ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175
Condroma de partes moles relato de caso e revisão da literatura
Soft tissue chondroma case report and review of the literature
Case Report -
Year2015 -
Volume30 -
Issue
3
Eduardo Amaral Gomes1,2,3; Jamil José Saliba3; Eduardo Paulino Júnior3; Gustavo Augusto Matos Saliba4,5,6,7,8; Clênio Martins de Souza Coelho4,6; Augusto Cesar de Melo Almeida4
http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2015RBCP0182
RESUMO
O presente estudo tem o objetivo de apresentar um relato de caso sobre condroma extra-esquelético ou de partes moles, uma lesão rara e benigna diagnosticada através da clínica, radiologia e exame histopatológico. O paciente (24 anos) compareceu ao Setor de Ortopedia do Hospital Unimed Betim com queixa de aumento de volume no polegar esquerdo, indolor há aproximadamente um ano. Durante o exame físico verificou-se presença de uma lesão nodular, de consistência dura, móvel, indolor que não acarretava em alteração funcional do dedo. O paciente foi encaminhado para setor de radiologia do hospital onde foi realizado RX e posteriormente ultrasonografia e ressonância magnética do polegar esquerdo. Diante dos achados dos estudos de imagem a equipe optou pela biópsia excisional da lesão. O exame histopatológico confirmou o diagnóstico de condroma extra-esquelético. Os elementos definidores do condroma de partes moles são: 1) curso clinico benigno e sintomatologia frusta; 2) ausência de conexão entre o tumor e estruturas adjacentes como periosteo, capsula articular ou osso; 3) crescimento lento; 4) ausência de prevalência por sexo; 5) características radiológicas e histológicas do tumor. O diagnóstico raramente é aventado quando confrontamos tumores de partes moles das mãos. A excisão é simples e deve ser completa para se evitar recorrências. A avaliação histopatológica deve ser realizada para confirmação diagnóstica.
Palavras-chave:
Condroma; Tumor benigno; Relato de caso.
ABSTRACT
The present study presents a case report of extraskeletal chondroma or soft tissue chondroma, a rare and benign lesion, diagnosed by clinical findings, imaging studies and histopathological exam. The 24-year-old patient presented at the Orthopedics Section of Unimed Betim Hospital with a slow painless growth on the left thumb about 1 year ago. During the physical examination, a nodular lesion was noted; it had a hard consistency, was mobile and painless, and didn't cause functional impairment for the finger. The patient was referred to the imaging unit of the hospital, where an X-ray was performed; later on, ultrasound and magnetic resonance imaging of the left thumb was done. After the imaging studies, the medical team chose excisional biopsy of the lesion. The histopathological examination confirmed the diagnosis of extra-skeletal chondroma or soft-tissue chondroma. Soft tissue chondroma is usually not considered for a soft-tissue tumor of the hand. Excision is easy and must be complete if recurrences are to be avoided. Histopathological evaluation is required for the final diagnosis.
Keywords:
Chondroma; Soft tissues neoplasm; Thumb.
INTRODUÇÃO
O condroma extraesquelético ou de partes moles é um tumor cartilaginoso benigno de crescimento lento, que provavelmente origina-se do estroma fibroso e não dos tecidos ósseos ou cartilaginosos maduros1. Essa lesão acomete preferencialmente mãos e pés em 90% dos casos, sendo os quirodáctilos o local mais acometido2-4. Mais comumente afeta adultos jovens entre 30-60 anos e sua etiologia é incerta3,4.
O condroma periosteal, descrito pela primeira vez por Lichtenstein & Hall em 19525, representa lesão cartilaginosa benigna localizada entre o tecido ósseo e o periósteo. Posteriormente, outros autores descreveram mais casos desta entidade e aproximadamente 200 casos foram relatados6. É evidente a partir da revisão da literatura que sob o termo condroma extraesqueléticos muitos autores também incluíram o condroma justacortical ou periosteal, um tumor benigno localizado entre o osso e o periósteo. Portanto, o número de casos de condroma de partes moles é realmente menor do que o número cotado1,6. Estes tumores são totalmente independentes das estruturas cartilaginosas ou ósseas, mas desde que eles são oriundos de tecido cartilaginoso, como os condromas ósseos, eles devem ser denominados condroma de partes moles ou condroma extraesquelético. Alguns autores resistem a esta denominação ou simplesmente classificaram como tumores cutâneos cartilaginosos, que não devem ser confundidos com tumores articulares, chamados condromas para-articulares1,2,7.
