ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Original Article - Year2019 - Volume34 - Issue 1

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2019RBCP0003

RESUMO

Introdução: A reconstrução de pálpebra inferior representa um desafio peculiar ao cirurgião plástico, uma vez que traduz uma região facial de importância estética e funcional. O objetivo é apresentar uma técnica opcional para a reconstrução de defeitos da pálpebra inferior com o retalho cutâneo zigomático-palpebral. Esta técnica mostra uma alternativa nos casos de pele escleroatrófica de pessoas idosas, bem como para pessoas jovens, que não apresentam redundância da pele palpebral superior, impossibilitando por exemplo o uso de enxertos de pálpebra superior ou retalhos como o de Fricke ou Tripier.
Métodos: Os autores mostram a indicação do retalho em casos de ectrópio cicatricial, reconstrução após ressecção de neoplasias, associação com outros retalhos como de Hughes ou para cobertura de enxertos cartilaginosos. É um retalho de transposição composto por pele e subcutâneo, randomizado. A técnica baseia-se no uso de retalho local, de características muito semelhantes à área do defeito, o que permite mimetização, segurança e exequibilidade.
Resultados: Os resultados imediatos e tardios são satisfatórios e bem aceitos pelos pacientes e pela equipe cirúrgica em termos estéticos e funcionais, com oclusão palpebral adequada e lubrificação ocular preservada.
Conclusão: O retalho zigomático-palpebral apresenta como vantagens a simplicidade de execução, sangramento mínimo, baixa morbidade de área doadora e feito sob anestesia local. O objetivo de reconstruir defeitos da pálpebra é restaurar a anatomia e função. Esta pode ser uma tarefa desafiadora, especialmente em defeitos maiores que podem estar presentes nos procedimentos oncológicos em jovens e em idosos com pele escleroatrófica e mínima frouxidão.

Palavras-chave: Olho; Pálpebras; Túnica conjuntiva. Doenças palpebrais; Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos; Retalhos

ABSTRACT

Introduction: Lower eyelid reconstruction represents a unique challenge to plastic surgeons, since it involves a facial region of aesthetic and functional importance. The objective is to present an optional technique for the reconstruction of lower eyelid defects using zygomatic-palpebral skin flap. This technique represents an alternative in cases of scleroatrophic skin in older patients, and for young people who do not have an upper eyelid skin redundancy, which prevents, for example, the use of upper eyelid grafts or flaps such as those of Fricke or Tripier.
Methods: The authors describe the flap used in cases of cicatricial ectropion and reconstruction after resection of neoplasms and association with other flaps, such as those of Hughes, or for coverage of cartilage grafts. The flap consisted of a transposition flap made up of skin and underlying subcutaneous tissues, randomized . The technique was based on the use of a local flap with highly similar characteristics to the defect area, which allowed it to mimic functions, while being safe and feasible.
Results: The immediate and late results in terms of aesthetics and function were satisfactory and well accepted by patients and the surgical team, with adequate eyelid occlusion and preserved ocular lubrication.
Conclusion: The advantages of the zygomatic-palpebral flap are its ease of execution, minimal bleeding, low morbidity of the donor area, and the use of local anesthesia. The reconstruction of eyelid defects aims to restore anatomy and function. This can be a challenging task, especially in cases with larger defects that may be present after oncologic procedures both in young and old patients presenting with scleroatrophic skin and minimal tissue laxity.

Keywords: Keywords: Eye; Eyelids; Conjunctiva; Eyelid diseases; Reconstructive surgical procedures; Flaps


INTRODUÇÃO

A reconstrução de defeitos da pálpebra visa dois pilares maiores: restaurar a anatomia e a função palpebrais. Essa pode ser uma tarefa desafiadora, especialmente em defeitos maiores como os que podem ocorrer nos procedimentos oncológicos em jovens, com mínima frouxidão tecidual, e em idosos com pele escleroatrófica; além dos casos de traumas ou queimaduras em que se tem uma perda tecidual significativa.

Várias técnicas reconstrutivas têm sido desenvolvidas e a escolha cirúrgica, habitualmente, dependerá das porções acometidas da pálpebra e da extensão do defeito. Procedimentos reconstrutivos devem manter a função e integridade das estruturas periorbitais, além de tentar uma reparação estética adequada. Os objetivos da reconstrução da pálpebra devem incluir os seguintes aspectos:

    Mucosa conjuntival interna lisa e macia – lubrificação ocular;

    Margem palpebral estável com suporte rígido como o tarso para assegurar forma e estabilidade;

    Rigidez palpebral nas áreas dos ligamentos cantais;

    Musculatura funcionalmente ativa para permitir tônus;

    Oclusão palpebral adequada para manter a proteção ocular;

    Resultado estético aceitável visando simetria facial.

