INTRODUÇÃO
A esteatonecrose é uma afecção benigna comum que pode ser assintomática ou
manifestar-se como massa palpável, dor ou achados associados, tais como espessamento
cutâneo ou retração do mamilo. A esteatonecrose pode ter vários aspectos
mamográficos. Achados comuns e característicos são massas circunscritas
radiotransparentes ou de densidade mista de gordura e partes moles com contorno
calcificado ou não, conhecidas como cisto lipídico ou oleoso1,2 (Figura 1).
Figura 1 - Imagem de ressonância magnética da mama direita com área de
esteatonecrose.
Figura 1 - Imagem de ressonância magnética da mama direita com área de
esteatonecrose.
Estes podem ser vistos depois de qualquer trauma da mama, inclusive cirurgia. A
esteatonecrose é comumente vista após ressecção de nódulo e radioterapia para
carcinoma de mama e depois de cirurgia extensa3. É uma complicação que ocorre com alguma frequência nas cirurgias
mamárias, principalmente nas reconstruções mamárias, nas cirurgias conservadoras ou
TRAM, caracterizando-se, inicialmente, por endurecimento de uma região que evolui
para uma nodulação de tamanhos variados, em qualquer região mamária, com cistos
oleosos e fibrose que traduz uma preocupação constante por parte das pacientes, do
oncologista, do mastologista e do cirurgião plástico devido à ocorrência de recidiva
tumoral.
Patologia
À microscopia, a mudança inicial é a interrupção de células de gordura, onde
vacúolos com os restos de células de gordura necróticas são formados. Eles,
então, tornam-se rodeados por macrófagos carregados de lipídios, células
gigantes multinucleadas e células inflamatórias agudas. A fibrose desenvolve-se
durante a fase de reparação, perifericamente encerrando uma área de gordura
necrótica e restos celulares, possivelmente palpáveis no sítio cirúrgico.
Eventualmente, a fibrose pode substituir a área de gordura degenerada por uma
cicatriz ou a gordura degenerada pode persistir por anos dentro de uma cicatriz
fibrótica4,5 (Figura 2).
Figura 2 - Imagem de ressonância magnética da mama esquerda com área de
esteatonecrose, medidas e presença de fibrose.
Figura 2 - Imagem de ressonância magnética da mama esquerda com área de
esteatonecrose, medidas e presença de fibrose.
Achados radiológicos
A densidade e as espiculações, comuns em cirurgias recentes, extensas e
associadas à radioterapia desaparecem ou tornam-se nódulos radioluscentes e
circunscritos (cistos oleosos - Figura 3)
em um período variável, que pode durar até 4 anos. Além disso, as calcificações
amorfas e inespecíficas tornam-se mais periféricas e grosseiras. As
calcificações grosseiras relacionadas à esteatonecrose devem ser descritas como
distróficas6-9.
Figura 3 - Imagem de ressonância magnética da mama direita com área de
esteatonecrose, presença de cisto oleoso.
Figura 3 - Imagem de ressonância magnética da mama direita com área de
esteatonecrose, presença de cisto oleoso.
Na recidiva subcicatricial, por outro lado, os achados mamográficos tornam-se
mais suspeitos em relação aos exames anteriores. A densidade, as espiculações
e/ou o número de calcificações amorfas aumentam10,11.
A marcação da cicatriz cirúrgica por marcador radiopaco apropriado pode ser útil
para a correlação espacial entre o achado mamográfico e a cicatriz. O marcador
radiopaco linear costuma ser padronizado para cicatriz cirúrgica na mama12.
OBJETIVO
Descrever uma técnica alternativa para o tratamento da esteatonecrose em cirurgias
de
reconstrução de mama e estética.
MÉTODO
Foi realizada uma revisão retrospectiva dos prontuários das pacientes submetidas à
cirurgias nas mamas, seja por tratamento da neoplasia da mama e terapias adjuvantes
ou cirurgia estética, no período de 2012 a 2016, que evoluíram com esteatonecrose,
sendo submetidas ao tratamento com lipoaspiração, inspirado na técnica de perfuração
óssea para tratamento de necrose óssea, realizada por ortopedistas1,2.
Todas as pacientes assinaram termo de consentimento informado autorizando o uso de
seus registros e de informações de seu tratamento, assim como de suas fotografias
e
exames, para fins científicos.
