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Articles - Year 2019 - Volume 34 - (Suppl.3)
Galactorreia associada à mamoplastia pós-bariátrica: relato de caso
RESUMO
Introdução: Pacientes pós-bariátricos apresentam rápida redução de peso e melhora das
comorbidades relacionadas à obesidade. As mulheres apresentam mamas
flácidas, ptóticas, com polo superior vazio e plano. Apesar da mamoplastia
com o uso de prótese ser considerado um procedimento comum e seguro, o mesmo
não está isento de complicações. Algumas complicações são bem conhecidas,
como os seromas, hematomas e abscessos, mas há ainda algumas mais incomuns
como a galactocele. No presente artigo, relatamos um caso de galactocele
após mamoplastia com prótese em paciente pós-bariátrica acompanhada em nosso
Serviço, e discutimos sobre as possíveis causas e possibilidades
terapêuticas apresentadas na literatura.
Método: Estudo retrospectivo e descritivo através da revisão de prontuário da
paciente do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Walter
Cantídio (HUWC-UFC).
Conclusões: A possibilidade de galactocele/galactorreia após mastopexia com prótese deve
ser lembrada, tendo várias possibilidades terapêuticas, desde conduta
expectante a tratamento cirúrgico e/ou farmacológico.
Palavras-chave: Mamoplastia; Cirurgia bariátrica; Galactorreia; Implante mamário; Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos
INTRODUÇÃO
A cirurgia bariátrica tem se tornado a cada ano mais comum, em resposta à obesidade e suas comorbidades. Após a cirurgia bariátrica, os pacientes apresentam rápida redução de peso e melhora das comorbidades relacionadas à obesidade. As mulheres, no pós-operatório da cirurgia bariátrica, apresentam mamas flácidas, ptóticas, com polo superior vazio e plano. O aspecto das mamas após a perda de peso varia muito entre uma paciente e outra; por isso, muitas técnicas podem ser empregadas1.
A mamoplastia com o uso de prótese é um procedimento comum e seguro na Cirurgia Plástica, mas o mesmo não está isento de complicações. Algumas complicações são bem conhecidas, como os seromas, hematomas e abscessos, mas há ainda algumas mais incomuns com as quais o cirurgião pode deparar-se algum dia, como a galactocele2,3.
Há várias causas de hiperprolactinemia, que se enquadram em cinco grandes categorias: fisiológicas, farmacológicas, doenças hipotalâmico-hipofisárias, doenças sistêmicas e macroprolactinemia4.
OBJETIVO
Relatar o caso de uma complicação incomum de mastopexia com prótese pós-bariátrica, a galactocele/galactorreia, e discutir sobre suas possíveis causas e tratamento.
MÉTODO
Estudo retrospectivo e descritivo através da revisão de prontuário da paciente submetida à cirurgia bariátrica e, posteriormente, à mamoplastia com prótese no Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC-UFC), apresentando galactocele no pós-operatório.
RELATO DE CASO
Paciente feminina, 33 anos, pós-bariátrica há 2 anos, com perda ponderal de 21kg no período, apresentando queixa de flacidez mamária (Figuras 1 e 2), foi submetida à mastopexia com prótese (275cc) periareolar. Evoluiu sem anormalidades até o 1º mês de pós-operatório, quando foi observado aumento do volume das mamas associado a flutuação, principalmente à esquerda e relato da paciente de episódio de saída de secreção de aspecto leitoso pelo mamilo esquerdo e dor em mamas. Foi realizada punção, com visualização de secreção de aspecto leitoso (Figura 3), e solicitado exames laboratoriais: B-HCG negativo, TSH normal, prolactina aumentada (83.1 - valor normal de 1.9 a 25ng/ml).
Paciente com história de diagnóstico de transtorno misto ansioso depressivo, acompanhada pela psiquiatria, fazia uso no período da cirurgia de Sertralina e Topiramato. Realizou uso de Fluoxetina até o mês anterior a cirurgia.
Foi submetida a 2 punções aliviadoras no 2º mês de pós-operatório e suspenso temporariamente a medicação antidepressiva, sendo encaminhada à psiquiatria para troca da mesma.
No 3º mês de pós-operatório, apresentava resolução do quadro de galactocele/galactorreia e estava em uso exclusivamente de Citalopram (Figuras 4 e 5).
Ao 5º mês, apresentou dosagem de prolactina de 9.7ng/ml e rippling, principalmente em mama esquerda, estando em aguardo de procedimento de lipoenxertia.
DISCUSSÃO
A mamoplastia com prótese não altera a função de lactação da mama. A abordagem periareolar apresentou maior índice de complicação associada com a lactação. Acredita-se que a manipulação dos ductos lactíferos durante a cirurgia esteja relacionada com sua gênese3.
