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Associação de retalho mucoso e retalho cutâneo local na reconstrução de perda de substância em região da bochecha
Mucosal and local skin flap reconstruction for loss of substance in the cheek region
Ideas and Innovation -
Year2014 -
Volume29 -
Issue
3
Jose Mauro de Oliveira Squarisi1; Thais Gomes Casali1; Diogo Petroni Caiado Fleury1; Fernanda Dinelli Scala1; Fabrício Nishimoto1; Paulo Roberto da Costa2
http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2014RBCP0079
RESUMO
A face representa uma estrutura importante nos seres humanos, devido a ser a parte mais visível do corpo e conter elementos delicados e complexos, que são essenci ais em termos de beleza e funcionalidade. As reconstruções faciais, em áreas de grandes perdas de substâncias, permanecem como um desafio para os cirurgiões. Apresentam várias opções de reparo, todas com suas vantagens e desvantagens. Mostramos o caso de um paciente apresentando perda de substância de espessura total em região de bochecha, que foi submetido à associação de retalho mucoso e retalho cutâneo local, apresentando bom resultado e preservação funcional.
Palavras-chave:
Reconstrução; Face; Bochecha; Retalhos cirúrgicos.
ABSTRACT
The face is an important structure, because it is the most visible part of the body and contains delicate and complex elements that are essential for aesthetics and functionality. Facial reconstruction of areas with substantial substance loss remains a surgical challenge. There are several repair options, with corresponding advantages and disadvantages. We present a case of a patient with substance loss of the total thickness of the cheek region who received mucosal and local skin flap surgery, with good results and functional preservation.
Keywords:
Reconstruction; Face; Cheek; Surgical flaps.
INTRODUÇÃO
A face representa uma estrutura importante nos seres humanos, devido a ser a parte mais visível do corpo e conter elementos delicados e complexos, que são essenciais em termos de beleza e funcionalidade1.
Do ponto de vista estético, a região da bochecha pode ser dividida em três unidades, de acordo com sua localização: suborbital, pré-auricular e bucomandibular2. A região bucomandibular é constituída de quatro camadas: cutânea, subcutânea, SMAS e mucosa oral, devendo ser reconstruída em mais de um plano cirúrgico.
Muitas formas de reconstrução têm sido descritas, abrangendo a camada superficial e a mucosa oral.
Fechamento primário, enxerto cutâneo parcial e total, retalhos locais (cutâneos e miocutâneos), retalhos livres e expansão tecidual constituem opções para reconstrução do plano superficial1-10.
Os defeitos mucosos na cavidade oral, resultantes de ressecções tumorais ou processos infecciosos agudos ou crônicos, podem levar o paciente a apresentar déficits funcionais e estéticos significantes, e podem ser reconstruídos com a utilização de fechamento primário, fechamento por segunda intenção com mucosalização, enxertos cutâneos, retalho de língua, retalhos cutâneos locais e retalhos livres7,9.
MÉTODO
Paciente do sexo masculino, 33 anos, faiodermo, estudante universitário, procedente de Pirapora-MG, solteiro, portador do vírus HIV, com relato de episódio de amigdalite havia seis anos, evoluindo com celulite de face (região bucal) bilateral, tendo sido inicialmente tratado com penicilina; apresentou reação alérgica e permaneceu internado com uso de antibioticoterapia, cujo nome desconhece; evoluiu com abcesso e necrose local. À esquerda, apresentando fechamento espontâneo, e à direita, permanecendo com grande área de perda de substância de espessura total; relatou a tentativa de enxerto na época, mas sem evolução satisfatória.
Ao exame, observamos hipotrofia facial importante bilateral e extensa área de perda de substância à direita, conforme evidenciado nas Figuras 1 e 2. Durante esses seis anos, o paciente realizou curativo oclusivo local, sendo necessária a troca várias vezes ao dia e sempre que se alimentava.
Figura 1. Vista anterior evidenciando hipotrofia importante bilateral e área de perda de substância complexa à direita.
Figura 2. Vista lateral evidenciando hipotrofia importante e área de perda de substância complexa à direita.
