INTRODUÇÃO
A obesidade é considerada uma doença de proporções epidêmicas, frequentemente
associada à morbidade e mortalidade aumentadas, assim como aumento dos gastos com
saúde, redução da qualidade de vida e da expectativa de vida1.
O manuseio clínico da obesidade é difícil, pois, não somente o emagrecimento, mas,
principalmente, a manutenção do peso alcançado, não é possível para a maioria dos
grandes obesos2.
Nos últimos anos, o tratamento cirúrgico da obesidade mórbida tem ganhado
popularidade. Sua eficácia na perda de peso tem sido confirmada por estudos bem
controlados, conduzidos especialmente nos Estados Unidos e na Suécia3,4. Nos Estados Unidos da América, o número de procedimentos cirúrgicos
para induzir a redução de peso aumentou de 28.800 em 1999 para 220.000 em 20094.
A segurança na realização da cirurgia bariátrica, representada por baixas taxas de
complicações precoces e tardias (tromboembolismo venoso, reintervenções cirúrgicas,
internações prolongadas) e uma mortalidade de 0,3%, aliada à melhora significativa
das comorbidades, justificam a sua inserção como importante estratégia no tratamento
da obesidade grave1,5.
Os pacientes bariátricos, frequentemente, queixam-se da grande redundância de pele
e
perda de partes moles, que interferem na prática de exercícios, adequação das
roupas, que representam não só um problema estético, mas, também, geram problemas
de
postura e mobilidade. Além disso, pode ser doloroso pela fricção mecânica, causar
dificuldade de higiene, associada com infecção fúngica e dermatite
intertriginosa6.
Os pacientes pós-bariátricos que desejam realizar um procedimento em cirurgia
plástica merecem uma avaliação cuidadosa pelo risco para complicações
pós-operatórias, pois, frequentemente, apresentam comorbidades residuais,
deficiências nutricionais e problemas psicológicos7.
OBJETIVO
O objetivo deste estudo é analisar o perfil antropométrico, a prevalência de
comorbidades e a taxa de complicações em pacientes submetidos à abdominoplastia após
gastroplastia redutora em Y Roux.
MÉTODO
Trata-se de um estudo prospectivo, realizado em hospital público de referência para
realização de cirurgia bariátrica. Foram avaliados indivíduos submetidos à derivação
gástrica em Y-de-Roux e que, posteriormente, foram submetidos a procedimentos em
cirurgia plástica de 2011 a 2016 após perda ponderal maciça.
Esta pesquisa foi elaborada em conformidade com a resolução do Conselho Nacional de
Saúde número 466, de 12/12/2012. Todos os indivíduos envolvidos neste estudo foram
informados e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para
anuência da execução. No presente estudo, não houve conflito de interesse. O
projetofoi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Secretaria de Saúde do
Distrito Federal, com o número CAAE 52738216.5.0000.5553 (parecer nº 1.504.199).
Todas as operações foram realizadas pela mesma equipe de assistentes no Hospital
Regional da Asa Norte, Brasília, DF.
Critérios de inclusão
Os critérios de inclusão para cirurgia plástica pós-bariátrica foram: a
estabilidade de peso, por pelo menos, seis meses após ter sido atingida a meta
de perda ponderal para cada caso; ausência de uso de drogas ilícitas ou
alcoolismo; ausência de quadros psicóticos ou demenciais moderados ou graves;
compreensão por parte do paciente da necessidade de manutenção do peso e da
necessidade de acompanhamento pós-operatório com equipe multidisciplinar1,8.
Critérios de exclusão
Os critérios de exclusão foram o tabagismo, a intenção gestacional, a
instabilidade ponderal com a não manutenção do peso por seis meses, indivíduos
que não assinaram o TCLE, pacientes submetidos a outros procedimentos
bariátricos depois da gastroplastia em Y-de-Roux, pacientes com seguimento de
pós-operatório menor que 12 meses e aqueles pertencentes a grupos vulneráveis
(doentes mentais, institucionalizados ou de idade inferior a 18 anos)8.
Variáveis analisadas
As variáveis analisadas incluíram: idade, sexo, peso, altura, índice de massa
corporal (IMC) antes da cirurgia bariátrica (kg/m2), IMC antes da
cirurgia plástica (kg/m2), perda de peso total (Kg), variação do IMC
(kg/m2), percentagem de perda do excesso de peso (%PEP),
intervalo de tempo entre a cirurgia bariátrica e a cirurgia plástica (meses),
presença de comorbidades antes da cirurgia bariátrica, presença de comorbidades
antes da cirurgia plástica, número de medicações utilizadas antes e depois da
cirurgia bariátrica e taxa de complicações pós-operatórias.
