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Special Article - Year2014 - Volume29 - Issue 3

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2014RBCP0083

RESUMO

O modus vivendi moderno tem produzido cada vez mais um crescente descontentamento em relação à anatomia corporal e a imaginação a respeito do corpo perfeito desperta um desejo no indivíduo nem sempre condizente com sua realidade. Sem limitação para as transfigurações, o corpo é modelado com base no sonho de uma estrutura corporal perfeita, na maioria das vezes, inalcançável, com os inúmeros procedimentos cirúrgicos propostos. Assim, é fundamental que os cirurgiões plásticos conheçam o Transtorno Dismórfico Corporal (TDC) ou dismorfofobia, desordem esta prevalente em ambos os sexos, em que a visão da aparência é deturpada, caracterizada pela inquietação excessiva de uma imperfeição física minúscula ou por imperfeições corporais ilusórias. O diagnóstico pode passar despercebido pelo não conhecimento, pelo subdiagnóstico ou pela preocupação apenas com a alteração corporal, o que pode trazer prejuízos pessoais, demandas jurídicas e até ajudar a manter o distúrbio.

Palavras-chave: Dismorfofobia; Transtorno dismórfico corporal; Cirurgia plástica; Imagem corporal; Transtornos somatoformes.

ABSTRACT

The modern modus vivendi has promoted a growing discontentment in regard to self body image, and imagining a perfect body leads to a desire in an individual that is not always compatible with reality. With no limits in transfiguration, the body is modeled based on the dream of a perfect body structure, which is most times unattainable and requires numerous proposed surgical procedures. Therefore, it is of utmost importance for plastic surgeons to become aware of Body Dysmorphic Disorder (BDD), or dysmorphophobia. This is a disorder that is prevalent in both sexes, in which self visual appearance is distorted. It is also characterized by an excessive concern over a tiny physical imperfection or delusive physical imperfections. The diagnosis can remain unnoticed due to lack of knowledge, misdiagnosis, or concern only over body alterations, which may lead to personal damage, legal claims, and also risk of prolonging the disorder.

Keywords: Dysmorphophobia; Body dysmorphic disorder; Plastic surgery; Body image; Somatoform disorders.


INTRODUÇÃO

Preocupar-se com a imagem corporal era uma preocupação predominantemente do sexo feminino; entretanto, há alguns anos, os homens também começaram a ter este cuidado. O descontentamento com a imagem física é o motivo principal da maioria dos transtornos psiquiátricos, mas especialmente importante para os cirurgiões plásticos, a Dismorfofobia ou Transtorno Dismórfico Corporal (TDC)1 coloca o cirurgião à mercê de uma patologia até então pouco conhecida, estudada e diagnosticada.

Com a melhora econômica do país e do mundo, a cirurgia plástica, que antes era tida como para poucos, passou a fazer parte de parcelas da população para as quais tal recurso era antes inacessível, trazendo melhorias estéticas e funcionais. A maioria dos cirurgiões plásticos reduziu sua visão holística do paciente e passou a preocupar-se mais com a forma e as distorções desta do que propriamente com o "todo". Tal fato, se somado ao quadro de um paciente com TDC, seria a combinação perfeita para o insucesso cirúrgico e o início de uma série de insatisfações por parte do paciente e do cirurgião.

O termo 'dismorfofobia' é uma palavra grega que significa feiura, especialmente na face, utilizado por Morselli1, pela primeira vez, há cem anos; porém, sua primeira referência aparece na história de Herodotus, no mito da garota feia de Esparta, que era levada pela sua família, todos os dias, ao templo para se livrar da sua falta de beleza e atrativos.