Os dados analisados foram as características da pele (deformidades), a cirurgia
prévia realizada, e aos resultados estéticos relacionados a técnica cirúrgica para
o
tratamento alternativo da esteatonecrose.
O tratamento da esteatonecrose foi definido pelo cirurgião plástico, autor preceptor,
inspirado na técnica de perfuração óssea para tratamento de necrose óssea, realizada
pelo ortopedia (“foragem”)1,2. Escolheu-se uma cânula de lipoaspiração com
furo cortante desenvolvida para o tratamento de hidroadenite e hiperidrose.
Decidiu-se experimentar a perfuração e aspiração das esteatonecroses, que são
ocorrências relativamente frequentes nas reconstruções mamárias e mamoplastias.
Delimitamos a área de necrose (Figura 4), e após
infiltração rotineira da região, introduzimos a cânula no interior do nódulo
necrosado e foram feitas várias perfurações com a mesma, conectada ao lipoaspirador,
que sugou parte do tecido necrosado, além do conteúdo oleoso dos eventuais cistos
que formam nestes nódulos.
Figura 4 - Foto da marcação pré operatória para realização da técnica de
lipoaspiração.
Figura 4 - Foto da marcação pré operatória para realização da técnica de
lipoaspiração.
Acreditamos que ocorra uma neovascularização destas áreas, que ficam mais amolecidas,
evitando as grandes deformações que a ressecção cirúrgica causa nestas áreas.
Todos os procedimentos foram realizadas pelo mesmo cirurgião. O método escolhido com
base na criteriosa análise do caso pelo cirurgião plástico assistente foi explicado
à paciente.
Todas as pacientes realizaram um acompanhamento pós-operatório de, no mínimo, 12
meses.
RESULTADOS
No período englobado, 8 pacientes foram selecionadas.
A idade média das pacientes foi de 56 anos.
Todas possuíam alguma deformidade na mama acometida, detectada após realização de
ressonância nuclear magnética, com média de tamanho de 1,8cm, sendo o cisto oleoso
o
mais comuns - 5 pacientes (62,5%).
Do total de pacientes 75% possuíam história de neoplasia mamária.
DISCUSSÃO
O tratamento clássico consiste em retirar os nódulos e fibrose, que muitas vezes
levam à deformidade da mama, com perda de volume e da forma da mama reconstruída.
A
técnica proposta neste trabalho propõe minimizar esses efeitos da técnica de
ressecção clássica, por meio da lipoaspiração e estímulo para a
neovascularização.
Este é um dos trabalhos pioneiros na literatura nacional a avaliar alternativa no
tratamento da esteatonecrose.
Ao buscar artigos de outras nacionalidades sobre o tema, notamos poucos trabalhos
específicos.
Quanto às características da pele
Observou-se a longo prazo, com seguimento mínimo de 12 meses, que as nodulações
palpável regrediram na sua totalidade. Não foram observadas deformidades
superficiais, nem retrações nas áreas lipoaspiradas.
Quanto às cirurgias prévias
75% possuíam história de neoplasia mamária.
Quanto ao tratamento proposto e adotado
Todas as pacientes foram submetidas à técnica cirúrgica proposta, com a
perfuração e aspiração das esteatonecroses. Delimitamos a área de necrose e,
após infiltração rotineira da região, introduziu-se a cânula no interior do
nódulo necrosado e foram feitas várias perfurações com a mesma, conectado ao
lipoaspirador, que sugou parte do tecido necrosado e também o conteúdo oleoso
dos eventuais cistos.
Quanto aos resultados estéticos relacionados à técnica cirúrgica para o
tratamento alternativo da esteatonecrose
Todas as pacientes ficaram satisfeitas com o resultado estético final, sem
depressão, nodulações palpáveis ou retrações.
Estudos adicionais são necessários para melhor caracterizar este padrão de
tratamento e fazer uma análise mais detalhada do quadro neste grupo
populacional, além do aumento do número de pacientes submetidas. Nosso trabalho
serve de base para estudos posteriores sobre o assunto e estudo posterior com
maior n, além de questionário elaborado para documentar a satisfação das
pacientes.
