC

Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Concepção e desenho do estudo, Realização das operações e/ou experimentos, Supervisão.

JFJS

Análise e/ou interpretação dos dados, Coleta de Dados, Conceitualização, Concepção e desenho do estudo, Realização das operações e/ou experimentos, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição.

KSCM

Coleta de Dados, Conceitualização, Concepção e desenho do estudo, Realização das operações e/ou experimentos, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição

REFERÊNCIAS

1. Caldeira AML, Lucas A. Flacidez músculo-aponeurótica abdominal intensa y su tratamiento. Cir Plást Iberolatinoam. 1998;24(1):9-15.

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3. Testut L, Jacob O. Traité d’Anatomie Topographique. Avec Applications Médico-Chirurgicales. Paris: Gaston Doin; 1909.

4. Alcino LS, Pimenta LG. Técnica da Transposição Peritoneoaponeurótica Longitudinal Bilateral. In: Alcino LS, Luiz GP, editores. Hérnia Incisional. São Paulo: MEDSI; 2004.

5. Caldeira AML, Niéves PA, Oliveira AL. Cirurgia do Contorno Corporal – Reflexões sobre um novo enfoque da cirurgia plástica do abdome. I – Classificações das deformidades abdominais e suas correlações cirúrgicas. Rev Bras Cir. 1990; 80(2):95-104.

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8. Psillakis JM. Abdominoplasty: Some ideas to improve results. Aesth Plast Surg. 1978 Dec;2(1):205-215. DOI: 10.1007/bjs.1800590134

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11. Caldeira AML, Carrión K, Jaulis J. Repair of the Severe Muscle Aponeurotic Abdominal Laxity with Alloplastic Mesh in Aesthetic Abdominoplasty. Aesth Plast Surg. 2018 Feb;42(4):1039-1049. DOI: https://doi.org/10.1007/s00266-018-1101-6 DOI: https://doi. org/10.1007/s00266-018-1101-6











1. Instituto Avançado de Cirurgia Plástica Alberto Caldeira, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Autor correspondente: Alberto Magno Lott Caldeira Rua Visconde de Pirajá, 414, Grupo 1012, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP 22410-002. E-mail: lottcaldeira@gmail.com

Artigo submetido: 24/1/2019.
Artigo aceito: 24/6/2019.

Conflitos de interesse: não há.

Instituição: Instituto Avançado de Cirurgia Plástica, Hospital Casa Evangélico, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

 

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