Variáveis antropométricas
O peso foi aferido em uma balança digital com capacidade máxima de 300 kg. A
altura foi obtida com estadiômetro Personal Caprice
Sanny®. A porcentagem de perda do excesso de peso (%PEP)
foi obtida a partir da fórmula: perda de peso após a operação/excesso de peso X
100. O excesso de peso foi calculado subtraindo-se o peso no início do
acompanhamento pré-operatório do peso ideal, estabelecido pelo IMC de 25
Kg/m2,9.
A variação do IMC (∆IMC) foi calculada pela diferença entre o IMC
máximo pré-bariátrico e o IMC no momento da abdominoplastia.
Variáveis clínicas e comorbidades
O diagnóstico de hipertensão arterial sistêmica, de dislipidemias, de diabetes
melito tipo 2 e da síndrome metabólica foram baseados nos parâmetros constantes
nas respectivas diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia, atualmente
descritos na I Diretriz Brasileira de Diagnóstico e Tratamento da Síndrome
Metabólica10. O diagnóstico da
esteatose hepática foi realizado com uso da ultrassonografia abdominal no
pré-operatório.
O diagnóstico pré-operatório da apneia obstrutiva do sono foi feito baseado no
índice de apneia-hipopneia (IAH). Um evento de apneia foi definido como cessação
do fluxo de ar oronasal ≥10 segundos. Um evento de hipopneia foi definido como
redução do sinal de pressão nasal ≥30% acompanhada de dessaturação ≥4% com
duração > 10 segundos.
O IAH foi definido como sendo a soma dos eventos de apneia e hipopneia por hora
de sono. O diagnóstico de apneia obstrutiva do sono foi baseado em um IAH ≥5,0
eventos por hora, e a gravidade da apneia obstrutiva do sono foi caracterizada
com base no IAH: leve (5,0 a 14,9 eventos/hora); moderada (15,0 a 29,9
eventos/hora); ou grave (≥30,0 eventos/hora)11.
O diagnóstico de artropatia foi definido como o paciente que havia se submetido a
tratamento cirúrgico por dor articular ou fazia uso regular de anti-inflamatório
para tratamento de dor articular9.
Número de medicações para tratamento das comorbidades
Após a cirurgia bariátrica, as comorbidades foram consideradas como resolvidas
quando foram controladas sem necessidade de medicação, e melhoradas, quando
foram controladas por doses reduzidas de medicação. Foi determinado o número de
medicações que o paciente tomava antes de ser submetido à cirurgia bariátrica e
o número de medicações que o paciente permaneceu tomando após a cirurgia
bariátrica. A definição dos medicamentos foram definidos por classes, por
exemplo: anti-hipertensivos, hipoglicemiantes, anti-inflamatórios, redutores do
colesterol, broncodilatadores, polivitamínicos, ansiolíticos e
antidepressivos12.
Abdominoplastia
A abdominoplastia incluiu a remoção do excesso de pele e gordura do abdome
combinada com amplo descolamento do retalho abdominal superior, correção da
diástase dos músculos retos abdominais e transposição umbilical. A
abdominoplastia em âncora incluiu ressecção vertical ao nível da linha média e,
frequentemente, foi necessária em pacientes que apresentaram cicatrizes medianas
prévias, hérnias incisionais e pacientes com excesso de panículo dermoadiposo
vertical e horizontal13,14.
Complicações pós-operatórias
As complicações avaliadas incluíram hematomas, seromas, deiscências, necrose
tecidual, hérnia interna, tromboembolismo venoso profundo e embolia pulmonar. As
complicações foram divididas em maiores e menores. As complicações maiores foram
consideradas aquelas com necessidade de novo procedimento cirúrgico para
drenagem de hematoma, drenagem de seroma, sutura de áreas de deiscência ou nova
internação para realização de antibioticoterapia sistêmica.
As variáveis epidemiológicas, antropométricas, clínicas e cirúrgicas foram
comparadas entre o grupo de pacientes com complicações pós-operatórias com o
grupo de pacientes que não tiveram complicações. Desta forma, foram determinados
os fatores associados para complicações em pacientes pós-bariátricos submetidos
à abdominoplastia15-18.
Cuidados pós-operatórios
Todos os pacientes receberam profilaxia tromboembólica não medicamentosa, tais
como deambulação precoce e enfaixamento de membros inferiores. Foram realizadas
sondagem vesical, com retirada do cateter vesical no primeiro dia
pós-operatório, e antibioticoterapia profilática, sendo usados dois gramas (2g)
de cefazolina endovenosa na indução anestésica.
