ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

Previous Article Next Article

Articles - Year2004 - Volume19 - Issue 2

RESUMO

Este trabalho descreve a associação de abdominoplastia com cirurgia ginecológica cavitária, em 51 pacientes, sem descolamento prévio do retalho abdominal.
O ginecologista inicia o procedimento através de incisão mediana infra-umbilical, a qual lhe propicia adequada exposição da cavidade, além de evitar o contato do material cavitário e trauma com os retalhos que permanecerão.
O descolamento do retalho na abdominoplastia poderá ser realizado por ressecção em bloco ou por descolamento infra ou supra-umbilical.

Palavras-chave: Abdominoplastia; abdominoplastia associada a cirurgia cavitária; abdominoplastia associada a cirurgia ginecológica; cirurgias associadas

ABSTRACT

This paper desenhes the association of abdominoplasty and intra-abdominal gynecologie surgery in 51 patients, with no previous abdominal fiap undermining. The gynecologist starts the procedure with a midline infraumbilieal incision, which appropriately exposes the abdomen, and avoids trauma and contact of intra-abdominal material with the fiaps to be preserved. The fiap may be undermined in abdominoplasty by block resection or infra- or supraumbilieal undermining.

Keywords: Abdominoplasty; abdominoplasty combined with intra-abdominal surgery; abdominoplasty combined with gynecologic surgery; combined surgeries


INTRODUÇÃO

A abdominoplastia associada à cirurgia ginecológica cavitária tem sido uma combinação atrativa tanto para o ginecologista, pela melhor e ampla exposição do campo operatório(1,2,3), quanto para a paciente, pois resolve seus problemas orgânicos e estéticos em único ato cirúrgico/anestésico, único pós-operatório, diminuição dos custos hospitalares e, por vezes, justifica a abdominoplastia perante o marido, a família ou o trabalho(1,2,4-8).

Com certeza é um procedimento de maior risco, pelo maior tempo cirúrgico, maior perda sangüínea, maior exposição dos tecidos, comunicação entre dois espaços e participação de duas equipes(8-10).

A cirurgia combinada é iniciada pelo ginecologista que usa uma incisão mediana infra-umbilical (Figs. 1 e 2), através da qual expõe amplamente a cavidade e por onde manipula o material cavitário, sem contato e sem trauma com a pele e o tecido subcutâneo que permanecerão após a abdominoplastia (Fig. 3), e sem exposição do retalho e da parede músculo aponeurótica. Após o término da cirurgia cavitária, a equipe de Cirurgia Plástica inicia a abdominoplastia utilizando a incisão indicada para o caso, e o descolamento pode ser inferior, superior(11) ou por ressecção em bloco do retalho(3,9,12 )(Fig. 4).


Fig. 1 - Marcação da área a ser excisada na abdominoplastia e da incisão mediana para cirurgia ginecológica.


Fig. 2 - Incisão mediana na parede abdominal, que possibilita ao ginecologista ampla exposição.


Fig. 3 - O contato do material cavitário, assim como o trauma na pele e subcutâneo se restringe à área que será excisada.


Fig. 4 - Após o termino da cirurgia ginecológica pode-se iniciar o descolamento pela marcação inferior, superior ou fazer a incisão em bloco.



Alguns autores(1,2,5,7,8,12,13) têm se manifestado favorável a esta combinação, desde que respeitados alguns cuidados pré e per-operatórios, ressaltando suas vantagens e o pequeno número de complicações.

Shull(8) e Voss(10) destacam o aumento do tempo cirúrgico, do tempo de internação, do número de transfusões e complicações como embolia, para restringir esta combinação.

Savage(7) e Cosin(12) citam os cuidados com os pacientes obesos e fumantes e a profilaxia da trombose venosa.

Castro(1, 4), Gemperli(5), Perry(6) e Franco(13) descrevem a abordagem inicial pelo cirurgião plástico com descolamento até a cicatriz umbilical e proteção dos retalhos com compressas, para então iniciar a cirurgia cavitária, e depois retornar e continuar com a abdominoplastia.

