INTRODUÇÃO
O aumento do dorso nasal nas rinoplastias demanda um bom planejamento pré-operatório,
boa execução intraoperatória e cuidados no pós-operatório. Numerosos materiais, incluindo
os sintéticos, autólogos e homólogos, principalmente a cartilagem, têm sido usados
para este fim1,2.
A utilização de cartilagem vem sendo amplamente estudada nas últimas décadas. O enxerto
é obtido a partir de cartilagem septal, conchal ou costal. Pode ser utilizada e moldada
de várias formas, sobrevivendo como um tecido vivo; a ocorrência de absorção, extrusão
e infecção é baixa. Além disso, há pouco estímulo à resposta imunológica1,3.
A cartilagem picada é uma versátil opção para enxertia cartilaginosa de preenchimento
e camuflagem. O processo é feito manualmente, obtendo-se pequenos cubos de menos de
um milímetro. O uso de fáscia para envolver a cartilagem picada pretende melhorar
o contorno, diminuir a palpabilidade e dispersibilidade dos enxertos; sendo descrito,
mais frequentemente, o uso de fáscia temporal para este fim1,3.
Relata-se um caso de paciente submetida a rinoplastia e mastopexia bilateral com próteses
no mesmo tempo cirúrgico. Neste caso, utilizamos fragmento de fáscia peitoral maior
para envolver a cartilagem costal picada, em técnica análoga à descrita por Erol,
em 20004.
RELATO DO CASO
Trata-se de R.K.S.M., 35 anos, submetida a rinoplastia estruturada, com aumento do
dorso e mastopexia com próteses, em 26 de janeiro de 2018 (Figura 1).
Figura 1 - Pré-operatório.
Figura 1 - Pré-operatório.
Realizou-se incisão no sulco mamário bilateralmente, sendo feito à direita dissecção
até o músculo peitoral maior e coleta de uma porção da sua fáscia, de aproximadamente
4cm x 4cm (Figuras 2-5).
Figura 2 - Fáscia do músculo peitoral maior direito.
Figura 2 - Fáscia do músculo peitoral maior direito.
Figura 3 - Marcação do fragmento de fáscia peitoral maior de tamanho 4cm x 4cm.
Figura 3 - Marcação do fragmento de fáscia peitoral maior de tamanho 4cm x 4cm.
Figura 4 - Excisão do fragmento de fáscia peitoral.
Figura 4 - Excisão do fragmento de fáscia peitoral.
Figura 5 - Fragmento de fáscia peitoral maior direita medindo 4cm x 4cm.
Figura 5 - Fragmento de fáscia peitoral maior direita medindo 4cm x 4cm.
Conforme descrito por Robotti e Penna5, as fibras do músculo peitoral maior são divulsionadas, evitando-se a secção das
mesmas. O sexto arco costal é acessado, sendo feita a diferenciação entre osso e cartilagem
através da cor e pela palpação com agulha. Desse modo, um fragmento inteiro de cartilagem
foi coletado, deixando-se o pericôndrio intacto posteriormente. A ferida é preenchida
com solução salina e a integridade da pleura é confirmada através de uma pressão ventilatória
positiva, realizada pelo anestesista. Seguiu-se com o fechamento por planos.
A fáscia coletada foi envolvida em uma seringa de 1ml e teve uma de suas extremidades
suturada, confeccionando-se, assim, uma bolsa aberta em uma de suas pontas, como na
técnica Turkish delight4. Através da extremidade aberta, preencheu-se a pequena bolsa de formato cilíndrico
com a cartilagem costal picada manualmente em pequenos cubos. A seguir, realizou-se
a sutura da extremidade aberta (Figura 6).
Figura 6 - Confecção da bolsa cilíndrica de fáscia peitoral, preenchida por cartilagem costal
picada com seringa de 1 ml.
Figura 6 - Confecção da bolsa cilíndrica de fáscia peitoral, preenchida por cartilagem costal
picada com seringa de 1 ml.