As malhas elásticas compressivas foram utilizadas rotineiramente por três meses.
Os drenos utilizados nas abdominoplastias eram retirados no sétimo dia,
independentemente do débito que este apresentava.
Os pacientes foram mantidos internados até o dia seguinte, em posição
semissentada de Fowler e com sonda vesical de demora, sendo estimulada a
movimentação ativa dos pés e dos joelhos.
As orientações básicas de alta foram: manter sempre a cinta modeladora
compressiva, aumentar a ingesta hídrica, estimular a deambulação e evitar
esforços físicos. Os retornos no pós-operatório eram semanais no primeiro mês e
depois mensais por um período mínimo de 12 meses.
Análise estatística
A análise estatística foi feita usando o pacote estatístico SPSS
(Statistical Package for Social Sciences) versão 20.0 para
Windows (SPSS Inc. Chicago, IL, EUA). As variáveis contínuas foram descritas com
o uso de média e desvio-padrão e as variáveis categóricas com o uso de
frequências relativas. A condição de normalidade das variáveis foi avaliada pelo
teste de Kolmogorov-Smirnov. A significância mínima aceita foi o nível de 5%
(p < 0,05).
As comparações entre os grupos foram realizadas por meio do teste do Qui-quadrado
para as variáveis dicotômicas, do teste t de Student para as variáveis contínuas
com distribuição normal e do teste U de Mann-Whitney para as variáveis contínuas
sem distribuição normal. As correlações entre as variáveis contínuas foram
avaliadas pelo coeficiente de correlação de Spearman (rs).
RESULTADOS
Foram operados 107 pacientes após gastroplastia redutora com derivação em Y de Roux,
sendo 55,8% (60 pacientes) por videolaparoscopia e 44,2% (47 pacientes) por via
laparotômica. A média de idade foi de 40,89 anos ± 9,76 e as mulheres foram as mais
frequentemente operadas em relação aos homens (91,6%; 98/107).
Variáveis antropométricas
Na Tabela 1, observa-se o perfil
antropométrico dos pacientes antes de serem submetidos à abdominoplastia após a
gastroplastia em Y de Roux.
Tabela 1 - Perfil antropométrico dos pacientes pós-bariátricos antes da
abdominoplastia no Hospital Regional da Asa Norte, Brasília, DF, no
período de 2011 a 2016.
Características |
Média |
DP*** |
Idade (anos) |
40,89 |
9,76 |
Peso máximo (kg) |
120,79 |
24,19 |
IMC*
máximo (kg/m2)
|
45,52 |
7,55 |
IMC final pré-plástica (kg/m2)
|
27,63 |
3,70 |
Perda de peso total (kg) |
47,70 |
17,32 |
%PEP ** |
78,79 |
12,61 |
Tabela 1 - Perfil antropométrico dos pacientes pós-bariátricos antes da
abdominoplastia no Hospital Regional da Asa Norte, Brasília, DF, no
período de 2011 a 2016.
Na Tabela 2, observa-se que os pacientes
submetidos à cirurgia bariátrica eram frequentemente obesos mórbidos, seguidos
de pacientes classificados como obesidade grau II e ambos representaram 100% da
amostra. Na Tabela 2, também observa-se
que os pacientes que foram submetidos à abdominoplastia pós-bariátrica estavam
mais frequentemente em sobrepeso, seguidos de pacientes com IMC normal e ambos
representavam 75,6% da amostra.
Tabela 2 - Distribuição dos pacientes segundo o grau de obesidade determinado
pelos IMC* pré-gastroplastia e IMC* pré-cirurgia plástica
pós-gastroplastia no Hospital Regional da Asa Norte, Brasília, DF, no
período de 2011 a 2016.
IMC (kg/m2)
|
Antes da gastroplastia Nº de Pacientes (%) |
Antes da cirurgia plástica Nº de Pacientes
(%)
|
Abaixo de 25 (normal) |
0 |
21 (19,6%) |
25,0 - 29,9 (Sobrepeso) |
0 |
60 (56,1%) |
30,0 - 34,9 (Grau I) |
0 |
24 (22,4%) |
35,0 - 39,9 (Grau II) |
22 (20,6%) |
1 (0,9%) |
Maior que 40,0 (Grau III) |
85 (79,9%) |
1 (0,9%) |
Tabela 2 - Distribuição dos pacientes segundo o grau de obesidade determinado
pelos IMC* pré-gastroplastia e IMC* pré-cirurgia plástica
pós-gastroplastia no Hospital Regional da Asa Norte, Brasília, DF, no
período de 2011 a 2016.