Petrorius(3), Souza Pinto(9) e Cosin(12) descrevem a excisão prévia, em bloco, da pele e do tecido subcutâneo, seguida pela cirurgia cavitária e posterior retorno da cirurgia plástica para a continuação da abdominoplastia.

Matthes(14) descreve um caso de implantação de endometrioma na cicatriz horizontal do abdominoplastia em cirurgia conjunta com histerectomia.


PACIENTES E MÉTODOS

Foram avaliadas, através de protocolo, 51 pacientes submetidas a abdominoplastia associada à cirurgia ginecológica cavitária, realizadas por um único Cirurgião Plástico e várias equipes ginecológicas, no período de janeiro de 1997 a agosto de 2002. A faixa etária variou entre 27 e 67 anos e a parte ginecológica constou de histerectomia em 36 pacientes (70,6%), cirurgia de trompa em 14 (27,4%) e cirurgia de ovário em 1 (2,0%).

São feitos exames pré-operatórios de rotina, avaliações ginecológica e respiratória; a paciente é informada da possibilidade de não realização da abdominoplastia se houver intercorrências durante a cirurgia ginecológica.

As pacientes são marcadas previamente, em posição ortostática, com linha no sulco suprapúbico, que se estende até as espinhas ilíacas ântero-superiores e outra ligando estas por sobre o umbigo, conferindo-lhe um desenho elíptico (Fig. 1). Também é determinada a linha média entre o umbigo e o sulco suprapúbico, onde será feita a incisão do ginecologista (Figs. 1 e 2). Depois da exposição da cavidade e do tratamento específico (Fig. 3), é feito o fechamento da parede até a musculatura dos retos abdominais. Nesse momento é feita a troca de todo o material e campos cirúrgicos e iniciada a abordagem pela equipe de Cirurgia Plástica por incisão na linha inferior (Fig. 4) e descolamento de retalho (Fig. 5), fechamento da aponeurose com mononylon 2.0 (Fig. 6), isolamento de umbigo e completado o descolamento até o rebordo costal. Segue-se a plicatura dos retos abdominais com mononylon 2.0, confecção e fixação do umbigo como preconiza Juarez Avelar (15) (Fig. 7). Em seguida procede-se à ressecção do excesso de pele e do tecido subcutâneo, à drenagem aspirativa por contra-incisão no púbis e fechamento da pele e tecido subcutâneo por planos (Fig.8).


Fig. 5 - Início do descolamento pela marcação da linha suprapúbica.


Fig. 6 - Fechamento da aponeurose infra-umbilical com náilon 2.0.


Fig. 7 - Após o término do descolamento, é realizada a plicatura dos retos e fixação do umbigo.


Fig. 8 - Término da cirurgia com drenagem aspirativa.



A anestesia por bloqueio foi realizada em 43 (84,3%) pacientes, e geral em 8 (15,7%) casos.

A deambulação fez-se entre 24 e 36 horas e os drenos foram retirados em 48 horas.

As pacientes permaneceram internadas por 48 horas em 43 (84,3%) casos e 72 horas em 08 (15,7%).

O uso da antibioticoterapia somente nas primeiras 24 horas foi em 40 (78,4%) casos e por mais de 24 horas em 11 (21,6%) casos, por indicação do ginecologista.

O tempo da cirurgia associada foi de: 2-3 horas em 16 (31,3%) pacientes, 3-4 horas em 26 (50,9%) pacientes e de 4-5 horas em 9 (17,8%) pacientes.

Um caso (1,9%) resultou em cicatriz em ¨T¨ invertido e dois casos (3,9%), com pequena cicatriz vertical suprapúbica.


RESULTADOS

A cicatriz resultante foi horizontal em 50 pacientes (98,0%). Em apenas um caso (2,0%) resultou cicatriz em T invertido como resíduo de cicatriz vertical pré-existente.

Seroma aconteceu em duas pacientes (3,9%), sendo uma (1,9%) diabética, que evoluiu para infecção por Escherichia coli, sendo tratada por drenagem e antibioticoterapia com resolução satisfatória.

