INTRODUÇÃO
Define-se lipoma como um crescimento anormal benigno de adipócitos. Trata-se da
formação tumoral mais comum em tecidos moles e acomete, principalmente, adultos
entre 50 a 60 anos. A sua classificação histopatológica mais comum, dita lipoma
convencional, costuma se manifestar, sob a forma de massas móveis, indolores,
bem
capsuladas e amareladas. Ainda, são formadas por lipócitos maduros, crescem
lentamente e é comum que ocorram em áreas isoladas1. Entretanto, quando a tumoração cresce e comprime estruturas vitais,
pode ser sintomática e causar limitações funcionais como dor, linfedema e
parestesias2.
Em se tratando de uma neoplasia benigna, tais sintomas são comuns quando há
ocorrência de lipomas gigantes. Esses, por definição, devem possuir pelo menos
10cm
de diâmetro e massa superior a 1.000g3. Em tal
situação, é importante que seja feito o exame anatomopatológico para que seja
descartada malignidade. Por fim, embora sejam benignos e em sua maioria
assintomáticos, os lipomas gigantes podem ser tratados cirurgicamente, a depender
do
desconforto estético e, nos casos sintomáticos, do desconforto funcional do
paciente. Neste relato, objetiva-se relatar o diagnóstico e tratamento de um caso
de
lipoma gigante intermuscular.
OBJETIVO
Relatar o diagnóstico e tratamento de um caso de lipoma gigante intermuscular.
MÉTODO
Relato de caso de um lipoma gigante intermuscular em coxa direita com registro
cronológico de manejo diagnóstico e terapêutico, seguido de evolução de 16 anos.
Posteriormente, foi realizada revisão de literatura por meio de pesquisa nas bases
do MEDLINE, LILACS, SciELO e da Revista Brasileira de Cirurgia Plástica. Foram
utilizados os descritores para: Lipomatose, Neoplasias lipomatosas; Cirurgia
Plástica e Coxas do MeSH e do DeCs. O screening foi feito por
título, por resumo e, em seguida, pela leitura integral de estudos primários em
inglês e português.
RESULTADOS
Paciente J.T.M., 54 anos, sexo feminino, caucasiana, multípara. Referiu notar
crescimento progressivo e concêntrico de uma massa em coxa direita há 3 anos.
Negou
dor ou qualquer outro sintoma.
Ao exame físico, notou-se aumento acentuado do terço proximal da coxa direita. À
palpação, a tumoração apresentava-se indolor, com aspecto fibroelástico e móvel
com
relação aos planos profundos. A paciente não manifestava nem alterações cutâneas,
nem dificuldade locomotora na coxa direita (Figura 1).
Figura 1 - Vista anterior pré-operatória.
Figura 1 - Vista anterior pré-operatória.
Solicitada uma tomografia computadorizada, que revelou aumento de volume em face
interna da coxa direita, abaixo do músculo vasto medial, envolvendo tronco vascular
femoral.
A abordagem cirúrgica foi realizada sob anestesia peridural, com sedação; o acesso
foi por meio de incisão oblíqua em face medial da coxa direita, com a visualização
do músculo vasto medial da coxa protuso. Foi realizada miotomia com dissecção
e
ressecção do tumor, além do isolamento do pedículo vascular femoral, seguido de
hemostasia, colocação de dreno à vácuo e sutura por planos (Figuras 2 e 4).
Figura 2 - Incisão subfascial com vista do músculo vasto medial
Figura 2 - Incisão subfascial com vista do músculo vasto medial
Figura 3 - Dissecção do tumor com isolamento de pedículo vascular femural.
Figura 3 - Dissecção do tumor com isolamento de pedículo vascular femural.
Figura 4 - Vista anterior do pós-operátorio imediato
Figura 4 - Vista anterior do pós-operátorio imediato
Foi possível a exérese total do tumor, que, retirado, apresentou dimensões de 21,7cm
x 18cm x 8,7cm, e massa de 1.494g (Figura 5). A
análise anatomopatológica confirmou o diagnóstico de lipoma, de subtipo
fibrolipoma.
Figura 5 - Peça cirúrgica.
Figura 5 - Peça cirúrgica.
Realizado seguimento da paciente por 16 anos, durante os quais, não ocorreram
recidivas, nem tampouco limitações funcionais no membro inferior direito (Figura 6).
Figura 6 - Topografia do local da incisão 16 anos após o procedimento.
Figura 6 - Topografia do local da incisão 16 anos após o procedimento.
DISCUSSÃO
Lipomas são processos tumorais benignos de adipócitos e o tumor de partes moles mais
comuns na vida adulta1. Topograficamente,
podem ocorrem em quaisquer áreas que apresentem tecido adiposo, o que confere
ao
lipoma característica de ubiquidade4.