Quando se estuda a lactação, vê-se que a produção e expressão de leite ocorrem devido à interação de alguns hormônios. A lactação parece ocorrer devido ao aumento dos níveis de prolactina, na presença da queda dos níveis de estrogênio e progesterona, e, enquanto isso, a ocitocina regula a ejeção de leite e é estimulada pelo reflexo de sucção. Já o neuromodulador dopamina age inibindo a secreção de prolactina pela neuro-hipófise2.
Devemos compreender esta fisiopatologia a fim de entendermos como a Sulpirida e outros inibidores da dopamina, que interagem nesse ciclo hormonal, podem estimular a produção de leite e estar envolvidos na formação da galactocele. Além dos efeitos sobre as vias dopaminérgicas, outros medicamentos causam hiperprolactinemia por inibir a receptação da serotonina, como opiáceos, a Fluoxetina, a Cimetidina e a Ranitidina. De modo contrário, agonistas da dopamina, como a Bromocriptina, também inibirão a prolactina e consequentemente a lactação, sendo, portanto, essenciais no tratamento da galactocele2,4.
Segundo Hugill, a lactação pode ser interrompida espontaneamente, sem medicação3. Harper, et al., orientam que uma pronta drenagem do fluido e terapia hormonal concomitante com agonistas dopaminérgicos devem ser iniciados. Já Chun e Taghinia recomendam apenas manejo clínico com Bromocriptina2.
A dose de Bromocriptina utilizada é de 2,5mg, 2 vezes ao dia por 7 dias e de Carbegolina é de 0,5mg, 1 a 2 comprimidos, por semana2,3. A Carbegolina, mais recente agonista dopaminérgico, apresenta eficácia comparada à da Bromocriptina e com maior tolerabilidade pelos reduzidos efeitos colaterais4.
Ao suspeitar de galactocele, a lesão deve ser drenada para que o diagnóstico seja confirmado e a possibilidade de abscesso e consequente necessidade de antibioticoterapia sejam afastadas2,3.
É recomendada avaliação endocrinológica para descartar alterações hipofisárias e realização de dosagem de gonadotrofina coriônica humana (B-HCG), para descartar gravidez. Se B-HCG for negativo, realiza-se ultrassonografia e drenagem guiada nos casos de coleções (galactocele), associadas ao uso sistêmico de inibidores da lactação. Para confirmação do diagnóstico de galactocele/galactorreia, é possível a dosagem de lactose da secreção3.
No caso relatado, após a confirmação de galactocele e hiperprolactinemia, foi optado pela suspensão da medicação antidepressiva com sua troca posterior, associada à drenagem por punções aspirativas, obtendo resolução completa do quadro de galactocele/galactorreia e da hiperprolactinemia, demonstrando uma outra opção de tratamento.
CONCLUSÃO
A possibilidade de complicação galactocele/galactorreia após mastopexia com prótese deve ser lembrada, principalmente se o acesso cirúrgico for periareolar e a paciente fizer uso de medicações que cursem com hiperprolactinemia, tendo várias possibilidades terapêuticas desde conduta expectante a tratamento cirúrgico e/ou farmacológico.
REFERÊNCIAS
1. Rosique MJF, Rosique RG. Mamoplastia após grande perda ponderal. Rev Bras Cir Plást. 2014;29(3):375-383. DOI: http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2014RBCP0069
2. Viaro MSS, Viaro PS, Batistti C. Galactocele medicamentosa pós-mamoplastia de aumento: relato de caso e revisão da literatura. Rev Bras Cir Plást. 2016;31(2):287-291. DOI: http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2016RBCP0047
3. Ascenço ASK, Graf R, Maluf Junior I, Balbinot P, Freitas RS. Galactorreia: como abordar essa complicação incomum após mamoplastia de aumento. Rev Bras Cir Plást. 2016;31(2):143-147. DOI: http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2016RBCP0024
4. Nahas EAP, Nahás-Neto J, Pontes A, Dias R, Fernandes CE. Estados hiperprolactinêmicos - inter-relações com o psiquismo. Rev Psiquiatr Clín [Internet]. 2006; [citado 2019 mai 21]; 33(2):68-73. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-60832006000200006&lng=pt http://dx.doi.org/10.1590/S0101-60832006000200006 DOI: https://doi.org/10.1590/S0101-60832006000200006
1. Hospital Universitário Walter Cantídio, Rodolfo
Teófilo, Fortaleza, CE, Brasil.
2. Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE,
Brasil.
Endereço Autor: Eudemara Fernandes de Holanda, Rua Isaías Domingos Silveira, 149, bairro De Lourdes , Fortaleza, CE, Brasil. CEP: 60177-180. E-mail: eudemaraholanda@yahoo.com.br