Pode receber vários nomes, como doença da beleza, síndrome da distorção da imagem, hipervalorização estética, globalização da beleza e padronização das formas; no entanto, é descrita como uma desordem somatoforme, caracterizada por uma preocupação excessiva na reparação de um defeito, na maioria das vezes, imaginário ou trivial de suas características físicas, capaz de causar um estresse emocional, levando ao prejuízo no convívio social, profissional e/ou afetivo. Contudo, somente um século depois de sua descrição, a dismorfofobia foi incorporada à classificação de diagnósticos psiquiátricos americana, como uma desordem somatoforme atípica e, em 1987, passou a constar como doença no Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-III-R), hoje em sua quarta edição. No Brasil, a primeira referência a esta doença surgiu num trabalho publicado, em 1976, por Pitanguy et al., que levantou a importância das questões psicológicas e psiquiátricas em cirurgia plástica.

Somente em 2009, foram realizadas mais de 600 mil cirurgias estéticas apenas no Brasil, o que nos leva a pensar qual a porcentagem desta amostra poderia apresentar TDC. Esse transtorno poderia estar sendo subdiagnosticado e negligenciado?


OBJETIVO

O objetivo deste trabalho é apresentar, através da revisão bibliográfica e de avaliações pessoais, algumas informações relevantes para auxiliar o cirurgião plástico sobre a dismorfofobia e o seu diagnóstico, bem como seu tratamento e manejo clínico dos portadores desta alteração psíquica, uma vez que a cada dia estão mais presentes nos consultórios de cirurgia plástica.


O TRANSTORNO DISMÓRFICO CORPORAL COMO DOENÇA

A patologia, apesar de não ser muito pesquisada, foi descrita há mais de um século, com diversas narrativas de casos comprovando problemas potenciais com contínuas cirurgias plásticas. E mesmo sendo utilizado de formas distintas, o termo descreve a preocupação excessiva com um defeito mínimo ou ilusório na aparência corporal, ou seja, um sentimento de feiura percebido pelo paciente2,3.

Segundo Fontenelle2, o transtorno dismórfico corporal é descrito por Phillips como "um nome novo para uma velha síndrome".

A definição de TDC é baseada, conforme Torres et al.4,5, na deturpação da percepção exposta como ansiedade, obsessão, pensamento supervalorizado ou desvairado em relação à forma corporal ou a algumas partes do corpo6,7.

Sua causa ainda permanece desconhecida e obscura, com origem multicausal, incluindo fatores biológicos, genéticos, psicológicos e até mesmo culturais e/ou ambientais.

Afeta igualmente homens e mulheres, apesar de a mulher apresentar, naturalmente, uma maior preocupação com sua imagem corporal do que o homem, o que a faz procurar com maior frequência a cirurgia plástica e desta exigindo melhores resultados.

Nos homens, a doença pode apresentar-se como vigorexia, que é o transtorno dismórfico muscular ou "síndrome da academia", preocupação com perda de cabelos, alterações dentárias e até mesmo com o biotipo. Apresenta pico na adolescência, com curso flutuante, e piora progressiva com o passar dos anos, caso o tratamento não seja instituído.

Alguns estudos avaliaram pacientes dismorfofóbicos em amostras da população geral que indicaram incidência de 1 a 7%, na Alemanha, e de 2 a 4%, nos Estados Unidos8-11. Em pacientes de cirurgia plástica, os estudos revelaram que a incidência varia entre 7 e 8%, nos Estados Unidos12,13, e de 6,3 a 9,1%, na Europa13-15.

No Brasil, acredita-se que esses números sejam bem parecidos à incidência mundial, porém não há como mensurar tais dados.

Hodgkinson16 assegurou que indivíduos insatisfeitos com os resultados das cirurgias plásticas podem apresentar transtorno dismórfico corporal. No geral, os estudos com indivíduos com grande preocupação com a aparência corporal, buscando tratamentos estéticos, dentários e cirurgias plásticas, apresentaram índices de 3 a 15%17-19.

Sarwer et al.13 analisaram cem indivíduos que se submeteram à cirurgia estética e identificaram dismorfofobia em 7%, porcentagem mais alta que a relatada por Andreasen & Bardach, que foi de 2% no mesmo tipo de população20.