O presente estudo visa apresentar um caso de condroma de partes moles acometendo o polegar da mão esquerda, diagnosticado por exame clínico, estudos de imagem e exame histopatológico.
RELATO DO CASO CLÍNICO
Paciente de 24 anos, do sexo masculino, atendido no Setor de Ortopedia do Hospital Unimed em Betim, na data de 10 de março de 2005, com queixa de tumoração não dolorosa de crescimento lento no polegar esquerdo entre a falange proximal e distal, com cerca de um ano de evolução.
Ao exame físico, o paciente apresentava assimetria do polegar esquerdo e ausência de sinais flogísticos. À palpação, foi evidenciado aumento de volume do polegar esquerdo, com uma lesão nodular de consistência dura, móvel, que não acarretava em alteração funcional do dedo.
Foi submetido ao exame radiológico, que não revelou alterações ósseas significativas. A ultrassonografia evidenciou, na face flexora do polegar, adjacente ao tendão flexor, formação nodular sólida ou líquida bastante espessa, medindo 8,0 x 6,0 mm de maiores dimensões, distando 1,7 mm da pele, sem evidências de derrame articular ou alterações da transição músculo-tendinosa.
Solicitada ressonância magnética da lesão, que evidenciou pequena formação de aspecto cístico medindo 7,4 x 4,8 mm, na face volar do polegar esquerdo. Mostrava hiposinal nas sequências ponderadas em T1 e hipersinal nas sequências ponderadas em DP/T2 com supressão de gordura, exibindo intenso realce anelar após a injeção endovenosa do agente paramagnético. As estruturas ligamentares, tendíneas e a articulação interfalângica não mostravam alterações. Pela ressonância, a lesão distava cerca de 2,4 mm da pele em seu ponto mais superficial, com estruturas ósseas de aspecto normal (Figura 1).
Figura 1. Notar pequena formação nodular, medindo 7,4 x 4,8 mm, com padrão semelhante ao de lesão cística na face volar do polegar esquerdo (setas). Não há acometimento de estruturas ligamentares e tendíneas. A articulação interfalangiana do polegar de aspecto normal.
O paciente passou a apresentar dor no polegar, sendo indicada pela equipe médica a biópsia excisional. O exame histopatológico da lesão revelou uma pequena lesão nodular, lobulada, brilhante, de coloração brancacenta e consistência firme. A lesão era envolta por cápsula conjuntiva fibrosa espessa e circundada totalmente por tecido fibroadiposo. A microscopia evidenciou a presença de lóbulos de cartilagem hialina madura, com múltiplos ninhos de condrócitos mais volumosos proliferados, sem atipias, em meio à matriz cartilaginosa (Figura 2A). Havia também a descrição de pequenas áreas mixoides e de esparsos focos de calcificação. Existem vários ninhos de condrócitos volumosos e proliferados não atípicos. Pequenas áreas mixoides e calcificação esparsa podem ser notadas (Figuras 2 e 3). O quadro morfológico descrito é compatível com o condroma de partes moles, com áreas mixoides.
Figura 2. Condroma. A - Detalhe da imagem anterior mostrando cápsula conjuntiva fibrosa espessa (setas) e lóbulos constituídos de condrócitos proliferados, em matriz cartilaginosa (HE - 100X). B - Lesão nodular circunscrita, de aspecto lobulado, envolta por tecido fibroadiposo (asterisco) (HE - 25 X).
Figura 3. Condroma. Notar grupo de condrócitos proliferados, sem atipias, formando lóbulo, em meio a matriz cartilaginosa. (HE - 400X).
DISCUSSÃO
O condroma extraesquelético ou de partes moles representa neoplasia benigna rara. Segundo Chung & Enzinger3, a faixa etária mais acometida situa-se entre 30-60 anos, sem prevalência por sexo. As áreas mais afetadas são principalmente membros superiores (72%), membros inferiores (24%), cabeça e pescoço (2%) e demais áreas do corpo (2%). A maioria dos estudos indica que as mãos são o local mais frequente de lesão3-8. O polegar é o menos acometido e o dedo médio é o local de maior incidência da lesão3,4. Há relatos de locais específicos, como os rins, fígado e língua.
