ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175
Avaliação e Acompanhamento Psicológico em Pacientes Submetidos à Cirurgia Plástica
Psychological evaluation and follow-up of patients submitted to plastic surgery
Reviw Article -
Year2005 -
Volume20 -
Issue
1
Cristina Maria Vieira Sá CopettiI, Jones M. CopettiII
RESUMO
São apresentados alguns aspectos, fruto de um trabalho de 21 anos, que consideramos importantes na avaliação e no acompanhamento psicológico de pacientes que se submetem à cirurgia plástica. Abordamos a construção do vínculo, a compreensão e a discriminação entre narcisismo saudável e patológico e a abordagem da família no processo cirúrgico.
Palavras-chave:
Recognição. Auto-imagem. Narcisismo
ABSTRACT
Some aspects are presented, fruit of a 21 year-old work, that we considered important in the evaluation and in the patients' psychological attendance that undergo the plastic surgery. We approached the construction of the bond, the understanding and discrimination between healthy and pathological narcissism and the approach of the family in the surgical process.
Keywords:
Recognition. Self concept. Narcissism
INTRODUÇÃO
A avaliação e o acompanhamento psicológico de pacientes submetidos à cirurgia plástica visa traçar os principais aspectos de personalidade que influenciam na percepção dos resultados obtidos. Muitas vezes, as expectativas e os desejos interferem na valorização dos mesmos. Portanto, este acompanhamento psicológico oportuniza um espaço especializado, em que o refinamento reside na construção do vínculo e na concepção do paciente como um todo. A questão da auto-imagem é abordada tanto do ponto de vista de uma saudável e estruturante necessidade de reconhecimento, quanto de um narcisismo patológico.
A auto-imagem (corporal e psíquica) está relacionada com aspectos inter e intra-relacionais. Seu desenvolvimento é iniciado desde a expectativa e desejos dos pais na gestação, bem como dos primeiros cuidados que o bebê recebe e vai incorporando. O que é levado em conta não é o que é feito e sim o como é feito (com entusiasmo, indiferença, raiva, depressão, etc... ). Essas gravações podem ser repetidas com o cirurgião e com a sua equipe e, quando bem compreendidas, reelaboradas. Há uma revivência de etapas muito iniciais do desenvolvimento emocional primitivo1-4.
A entrevista psicológica é baseada na teoria e na técnica psicanalítica vincular1, humanista5 e sistêmica6 associada à aplicação de testes projetivos, portanto, um referencial multifocal.
O acompanhamento psicológico pré-operatório consta de um espaço oferecido ao paciente, onde ele possa colocar suas motivações, insatisfações, desejos, fantasias, expectativas e sentimentos, os mais variados possíveis, em relação à cirurgia que será submetido.
O acompanhamento psicológico com familiares ou acompanhantes cuidadores também é importante, haja vista que a cirurgia de um familiar pode despertar ansiedades e sentimentos ambivalentes (de culpa, de dívida, de inveja, de ciúmes inconscientes, etc...). Como esse processo é interacional, a ansiedade vivenciada pode ser "contagiosa".
Com o acompanhamento psicológico pós-operatório, poderemos verificar que quando a comunicação entre o paciente e seu cirurgião foi construída, composta ("com" -juntamente construída) em vez de imposta por uma ou ambas as partes, há uma maior e melhor capacidade para suportar e vivenciar alguns desconfortos (edemas, ecmoses, pruridos, etc) que fazem parte desse processo de recuperação. A capacidade "continente" da equipe, dos familiares e do próprio paciente é ativada. Algumas ansiedades são características desse período quando, por exemplo, acordam no pós-operatório imediato e estão com algum curativo, cinta, pontos, etc...; no dia da retirada de pontos com medo da dor; a primeira vez que se olham no espelho e se deparam com uma nova imagem que ainda não é o resultado final almejado. O "olhar" do cirurgião funciona como o espelho das projeções (idealizada, persecutória, protetora, incentivadora) do seu paciente.