Warnick9 relatou, em estudo, que algumas evidências anteriores indicavam que a dismorfofobia é diagnosticada regularmente com incidência igual nos sexos feminino e masculino. Nos estudos de Connolly & Gipson e Hay, também foram encontrados índices iguais entre os sexos2,5,11,21,22.

O primeiro indício ocorre normalmente no começo da adolescência e se estende até aproximadamente os 20 anos, porque neste período é que vários problemas em relação ao desenvolvimento corporal ocorrem6,14,18,21.

Na dismorfofobia, se existe uma pequena anormalidade física, o indivíduo demonstra exagerada preocupação em relação a esta, ocasionando grande sofrimento na parte clínica e prejuízo no convívio social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do paciente, inclusive causando relevante morbidade22,23.

Muitos destes indivíduos vivem isolados por anos em casa, muitos progridem com significativas perdas sociais e profissionais, e a maior parte deles procura tratamento cirúrgico ou estético, sem acompanhamento psicológico, resultando claramente no insucesso24-26. Constantemente, pacientes com dismorfofobia procuram e encontram tratamento cirúrgico ou médico com o propósito de corrigir os defeitos fictícios, mas, mesmo assim continuam tratando seu corpo e partes deste com discriminação. Desta forma, o tratamento pode ocasionar o crescimento da obsessão ou incentivar novas inquietações, que podem resultar em cirurgias mal sucedidas, deixando estes indivíduos ainda insatisfeitos.

É constantemente evidenciado na literatura o sofrimento que o TDC pode causar, resultando em problemas sociais e conjugais que desestruturam totalmente a vida do indivíduo, podendo, inclusive, estimular a ideia de suicídio. Isto pode ocorrer devido ao tempo que alguns indivíduos consomem com suas aflições, descuidando de outras áreas da sua vida.


DIAGNÓSTICO

Desejar uma imagem perfeita não significa sofrer de uma doença mental, mas aumenta as possibilidades deste tipo de transtorno que deve, sim, ser encarado como uma doença. O Manual de Diagnóstico e Estatística das Desordens Mentais IV (DSMV-IV) enquadra a doença como sendo um transtorno do espectro obsessivo compulsivo, assim como a bulimia e a anorexia, e estipula critérios diagnósticos (Tabela 1). Em alguns casos, torna-se difícil o diagnóstico se a doença apresentar-se em associação com outros transtornos mentais7.




A deformidade, insignificante ao outro indivíduo, é vista pelo paciente como devastadora, provocando ansiedade e apreensão, além do estresse, levando-o incessantemente a procurar a perfeição e a harmonia física, de forma insensata1,5,11,19. Também causa apreensão, desagrado, exagero na percepção da deformidade, degeneração expressiva no desempenho social e ocupacional, além de grande angústia.

O diagnóstico baseia-se na consulta clínica, pois a grande parte destes pacientes apresentar-se-á ansiosa, perfeccionista, com baixa autoestima e introvertida, e suas queixas mudam ao longo do tempo. Pode associar-se a outras doenças, tais como transtorno ansioso e depressivo, fobias (síndrome do pânico), sendo que a ideação suicida pode estar presente em até 80% dos pacientes. Os casos mais graves podem levar à incapacidade funcional progressiva e ao isolamento social.

Normalmente, as reclamações são baseadas em defeitos ilusórios ou mínimos, na cabeça ou no rosto, como acne, inchaço, cicatriz, ruga, excesso de pelo, falta de cabelo, desproporção ou falta de simetria facial, formato e tamanho do nariz, olhos, boca, sobrancelhas, orelhas, dentes, queixo, mandíbula e bochecha. Contudo, qualquer parte do corpo pode ser alvo de inquietações, como genitais, abdômen, nádegas, quadris e ombros, e pode também reunir várias partes ao mesmo tempo26-28,.

