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Correção cirúrgica de múltiplas hérnias abdominais associada à abdominoplastia: relato de caso
RESUMO
O abdômen possui importância estética e funcional de extrema importância no ser humano. O reparo da hérnia abdominal muitas vezes causa cicatrizes em posições indesejadas E alterações morfológicas em região abdominal. Relato de caso de paciente submetida à abdominoplastia com posterior surgimento de hérnias abdominais. Para a correção cirúrgica, foi realizada incisão em cicatriz prévia e dissecção ampla de parede abdominal, com suturas de sacos herniários e colocação de tela de polipropileno abrangendo toda área de descolamento. Paciente evolui satisfatoriamente, com melhora da dor abdominal e com resultado estético abdominal satisfatório. Procedimentos não estéticos combinados, como quando associados com hernioplastia, carregam um risco maior do que o procedimento isolado. Nenhum caso semelhante foi encontrado na literatura.
Palavras-chave:
Hérnia abdominal; Abdominoplastia; Cicatriz; Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos.
INTRODUÇÃO
O abdômen possui importância estética e funcional de extrema importância no ser humano. As primeiras abdominoplastias foram realizadas com o intuito de corrigir grandes hérnias ventrais1. Com a evolução da técnica, os estigmas das cicatrizes e os resultados estéticos foram se aprimorando, com resultados satisfatórios. O reparo da hérnia abdominal muitas vezes causa cicatrizes em posições indesejadas, alterações morfológicas em região abdominal. O procedimento combinado é uma opção para obter-se o melhor resultado cirúrgico funcional e estético.
OBJETIVO
Relato de caso de paciente apresentando múltiplas hérnias abdominais submetida à correção cirúrgica associada à abdominoplastia.
MÉTODOS
O prontuário e registros fotográficos do paciente foram verificados. Uma revisão bibliográfica sobre correção de hérnia após realização de abdominoplastia foi realizada em CAPES, Scielo e PubMed dispondo-se dos termos "hernia associated with abdominoplasty", "abdominoplasty complication" e "abdominal hernias following abdominoplasty", além da literatura especializada atual.
RESULTADOS
Relato de caso de paciente de 42 anos, hígida, submetida à abdominoplastia em setembro de 2016, procedimento sem intercorrências (Figura 1). Após seis meses de pós-operatório, iniciou com dor abdominal inespecífica, sem abaulamentos abdominais ou outras queixas. Realizada ecografia, que evidenciou quatro hérnias abdominais, conforme laudo: hérnia em linha média, na região epigástrica, não encarcerada, com colo de 1,7cm x 1,0cm, hérnia umbilical, não encarcerada, com colo de 1,0cm x 1,0cm, hérnia em fossa ilíaca esquerda, com colo de 1,0cm x 1,0cm e hérnia em fossa ilíaca direita, não encarcerada, com colo de 1,6cm x 1,2cm, sendo as duas últimas classificadas como hérnia de Spiegel.
Figura 1. Pré-operatório e pós-operatório de 30 dias após abdominoplastia.
Paciente submetida à correção cirúrgica de múltiplas hérnias abdominais por equipe de cirurgia geral e em conjunto com equipe de cirurgia plástica do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre em fevereiro de 2018. Optou-se por realizar abordagem semelhante à técnica de abdominoplastia tradicional, com incisão em cicatriz prévia e dissecção ampla de subcutâneo, realizada por equipe de cirurgia plástica, com exposição de defeitos herniários em região epigástrica e umbilical, e em fossas ilíacas demonstrou-se um enfraquecimento de parede abdominal, sem saco herniário visível. (Figura 2).
Figura 2. Identificação transoperatória de hérnia umbilical e epigástrica, e tela de polipropileno abrangendo toda área de descolamento.
Foi realizada sutura de defeitos em região epigástrica, umbilical e em fossas ilíacas com fio de polipropileno 2-0. Para o reforço de parede abdominal, foi utilizada tela de polipropileno de 30cm x 30cm, abrangendo toda área de descolamento e cobrindo defeitos aponeuróticos, e fixada com fio de Poliglecaprone 3-0. Não foram realizadas suturas de adesão (Baroudi) e optou-se por inserir dreno de Portovac ¼ em saída em região inguinal direita. Procedimento sem intercorrências (Figura 3).
Figura 3. Pós-operatório imediato.
Paciente evolui satisfatoriamente, apresentando discreta epidermólise em cicatriz umbilical, com melhora de dor abdominal (Figura 4).