O cilindro de cartilagem picada envolvido por fáscia foi posicionado no dorso nasal
da paciente, promovendo seu aumento (Figura 7). Foi realizada a mastopexia com inclusão de próteses; a cirurgia seguiu sem intercorrências
e a paciente teve alta no 1º dia pós-operatório (DPO), em ótimo estado geral. No acompanhamento
ambulatorial, observou-se a estabilidade do enxerto no dorso nasal, 17 meses após
a cirurgia (Figura 8).
Figura 7 - Pós-operatório imediato
Figura 7 - Pós-operatório imediato
Figura 8 - A: Pré-operatório. B: 17 meses de pós-operatório.
Figura 8 - A: Pré-operatório. B: 17 meses de pós-operatório.
DISCUSSÃO
É frequente o uso da fáscia temporal profunda em rinoplastias primárias e secundárias,
pois possui boa flexibilidade e espessura, baixo índice de absorção e resistência
à infecção. Assim, a fáscia pode ser utilizada como cobertura do arcabouço osteocartilaginoso
nasal, para evitar que irregularidades se tornem aparentes, especialmente em pacientes
com pele fina. Também é utilizada para aumento do dorso nasal e melhor definição da
ponta5.
O uso da fáscia envolvendo a cartilagem picada também traz outros benefícios. Já foi
demonstrado que as partes picadas revestidas por fáscia coalescem em uma massa com
arquitetura organizada e com condrócitos que apresentam atividade metabólica normal.
Assim, temos um enxerto com adequada durabilidade e estabilidade2.
A coleta de fáscia temporal é um procedimento simples que, entretanto, necessita de
uma segunda incisão em um campo cirúrgico separado, acrescentando tempo e morbidade
à cirurgia; além de uma nova cicatriz. Existem relatos do uso de fáscia lata para
o mesmo fim, mas esta apresenta desvantagens relativas, como menor flexibilidade.
Cita-se ainda, a ocorrência de alopecia próximo à incisão cirúrgica temporal6.
Já a fáscia do músculo reto abdominal é comparativamente menos complacente e mais
espessa, além de ser importante para a integridade e contratilidade da parede abdominal.
Estudos feitos por As’adi et al., em 20149 e Cerkes e Basaran, em 201610, com fáscia do músculo reto abdominal e cartilagem picada para aumento do dorso nasal,
demonstraram boa viabilidade dos enxertos a longo prazo. Porém, mais estudos são necessários
acerca da estabilidade e contração do músculo reto abdominal7,8,9,10.
A fáscia peitoral maior é uma fina lâmina de tecido conjuntivo que cobre o músculo
peitoral maior, histologicamente e macroscopicamente semelhante a fáscia temporal.
Rotineiramente é dissecada e removida em mastectomias radicais oncológicas. Não são
necessárias manobras cirúrgicas específicas, para evitar deiscência do músculo peitoral
maior ou nenhuma outra complicação. Ademais, demonstrou-se que a retirada da fáscia
peitoral maior em mastectomias não influencia em sangramento pós-operatório e formação
de seromas7.
Em pacientes com necessidade de aumento de dorso nasal e em rinoplastias de revisão,
usualmente é feita a coleta de cartilagem costal autóloga, obtendo-se, assim, cartilagens
de boa qualidade para o aumento ou a estruturação nasal. A cartilagem costal possui
grandes vantagens sobre a auricular, no que diz respeito à quantidade e qualidade
do material coletado7,8.
Para a retirada da cartilagem, ao se escolher o quinto, sexto ou sétimo arco costal,
tem-se acesso à fáscia do peitoral maior pela mesma incisão. Deste modo, pode-se coletar
uma parte da fáscia para ser utilizada na rinoplastia, evitando-se outra incisão cirúrgica
e sua inerente morbidade7. No presente caso, a paciente foi submetida a uma mastopexia bilateral em conjunto
com a rinoplastia. Logo, através da incisão da mastopexia, foi possível a coleta de
fáscia peitoral e de cartilagem costal.