Comportamentos frequentes são observados nestes pacientes, como comparar a parte feia com a dos outros; olhar a deformidade repetidamente no espelho ou superfícies refletoras, apesar de geralmente evitar olhar para diminuir o desconforto e a preocupação; pensar diariamente por horas na deformidade, deixando que os pensamentos dominem suas vidas; não tirar fotografias; usar roupa, chapéu e maquiagem excessiva para camuflar a imperfeição; utilizar as mãos ou postura para esconder o defeito; cumprir rituais elaborados para tratar da aparência; pesquisar excessivamente sobre a parte do corpo "imperfeita"; procurar cirurgia ou tratamento médico apesar das recomendações contrárias; procurar confirmação acerca do defeito ou tentar convencer os outros de que é anormal; evitar eventos sociais em que a imperfeição pode ser notada; sentir fobia social por causa do defeito; se isolar socialmente; apresentar introversão e baixa autoestima, e com dismorfofobia severa, os pacientes podem abandonar a escola, deixar o emprego ou até mesmo evitar sair de casa23,24,29-31

Alguns indicadores da dismorfofobia são: sentimento de desconforto em público; preocupação e avaliação da aparência; tendência para sobrevalorizar a aparência, ao determinar o valor próprio; evitar circunstâncias sociais e contato físico com outros, e alteração excessiva da aparência através de roupas ou cosméticos6,25-27,30.

De acordo com o DSM-IV (Diagnostic Statistic Manual of Mental Disorders), os critérios necessários para diagnosticar a dismorfofobia são: (a) preocupação com um defeito imaginário na aparência ou, se na presença de uma anomalia física mínima, o paciente apresenta excesso de preocupação; (b) se a preocupação motiva perturbação ou prejuízo significativo no funcionamento das áreas social, ocupacional ou em outras áreas importantes; (c) a preocupação não é tão bem explicada por outro transtorno mental, como, por exemplo, na anorexia nervosa6.

Os indivíduos com quadro de dismorfofobia normalmente são tímidos, suscetíveis à rejeição, socialmente impacientes e perfeccionistas, e a maior parte deles tem problemas de depressão, que frequentemente é exposta através de intensa angústia ou inferioridade, exibindo transtornos alimentares muito graves.

Também, ao se autoavaliar, a pedido do médico, o faz de modo correto, porém exclui aquilo que mais lhe perturba, mas mesmo assim um mínimo defeito excessivamente aumentado por ele é capaz de aniquilar sua segurança. E mesmo com todas as evidências contra, acredita totalmente que tem a imperfeição e não consegue parar de se preocupar, mesmo sem o motivo13,15,31-33.

Segundo Bárbara Machado34, os pacientes podem assumir uma das quatro formas de temperamento descritas por Ferreira35. Tal personalidade indica sobre o curso de um eventual pós-operatório e o nível de expectativa em ralação ao tratamento. Assim, teríamos as seguintes personalidades que poderiam ser assumidas pelo dismorfofóbico:
- Pacientes coléricos são determinados, dominadores, impulsivos e tendem a dominar a situação. Se as colocações do médico contrariam suas expectativas, contra-argumentam ou não aceitam, e se o médico insiste, podem mesmo não seguir as orientações e acabam, por vezes, buscando outro profissional que corrobore suas ideias. Nessas situações, propor desafios, conduzir o diálogo de modo que o paciente se sinta estimulado a pensar de outra forma e a observar novos aspectos relacionados a si mesmo e à sua deformidade pode ser uma boa técnica de abordagem, embora exija um tempo maior ou mesmo novas consultas.

- Pacientes fleumáticos são tranquilos, observadores, passivos, dedutivos e costumam aceitar as colocações do médico, mas pensam metódica e cuidadosamente a respeito, procuram novos dados que lhes permitam avaliar melhor a situação, e talvez necessitem também de um tempo maior para digerir tudo o que ouviram, sendo importante disponibilizar-lhes todos os dados e informações dos quais sintam necessidade.