A diferença entre o IMC máximo antes da cirurgia bariátrica e o IMC antes da
cirurgia plástica reparadora (∆IMC) foi de 18,60 ± 9,34. Sendo que 33,6%
(36/107) dos pacientes apresentaram variação de IMC maior que 20 e 36,4%
(39/107) dos pacientes tiveram perda de peso igual ou superior a 50 Kg.
Variáveis clínicas e comorbidades
Na Tabela 3, são apresentadas as doenças
presentes anteriores à realização da cirurgia bariátrica. Observa-se que as
morbidades mais frequentemente presentes foram a síndrome metabólica e a
hipertensão arterial, seguidas da artropatia, da depressão/ansiedade e do
diabete melito. A síndrome da apneia obstrutiva do sono, a esofagite e a
dislipidemia foram as morbidades menos frequentes.
Tabela 3 - Distribuição dos pacientes quanto a presença de doenças associadas
antes e após a gastroplastia operados no Hospital Regional da Asa Norte,
Brasília, DF, no período de 2011 a 2016.
Doenças associadas |
Antes da gastroplastia Nº de Pacientes (%) |
Antes da cirurgia plástica Nº de Pacientes
(%)
|
Valor p |
Síndrome Metabólica |
61 (56,5%) |
6 (5,6%) |
0,027 |
Hipertensão arterial |
59 (54,6%) |
12 (11,1%) |
0,001 |
Artropatia |
42 (38,9%) |
5 (4,6%) |
0,004 |
Diabete melito |
41 (38,0%) |
6 (5,6%) |
0,002 |
Depressão/Ansiedade |
40 (37,0%) |
27 (25,0%) |
0,001 |
Dislipidemia |
26 (24,1%) |
2 (1,9%) |
0,010 |
S. Apneia do Sono |
22 (20,4%) |
2 (1,9%) |
0,005 |
Esofagite |
22 (20,4%) |
4 (3,8%) |
0,005 |
Tabela 3 - Distribuição dos pacientes quanto a presença de doenças associadas
antes e após a gastroplastia operados no Hospital Regional da Asa Norte,
Brasília, DF, no período de 2011 a 2016.
A grande maioria dos pacientes, após o tratamento cirúrgico da obesidade, referia
melhora ou completa resolução das diversas comorbidades. Entretanto, conforme
evidenciado na Tabela 3, alguns pacientes
ainda apresentavam doenças no momento da realização da cirurgia plástica
reparadora, destacando-se mais frequentemente as presenças de
depressão/ansiedade e a hipertensão arterial. Já 35,2% (38/107) dos pacientes
haviam sido submetidos à colecistectomia antes cirurgia plástica reparadora.
Número de medicações para tratamento das comorbidades
Quanto ao número diário de comprimidos que os pacientes faziam uso antes da
cirurgia bariátrica, a média foi de 4,24 ± 3,25. Depois da cirurgia bariátrica,
a média diminuiu para 1,74 ± 1,31. A diferença foi significativa entre a média
do número de comprimidos antes e depois da operação bariátrica
(p < 0,001; IC 95%: 3,62-4,86).
Abdominoplastia: intervalo de tempo após a gastroplastia, cirurgias
associadas e taxa de complicações
A média do intervalo de tempo entre a cirurgia bariátrica e a abdominoplastia foi
de 43,47 ± 29,82 meses. Os pacientes foram submetidos à cirurgia plástica mais
frequentemente entre 25 e 48 meses, seguidos de 18 a 24 meses e ambos
representaram 70,6% da amostra.
A técnica clássica foi usada em 80 (74,8%) pacientes, seguida da técnica em
âncora em 27 (25,2%) pacientes operados. A hérnia incisional estava presente em
seis pacientes e hérnia umbilical em oito pacientes, representando 13,1% dos
pacientes submetidos a abdominoplastias. A herniorrafia foi realizada no momento
da abdominoplastia (Figura 1).
Figura 1 - Paciente pós-bariátrico submetido à herniorrafia incisional no
momento da abdominoplastia. A: Hérnia incisional
verificada durante a abdominoplastia; B: Hérnia
incisional reduzida durante a abdominoplastia.
Figura 1 - Paciente pós-bariátrico submetido à herniorrafia incisional no
momento da abdominoplastia. A: Hérnia incisional
verificada durante a abdominoplastia; B: Hérnia
incisional reduzida durante a abdominoplastia.
Noventa e um pacientes (85,0%) realizaram apenas um procedimento cirúrgico por
etapa, 16 (14,9%) pacientes realizaram operações associadas no mesmo ato
cirúrgico. Os outros procedimentos cirúrgicos associados foram: mastoplastia em
12 pacientes e braquioplastia em quatro pacientes.