Duas pacientes (3,9%) apresentaram epidermólise em pequena cicatriz vertical suprapúbica, duas tiveram hematoma, sendo um com drenagem espontânea pela pequena cicatriz vertical.

Houve necessidade de transfusão (1,9%) em apenas uma paciente, que apresentou fístula vesicovaginal no pós-operatório, sendo reoperada após um mês com resolução adequada.

Todas as 51 pacientes submetidas a abdomino-plastia associada à cirurgia ginecológica cavitária tiveram satisfação de ordem morfológica e emocional (Figs. 9-12).


Fig. 9 - Pré-operatório: abdominoplastia e histerectomia. Vista frontal.


Fig. 10 - Pós-operatório com 5 meses.


Fig. 11 - Pré-operatório, vista lateral.


Fig. 12 - Pós-operatório com 5 meses.



COMENTÁRIOS

A associação da abdominoplastia com cirurgia ginecológica tem sido solicitada pelas pacientes, pois resolvem problemas estéticos e orgânicos em único ato cirúrgico.

Os cuidados pré-operatórios como restrição ao fumo, avaliação angiológica e a fisioterapia respiratória quando necessária, assim como o exame ginecológico, são importantes na prevenção das complicações.

A possibilidade do cancelamento da abdominoplastia devido a alguma intercorrência de grande vulto durante a cirurgia ginecológica deve ser lembrada à paciente.

A abordagem dessa associação em separado pelo ginecologista por meio da incisão mediana infra-umbilical tem como vantagens:

  • Ampla exposição da cavidade e conseqüente diminuição do tempo da cirurgia ginecológica.
  • Ausência de incisões em aponeurose e músculos, como na abordagem por incisão de Piffanenstiel.
  • Menor possibilidade de contaminação e implante de tecidos ectópicos na parede abdominal como na endometriose, por não haver contato do material da cavidade com os tecidos que permanecerão.
  • Menor exposição do tecido subcutâneo e da aponeurose e diminuição das perdas de líquidos e sangue, devido ao não descolamento prévio do retalho.
  • Possibilidade de o cirurgião plástico iniciar o descolamento por incisão inferior, superior ou fazer ressecção em bloco do retalho (Fig.4).
  • Única atuação de cada equipe cirúrgica, com conseqüente diminuição de custos.
  • Se a evolução da cirurgia ginecológica contra-indicar a abdominoplastia, terão sido evitados descolamentos desnecessários
  • .

    A antibioticoterapia profilática é realizada em todos os casos, tendo em alguns, por entendimento do ginecologista, se estendido além de 24 horas. O tempo do ato cirúrgico dos dois procedimentos foi, na maioria dos casos (82,2%), inferior a quatro horas. O menor tempo de exposição dos tecidos e a conseqüente diminuição da perda de líquidos e sangue, associados à hemostasia rigorosa, evitou o aumento da morbidade, assim como a necessidade de transfusão sangüínea.

    A mobilização ativa e constante dos membros no pós-operatório imediato e a deambulação em 24 a 36 horas, visaram a profilaxia da trombose venosa profunda e da embolia pulmonar e possibilitaram o tempo de internação curto, que foi de 48 horas em 8,3% e 72 horas em 15,6% dos casos.

    As complicações foram de dois casos de seroma, sendo um em paciente diabética que evoluiu com infecção por Escherichia coli, que se resolveu com drenagem pela cicatriz e antibioticoterapia específica. Em outra paciente houve a drenagem espontânea de hematoma pela pequena cicatriz vertical suprapúbica, com conseqüente epidermólise desse segmento, tendo sido ressuturado posteriormente. No outro caso de epidermólise, houve cicatrização por segunda intenção, sendo esteticamente corrigida posteriormente.

    A transfusão sangüínea aconteceu em apenas um caso, tendo essa paciente desenvolvido uma fístula vesicovaginal, que foi corrigida posteriormente.


    CONCLUSÕES

    A associação da abdominoplastia com a cirurgia ginecológica cavitária, quando tomados os cuidados adequados pré, per e pós-operatórios, não aumentou a morbidade ou a mortalidade.