Realizava acompanhamento frequente com infectologista, utilizando corretamente terapia antirretroviral prescrita e não apresentando contraindicações à cirurgia.
RESULTADO
Procedimento cirúrgico
Paciente submetido à anestesia geral, com antissepsia cutânea e de cavidade oral. Realizada, inicialmente, incisão na borda entre a região cutânea e a região de mucosa oral (mucosalização), com dissecção em plano mucoso, confeccionando-se dois retalhos mucosos. Realizada sutura em dois planos, com manutenção da camada mucosa na região intraoral (Figuras 3, 4 e 5).
Figura 3. Imagem evidenciando descolamento de área de mucosalização.
Figura 4. Imagem evidenciando término de confecção de retalho mucoso.
Figura 5. Imagem evidenciando término da sutura em dois planos de retalho mucoso.
Realizada dissecção de retalho cutâneo em plano supra-SMAS de região de terço médio facial, confeccionando-se retalho de transposição lateral e fechamento por planos, seguido de curativo local (Figuras 6 e 7).
Figura 6. Confecção de retalho cutâneo local.
Figura 7. Aspecto final ao término da cirurgia - observa-se dreno aspirativo.
Paciente foi submetido à antibioticoprofilaxia com clindamicina e à drenagem aspirativa a vácuo.
No sétimo dia de evolução pós-operatória, paciente apresentou pequena região de sofrimento do retalho cutâneo (bordas), com secreção local purulenta. Foi prescrita então antibioticoterapia por sete dias (ciprofloxacina e metronidazol), com boa evolução e fechamento por segunda intenção. Apresentou-se, assim, resultado satisfatório, com ausência de fístula salivar, preservação da função mastigatória e sem necessidade de manutenção de curativos (Figuras 8, 9 e 10).
Figura 8. Vista anterior de pós-operatório de três meses.
Figura 9. Vista em perfil direito de pós-operatório de três meses.
Figura 10. Vista intraoral evidenciando mucosa íntegra.
DISCUSSÃO
As reconstruções faciais em áreas de grandes perdas de substâncias permanecem como um desafio para os cirurgiões1,3. Apresentam várias opções de reparo, todas com suas vantagens e desvantagens1.
Os enxertos cutâneos constituem opções simples, com pouca morbidade associada, porém apresentam coloração e espessura diferentes da região receptora, apresentando resultado estético insatisfatório1,3,6.
Os retalhos livres são uma excelente opção, porém necessitam de estrutura apropriada para realização do procedimento e equipe com experiência em microcirurgia. Podem apresentar complicações, como infecção, trombose e perda do retalho3,4,8,9.
Os retalhos locais apresentam-se como uma ótima escolha, pois fornecem tecido de cor e textura semelhantes, e têm um risco reduzido para pacientes com comorbidades; porém, têm aplicação limitada em defeitos extensos. Como exemplos de retalhos que são utilizados, podemos citar os retalhos de Esser, Blascowicz, Ferris Smith, Mustardé, Converse, Stark, Juri e Juri, Zide e Schruder e Kroll6,11,12.
Função oral adequada e resultados estéticos devem ser buscados na reconstrução da cavidade oral; enxertos cutâneos, retalhos cutâneos locais e retalhos livres apresentam-se como opções para reconstrução da mucosa oral. O retalho de língua também constitui uma opção, porém pode apresentar alteração mastigatória e de deglutição7,9.
Reconstruções de grandes perdas de substâncias na face constituem um desafio cirúrgico e a associação de retalho mucoso e retalho cutâneo local constitui uma boa opção, com baixa morbidade e com tecido semelhante, na reconstrução de espessura total na região da bochecha.
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1. Residente de Cirurgia Plástica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil
2. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), Preceptor do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil
Instituição: Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Autor correspondente:
Jose Mauro de Oliveira Squarisi
Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais
Avenida Professor Alfredo Balena, 110 - Santa Efigênia
Belo Horizonte, MG, Brasil CEP 30130-100
E-mail: josemauroeu@yahoo.com.br
Artigo submetido: 30/12/2013.
Artigo aceito: 03/08/2014.
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