Figura 4. Pós-operatório de correção de hérnia abdominal de 60 dias.
DISCUSSÃO
Os objetivos do reparo da hérnia abdominal são reconstruir a integridade estrutural da parede abdominal, minimizando a morbidade2. As técnicas atuais incluem o fechamento primário, o reparo por estágios e o uso de materiais protéticos. As técnicas para abdominoplastia incluem o uso da incisão abdominal transversa inferior e a ressecção do excesso de pele, como descrito por Pitanguy em 19671.
A abordagem tradicional do reparo da hérnia incisional geralmente envolve uma abordagem cirúrgica através da cicatriz vertical, ou em topografia de hérnia, sendo não aceita pelos pacientes, principalmente por mulheres jovens. Eles preferem não ser operados em vez de ter uma cicatriz tão visível. Contudo, uma abordagem através de uma incisão baixa transversal pode ser considerada2.
Segundo estudo, a cirurgia abdominoplastia combinada com o reparo de hérnia não acrescenta riscos comparada com a cirurgia de hernioplastia apenas, segundo um estudo realizado com 111 pacientes3.
Uma análise de 4925 pacientes submetidos à abdominoplastia com ou sem hernioplastia concomitante evidenciou que os procedimentos combinados apresentavam maiores complicações em relação ao procedimento único. Hipertensão, tabagismo e uso crônico de esteroides foram identificados como preditores de complicações, e o grupo com a cirurgia combinada (abdominoplastia associada à hernioplastia) teve maior taxa de complicações (18,3% versus 9,8%)4.
O uso de tela de polipropileno para correção de hérnias abdominais está consolidado, com menos complicações e recidiva5. Casos semelhantes foram pesquisados na literatura e não foram encontrados relatos de correções cirúrgicas de múltiplas hérnias associadas à abordagem da abdominoplastia, apenas casos de hérnia única corrigida durante abdominoplastia6.
CONCLUSÃO
O reparo de hérnias abdominais através da incisão e dissecção realizadas como nas abdominoplastias tradicionais representam uma boa opção para pacientes que não desejam ter cicatrizes abdominais visíveis ou que já realizaram procedimento prévio. O procedimento combinado apresenta maior chance de riscos de complicações pós-operatórias, portanto, deve-se expor estes riscos e a escolha deve ser realizada em conjunto com o paciente. Não foram encontrados casos semelhantes ao descrito na literatura.
REFERÊNCIAS
1. Pitanguy I. Abdominal lipectomy: An approach to it through an analysis of 300 consecutive cases. Plast Reconstr Surg. 1967;40(4):384-91. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/00006534-196710000-00012
2. Grella R, Razzano S, Lamberti R, Trojaniello, D'Andrea F, Nicoletti GF. Combined epigastric hernia repair and mini-abdominoplasty. Case report. Int J Surg Case Rep. 2015;8C:111-3. PMID: 25667986 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.ijscr.2014.10.033
3. Moreno-Egea A, Campillo-Soto Á, Morales-Cuenca G. Does Abdominoplasty Add Morbidity to Incisional Hernia Repair? A Randomized Controlled Trial. Surg Innov. 2016;23(5):474-80. DOI: http://dx.doi.org/10.1177/1553350616646480
4. Koolen PG, Ibrahim AM, Kim K, Sinno HH, Lee BT, Schneider BE, et al. Patient selection optimization following combined abdominal procedures: analysis of 4925 patients undergoing panniculectomy/abdominoplasty with or without concurrent hernia repair. Plast Reconstr Surg. 2014;134(4):539e-50e. PMID: 25357048 DOI: http://dx.doi.org/10.1097/PRS.0000000000000519
5. Luijendijk RW, Hop WC, van den Tol MP, de Lange DC, Braaksma MM, IJzermans JN, et al. A comparison of suture repair with mesh repair for incisional hernia. N Engl J Med. 2000;343(6):392-8. PMID: 10933738 DOI: http://dx.doi.org/10.1056/NEJM200008103430603
6. Robertson JD, de la Torre JI, Gardner PM, Grant JH 3rd, Fix RJ, Vásconez LO. Abdominoplasty repair for abdominal wall hernias. Ann Plast Surg. 2003;51(1):10-6. PMID: 12838119 DOI: http://dx.doi.org/10.1097/01.SAP.0000054240.21252.64
Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, UFCSPA, Porto Alegre, RS, Brasil.
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