INTRODUÇÃO
O câncer de mama é a neoplasia maligna1 mais
comum na mulher. Além do tratamento oncológico eficaz, a reconstrução mamária
pós-mastectomia com resultados estéticos satisfatórios é importante para melhora da
autoestima dessas pacientes. Entre as diversas técnicas de reconstrução, o retalho
miocutâneo grande dorsal consiste em umas das técnicas mais frequentemente
utilizadas, devido a sua segurança vascular e poucos índices de complicações se
comparadas a outros retalhos autólogos2,3.
Descrito pela primeira vez por Iginio Tansini4,
o retalho grande dorsal apresenta como complicação mais frequente o seroma na área
doadora (dorso), com incidência de até 90% dos casos5. A ocorrência dessa complicação tem como consequência o aumento da
taxa de deiscência de ferida, infecção, necrose do retalho6 e necessidade de drenagem percutânea em alguns casos.
Diversas técnicas para evitar a formação de seroma são descritas, tais como dreno
de
sucção, colas de fibrina6 e a sutura de
adesão. Estudos sobre a utilização de sutura de adesão em retalho grande dorsal
foram descritos com evidências razoavelmente convincentes sobre a eficácia na
prevenção de seroma na área doadora do retalho7.
OBJETIVO
Este trabalho tem como objetivo avaliar a efetividade da sutura de adesão como
prevenção da formação de seroma em retalho grande dorsal nas cirurgias de
reconstrução de mama.
MÉTODO
O trabalho incluiu 43 pacientes submetidas a reconstrução de mama com retalho grande
dorsal no serviço de Cirurgia Plástica Hospital São Lucas PUCRS durante o período
de
agosto 2012 a fevereiro 2019. Consiste em um estudo longitudinal retrospectivo que
avaliou o índice de seroma em pacientes submetidas a reconstrução de mama com
retalho grande dorsal. As pacientes foram separadas em dois grupos: reconstrução com
retalho grande dorsal com sutura de adesão em área doadora versus
pacientes submetidas a reconstrução, porém sem sutura de adesão em área doadora.
Essa divisão é cronológica, pois a partir de 2017 o serviço começou a realizar
suturas de adesão em todas as pacientes submetidas a reconstrução com retalho grande
dorsal, o que anteriormente não era realizado. Todas as pacientes utilizaram dreno
de portovac durante a média de 14,34 dias, em que os critérios de retirada do dreno
foram: drenagem menor que 30 mL/dia e secreção serosa em dois dias consecutivos.
Para análise de dados foi utilizado o programa SPSS, sendo realizado o teste exato
de Fisher e análise percentual dos dados.
Os critérios de inclusão foram todas pacientes submetidas a reconstrução mamária com
retalho grande dorsal com ou sem prótese mamária em reconstrução imediata
pós-mastectomia, reconstrução tardia primária ou secundária (complicação de
reconstrução prévia). Os critérios de exclusão foram as pacientes que não realizaram
seguimento pós-operatório, ou submetidas a outros procedimentos simultâneos. Outras
variáveis como comorbidades, idade e índice de massa corporal não foram analisados
neste estudo.
RESULTADOS
Em nosso trabalho, 43 pacientes foram analisadas no pós-operatório quanto ao
desenvolvimento de seroma em área doadora. A análise foi retrospectiva, em cirurgias
de reconstrução mamária no Hospital São Lucas da PUCRS durante o período agosto 2012
a fevereiro 2019. As suturas de adesão foram realizadas em 20 pacientes, sendo essas
comparadas com 23 pacientes em que não foram realizadas as suturas de adesão (Figuras 1 e 2).
Figura 1 - Marcação anterior da área receptora de retalho miocutâneo grande
dorsal.
Figura 1 - Marcação anterior da área receptora de retalho miocutâneo grande
dorsal.
Figura 2 - Marcação posterior da área de pele a ser utilizada no retalho
miocutâneo grande dorsal.
Figura 2 - Marcação posterior da área de pele a ser utilizada no retalho
miocutâneo grande dorsal.
Entre as pacientes em que realizamos sutura de adesão, 20% (quatro pacientes)
desenvolveram seroma, enquanto no grupo sem sutura, 21% (cinco pacientes)
apresentaram esta complicação. A aplicação do teste exato de Fisher não evidenciou
diferença estatística significante na incidência do seroma entre os grupos
comparados (Gráfico 1).
Grafico 1 - Gráfico evidenciando incidência de seroma em grupos analisados (grupo
sem sutura de adesão versus grupo com sutura de adesão) em reconstruções
mamárias com retalho grande dorsal.
Grafico 1 - Gráfico evidenciando incidência de seroma em grupos analisados (grupo
sem sutura de adesão versus grupo com sutura de adesão) em reconstruções
mamárias com retalho grande dorsal.
DISCUSSÃO
Reconstruções mamárias com uso de expansores de tecido ou próteses podem deixar de
fornecer tamanho, forma e volume necessário para atender os resultados estéticos
desejados.