- Em relação aos melancólicos, pacientes sensíveis, emotivos e intuitivos, e que geralmente desenvolvem relacionamentos pouco numerosos, porém profundos, deve-se ter muito cuidado no modo de informá-los, sobretudo quando as informações podem gerar algum tipo de medo ou ansiedade, pois tendem a ficar deprimidos. Precisam se sentir seguros de que o médico é alguém com quem podem contar e que lhes oferecerá todos os recursos possíveis e necessários para lidarem com a sua situação.

- Os pacientes ditos sanguíneos são lábeis, sedutores, atraentes, de relacionamentos fáceis e numerosos, porém tendendo a superficiais; eles provavelmente aceitarão facilmente os argumentos e orientações do médico, o que não quer dizer que estarão realmente convencidos de tudo o que o médico disse. Talvez não sigam de forma correta as orientações, alegando esquecimento, falta de tempo ou excesso de atividades, entre várias possíveis desculpas. Se o médico identifica nele a predominância deste temperamento, é importante não criticar, mas buscar, de forma tranquila e firme, que o paciente se conscientize e siga a orientação33,35.
Obviamente, é difícil encontrarmos pacientes que manifestem apenas um dos quatro temperamentos descritos, porém há quase sempre a predominância de um, e saber como lidar com eles amplia em muito nossas chances de sucesso35.

O paciente dismorfofóbico pode assumir qualquer uma das quatro apresentações, isso diferirá muito conforme sua personalidade; no entanto, algumas questões podem ser levantadas quando do atendimento a um paciente suspeito de ser portador de dismorfofobia:
1- Foi identificado algum "problema" ou alteração? O cirurgião pode tratá-lo?

2- O paciente é manejável? O médico gostaria de tê-lo no consultório?

3- Caso haja alguma complicação, o paciente cooperará?

4- O paciente entende a margem de erro inerente ao procedimento?
Com base nestas respostas, o cirurgião plástico poderá inferir o tipo de paciente que estará abordando, mas vale lembrar que o diagnóstico, muitas vezes, pode passar despercebido, caso o médico se volte apenas para a alteração corporal do paciente, sem dar ênfase adequada a um exame clínico e psicológico adequado, uma vez que cerca de aproximadamente 10% dos pacientes de cirurgia plástica apresentam algum grau de dismorfofobia. Mesmo após várias descrições na literatura, tal tema ainda permanece obscuro para inúmeros colegas que deixam de diagnosticar esses pacientes, submetendo-os a procedimentos cirúrgicos que, além de não trazerem benefícios, não conseguirão solucionar os problemas factoides apontados por eles.


COMO TRATAR O DISMÓRFICO

Mesmo relatado há mais de 100 anos e ser causa de bastante sofrimento, acredita-se que somente 10% dos dismórficos recebam tratamento adequado17,18.

Para o tratamento, geralmente é utilizada a combinação de medicamento, antidepressivos que ajudam a diminuir os sintomas da depressão, com psicoterapia, que aumenta a segurança e a confiança; os dois métodos juntos ajudam o paciente a dominar a obsessão e a ansiedade relacionadas com a aparência21,22.

Com os antidepressivos, os pacientes conseguem diminuir a preocupação, o incômodo e os rituais comportamentais, e ocorre significativa melhora no comportamento social e ocupacional. E embora a deformidade ainda seja notada, porque nunca deixa de ser, de modo geral, esta causará menor incômodo1,13,17,18,31.

Na terapia cognitiva-comportamental, os métodos incluem automonitorar os pensamentos, fiscalizar o tempo gasto com o espelho, tentar modificar o pensamento sobre a aparência, se expor a situações de confronto social e prevenir e evitar os comportamentos compulsivos25,31,35.

A cirurgia não traz benefícios neste grupo de pacientes, estando contraindicada, uma vez que, devido à distorção da imagem, o mais belo resultado ainda ficará bem aquém de suas expectativas, que são, na verdade, insuperáveis.


