INTRODUÇÃO
Queimaduras são lesões de grande morbidade e mortalidade que geram considerável ônus
para o país. Observa-se grande incidência de queimaduras, fomentando pesquisas para
entender suas causas, distribuição e maneiras de combater esse agravo à saúde
pública.
No Brasil, as queimaduras representam um agravo significativo à saúde pública.
Algumas pesquisas apontam que, entre os casos de queimaduras notificados no país,
a
maior parte ocorre nas residências das vítimas e quase a metade das ocorrências
envolve a participação de crianças. Entre as queimaduras mais comuns, tendo as
crianças como vítimas, estão as decorrentes de escaldaduras (manipulação de líquidos
quentes, como água fervente, pela curiosidade característica da idade) e as que
ocorrem em casos de violência doméstica. Por sua vez, entre os adultos do sexo
masculino, as queimaduras mais frequentes ocorrem em situações de trabalho. Idosos
também compreendem um grupo de risco, principalmente por limitações relacionadas à
idade1.
As queimaduras são acidentes relativamente comuns que requerem tratamento hospitalar
específico multiprofissional dependendo da gravidade da lesão. As repercussões para
a vítima variam de uma lesão superficial ao óbito, dependendo da gravidade e
extensão, profundidade e localização das lesões, com a possibilidade de tempo
prolongado de internação, de tratamento doloroso e de alto custo com sequelas
físicas, psíquicas e sociais com resultados funcionais e estéticos, que nem sempre
são satisfatórios.
Segundo a Sociedade Brasileira de Queimaduras, no Brasil acontecem um milhão de casos
de queimaduras a cada ano; 200 mil são atendidos em serviços de emergência, e 40 mil
demandam hospitalização2. As causas mais
frequentes das queimaduras são a chama de fogo, o contato com água fervente ou
outros líquidos quentes e o contato com objetos aquecidos. Menos comuns são as
queimaduras provocadas pela corrente elétrica, transformada em calor ao contato com
o corpo3. Esse tipo de evento constitui, nas
diferentes idades, a terceira causa de óbito por trauma e a segunda em menores de
quatro anos, tendo na maioria dos casos uma ocorrência acidental4.
A queimadura é uma ferida traumática causada, principalmente, por agentes térmicos,
químicos, elétricos ou radioativos. Acontece nos tecidos de revestimento do corpo
humano, podendo destruir parcial ou totalmente a pele e seus anexos, e também as
camadas mais profundas como tecido celular subcutâneo, músculos, tendões e
ossos5.
Diante de tais informações expostas, fica clara a importância de se comprometer com
publicações que tracem perfis epidemiológicos, de modo a melhor entender fatores
causais, distribuição e maneira de se evitarem tais acidentes. É de extrema
importância, em todas as áreas de atuação médica, o conhecimento da epidemiologia,
que fornece subsídios de avaliação e de organização de programas de tratamento e
campanhas de prevenção.
OBJETIVO
Este estudo teve como objetivo avaliar o perfil epidemiológico dos pacientes
atendidos no Hospital Universitário Evangélico Mackenzie de janeiro a dezembro de
2017, estratificando os pacientes quanto a sexo, idade, etiologia e pacientes
internados.
Estudar o perfil do paciente atendido nas unidades de queimaduras é tentar entender
os principais mecanismos e partir disso criar medidas para reduzir o número de
queimaduras que ocorrem. Os acidentes por esse tipo de lesão merecem abordagem
preventiva.
MÉTODO
Trata-se de um estudo epidemiológico observacional transversal, de caráter descritivo
quantitativo, retrospectivo, realizado por meio do acesso ao livro de registro de
entrada de atendimentos aos pacientes do Serviço de Queimados do Hospital
Universitário Evangélico Mackenzie de Curitiba. Foram incluídos pacientes atendidos
entres os meses de janeiro a dezembro de 2017.
As informações foram analisadas por meio de tabelas e conclusões foram obtidas quanto
ao sexo (masculino e feminino), meses de maior incidência e causas das queimaduras
(escaldaduras, líquidos inflamáveis, superfícies aquecidas, produtos químicos,
choque elétrico e outros). As faixas etárias foram divididas em lactentes (0-2
anos), pré-escolares (3-4 anos), escolares (5-10 anos), adolescentes (11-19),
adultos jovens (20-39 anos), adultos (40-60 anos) e idosos (idade maior que 60) e
caracterizadas individualmente.
Dados referentes à profundidade e extensão de queimaduras foram supressos dada a
inexatidão de suas descrições em tais registros.