A taxa geral de complicações foi de 31,5% (34/107) dos pacientes. A taxa de
complicações maiores foi de 11,1% (12 pacientes), sendo quatro casos de
deiscência com necessidade de nova sutura, três casos de hematoma/seroma com
necessidade de reoperação, três casos de hérnia interna com obstrução intestinal
e dois casos de infecção de ferida com necessidade de tratamento com
antibioticoterapia intravenosa.
A taxa de complicações menores foi de 20,4% (22 pacientes), sendo nove casos de
seroma com necessidade de punções repetidas, cinco casos de hematoma com
drenagem ou resolução espontânea, cinco casos de deiscência sem necessidade de
ressutura e três casos de infecção de ferida com necessidade de tratamento
apenas com antibioticoterapia oral.
O tempo médio de cirurgia foi de 2 horas e 50 minutos ± 55,33. Em todos os casos
de abdominoplastia, foram usados drenos a vácuo.
A anestesia geral foi usada em 88,8% (95 pacientes) dos casos e peridural em
11,2% (12 pacientes).
O tempo médio de internação foi de 2 ± 1,2 dias, sendo que o período de
internação por dois dias foi necessário em 98 (91,6%) das internações
realizadas. Apenas nove (8,4%) pacientes permaneceram internados por período
superior.
Os pacientes foram acompanhados por, no mínimo, 12 meses. Não houve casos de
trombose venosa profunda, embolia pulmonar ou letalidade no presente estudo.
Fatores associados a complicações em abdominoplastias em pacientes
pós-bariátricos
Na Tabela 4, apresentamos os fatores
associados a complicações pós-abdominoplastia em pacientes pós-bariátricos,
relacionados à idade e a variáveis antropométricas. Observa-se que os fatores
que se associaram significativamente a complicações pós-operatórias nesses
pacientes pós-bariátricos foram a idade acima de 40 anos, o peso máximo
pré-gastroplastia, o IMC máximo pré-gastroplastia, a variação de IMC (∆IMC), a
perda de peso total e a variação de IMC (∆IMC) maior que 20 Kg/m2. O
IMC pré-plástica e a perda de peso maior que 50Kg foram superiores nos pacientes
pós-bariátricos que apresentaram complicações nas abdominoplastias, mas os dados
não foram significativos (p < 0,08).
Tabela 4 - Fatores associados a complicações pós-operatórias em pacientes
pós-bariátricos submetidos a abdominoplastia, relacionados à idade e a
variáveis antropométricas.
Variáveis |
Com complicações |
Sem complicações |
Valor p |
OR |
IC95% |
Pacientes (nº) |
34 |
73 |
- |
- |
- |
Idade (em anos)a |
43,09 ± 12,1 |
39,9 ± 8,4 |
0,058 |
- |
- |
Idade > 40 anos |
73,5% |
47,3 |
0,011*** |
2,22 |
[1,15-4,30] |
Peso máximo médio pré-gastroplastia(kg)a |
129,4 ± 30,6 |
116,5 ± 19,5 |
0,010*** |
- |
- |
IMC máximo pré-gastroplastia (kg/m²)a |
48,5 ± 9,6 |
44,1 ± 5,9 |
0,004*** |
- |
- |
IMC médio pré-plástica (kg/m2)a |
28,5 ± 4,4 |
27,2 ± 3,3 |
0,094 |
- |
- |
∆IMC médio (Kg/m2)a |
19,7 ± 7,5 |
16,9 ± 4,9 |
0,022*** |
- |
- |
Perda de peso total (kg)a |
54,5 ± 23,1 |
44,3 ± 12,9 |
0,004*** |
- |
- |
Peso perdido ≥50Kg |
50,1% |
31,0% |
0,059 |
1,70 |
[0,98;2,94] |
ΔIMC > 20 (Kg/m2)**
|
47,0% |
27,0% |
0,040*** |
1,78 |
[1,03;3,06] |
IMC > 30 pré-plástica (Kg/m2)
|
24,32% |
21,57% |
0,818 |
- |
- |
Tabela 4 - Fatores associados a complicações pós-operatórias em pacientes
pós-bariátricos submetidos a abdominoplastia, relacionados à idade e a
variáveis antropométricas.
Na Tabela 5, apresentamos os fatores
associados a complicações pós-operatórias de abdominoplastia em pacientes
pós-bariátricos, relacionados comorbidades e ao peso do retalho retirado do
abdome. Observa-se que os fatores que se associaram significativamente a
complicações pós-operatórias nesses pacientes foram a presença de comorbidades
(dislipidemia, diabetes e hipertensão arterial), assim como o peso do retalho
retirado nas abdominoplastias, principalmente quando o peso do retalho do abdome
foi maior que 2.000 g (Figura 2).