CONCLUSÕES

Dismorfofobia ou Transtorno Dismórfico Corporal, descrita pela primeira vez em 1886 como "um sentimento subjetivo de feiura ou defeito físico no qual os pacientes sentem que são observados por terceiros, embora sua aparência esteja dentro dos limites da normalidade"4. O corpo, dessa forma, é o motivo de tanto sofrimento, sendo rejeitado e ultrajado sem compaixão, submetido a procedimentos extremos desnecessários ou a isolamento e desleixo.

Geralmente, não é diagnosticada devido à ausência de investigação dos médicos sobre as queixas do paciente ou por estes preocuparem-se apenas com alterações somáticas.

O dismórfico vive em constante estresse porque não consegue controlar suas perturbações com a aparência corporal negativa que acredita que possui, mesmo quando lhe é garantido que está bem, que o defeito é insignificante, mínimo ou até mesmo não existe. É uma preocupação que prejudica sua compreensão e reconhecimento corporal.

Estas perturbações distorcem a imagem que estes indivíduos têm de si mesmos, tornando-os obcecados com a aparência corporal perfeita, transformando mínimas imperfeições em verdadeiras monstruosidades, causando imenso sofrimento e isolamento social, ocupacional e familiar.

Com a finalidade de mudar sua aparência, pacientes com dismorfofobia buscam tratamentos com diversos profissionais, inclusive cirurgiões plásticos; posteriormente, insatisfeitos com os resultados, fazem novos procedimentos para a mesma reclamação ou para outra parte do corpo, que se torna o novo alvo das atenções14,16,18,21.

É de total importância que os profissionais da área da saúde conheçam os sintomas da dismorfofobia e investiguem profundamente as perturbações de seus pacientes antes de qualquer procedimento.

É fundamental frisar que o cirurgião plástico pode se deparar com algumas dificuldades para identificar a dismorfofobia e como pacientes dismórficos criam expectativas ilusórias sobre os procedimentos estéticos - e geralmente não ficam satisfeitos -, podem responsabilizá-lo por isto, levando a demandas judiciais.

O cirurgião plástico desinformado sobre a dismorfofobia pode ter prejuízos pessoais ou até mesmo ajudar a manter o transtorno, conforme efetua continuamente os procedimentos. Este profissional se depara com um paciente alterado psicologicamente que, no pós-operatório, encontrase insatisfeito, retornando de forma frequente ao consultório, apresentando queixas sem fundamentos e até mesmo propondo novos procedimentos como forma de "atenuar" a sua não satisfação com o procedimento recém-realizado.

A cirurgia para esses pacientes encontra-se formalmente contraindicada, pois, além de não atender às expectativas, pode piorar o transtorno, culminando em demandas judiciais, agressões verbais e até mesmo físicas.

O tratamento se baseia em acompanhamento especializado com psiquiatra, psicólogo e drogas que auxiliem no tratamento da ansiedade e obsessão.


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1. Pós-Graduação, Especialista, Preceptor no Centro de Estudos e Pesquisas na Área de Cirurgia Plástica do Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG, Brasil
2. Residente do Centro de Estudos e Pesquisas na Área de Cirurgia Plástica do Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG, Brasil
3. Residente do Centro de Estudos e Pesquisas na Área de Cirurgia Plástica do Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG, Brasil
4. Acadêmica Segundanista do Curso de Direito da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Ponta Grossa, PR, Brasil

Instituição: Trabalho realizado no Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG, Brasil.

Autor correspondente:
Jorge Antônio de Menezes
Centro de Estudos e Pesquisas na Área de Cirurgia Pástica do Hospital Mater Dei
Rua Aimorés, 2480, sala 801 - Santo Agostinho
Belo Horizonte, MG, Brasil CEP 30140-072
E-mail: jorgeamenezes@uol.com.br

Artigo submetido: 13/02/2013.
Artigo aceito: 10/03/2013.

 

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