Esse fato, na maioria das vezes, é devido à escassez de tecido mole após mastectomia.
Nesses casos, a indicação da reconstrução mamária com tecido autólogo de retalho
grande dorsal proporcionará contornos suaves e naturais, podendo ser adicionado o
uso de próteses mamárias associadas para alcançar volume adequado. Entre os retalhos
utilizados para a reconstrução, o retalho grande dorsal consiste na técnica mais
utilizada devido a eficiente vascularização por meio da artéria toracodorsal, baixa
morbidade e por promover alto grau de satisfação das pacientes2.
O músculo grande dorsal é um músculo triangular com cerca de 25×35 cm e cobre
o segmento posterior do tronco. Tem sua origem na crista ilíaca, nas seis vertebras
torácicas inferiores e terço inferior da quarta costela lateralmente, onde está
associado com origem do músculo oblíquo externo. O pedículo dominante é composto da
artéria toracodorsal, duas veias e nervo toracodorsal, classificado como retalho
tipo V de Mathes Nahai. A artéria toracodorsal tem 8 cm de comprimento e diâmetro
de
2,5 mm. Devido ao calibre do vaso, previsibilidade e variação anatômica mínima,
essas características fazem com que o retalho grande dorsal seja uma opção segura
para reconstruções de mama. A sua função de aduzir, estender e girar o úmero
medialmente, são preservadas pelo restante dos músculos da cintura escapular, não
ocasionando assim déficit funcional ao paciente.
Apesar de sua segurança vascular, complicações são relatadas no pós-operatório de
reconstruções com RGD (retalho grande dorsal), entre elas, hematoma, seroma,
deiscência de sutura e até mesmo necrose com perda do retalho. O seroma consiste na
complicação mais frequente10 – com incidência
de até 90% dos casos5. O seroma é definido
como uma coleção de fluido seroso contendo plasma sanguíneo e ou linfa11. Seu desenvolvimento é multifatorial,
podendo ocorrer devido a lesão térmica ao tecido durante a hemostasia, rupturas dos
linfáticos, capilares, liberação de mediadores inflamatórios e espaço morto
ocasionado pelo descolamento necessário6.
Estudos relatam como fatores de risco para o desenvolvimento de seroma:
comorbidades, idade, obesidade e história de tabagismo.8 A fim de evitá-los, muitos estudos analisam o uso de curativos
externos compressivos, suturas de adesão, escleroterapia, cola de fibrina e até
mesmo agentes quimioterápicos aplicados localmente6. Os drenos de sucção têm sido utilizados rotineiramente, o que
consiste no método mais utilizado para a prevenção de seroma6,7.
Um método mecânico para redução de seroma foi relatado recentemente6, descrito por Gisquet e cols., 2009: as
suturas de adesão ou pontos captonados (capittonné) são utilizados na prevenção de
seroma. A técnica é descrita realizando suturas de adesão entre a fáscia superficial
e parede torácica, utilizando fio reabsorvível vicryl 1. Forças de tração cutânea
são distribuídas entre esses pontos, o que permite um fechamento livre de tensão na
cicatriz e redução do espaço morto5.
No nosso trabalho, a utilização da sutura de adesão não demonstrou reduzir a
incidência de seroma; a limitação da análise e resultado dos dados foi o tamanho
pequeno da amostra. No entanto, observamos em nossa rotina diária que os pontos de
adesão, além do possível benefício na prevenção de seroma – demonstrado em alguns
trabalhos, também evitam tensão na cicatriz em dorso, proporcionando melhor
resultado estético e menor índice de complicações como deiscência de sutura.
CONCLUSÃO
Sendo assim, o retalho grande dorsal é uma excelente opção para reconstruções
mamárias. O uso desse retalho tem se mostrado um método efetivo e estético cada vez
mais utilizado após mastectomia. Sua principal complicação consiste no seroma em
área doadora. Várias são as técnicas descritas para prevenção dessa complicação,
entre elas dreno de sucção, cola de fibrina e pontos de adesão. A análise dos dados
do trabalho realizado não evidenciou diferença estatística significante entre os
grupos comparados (com sutura de adesão versus sem sutura), tendo
como limitação do estudo o pequeno tamanho da amostra (43 pacientes). Diversos
trabalhos publicados consideram as suturas de adesão como uma técnica efetiva e
essencial para a prevenção de seroma em área doadora do retalho grande dorsal5,7,10,11. Em nossa prática diária, continuamos
utilizando a sutura de adesão, tendo como principais objetivos: a prevenção da
formação de seroma, menor tensão na cicatriz de área doadora, resultando em menor
índice deiscência de ferida operatória. A prevenção dessa complicação é de suma
importância, pois resulta em menor morbidade desse procedimento e maior índice de
satisfação dessas pacientes.
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1. Hospital São Lucas Pontífica Universidade
Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.
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Brasil CEP 90420-111; E-mail:
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