Neste trabalho, os autores apresentam a utilização do retalho zigomático-palpebral, uma técnica inicialmente descrita por Hermann Eduard Fritze, em 1845, que, apesar da longiquidade, demonstra ser uma opção cirúrgica segura, versátil e com boa resolubilidade na reconstrução da pálpebra inferior.

OBJETIVOS

O objetivo deste trabalho é apresentar uma técnica opcional para a reconstrução de defeitos da lamela anterior da pálpebra inferior com retalho cutâneo zigomático-palpebral. Esta técnica mostra-se como uma alternativa excelente nos casos de pele escleroatrófica de pessoas idosas, bem como para pessoas jovens, que não apresentam redundância da pele palpebral superior, impossibilitando, por exemplo, o uso de enxertos de pálpebra superior ou retalhos como o de Fricke ou Tripier, além de indicações em retrações por queimaduras, traumas ou em associação com outras técnicas.

MÉTODO

Os autores mostram a indicação do retalho em casos de ectrópio, reconstrução após ressecção de neoplasias, associação com outros retalhos como de Hughes, para cobertura de enxertos cartilaginosos e retrações por queimaduras. É um retalho de transposição composto por pele e subcutâneo, randomizado. A técnica baseia-se no uso de retalhos locais, de características muito semelhantes à área do defeito, o que permite mimetização, segurança e exequibilidade.

O princípio técnico para confecção do retalho é o mesmo em todos os casos. A área receptora tem os seus limites avaliados (Figura 1A) e baseado na extensão do defeito delimita-se a área doadora na região malar ipsilateral. Então, o retalho é marcado na região zigomática (Figura 1B) a partir do canto lateral da pálpebra, descendo no sentido perpendicular à 90º em relação à margem ciliar inferior. O retalho cutâneo é elevado com um tecido subcutâneo de espessura suficiente para preencher o defeito (Figuras 1C, 1D). Depois disso, o processo de transposição é realizado, seguido por sutura, tanto da área doadora quanto da região receptora do retalho, com pontos subdérmicos profundos com polidioxanona 4-0 e superficialmente com pontos simples separados com náilon monofilamentado 6-0 (Figura 1E).

Figura 1 - Sequência técnica do retalho zigomático-palpebral para correção de ectrópio senil. A: Ectrópio; B: Desenho do retalho; C: Incisão e dissecção; D: Transposição do retalho; E: Pós-operatório imediato; F: Segundo dia de pós-operatório.

RESULTADOS

O retalho zigomático-palpebral para reconstrução da pálpebra inferior permite a restauração da altura e comprimento vertical palpebral, prevenindo e corrigindo o ectrópio. Os resultados imediatos (Figura 1F) e tardios são satisfatórios e bem aceitos pelos pacientes e pela equipe cirúrgica em termos de estética, qualidade da cicatriz e em termos funcionais, com oclusão palpebral adequada e lubrificação ocular preservada.

O edema linfático do retalho tem sido a maior queixa nos casos operados, mas apresenta resolução espontânea com tempo médio de 6 meses. Infecção, deiscência cirúrgica, hematomas e demais intercorrências ainda não foram registrados pela equipe. São apresentados a seguir, a fim de exemplificar, casos de reconstrução da pálpebra inferior decorrente de câncer de pele em paciente jovem (Figura 2), em idoso (Figura 3) e de correção de ectrópio cicatricial em vítima de queimadura térmica (Figura 4).

Figura 2 - Carcinoma basocelular em pálpebra inferior. A: Marcação da lesão; B: Defeito maior que 50 % da lamela anterior em paciente jovem, sem excedente de pele; C: Pós-operatório imediato; D: Pós-operatório de 6 meses.

Figura 3 - Carcinoma espinocelular em pálpebra inferior. A: Marcação da lesão e margem cirúrgica da resseção em plano total; B: Reconstrução da lamela posterior e média com retalho de Hughes; C: Posicionamento do retalho zigomático-palpebral para reconstrução do defeito e fechamento da área doadora; D: Pós-operatório de 6 meses.

Figura 4 - Sequela de queimadura térmica. A: Ectrópio cicatricial; B: Marcação do retalho e da extensão da área receptora; C: Pós-operatório imediato; D: Pós-operatório de 6 meses.

DISCUSSÃO

As pálpebras cobrem e protegem os olhos. Têm por função a proteção contra a luz excessiva, traumas ou ressecamentos. Contêm glândulas que produzem muco, lubrificantes e lipídeos que compõem o filme lacrimal. As pálpebras são divididas em três lamelas. A lamela anterior contém pele e músculo, a lamela média contém o septo orbital e a lamela posterior contém tarso, placas tarsais e os músculos retratores da pálpebra e conjuntiva. A pele das pálpebras é extremamente fina, sendo a pele da pálpebra superior mais fina do que a da pálpebra inferior. Há muito pouca gordura subcutânea na base da pele da pálpebra.