    A abordagem em separado do ginecologista e do cirurgião plástico diminui o trauma nos tecidos que permanecerão, as perdas de líquidos e sangue, a possibilidade do contato do material cavitário com a parede abdominal, o trauma na parede músculo aponeurótica, e evita o descolamento desnecessário do retalho, na impossibilidade da realização da abdominoplastia.

    As poucas complicações não alteraram o resultado estético, nem a satisfação das pacientes.


    AGRADECIMENTOS

    À Dra. Talita Franco, Professora Titular de Cirurgia Plástica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, pela orientação na confecção deste trabalho.


    BIBLIOGRAFIA

    1. Castro CC, Salema R, Aboudib Jr JH, Braga L. Análise da associação entre abdominoplastia e cirurgias ginecológicas. J Bras Gin. 1991;101(10):447-9.

    2. Porchat CA. Estudo comparativo da evolução pós-operatória de pacientes submetidos a abdominoplastia isolada e combinada a outras cirurgias do abdômen. Tese de Mestrado, Fac. Méd. U.F.R.J., Rio de Janeiro, 2000.

    3. Pretorios RG, Matory Jr WE, LaFontaine D. Management of massive ovariun tumors. Surg Ginecol Obstet. 1989;169(6):532-6.

    4. Castro CC. Estudo da associação cirúrgica da plástica de abdome com procedimentos ginecológicos. J Bras Gin. 1977;83(3):137-42.

    5. Gemperli R, Neves RI, Tuma P, Bonamichi GT, Manders EK. Abdominoplasty combined with other intraabdominal procedures. Ann Plast Surg. 1992;29(1):18-22.

    6. Perry AW. Abdominoplasty combined with total histerectomy. Ann Plast Surg. 1986;16(2):121-2.

    7. Savage RC. Abdominoplasty combined with other surgical procedures. Plast Reconstr Surg. 1982;70(4):437-43.

    8. Shull BL, Verheyden CN. Combined plastic and ginecological surgical procedures. Ann Plast Surg. 1988;20(6):552-7.

    9. Souza Pinto EB, Almeida AEF, Reyes MFC. Abdominoplastia com cirurgia da cavidade. Anais do Simpósio Brasileiro de Abdominoplastia.- SBCP; São Paulo, Brasil. 1982.

    10. Voss SC, Sharp HC, Scott JR. Abdominoplasty combined with gynecological surgical procedures. Obstet Gynecol. 1986.;67(2):181-5.

    11. Sinder R. Cirurgia plástica do abdome. Rio de Janeiro, Brasil, 1979.

    12. Cosin A, Powell JL, Donovan JT, Stueber K. The safety and efficacy of extensive abdominal panniculectomy at the time of pelvic surgery. Gyneco Oncol. 1994;55:36-40.

    13. Franco T. A associação de abdominoplastia a cirurgias intracavitárias. Rev Bras Cir. 1971;61:5-17.

    14. Matthes G, Zabel DD, Nastala CL, Shestak KC. Endometrioma of the abdominal wall following combined abdominoplasty and histerectomy: case report and review of the literature. Ann Plast Surg. 1998; 40(6):672-5.

    15. Avelar J. Cicatriz umbilical - da sua importância e técnica de confecção nas abdominoplastias. Rev Bras Cir. 1979;69:41-52.










    I. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Membro Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Mestre em Cirurgia Plástica - Universidade Federal do Rio de Janeiro.
    II. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Membro Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões.
    III. Membro Especialista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.

    Endereço para correspondência:
    João Medeiros Tavares Filho
    Rua Buenos Aires, 255
    Petrópolis - RJ - 25610-140
    Fone/fax: (24) 2243-8033
    e-mail: jmedeiro@compuland.com.br

    Trabalho realizado nos Hospitais Santa Teresa e Beneficência Portuguesa - Petrópolis, RJ.

     

    Previous Article Back to Top Next Article

    Indexers

    Licença Creative Commons All scientific articles published at www.rbcp.org.br are licensed under a Creative Commons license