A patogênese deste tumor não é bem esclarecida. Há várias teorias para explicar a origem desta entidade nos tecidos moles4. Alguns autores acreditam que ele seja originário da bainha tendinosa, entretanto, outros defendem a ideia da origem a partir da ativação de ilhas de tecido cartilaginoso heterotópico4, motivo pelo qual não apresentam conexão com o tecido ósteocartilaginoso. A hipótese do microtrauma também é aventada como fator etiológico. Segundo Kho & Chen9, existem relatos de múltiplos condromas de partes moles como resultado de herança autossômica dominante Recentemente, mudanças clonais não aleatórias dos cromossomos 6, 11 e 12 foram envolvidos na etiologia do condroma de partes moles. Em outro estudo, a análise molecular revelou que o gene HMGA2 localizado no 12Q15 está relacionado a este patologia, bem como da lipoma9.
O primeiro sintoma é o aparecimento de uma lesão nodular pequena, que gradualmente aumenta de tamanho, embora raramente ocasione dor1-4. A compressão do nervo periférico pelo tumor é rara, mas há relatos do envolvimento dos nervos ulnar, radial e mediano. Ao raio x, 60% das lesões apresentam algum grau de calcificação1,2,9. Os ossos ao redor da lesão raramente são afetados. Macroscopicamente, o tumor tem o diâmetro de aproximadamente 3 cm ou menos, é facilmente delimitado e tem uma consistência firme. Este tumor pode aderir aos tendões, às cápsulas articulares, aos ligamentos ou outros tecidos moles, mas pode ser facilmente removido e, ao contrário do condroma periosteal, está localizado fora do periósteo3,4,10.
A biópsia revela frequentemente um tumor cartilaginoso lobulado benigno, com um notável celularidade e calcificação proeminente. A histopatologia é característica, evidenciando células cartilaginosas com zonas centralizadas de polimorfismo celular e proliferação de células gigantes na margem do tumor. Ocasionalmente, este tumor pode apresentar características morfológicas atípicas, o que dificulta o diagnóstico diferencial com lesões malignas2,11.
O diagnóstico diferencial do condroma extraesquelético deve ser considerado com outros tumores com características similares, mas de comportamento clinico diferente. Os tumores mais importantes são: condroblastoma, condrossarcoma justacortical, osteocondroma, condromatose sinovial e alguns outros como fibroma condromixoide justacortical, tumor desmoide periosteal e calcinose tumoral8-11.
Embora algumas formas do condroblastoma possam ser de interesse por causa de suas características celulares atípicas, não há nenhuma evidência na literatura que esses tumores comportam-se de maneira diferente das formas bem diferenciadas compostas por cartilagem hialina madura1. Assim, é notável que a transformação do condroma extraósseo em condrossarcoma não foi encontrada até agora; entretanto, isso é raro nas lesões condroides do osso1. A excisão completa é a conduta recomendada pela literatura consultada1-4,9. A biópsia primária é contraindicada12. A taxa de recorrência é de 18%, principalmente devido à ressecção incompleta da lesão3.
Em resumo, os elementos definidores do condroma extraósseo ou de partes moles são: 1) curso clínico benigno e assintomático; 2) falta de conexão entre o tumor e as estruturas adjacentes como periósteo, cápsulas articulares ou osso; 3) crescimento tumoral lento; 4) ausência de predominância entre sexo; 5) a característica radiológica e histológica do tumor.
O diagnóstico de condroma de partes moles não é geralmente considerado quando confrontado com um tumor de partes moles da mão. A excisão é fácil e deve ser completa, evitando recorrências. A avaliação histopatológica deve ser realizada para confirmação diagnóstica.
REFERÊNCIAS
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1. Sociedade Brasileira de Cirurgia de Mão, São Paulo, SP, Brasil
2. Hospital Geral Governador Israel Pinheiro, Belo Horizonte, MG, Brasil
3. Hospital Unimed Betim, Betim, MG, Brasil
4. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São Paulo, SP, Brasil
5. Hospital Unimed BH, Belo Horizonte, MG, Brasil
6. Biocor Instituto, Nova Lima, MG, Brasil
7. Hospital Vera Cruz, Belo Horizonte, MG, Brasil
8. IMOP - Instituto de Mastologia, odontologia e cirurgia plástica, Belo Horizonte, MG, Brasil
Instituição: Unimed Betim Hospital, Betim, MG, Brasil.
Autor correspondente:
Gustavo Augusto Matos Saliba
Rua Raul Saraiva Ribeiro, 633
Betim, MG, Brasil CEP 32610-320
E-mail: salibagustavo@yahoo.com.br
Artigo submetido: 23/04/2012.
Artigo aceito: 01/07/2012.
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