Tabela 5 - Fatores associados a complicações pós-operatórias em pacientes
pós-bariátricos submetidos a abdominoplastias, relacionados ao peso do
retalho e a comorbidades.
Variáveis |
Com complicações |
Sem complicações |
Valor p |
OR |
IC95% |
Peso do retalho retirado do abdome (g)a |
2743 ± 1601 |
1630,1 ± 846 |
<0,001*** |
- |
- |
Peso do retalho retirado ≥ 2000g* |
61,8% |
25,7% |
0,004*** |
3,41 |
[2,11; 5,56] |
Diabetes |
11,8% |
2,7% |
0,056 |
2,27 |
[1,19;4,30] |
Hipertensão arterial |
17,7% |
8,1% |
0,143 |
1,71 |
[0,90;3,27] |
Dislipidemia |
5,9% |
0,0% |
0,035*** |
3,31 |
[2,48;4,42] |
Síndrome Metabólica |
11,8% |
2,7% |
0,056 |
2,27 |
[1,19-4,30] |
Diabetes/Hipertensão** |
26,5% |
8,1% |
0,011*** |
2,23 |
[1,31-3,80] |
Tabela 5 - Fatores associados a complicações pós-operatórias em pacientes
pós-bariátricos submetidos a abdominoplastias, relacionados ao peso do
retalho e a comorbidades.
Figura 2 - Retalho retirado do abdome após abdominoplastia pesando acima de
2000g.
Figura 2 - Retalho retirado do abdome após abdominoplastia pesando acima de
2000g.
A presença de diabetes e hipertensão arterial sistêmica isoladamente foram mais
frequentes nos pacientes que apresentaram complicações pós-operatórias em
cirurgia plástica, mas os dados não foram significativos (p
< 0,09). Entretanto, quando juntamos os pacientes com diabetes e/ou
hipertensão arterial, a presença dessas comorbidades esteve associada
significativamente a mais complicações pós-operatórias em cirurgia plástica.
DISCUSSÃO
Após a expressiva perda ponderal, é frequente a queixa de flacidez tecidual e
alterações cutâneas, localizadas principalmente em mamas, abdome, dorso, braços,
coxas e face. Ao lado do impacto psicossocial do dermatocalásio generalizado, também
há implicações médicas, com doenças como o intertrigo e limitações funcionais para
deambulação, micção e atividade sexual19.
A cirurgia plástica do contorno corporal ajuda a promover a reintegração social e
psicológica desses pacientes com um sofrimento já prolongado. Além disso, essas
operações plásticas reparadoras têm como objetivo otimizar os resultados funcionais
obtidos pela cirurgia bariátrica através da remoção do excesso de pele2,8.
Nosso estudo mostrou que a maioria dos pacientes submetidos à abdominoplastia
pós-bariátrica são mulheres com média de idade de 41 anos, de IMC máximo de 45
kg/m2, de peso médio máximo de 119 Kg e de perda de peso médio de 47
Kg. Semelhantes a estudos nacionais9,14,19 e estudos na Itália20, na Áustria4,17, na França18, na Suíça2 e nos EUA16.
Entretanto, outros estudos mostram idade média superior, principalmente nos Estados
Unidos13,21 e na Espanha22. Assim
como, IMC máximo superior a 50 kg/m2, principalmente nos Estados
Unidos23-25.
Existe uma associação estatisticamente significante entre o desconforto com o excesso
de pele após a cirurgia bariátrica e o sexo feminino, ou seja, as mulheres se
incomodam mais com o excesso de pele após a cirurgia bariátrica que os homens26.
A média do IMC antes da cirurgia plástica foi de 27,4 kg/m2, similar a
outro estudo nacional14 e internacionais: na
Itália20, na Áustria4,17, na
França18, na Suíça2 e nos EUA13,16. Porém, abaixo
do IMC verificados por outros estudos nos EUA6,24,25, na Turquia27 e na Grécia28.
A obesidade residual é um problema persistente nos pacientes após perda maciça de
peso. Coon et al.23 apontaram que 45% dos
pacientes que procuram a cirurgia plástica após gastroplastia tinham IMC > 30 e
20% IMC > 35. Orpheu et al.19 verificaram
uma obesidade residual de 27,55% (IMC > 30), similar ao nosso estudo.
Houve uma redução significativa das comorbidades após a cirurgia bariátrica, sendo
que no momento da realização da abdominoplastia, apenas 11,5% dos pacientes
apresentaram hipertensão arterial sistêmica e 5,7% dos pacientes, diabete melito.
