INTRODUÇÃO
A cirurgia bariátrica tem se tornado a cada ano mais comum, em resposta à obesidade
e
suas comorbidades. Após a cirurgia bariátrica, os pacientes apresentam rápida
redução de peso e melhora das comorbidades relacionadas à obesidade. As mulheres,
no
pós-operatório da cirurgia bariátrica, apresentam mamas flácidas, ptóticas, com polo
superior vazio e plano. O aspecto das mamas após a perda de peso varia muito entre
uma paciente e outra; por isso, muitas técnicas podem ser empregadas1.
A mamoplastia com o uso de prótese é um procedimento comum e seguro na Cirurgia
Plástica, mas o mesmo não está isento de complicações. Algumas complicações são bem
conhecidas, como os seromas, hematomas e abscessos, mas há ainda algumas mais
incomuns com as quais o cirurgião pode deparar-se algum dia, como a galactocele2,3.
Há várias causas de hiperprolactinemia, que se enquadram em cinco grandes categorias:
fisiológicas, farmacológicas, doenças hipotalâmico-hipofisárias, doenças sistêmicas
e macroprolactinemia4.
OBJETIVO
Relatar o caso de uma complicação incomum de mastopexia com prótese pós-bariátrica,
a
galactocele/galactorreia, e discutir sobre suas possíveis causas e tratamento.
MÉTODO
Estudo retrospectivo e descritivo através da revisão de prontuário da paciente
submetida à cirurgia bariátrica e, posteriormente, à mamoplastia com prótese no
Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC-UFC), apresentando galactocele no
pós-operatório.
RELATO DE CASO
Paciente feminina, 33 anos, pós-bariátrica há 2 anos, com perda ponderal de 21kg no
período, apresentando queixa de flacidez mamária (Figuras 1 e 2), foi submetida à
mastopexia com prótese (275cc) periareolar. Evoluiu sem anormalidades até o 1º mês
de pós-operatório, quando foi observado aumento do volume das mamas associado a
flutuação, principalmente à esquerda e relato da paciente de episódio de saída de
secreção de aspecto leitoso pelo mamilo esquerdo e dor em mamas. Foi realizada
punção, com visualização de secreção de aspecto leitoso (Figura 3), e solicitado exames laboratoriais: B-HCG negativo,
TSH normal, prolactina aumentada (83.1 - valor normal de 1.9 a 25ng/ml).
Figura 1 - Pré-operatório (vista anterior).
Figura 1 - Pré-operatório (vista anterior).
Figura 2 - Pré-operatório (vista perfil-oblíquo esquerdo).
Figura 2 - Pré-operatório (vista perfil-oblíquo esquerdo).
Figura 3 - Líquido com aspecto leitoso puncionado das áreas de flutuação das
mamas.
Figura 3 - Líquido com aspecto leitoso puncionado das áreas de flutuação das
mamas.
Paciente com história de diagnóstico de transtorno misto ansioso depressivo,
acompanhada pela psiquiatria, fazia uso no período da cirurgia de Sertralina e
Topiramato. Realizou uso de Fluoxetina até o mês anterior a cirurgia.
Foi submetida a 2 punções aliviadoras no 2º mês de pós-operatório e suspenso
temporariamente a medicação antidepressiva, sendo encaminhada à psiquiatria para
troca da mesma.
No 3º mês de pós-operatório, apresentava resolução do quadro de
galactocele/galactorreia e estava em uso exclusivamente de Citalopram (Figuras 4 e 5).
Figura 4 - Pós-operatório: após resolução da galactocele (vista
anterior).
Figura 4 - Pós-operatório: após resolução da galactocele (vista
anterior).
Figura 5 - Pós-operatório: após resolução da galactocele (vista perfil-oblíquo
esquerdo).
Figura 5 - Pós-operatório: após resolução da galactocele (vista perfil-oblíquo
esquerdo).
Ao 5º mês, apresentou dosagem de prolactina de 9.7ng/ml e rippling,
principalmente em mama esquerda, estando em aguardo de procedimento de
lipoenxertia.
DISCUSSÃO
A mamoplastia com prótese não altera a função de lactação da mama. A abordagem
periareolar apresentou maior índice de complicação associada com a lactação.
Acredita-se que a manipulação dos ductos lactíferos durante a cirurgia esteja
relacionada com sua gênese3.