RESULTADOS
durante os 12 meses de atendimento, revelaram 4.398 atendimentos de pacientes vítimas
de queimaduras. Foi verificado um predomínio de pacientes do sexo feminino com um
total de 2.346 pacientes compatível com 53,8% dos atendimentos. Já os atendimentos
para o sexo masculino foram 2.022 pacientes, que representam 46,2% dos atendimentos
no serviço (Tabela 1).
Tabela 1 - Características dos pacientes atendidos (n = 4.398), quanto ao
sexo.
|
n |
% |
Feminino |
2.346 |
53,8% |
Masculino |
2.022 |
46,2% |
Total |
4.398 |
100% |
Tabela 1 - Características dos pacientes atendidos (n = 4.398), quanto ao
sexo.
Com relação às faixas etárias, os indivíduos mais acometidos, que representam 40,3%
do total, foram adultos jovens com idade entre 20 e 39 anos, correspondendo a 1.775
pacientes. Esses são seguidos de adultos com idade entre 40 a 60 anos, com 1.032
pacientes representando 23,40%. Adultos em idade laboralmente produtiva correspondem
ao pico de incidência da amostra estudada.
Durante a infância e adolescência foi possível observar uma prevalência nas crianças
menores de 2 anos. Foram 441 atendimentos a lactentes menores que 2 anos, que
representam 10% da população atendida. Na idade de 2 a 4 anos foram realizados 118
atendimentos, correspondente a 2,68%. Na idade de 5 a 10 anos foram realizados 247
atendimentos que representam 5,61%. Os adolescentes de 11 a 15 anos representam 438
atendimentos, compatível com 9,95% dos atendimentos, porcentagem muito próxima dos
menores de 2 anos. Esses dados estão representados no Gráfico 1.
Gráfico 1 - Características dos pacientes atendidos quanto a idade.
Gráfico 1 - Características dos pacientes atendidos quanto a idade.
Dentre todos os 12 meses, observou-se um aumento dos atendimentos nos meses de
janeiro, fevereiro e dezembro com número de atendimentos de 464, 413, 410
respectivamente. O aumento no número de atendimentos nesses meses é compatível com
época de festas e recesso dos pacientes, em que aumentam substancialmente as
queimaduras por fogos e queimaduras solares. No Gráfico 2 é possível observar o número de atendimentos separados
mensalmente.
Gráfico 2 - Número de atendimentos separados mensalmente.
Gráfico 2 - Número de atendimentos separados mensalmente.
Nos atendimentos realizados foram apontadas diversas causas de queimaduras. O
principal agente agressor para os pacientes estudados, com número expressivo de
55,77% das pessoas, foi por líquidos escaldantes, englobando água, óleo, leite, café
e chá em altas temperaturas. A segunda causa, com 14,30% dos casos, foi o contato
com superfícies aquecidas, resultando em 629 afetados. O fogo acometeu 324 queimados
pelo contato direto com a chama, que representa 7,36% dos atendimentos.
Foram vítimas de choque elétrico, situação que exige internamento, 53 pacientes,
predominando homens adultos jovens. Destacam-se ainda 102 episódios de queimadura
solar, principalmente no último trimestre, todos manejados ambulatorialmente. Alguns
pacientes não tiveram a causa da queimadura informada, representando 25 pacientes.
As causas de queimaduras estão representadas no Gráfico 3.
Gráfico 3 - Causas de queimaduras em 2017.
Gráfico 3 - Causas de queimaduras em 2017.
De todos os atendimentos, 391 pacientes necessitaram ser internados, representando
8,89% dos pacientes; 3.397 pacientes não demandaram internamento e 10 dos pacientes
atendidos não apresentavam essas informações relatadas.
DISCUSSÃO
As queimaduras representam um importante agente causador de danos que não só ameaçam
a vida, mas que representam aos sobreviventes de lesões térmicas estigmas funcionais
e estéticos importantes. A maioria das queimaduras acomete pacientes em idades
laborais, as quais representam prejuízo relacionado ao absenteísmo ocupacional.
A faixa etária mais acometida foi de pacientes entre 20 e 60 anos, com 2.807
pacientes que representam 63,8% dos atendimentos. Essa faixa etária mais acometida
trata-se daquela em que se concentra a maior força produtiva de mão de obra, sendo
os adultos jovens os com maior taxa de acometimento de lesões térmicas.
Há, ainda, um predomínio de mulheres na amostra em geral, majoritariamente entre
mulheres adolescentes, adultas e idosas. Esses dados se tornam importantes, uma vez
que mulheres jovens em idade reprodutiva têm suas vidas limitadas pela queimadura
e
suas complicações.