CONCLUSÃO
Concluímos que a individualização do paciente é a chave para o sucesso do tratamento
da esteatonecrose e uma ferramenta essencial para atender às expectativas e anseios
da paciente após essa complicação. Cada técnica tem suas indicações, vantagens e
limitações, que devem ser amplamente discutidas com o paciente visando o melhor
resultado possível. Na técnica proposta foram evidenciadas vantagens quanto a
deformidades e satisfação das pacientes.
COLABORAÇÕES
LDPB
|
Análise e/ou interpretação dos dados; análise estatística; concepção e
desenho do estudo; realização das operações e/ou experimentos; redação
do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
|
OMC
|
Análise e/ou interpretação dos dados; análise estatística; aprovação
final do manuscrito; concepção e desenho do estudo.
|
MCC
|
Análise e/ou interpretação dos dados; análise estatística; aprovação
final do manuscrito.
|
LMCD
|
Análise e/ou interpretação dos dados; análise estatística; redação do
manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
|
MCAG
|
Análise e/ou interpretação dos dados; análise estatística; redação do
manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.
|
IRJ
|
Análise e/ou interpretação dos dados; análise estatística.
|
REFERÊNCIAS
1. Althoff FP, Petrelli ASC. Correlação dos achados mamográficos com o
sistema BI-RADS. [Monografia]. Rio de Janeiro: Curso de Pós-Graduação da Santa
Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro; 2005.
2. American College of Radiology. ACR BI-RADS Mammography. 4th ed. In:
ACR Breast Imaging Reporting and Data System, Breast Imaging Atlas. Reston:
American College of Radiology; 2003.
3. http://www.inca.gov.br
4. Bargum K, Nielsen SM. Case report: fat necrosis of the breast
appearing as oil cysts with fat-fluid levels. Br J Radiol. 1993;66(788):718-20.
DOI: 10.1259/0007-1285-66-788-718 DOI: http://dx.doi.org/10.1259/0007-1285-66-788-718
5. Taboada JL, Stephens TW, Krishnamurthy S, Brandt KR, Whitman GJ. The
many faces of fat necrosis in the breast. AJR Am J Roentgenol.
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Early Results of Capitate Forage as a New Treatment Method for Kienböck's
Disease. J Hand Microsurg. 2013;5(2):58-62. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s12593-013-0098-y
7. Godinho ER, Koch HA. Submissão às recomendações do BI-RADS(tm) por
médicos e pacientes: análise preliminar de 3.000 exames realizados em uma
clínica particular. Radiol Bras. 2004;37(1):21-3. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-39842004000100006
8. Aguillar V, Bauab S, Maranhão N. Relatório mamográfico e
ultra-sonográfico segundo o BI-RADS. Guia e dúvidas. In: Aguillar V, Bauab S,
Maranhão N, eds. Mama: diagnóstico por imagem. 1ª ed. Rio de Janeiro: Revinter;
2009. p. 301-4.
9. Kopans DB. Analisando a mamografia. In: Kopans DB, ed. Imagem da
mama. 2ª ed. Rio de Janeiro: Medsi; 1998. 332 p.
10. Jackson VP, Jahan R, Fu YS. Lesões benignas da mama. In: Basset LW,
Jackson VP, Jahan R, Fu YS, Gold RH, eds. Doenças da mama. Diagnóstico e
tratamento. 1ª ed. Rio de Janeiro: Revinter; 2000.
11. Sickles EA, D'Orsi CJ, Bassett LW. ACR BI-RADS® Mammography. In: ACR
BI-RADS® Atlas, Breast Imaging Reporting and Data System. Reston: American
College of Radiology; 2013.
12. http://www.indatasus.gov.br/siscam/siscam.php
1. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São
Paulo, SP, Brasil.
2. Hospital Daher Lago Sul, Brasília, DF,
Brasil.
3. Hospital das Forças Armadas, São Paulo, SP,
Brasil.
Autor correspondente: Ognev Meireles Cozac, SGA/L2 Sul Quadra 616,
Conjunto A, Loja 06. Centro clínico Linea Vitta - Brasília, DF, Brasil. CEP:
70200-760. E-mail: ognev@terra.com.br
Artigo submetido: 1/12/2016.
Artigo aceito: 17/5/2018.
Conflitos de interesse: não há.