Quando se estuda a lactação, vê-se que a produção e expressão de leite ocorrem devido
à interação de alguns hormônios. A lactação parece ocorrer devido ao aumento dos
níveis de prolactina, na presença da queda dos níveis de estrogênio e progesterona,
e, enquanto isso, a ocitocina regula a ejeção de leite e é estimulada pelo reflexo
de sucção. Já o neuromodulador dopamina age inibindo a secreção de prolactina pela
neuro-hipófise2.
Devemos compreender esta fisiopatologia a fim de entendermos como a Sulpirida e
outros inibidores da dopamina, que interagem nesse ciclo hormonal, podem estimular
a
produção de leite e estar envolvidos na formação da galactocele. Além dos efeitos
sobre as vias dopaminérgicas, outros medicamentos causam hiperprolactinemia por
inibir a receptação da serotonina, como opiáceos, a Fluoxetina, a Cimetidina e a
Ranitidina. De modo contrário, agonistas da dopamina, como a Bromocriptina, também
inibirão a prolactina e consequentemente a lactação, sendo, portanto, essenciais no
tratamento da galactocele2,4.
Segundo Hugill, a lactação pode ser interrompida espontaneamente, sem medicação3. Harper, et al., orientam que
uma pronta drenagem do fluido e terapia hormonal concomitante com agonistas
dopaminérgicos devem ser iniciados. Já Chun e Taghinia recomendam apenas manejo
clínico com Bromocriptina2.
A dose de Bromocriptina utilizada é de 2,5mg, 2 vezes ao dia por 7 dias e de
Carbegolina é de 0,5mg, 1 a 2 comprimidos, por semana2,3. A Carbegolina,
mais recente agonista dopaminérgico, apresenta eficácia comparada à da Bromocriptina
e com maior tolerabilidade pelos reduzidos efeitos colaterais4.
Ao suspeitar de galactocele, a lesão deve ser drenada para que o diagnóstico seja
confirmado e a possibilidade de abscesso e consequente necessidade de
antibioticoterapia sejam afastadas2,3.
É recomendada avaliação endocrinológica para descartar alterações hipofisárias e
realização de dosagem de gonadotrofina coriônica humana (B-HCG), para descartar
gravidez. Se B-HCG for negativo, realiza-se ultrassonografia e drenagem guiada nos
casos de coleções (galactocele), associadas ao uso sistêmico de inibidores da
lactação. Para confirmação do diagnóstico de galactocele/galactorreia, é possível
a
dosagem de lactose da secreção3.
No caso relatado, após a confirmação de galactocele e hiperprolactinemia, foi optado
pela suspensão da medicação antidepressiva com sua troca posterior, associada à
drenagem por punções aspirativas, obtendo resolução completa do quadro de
galactocele/galactorreia e da hiperprolactinemia, demonstrando uma outra opção de
tratamento.
CONCLUSÃO
A possibilidade de complicação galactocele/galactorreia após mastopexia com prótese
deve ser lembrada, principalmente se o acesso cirúrgico for periareolar e a paciente
fizer uso de medicações que cursem com hiperprolactinemia, tendo várias
possibilidades terapêuticas desde conduta expectante a tratamento cirúrgico e/ou
farmacológico.
REFERÊNCIAS
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Bras Cir Plást. 2014;29(3):375-383. DOI:
http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2014RBCP0069
2. Viaro MSS, Viaro PS, Batistti C. Galactocele medicamentosa
pós-mamoplastia de aumento: relato de caso e revisão da literatura. Rev Bras Cir
Plást. 2016;31(2):287-291. DOI:
http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2016RBCP0047
3. Ascenço ASK, Graf R, Maluf Junior I, Balbinot P, Freitas RS.
Galactorreia: como abordar essa complicação incomum após mamoplastia de aumento.
Rev Bras Cir Plást. 2016;31(2):143-147. DOI:
http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2016RBCP0024
4. Nahas EAP, Nahás-Neto J, Pontes A, Dias R, Fernandes CE. Estados
hiperprolactinêmicos - inter-relações com o psiquismo. Rev Psiquiatr Clín
[Internet]. 2006; [citado 2019 mai 21]; 33(2):68-73. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-60832006000200006&lng=pt
http://dx.doi.org/10.1590/S0101-60832006000200006 DOI:
https://doi.org/10.1590/S0101-60832006000200006
1. Hospital Universitário Walter Cantídio, Rodolfo
Teófilo, Fortaleza, CE, Brasil.
2. Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE,
Brasil.
Endereço Autor: Eudemara Fernandes de Holanda, Rua
Isaías Domingos Silveira, 149, bairro De Lourdes , Fortaleza, CE, Brasil. CEP:
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