Nos EUA, a prevalência de comorbidades antes da cirurgia plástica em pacientes
pós-bariátricos chega a 32,5% de hipertensão arterial, 15% de diabete melito e 5%
de
síndrome de apneia do sono6.
Essa melhora significativa nas taxas de prevalência de comorbidades reflete
diretamente na queda do número de comprimidos e medicações utilizados pelos
pacientes após a cirurgia bariátrica. O nosso estudo evidenciou uma diferença
significativa entre a média do número de comprimidos antes e depois da operação
bariátrica (p < 0,001; IC 95%: 3,64-4,69).
Outro estudo verificou reduções semelhantes às verificadas em nosso estudo. Lopes
et
al.12 verificaram que a média de número
de medicações utilizadas por paciente reduz de 3,9 ± 1,67 medicações antes da
cirurgia para 1,64 ± 1,68 no período pós-operatório. Portanto, a média de redução
de
uso de drogas foi de dois medicamentos por paciente (IC 95% 2,38 a 1,69;
p = 0,71). Isto mostrou uma redução maior que 50% no número de
medicamentos usados por paciente após a cirurgia12.
A média do intervalo de tempo entre a cirurgia bariátrica e a realização da
abdominoplastia foi 43 meses, similar aos 47 meses verificado em outro estudo
nacional14. Entretanto, esse intervalo de
tempo foi superior aos 32 meses verificados por outro estudo nacional29 e bem acima dos 22 a 26 meses verificados em
outros países, como Espanha22 e EUA6,25.
A taxa geral de complicação pós-abdominoplastia em pacientes pós-bariátricos foi de
31%. Similar aos estudos de de Kerviler et al.2 e de Espinosa-de-los-Monteros et al.25, mas abaixo de outros estudos com taxas que variaram de 35 a 50% dos
pacientes operados13,22-24,29.
A baixa taxa de complicações maiores neste estudo, como eventos tromboembólicos,
necroses de retalho e baixo número de reoperações, pode estar associada ao baixo
número de cirurgias associadas verificada neste estudo. Os estudos que apresentam
maiores taxas de complicações geralmente tiveram maior percentual de associações
cirúrgicas13,23. A associação de operações leva a um maior
tempo cirúrgico (> 6 horas), maior perda sanguínea e maior necessidade de
transfusões sanguíneas, que são fatores que podem favorecer um aumento da taxa de
complicações pós-operatórias6,23,29.
As taxas de deiscência, seroma, infecção e necroses são relacionadas ao número de
procedimentos cirúrgicos23. Quando comparamos
um grupo de pacientes que realizou apenas um procedimento cirúrgico com um grupo de
pacientes que foi submetido a múltiplos procedimentos pós-bariátricos ocorre um
aumento significativo na taxa de complicações pós-operatórias23.
As operações plásticas reparadoras associadas são normalmente desencorajadas,
evitando-se maior tempo cirúrgico e maior agressão e espoliação do paciente.
Contudo, em casos selecionados, após análise criteriosa do estado clínico,
nutricional, emocional e condições sociais, a associação de mais de uma cirurgia
plástica, como ocorreu em 16 (14,8%) pacientes deste estudo, ou outros procedimentos
cirúrgicos (por exemplo, herniorrafias) poderá ser realizada sem maiores
consequências ou complicações. Associação de procedimentos cirúrgicos em cirurgia
plástica é comum em outros centros de tratamento para pacientes pós-bariátricos, mas
procurando realizar as combinações de cirurgias geralmente em casos
selecionados6,13,30.
Além disso, outro importante fator que pode ter contribuído para uma menor taxa de
complicações foi a baixa presença de comorbidades no momento da realização da
abdominoplastia. Um estudo americano envolvendo 449 pacientes pós-bariátricos
apresentou uma taxa de complicações de 41,8%; entretanto, a prevalência de
hipertensão arterial sistêmica foi de 44,2% e de diabete melito de 22,3% entre os
pacientes que realizaram cirurgia plástica pós-bariátrica13.
Além disso, nesse mesmo estudo, mais de 50% dos pacientes que procuravam a cirurgia
plástica tinham uma obesidade residual. No nosso estudo apenas 22,3% dos pacientes
operados apresentavam uma obesidade grau I no momento da realização da cirurgia
plástica.
A presença de obesidade no momento da abdominoplastia pode ter profunda influência
na
taxa de complicações relacionadas principalmente à ferida operatória16-18.