CONCLUSÃO
Portanto, a coleta e uso de fáscia peitoral, em casos que necessitam de cartilagem
costal, dispensa a necessidade de outra incisão e outra cicatriz; além de diminuir
a morbidade e o tempo cirúrgico. A fáscia do músculo peitoral maior mostrou ser uma
boa alternativa para uso em rinoplastias.
COLABORAÇÕES
CMV
|
Conceitualização, Metodologia, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão
e Edição, Visualização
|
LSC
|
Análise e/ou interpretação dos dados, Redação - Preparação do original
|
ASM
|
Redação - Preparação do original
|
MV
|
Análise e/ou interpretação dos dados, Redação - Preparação do original
|
DSOA
|
Redação - Preparação do original
|
KRO
|
Redação - Preparação do original
|
WCNBP
|
Aprovação final do manuscrito, Realização das operações e/ou experimentos, Supervisão
|
SMC
|
Supervisão
|
REFERÊNCIAS
1. Baser B, Kothari S, Thakur M. Diced cartilage: na effective graft for posttraumatic
and revision rhinoplasty. Indian J Otolaryngol Head Neck Surg. 2013 Aug;65(Suppl 2):356-359.
DOI: https://doi.org/10.1007/s12070-012-0525-6
2. Park P, Jin HR. Diced cartilage in fascia for major nasal dorsal augmentation in Asians:
a review of 15 consecutive cases. Aesth Plast Surg. 2016 Dec;40(6):832-839. DOI: https://doi.org/10.1007/s00266-016-0698-6
3. Bussi M, Palonta F, Toma S. Grafting in revision rhinoplasty. Acta Otorhinolaryngol
PMID: 23853414Ital. 2013;33(3):183-189.
4. Erol OO. The Turkish delight: a pliable graft for rhinoplasty. Plast Reconstr Surg.
2000 May;105(6):2229-41. DOI: https://doi.org/10.1097/00006534-200005000-00051
5. Park SW, Kim JH, Choi CY, Jung KH, Song JW. Various applications of deep temporal
fascia in rhinoplasty. Yonsei Med J. 2015 Jan;56(1):167-174. DOI: https://doi.org/10.3349/ymj.2015.56.1.167
6. Hodgkinson DJ, Valente V. The versatile posterior auricular fascia in secondary rhinoplasty
procedures. Aesth Plast Surg. 2017 Aug;41(4):893-897. DOI: https://doi.org/10.1007/s00266-017-0824-0
7. Xavier R. Pectoralis major fascia in rhinoplasty. Aesth Plast Surg. 2015 Mar;39(3):300-305.
DOI: https://doi.org/10.1007/s00266-015-0461-4
8. Daniel RK, Sajadian A. Secondary rhinoplasty: management of the overresected dorsum.
Facial Plast Surg. 2012 Aug;28(4):417-26. DOI: https://doi.org/10.1055/s-0032-1319840
9. As’adi K, Salehi SH, Shoar S. Rib diced cartilage-fascia grafting in dorsal nasal
reconstruction: a randomized clinical trial of wrapping with rectus muscle fascia
vs deep temporal fascia. Aesthet Surg J. 2014 Aug;34(6):NP21-31. PMID: 24879882 DOI:
https://doi.org/10.1177/1090820X14535078
10. Cerkes N, Basaran K. Diced Cartilage Grafts Wrapped in Rectus Abdominis Fascia for
Nasal Dorsum Augmentation. Plast Reconstr Surg. 2016 Jan;137(1):43-51. PMID: 26368329
DOI: https://doi.org/10.1097/PRS.0000000000001876
1. Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil.
2. Santa Casa de Misericórdia, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Autor correspondente: Camila Matos Versiani Rua Platina, 56, Apto 201, Belo Horizonte, MG, Brasil. CEP: 30411-092. E-mail: camilamversiani@hotmail.com
Artigo submetido: 25/10/2018.
Artigo aceito: 22/1/2019.
Instituição: Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Conflitos de interesse: não há.