Entretanto, são mais comuns nas extremidades, sobretudo na coxa. Em nível de
anatomia histológica, possuem predileção pela hipoderme, embora possam acometer
região subfascial, podendo ser intramuscular, que corresponde de 0 a 5% dos casos,
e
intermuscular, que corresponde de 0,3 a 1,9% dos casos5. Os lipomas, ademais, costumam ser pequenos, isolados, móveis, moles,
indolores, capsulados e assintomáticos. O respectivo tratamento consiste em simples
excisão cirúrgica por razões de desconforto estético.
Os lipomas gigantes, por sua vez, são definidos como aqueles que possuem diâmetro
de
pelo menos 10cm e massa de pelo menos 1.000g3.
Além disso, costumam ser de mais rara ocorrência, acometendo estratos teciduais
profundos, como o do presente relato, podendo ser encontrados nos tecidos
subfasciais. São locais de predileção: região cervical, torácica e de membros
inferiores6. O crescimento desse tipo de
lipoma, na maioria dos casos, é lento e isolado, podendo apresentar evolução
superior a uma década4. Outrossim, são
geralmente assintomáticos, exceto nos casos em que o crescimento exacerbado do
tumor
cause a compressão de estruturas neurovasculares adjacentes2. A transformação maligna, lipossarcoma, originada de lipomas é
rara, porém já há relatos dessa associação7.
Nesses casos, a evolução tumoral é rápida, sintomática e capaz de gerar lesões
ulcerativas e de metastatizar. Por essa razão, os lipomas gigantes devem sempre
ser
submetidos à análise histopatológica, para que haja a devida diferenciação de
malignidade.
O diagnóstico clínico é importante e é principal fundamento para suspeita
diagnóstica, contudo, não é definitivo. A confirmação diagnóstica de lipoma é
dada
exclusivamente pelo exame histopatológico, por meio do qual, é possível realizar
a
distinção entre os subtipos: convencional; fibrolipoma; angiolipoma; lipoma de
células fusiformes e mielolipoma1. Impõe
destacar a relevância dos exames radiológicos: ultrassonografia, tomografia
computadorizada e ressonância magnética, as quais, além de serem capazes de auxiliar
no diagnóstico, são cruciais para a observação das correlações anatômicas do tumor,
e para a execução do plano cirúrgico, quanto à decisão da melhor rota
operatória.
O tratamento de escolha para os lipomas gigantes é cirúrgico, a depender do grau de
desconforto estético e funcional do paciente. Na maioria dos casos, é possível
obter
desfechos clínicos favoráveis, sem recidivas. Excetuam-se as exéreses parciais
de
lipoma intramuscular, cuja recidiva é mais provável5.
Dessarte, resta relatado um caso de exérese total de lipoma gigante intermuscular
assintomático em coxa, o qual possuía dimensões de 21,7cm x 18cm x 8,7cm e possuía
massa de 1.494g. Registra-se, ainda, a importância da tomografia computadorizada
como ferramenta de diagnóstico e sobretudo de planejamento cirúrgico, haja vista
a
complexidade da abordagem devido ao raro sítio em que o tumor se alojara:
profundamente ao músculo vasto medial, com envolvimento de pedículo vascular
femoral. Nesta oportunidade, a completa ressecção e cura do lipoma gigante foi
possível. Não houve recidivas após 16 anos de seguimento, o que resultou em desfecho
estético e funcional positivo após o tratamento cirúrgico.
REFERÊNCIAS
1. Kumar V, Abbas A, Fausto N. Robbins & Cotran - Patologia - Bases
Patológicas das Doenças. 9ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2016.
2. Mazzocchi M, Onesti MG, Pasquini P, et al. Giant fibrolipoma in the
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Sep/Oct;26(5B):3649-54.
3. Sanchez MR, Golomb FM, Moy JA, Potozkin JR. Giant lipoma: case
report and review of the literature. J Am Acad Dermatol. 1993 Feb;28(2 Pt
1):266-8.
4. Mordjikian E, Leão E. Giant lipoma of the thigh: case report. Rev
Bras Cir Plást. 2001;16(3):17-28.
5. d’Alessandro GS, Nunes TR, Lajner A, Beirigo MF, Porto O, Pinto WS.
Lipoma intermuscular gigante: relato de caso. Rev Bras Cir Plást.
2008;23(3):226-8.
6. Daher JC, Cammarota JDLGAMC, Benedik Neto A, Faria CADC. Giant
lipoma of the lower limb and its impact on the vascular system. Rev Bras Cir
Plást. 2013;28(3):522-5.
7. Bertozzi E, Migliano E, et al. Giant Mixed Lipoma/Liposarcoma of the
Thigh: Diagnostic Approaches and Surgical Management. Surg Curr Res.
2014;4(6):1-3. DOI: http://dx.doi.org/10.4172/2161-1076.1000206
1. Faculdade de Medicina Nova Esperança, Gramame,
João Pessoa, PB, Brasil.
2. Universidade Federal da Paraíba, Cidade
Universitaria, PB, Brasil.
Endereço Autor: José Romero de Almeida Ferreira
Filho, Av. Governador Argemiro de Figueiredo, nº 92, Jardim Oceania,
João Pessoa, PB, Brasil. CEP: 58037-030. E-mail:
romero_almeida@hotmail.com