O número de pacientes idosos queimados merece destaque por ser grupo de risco que
apresenta maior morbimortalidade e custo com cuidados hospitalares, visto que esse
grupo geralmente manifesta outras comorbidades relacionadas.
Quanto ao agente causador, as queimaduras podem ser resultantes da exposição a
chamas, líquidos quentes, superfícies quentes, frio, substâncias químicas, radiação,
atrito, fricção ou corrente elétrica. As queimaduras por escaldo, na literatura, são
as mais comuns em todas as faixas etárias6. O
presente estudo apresentou resultados que corroboram, portanto, com os dados da
literatura no que concerne aos agentes etiológicos, representados por 56% das causas
de queimaduras dos pacientes atendidos. Destacamos como principais causadores o
café, chá e alimentos quentes. A queimadura em superfície aquecida representa um
número significativo de pacientes, representando 14,3% das queimaduras.
Em relação às ocorrências mensais de queimaduras no referido intervalo de tempo
pesquisado, também se constatou que os acidentes aconteceram durante todos os meses
com poucas variações. No entanto, o mês de janeiro obteve o maior número de
registros com 464 casos (10,55%), seguido dos meses de fevereiro (413; 9,39%) e
dezembro (410; 9,32%). Um dos motivos para a elevação de registros de queimaduras
no
mês de janeiro e dezembro, possivelmente está relacionado às festividades de final
de ano comemoradas em grande intensidade nessa época, principalmente nas que é
tradição a utilização de fogos de artifícios. Estes são frequentemente manuseados
não apenas por adultos, mas também pelas crianças, elevando os riscos de
acidentes.
CONCLUSÃO
O perfil epidemiológico encontrado nesse serviço, para as vítimas admitidas por conta
de acidentes envolvendo queimaduras, foi maior em pacientes do gênero feminino. A
taxa de idade de maior acometimento foi entre 20 e 40 anos, sendo a escaldadura o
principal agente etiológico. Houve também uma porcentagem significativa de pacientes
menores de 19 anos, nos quais a principal causa de queimadura também foi a
escaldadura, principalmente em ambientes domésticos.
O acesso à cultura, crenças e aos hábitos de vida da família é essencial por parte
dos profissionais de saúde para subsidiar o planejamento de atividades preventivas
periódicas. Dessa forma, tendo por base a realidade vivenciada por cada família,
será possível estimular a prevenção desses acidentes e promover uma melhor
assistência e qualidade de vida às vítimas de queimaduras, quando inevitáveis.
Por fim, ressalta-se que os achados deste estudo apresentam limitações por se tratar
de estudo retrospectivo no qual algumas variáveis, como a avaliação do momento do
trauma e o perfil individual dos pacientes, dentre outras, não foram profundamente
elucidadas. Assim sendo, sugere-se a realização de novos estudos que abordem essas
limitações.
REFERÊNCIAS
1. Batista BFC. Perfil epidemiológico de pacientes que sofreram
queimaduras no Brasil: revisão de literatura. Rev Bras Queimaduras. 2012;
11:246-50.
2. Macedo JLS, Rosa SC. Estudo epidemiológico dos pacientes internados
na Unidade de Queimados: Hospital Regional da Asa Norte, Brasília, 1992-1997.
Brasília Med. 2000; 37:87-92.
3. Leão CEG. Queimaduras. In: Fonseca FP, Rocha PRS (eds.). Cirurgia
ambulatorial. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1999. p.
122-8.
4. Fernandes FMFA, Torquato IMB, Dantas MAS, Pontes Júnior FAC,
Ferreira JA, Collet N. Queimaduras em crianças e adolescentes: caracterização
clínica e epidemiológica. Rev Gaúcha Enferm. 2012; 33(4):133-41. DOI: https://doi.org/10.1590/S1983-14472012000400017
5. Serra MCVF, Gomes DR, Crisóstomo MR. Fisiologia e fisiopatologia.
In: Maciel E, Serra MC. Tratado de queimaduras. São Paulo: Atheneu; 2006.
p.37-42.
6. Mariani U. Queimaduras. In: Marcondes E (ed.). Pediatria básica. 8
ed. São Paulo: Sarvier; 1991. p.866-70.
1. Hospital Universitário Evangélico Mackenzie,
Curitiba, PR, Brasil.
2. Pontifícia Universidade Católica do Paraná,
Curitiba, PR, Brasil.
3. Hospital Santa Casa, Curitiba, PR,
Brasil.
4. Hospital Cajuru, Curitiba, PR,
Brasil.
5. Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR,
Brasil.
Endereço Autor: Taynah Bastos Lima da Silva Avenida
Republica Argentina, nº 965 apto 601 - Agua Verde, Curitiba, PR, Brasil CEP
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