INTRODUÇÃO
No Brasil e no mundo, vem aumentando o número de pacientes que se submetem a
realização de cirurgia estética ou reparadora com uso de prótese mamária. A
mamoplastia de aumento teve um crescimento de 64% no número de procedimentos
realizados desde o ano de 2000, tornando-se um dos procedimentos cirúrgicos
estéticos mais realizados no mundo. No Brasil, é o segundo procedimento cirúrgico
estético mais realizado6.
As próteses de silicone podem ser colocadas sob o músculo peitoral (submuscular),
sob
a glândula mamária (subglandular) ou por técnica dual plane, na
qual a prótese contempla os dois planos. As técnicas de inserção da prótese podem
ser inframamária, transaxilar, periareolar ou transareolar. No Brasil, a abordagem
mais usada é a inframamária, usando-se o sulco mamário para a inserção da prótese,
o
que limita o risco de contaminação pela flora endógena da mama, porém resulta em
cicatriz visível.
Dentre as complicações pós-operatórias, as mais comumente relatadas são infecção,
hematoma e contratura capsular, mas suas frequências diferem7. Um estudo retrospectivo realizado com 3.002 mulheres com
aumento estético primário de mama evidenciou frequência de 4,6% de complicações,
sendo essas com hematomas em 1,5%, contraturas capsulares em 0,5% e infecções
representando 1,1%8. Em outro estudo
prospectivo realizado na Dinamarca em 1.090 mulheres submetidas a aumento estético
de mama, foram observadas 4,1% com contratura capsular, 1,1% com hematomas e 0,8%
registradas com infecção9.
A mama humana não é uma estrutura estéril, pois contém a flora endógena derivada do
mamilo. Essa flora pode ser responsável pela contaminação da prótese no momento da
implantação, em particular quando se usam técnicas cirúrgicas com abordagem via
periareolar ou transareolar9.
A infecção pós-operatória é uma complicação pouco comum no implante de prótese
mamária, ocorrendo em cerca de 2% nos casos estéticos1 e até 20% nas cirurgias reconstrutivas,2 sendo que em 2/3 dos casos, a infecção ocorre dentro dos 12 meses do
pós-operatório3. Apesar de incomum, a
infecção periprotética é a complicação mais temida e que inclusive pode levar ao
óbito por choque tóxico-infeccioso2. Entre
esses casos, a grande maioria das infecções são causada por bactérias
Gram-positivas, especificamente o Staphylococcus aureus e
Staphylococcus epidermidis1.
Associado aos procedimentos de assepsia e antissepsia, para o implante de próteses
é
recomendável o uso profilático de antibióticos que se concentram na atividade das
bactérias em questão, recomendando-se o uso de cefalosporina de primeira geração,
como a cefazolina intravenosa (1 g administrado dentro de 30 minutos antes da
incisão e por até 10 dias no pós-operatório.)1.
Como qualquer colocação de implante, as medidas de prevenção de infecção devem ser
tomadas. A Sociedade Francesa de Higiene Hospitalar (SFHH), em um consenso em 2004,
sugere medidas como rastreamento de transporte nasal de S. aureus;
tratamento com mupirocina; profilaxia antibiótica intravenosa na indução anestésica;
não depilação ou, em caso de depilação, realizar tricotomia fora do quarto; banho
com antisséptico no dia anterior e na manhã da operação no campo cirúrgico; não
secar o antisséptico; evitar tecidos 100% algodão; Mminimizar a exposição ao ar e
manipulações dos implantes; hemostasia.
Após identificado o quadro de infecção dos implantes mamários, embora tenhamos poucos
estudos na literatura como proposta de protocolo no tratamento, sugere-se a
utilização de antibioticoterapia, irrigação e a remoção precoce do implante mamário
para evitar a extrusão do implante e contratura tecidual3, e a reinserção tardia após o desaparecimento do processo
infeccioso4, por pelo menos após 6
meses5, gerando importantes implicações
psicológicas para a paciente.
OBJETIVO
Este trabalho tem como objetivo relatar o caso de uma paciente que evoluiu com
infecção de prótese mamária em pós-operatório precoce, sendo submetida a tratamento
conservador com sucesso sem necessidade de intervenção cirúrgica.