Técnicas de reconstrução da pálpebra envolvem a restauração de todas as lamelas, e pelo menos uma destas camadas tem de ser bem vascularizada. Retalhos são preferíveis quando comparados aos enxertos devido ao fenômeno like-to-like - semelhança com a pele adjacente em textura, cor, espessura, elasticidade, além do fornecimento de sangue intrínseco, a manutenção da sensação tátil, mesmo campo cirúrgico, e durabilidade. Para os defeitos de espessura parcial, no entanto, enxertos de pele podem ser bem adequados. A reconstrução satisfatória da pálpebra inferior deve resultar em pálpebra justaposta ao globo ocular para prevenir o ectrópio.

O tipo de reconstrução da pálpebra a ser realizada pode ser definida baseada em termos de espessura e extensão do defeito. Técnicas de fechamento direto podem ser usadas em defeitos de até 30% em pacientes jovens e até 45% no paciente idoso. Em casos-limite, uma cantólise lateral pode proporcionar um relaxamento adicional do fechamento da ferida.

Os retalhos locais e de vizinhança são úteis para reconstrução da lamela anterior. Retalhos, como descrito por Tenzel, Hughes, Mustardé e Cutler são bem conhecidos pelos cirurgiões plásticos e úteis em grandes defeitos, assim como enxertos de cartilagem1-6. Tarso livre pode ser usado para reconstrução da lamela posterior associado a retalho miocutâneo.

Na revisão da literatura, observa-se que a escolha do tipo de reconstrução da pálpebra inferior varia de acordo com a textura da pele, as cicatrizes adjacentes à área receptora, a idade do paciente, provável resultado estético, o tamanho do defeito e alternativas já utilizadas. O retalho zigomático-palpebral apresenta algumas vantagens, dentre elas a simplicidade de execução, sangramento mínimo, baixa morbidade de área doadora e pode ser feito sob anestesia local. Embora alguns autores questionem o fato de o desenho do retalho não levar em conta qualquer das subunidades estéticas da face, sendo este a maior ressalva encontrada na literatura, as cicatrizes ao longo da região malar são esteticamente aceitáveis pelo paciente e considerada de bom aspecto pela equipe cirúrgica.

CONCLUSÃO

Retalho zigomático-palpebral é uma técnica alternativa que pode ser lembrada em casos de pele escleroatrófica em pacientes idosos e para os jovens sem tecido suficiente para reconstruir grandes defeitos.

COLABORAÇÕES

AGM

Análise e/ou interpretação dos dados; coleta de dados; concepção e desenho do estudo; gerenciamento do projeto; redação - preparação do original; redação - revisão e edição.

MPSN

Análise e/ou interpretação dos dados; coleta de dados; gerenciamento do projeto.

LRCCT

Coleta de dados; redação - preparação do original.

MTRC

Coleta de dados.

CRRC

Coleta de dados.

VAP

Coleta de dados.

JPRP

Coleta de dados.

REFERÊNCIAS

1. Alghoul M, Pacella SJ, McClellan WT, Codner MA. Eyelid reconstruction. Plast Reconstr Surg. 2013;132(2):288e-302e. PMID: 23897357

2. Putterman AM. Deep and superficial eyelid fascia. Plast Reconstr Surg. 2012;129(4):721e-3e.

3. Fezza JP, Massry G. Lower Eyelid Length. Plast Reconstr Surg. 2015;136(2):152e-9e.

4. Jindal K, Sarcia M, Codner MA. Functional considerations in aesthetic eyelid surgery. Plast Reconstr Surg. 2014;134(6):1154-70. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/PRS.0000000000000748

5. Orgill DP, Ogawa R. Current methods of burn reconstruction. Plast Reconstr Surg. 2013;131(5):827e-36e. PMID: 23629122

6. Alves JCRR, Liu RP, Silva Filho AF, Pereira NA, Carvalho EES. Reconstrução palpebral com enxerto de cartilagem autóloga de concha de orelha. Rev Bras Cir Plast. 2012;27(2):243-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1983-51752012000200013











1. Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG, Brasil.

Instituição: Hospital de Clínicas,  Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG, Brasil.

Autor correspondente: Aluísio Gonçalves Medeiros Rua José de Alencar, nº 904, apto 203 - Abadia, Uberaba, MG, Brasil CEP 38025-120 E-mail: aluisiogm@hotmail.com

Artigo submetido: 20/6/2018.
Artigo aceito: 11/11/2018.

Conflitos de interesse: não há.

 

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