Nesse período, auxiliamos o paciente a desenvolver sua capacidade negativa1,7, que seria a capacidade de suportar suas sensações e emoções desconfortáveis. A paciência é fundamental para posteriormente se permitir desfrutar8 o realizado.
Diversos assuntos poderão ser descritos e compreendidos, como por exemplo: aspectos transferenciais e contratransferências do paciente e da equipe cirúrgica; sabotagens inconscientes no pós-operatório; pacientes que escolhem datas significativas para se operarem; os que se submetem à cirurgia escondidos de seus familiares; pacientes que entram numa compulsão de cirurgias; pacientes insatisfeitos e seus diversos manejos9; reintervenções, como lidar com pacientes de difícil acesso, etc.
CONCLUSÃO
Diante da escassez de referenciais bibliográficos específicos ao tema, fomos construindo, a partir de vivências com os pacientes, familiares, equipe cirúrgica e psicólogos, uma compreensão baseada numa abordagem psicoterapêutica multifocal, que adaptamos para a avaliação e acompanhamento pré e pós-operatórios.
Percebemos que oferecendo esse espaço especializado, no qual os sentimentos são expressos e compreendidos, há uma maior possibilidade de valorização dos resultados cirúrgicos. O vínculo e o contrato realizados de maneira mais clara possibilita um melhor trânsito na comunicação e resolução de alguma intercorrência. Pode haver uma maior prevenção da realização de sabotagens inconscientes por parte do paciente. Por meio de reuniões de equipe e estudo de casos clínicos, podemos verificar se está sendo construído um conluio patológico narcísico entre paciente e cirurgião. Refletindo sobre os mecanismos transferenciais e contratransferenciais, possibilitamos à equipe instrumentalizar- se para melhor lidar com sentimentos desagradáveis, que possam ser expressos por meio de atuações impulsivas resultantes de jogos psicológicos de diversos graus.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Zimerman DE. Bion: da teoria à prática - uma leitura didática. Porto Alegre: Artes Médicas; 1995.
2. Winnicott D. O papel de espelho da mãe e da família no desenvolvimento infantil. Rio de Janeiro: Imago; 1975.
3. Rosenfeld H. Da psicopatologia ao narcisismo: uma aproximação clínica. Rio de Janeiro: Zahar; 1968.
4. Tustin F. Barreiras autísticas em pacientes neuróticos. Porto Alegre: Artes Médicas; 1990.
5. Cocke Jr WM. Essentials of plastic surgery. Boston: Little, Brown; 1979.
6. Carter B, McGoldrick M. As mudanças no ciclo de vida familiar. Porto Alegre: Artes Médicas; 1989.
7. Zimerman D. Fundamentos psicanalíticos: teoria, técnica e clínica. Porto Alegre: Artmed; 1998.
8. Kohut H. Análise do self. Rio de Janeiro: Imago; 1988.
9. Copetti J, Copetti C. Resultado cirúrgico satisfatório versus insatisfação do paciente. Annais XXII Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica; 1985.
I. Coordenadora do núcleo de apoio psicológico da SBCP-regional RS, Membro da Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar, Especialista em Psicologia Clínica pelo CFP, Especialista em Psicologia de Casais, Especialista em Metodologia do Ensino Superior, Diretora do Setor de Psicologia da PSICOPLAST (Clínica Integrada de Cirurgia Plástica e de Psicologia).
II. Membro Titular da SBCP, Especialista em Metodologia do Ensino Superior, Preceptor do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário da PUCRS, Diretor e Responsável Técnico da PSICOPLAST.
Correspondência para:
PSICOPLAST-(Clínica Integrada de Cirurgia Plástica e de Psicologia). Praça Joaquim Leite, 39
Porto Alegre, RS - Brasil - CEP: 91330-070
E-mai: psicoplast@terra.com.br
Site: www.psicoplast.com.br
Trabalho realizado na PSICOPLAST - Clìnica Integrada de Cirurgia Plástica e de Psicologia.
Artigo recebido: 02/02/2004
Artigo aprovado: 31/05/2004
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