MÉTODO
BMS, feminina, 19 anos, submetida a mamoplastia de aumento no dia 18 de dezembro de
2018, por meio de técnica dual plane, prótese Polytech, 300 mL,
extra alto, microtexturizada.
Técnica utilizada: (1) paciente em decúbito dorsal, submetida a anestesia geral; (2)
assepsia e antissepsia e colocação de campos estéreis; (3) infiltração com solução
anestésica e incisão em sulco inframamário; (4) dissecção do plano subglandular até
a região do bordo inferior da aréola onde foi divulsionado e dissecado o plano
submuscular; (5) realizado revisão de hemostasia rigorosa, lavagem da loja com SF
0,9% e keflin; (6) colocação de próteses bilateralmente e dreno de portovac; (7)
fechamento em três planos com náilon 3.0, 4.0 e monocryl 4.0; (8) curativo e
soutien cirúrgico.
Paciente recebeu profilaxia com keflin 1 g, endovenosa, 30 minutos antes da incisão
anestésia e a cada 6 horas por dia via endovenosa. Recebeu alta na manhã seguinte
com recomendações e uso de ciprofloxacino por 7 dias.
RESULTADOS
Primeiro retorno foi realizado com 9 dias, paciente com ótima evolução
pós-operatória. Ao 12º dia pós-operatório, paciente relata por meio de contato com
médico assistente a saída de secreção purulenta em incisão inframamária direita.
Paciente foi atendida e evidenciado por meio de exame físico a saída de grande
quantidade de secreção purulenta. Foi iniciada antibioticoterapia com amoxicilina
+
clavulanato 875 mg associada à clindamicina 300 mg empiricamente e foi coletado
material para cultura. Foi optado pela equipe a limpeza diária da loja com soro
fisiológico 100 mL enquanto aguardava resultado da cultura.
Resultado da cultura (Figuras 1, 2 e 3)
demonstrou contaminação por Staphylococcus aureus sensível a
sulfametoxazol + trimetropim e resistente à antibioticoterapia inicialmente
utilizada; foi optado então pela troca da medicação e manutenção da limpeza diária
com 100 mL de soro fisiológico 0,9%.
Figura 1 - Pré operatório.
Figura 1 - Pré operatório.
Figura 2 - Pós Operatório imediato.
Figura 2 - Pós Operatório imediato.
Figura 3 - Cultura e antibiograma.
Figura 3 - Cultura e antibiograma.
A paciente foi mantida com a conduta por 25 dias, com melhora diária significativa
e
parada total da eliminação de líquido purulento. Após esse período foram realizados
pontos de reforço na incisão e solicitada ultrassonografia de controle; esta foi
realizada com 42 dias de pós-operatório e laudo apresentou-se sem alterações
detectáveis ao método (Figuras 4 e 5).
Figura 5 - Ultrassonografia 42 PO.
Figura 5 - Ultrassonografia 42 PO.
DISCUSSÃO
A infecção é sem dúvida uma das complicações mais temidas após colocação de prótese
mamária, traz consigo uma série de dúvidas para a equipe médica e pode abalar
seriamente a relação médico/paciente. A literatura sobre o assunto relata uma taxa
de infecção entre 1% a 35% dos casos; em sua grande maioria esses estudos abordam
infecção de próteses após mastectomias. A terapia com antibiótico é sem dúvida a
mais conservadora, porém seus resultados são inconsistentes: sucesso sem necessidade
de remoção da prótese em menos de 25% dos casos10.
CONCLUSÃO
Atualmente não há nenhum protocolo sobre o assunto, orientação sobre o tempo de
antibiótico pós-operatório ou conduta definida após diagnóstico de infecção. Sabe-se
que na grande maioria dos casos a retirada da prótese é inevitável. Este relato de
caso abre a discussão para realização de estudos mais específicos e montagem de
protocolos específicos para segurança da equipe cirúrgica e do paciente.
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5(supl 9):56-7.
1. Serviço de Cirurgia Plástica Dr. Ewaldo Bolivar
de Souza Pinto, São Paulo, SP, Brasil.
2. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São
Paulo, SP, Brasil.
Endereço Autor: Pedro Cordova Avenida Ana Costa, nº
120 - Gonzaga, Santos, SP, Brasil CEP 11060000 E-mail:
pedro_cordova@hotmail.com