Alguns estudos reportam taxas de tabagismo de até 48% nos pacientes que realizam
abdominoplastia, sendo que o tabagismo aumenta o risco de complicações da ferida em
três vezes20,31. Os tabagistas não foram incluídos no presente estudo, o que
pode ter contribuído para baixar as taxas de complicação.
No presente estudo, os fatores clínicos e antropométricos que se associaram
significativamente a complicações pós-operatórias nesses pacientes pós-bariátricos
foram principalmente o peso máximo pré-gastroplastia, o IMC pré-gastroplastia, a
perda de peso total, a variação de IMC e a presença de comorbidades. No nosso
estudo, as comorbidades foram preditores de complicação. Entretanto, alguns estudos
apontam que as comorbidades são pobres preditores de complicações13,18.
A variação de IMC (∆IMC), principalmente quando essa variação de IMC for maior que
20kg/m2 (comparando o IMC antes da bariátrica com o IMC antes da
plástica) mostrou uma associação significativa com complicações pós-operatórias em
abdominoplastia em pacientes pós-bariátricos. Esses dados foram confirmados por
outros estudos13,32. Assim como, a média de perda de peso foi
superior nos pacientes que complicaram, semelhante a outro estudo16.
Um IMC máximo > 50Kg/m2 apresenta um risco 2,6 vezes maior de
desenvolver uma infecção que um IMC máximo menor que
50Kg/m2,13.
O peso total do tecido ressecado durante a abdominoplastia influenciou de forma
significativa no aparecimento de complicações pós-operatórias, tais como: seroma e
deiscência de ferida, principalmente quando o retalho pesava mais de 2.000g. Outros
estudos também verificaram o aumento de complicações pós-operatórias conforme o
aumento do peso dos tecidos ressecados nas cirurgias plásticas pós-bariátricas2,17,25,31.
O advento da cirurgia bariátrica trouxe resultados duradouros e satisfatórios no
combate à obesidade. O desejo do paciente após perda ponderal maciça é realizar
procedimentos cirúrgicos para melhora do contorno corporal. A abordagem criteriosa
e
diferenciada do cirurgião para cada caso, ao lado de um acompanhamento
multidisciplinar, serão fatores fundamentais para uma adequada conduta destes
pacientes, visando o melhor resultado reparador e prevenção de complicações8,19.
O cirurgião plástico deve estar atento aos aspectos antropométricos, clínicos e
cirúrgicos que aumentam significativamente o risco de complicações pós-operatória
em
pacientes pós-bariátricos. Apesar da perda de peso significativa dos
pós-bariátricos, eles não conseguem reverter totalmente seu risco aumentado para
complicações. Isso merece investigações futuras para determinar as razões biológicas
e mecanismos para diminuir a taxa de complicações desses pacientes. Assim como,
estudar protocolos para preparar melhor esses pacientes para novos procedimentos
cirúrgicos.
CONCLUSÃO
O perfil dos pacientes pós-bariátricos submetidos à abdominoplastia foi representado
por mulheres, com média de idade de 41 anos, de IMC máximo de 46 kg/m2,
de peso médio máximo de 120 Kg e de perda de peso médio de 48Kg. Esses pacientes
apresentaram IMC médio antes da plástica de 27,6 Kg/m2 e % PEP de 78,8%.
Houve redução significativa das comorbidades após a cirurgia bariátrica,
destacando-se as taxas de remissão completa para diabete melito, dislipidemia,
síndrome da apneia do sono e síndrome metabólica.
A média do intervalo de tempo entre a cirurgia bariátrica e a realização da
abdominoplastia foi de 43 meses. A taxa geral de complicação pós-abdominoplastia em
pacientes pós-bariátricos foi de 31,5% e os fatores significativamente associados
às
complicações foram: idade maior que 40 anos, presença de comorbidades, peso do
retalho retirado do abdome maior que 2.000g e ΔIMC maior que 20Kg/m2.
COLABORAÇÕES
SCR
|
Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito;
concepção e desenho do estudo.
|
JLSM
|
Aprovação final do manuscrito; concepção e desenho do estudo; realização
das operações e/ou experimentos.
|
LAC
|
Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito.
|
FGF
|
Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito.
|
JLDF
|
Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito.
|
LRC
|
Análise estatística; redação do manuscrito ou revisão crítica de seu
conteúdo.
|
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DF, Brasil.
Autor correspondente: Jefferson Lessa Soares
de Macedo, SQS 213, Bloco H, Apto 303 - Asa Sul, Brasília, DF,
Brasil. CEP 70292-080. E-mail: jlsmacedo@yahoo.com.br
Artigo submetido: 18/1/2018.
Artigo aceito: 17/5/2018.
Conflitos de interesse: não há.