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Special Article - Year2013 - Volume28 - Issue 3

RESUMO

A fratura do complexo nasoetmoideorbital (NEO) permanece como uma das tarefas mais desafiadoras no trauma facial. Corresponde a 2,1% dos casos de trauma de face. Achados clínicos clássicos das fraturas NEOs são telecanto e deformidade com retroposicionamento da pirâmide nasal. O estudo com tomografia computadorizada é imprescindível para determinar detalhes e procurar localizar deslocamentos ósseos e fístulas. O tratamento é direcionado à reconstrução da relação intercantal, da projeção nasal e das estruturas internas da órbita.

Palavras-chave: Osso etmoide/lesões. Osso nasal/lesões. Fraturas orbitárias/cirurgia. Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos.

ABSTRACT

Fractures of the naso-orbitoethmoid complex (NOE) remain one of the most challenging tasks in facial reconstruction and account for 2.1% of facial trauma cases. Clinical analyses of NOE fractures showed that they usually affect the telecanthus and cause deformities that would then require retropositioning of the nasal pyramid. Therefore, computed tomography is an essential technique for further assessment and to identify bone dislocations and fistulas. Treatment involves reconstruction of the intercanthal distance, nasal projection, and internal orbital structures.

Keywords: Ethmoid bone/injuries. Nasal bone/injuries. Orbital fractures/surgery. Reconstructive surgical procedures.


INTRODUÇÃO

O diagnóstico e o tratamento da fratura do complexo nasoetmoideorbital (NEO) permanecem como tarefas desafiadoras no trauma facial e, se não forem bem conduzidos, resultam em sequelas visíveis na face do paciente1-7.

A Figura 1 ilustra a experiência de nossa instituição, baseada em 8.240 pacientes com fraturas faciais, operados entre janeiro de 1974 e dezembro de 2010 pelo primeiro autor. Desses pacientes, 416 (5%) apresentavam fraturas NEOs, porém somente 170 (2,1%) eram NEOs puras, 117 (1,4%) tinham fraturas frontobasonasoetmoideorbitais e 129 (1,6%), fraturas complexas da face com todos os ossos faciais fraturados em associação. Dos 170 pacientes com fraturas NEOs, 14,6% eram do sexo feminino e 85,4% do sexo masculino, com média de idade de 27,9 anos (variação de 16 anos a 85 anos). Não houve nenhum óbito decorrente da correção da fratura de face.


Figura 1 - Gráfico demonstrando a inversão trânsito vs. violência como principal causa de acidentes e agravo do descompasso psicossocial.



Achados clínicos clássicos das fraturas NEOs são telecanto e deformidade com retroposicionamento da pirâmide nasal8. A distância intercantal normal em adultos é de 30 mm (Figura 2). No telecanto, as pálpebras superior e inferior estão desviadas lateralmente, como consequência do deslocamento do ligamento cantal medial, que se traduz pelo aumento da distância intercantal. As fraturas NEOs consistem na lesão do dorso nasal e de um ou ambos os ramos montantes maxilares, local de inserção do ligamento cantal medial. A aparência pseudo-hipertelórica da órbita é acentuada pelo achatamento e alargamento do dorso ósseo do nariz. Como resultados, os olhos parecem mais distantes (Figuras 3 a 5)1,9.


Figura 2 - Distância intercantal normal e telecanto.


Figura 3 - Fratura do complexo nasoetmoideorbital do tipo 1, segundo a classificação de Markowitz.


Figura 4 - Fratura do complexo nasoetmoideorbital do tipo 2, segundo a classificação de Markowitz.


Figura 5 - Fratura do complexo nasoetmoideorbital do tipo 3, segundo a classificação de Markowitz.



TRATAMENTO CIRÚRGICO

O tratamento consiste na reposição das estruturas anatômicas deslocadas, podendo associar o uso de enxertos ósseos, cartilaginosos e/ou implantes aloplásticos, para o preenchimento de deslocamentos ósseos etmoidais não passíveis tecnicamente de redução adequada. A realização de cantopexia transnasal é importante para obtenção de equilíbrio posicional dos ligamentos cantais mediais e consequente correção da distância intercantal. O segmento de osso ao qual o tendão cantal medial está aderido ou o próprio tendão levado a sua posição anatômica deve ser fixado com síntese de arame transorbitonasal, segundo a técnica de Raveh, ou com pequenas âncoras de titânio quando há suficiente osso para apoio. Aplicação de enxertos ósseos de crista ilíaca, tábua externa do crânio ou costela é procedimento de rotina para a reposição de conteúdo orbital e recuperação de projeção ocular e da pirâmide nasal (Figuras 6 a 8)10,11.


Figura 6 - Pré-operatório de telescopagem com deslocamento etmoidal sobre o nervo óptico.


Figura 7 - Pós-operatório de correção óssea sem enxerto e descompressão do nervo óptico.


Figura 8 - Pós-operatório de fratura do complexo nasoetmoideorbital associada a outras fraturas do terço médio: reconstrução com enxerto, malha de titânio, microplacas e parafusos.



Os acessos diretos (coronal, transpalpebral, súpero-medial e transconjuntival) são preferidos para a correção da parede etmoidal. Acessos através de feridas também são usados. Os acessos transorbitonasais para a parede medial orbital com auxílio da nasofibroscopia são de difícil realização e levam a iatrogenia, pelo agravo da parede lateral nasal, para se acessar a região orbital comprometida. Em casos especiais, esses acessos poderão ser usados. As fístulas liquóricas pela lâmina cribiforme são preferencialmente tratadas com a técnica de acesso endonasal, apresentando bons resultados.

As fraturas da pirâmide nasal são tratadas por redução digital e/ou, eventualmente, desimpactadas com fórceps de Asch. Pode ser necessário o uso de microplacas e parafusos para fixação desse tipo de fratura. Para a fixação da disjunção da cartilagem septal do etmoide e do dorso nasal são usados fios de Kirschner transnasais, apoiados na borda anterior do processo frontal da maxila1,2,12,13 (Figura 9).


Figura 9 - Fios de Kirschner apoiados sobre processos frontais da maxila estabilizando a cartilagem septal.



Fraturas nasais inadequadamente manejadas apresentam alta incidência de deformidades pós-cirúrgicas tardias (ao redor de 50%). Segundo a literatura, os fatores primários que geralmente contribuem para inadequado resultado a longo prazo são deformidades não reconhecidas previamente à redução e fraturas septais também não identificadas3.

As sequelas são de difícil resolução. Distopias óculo-orbitais, deformidades nasais e sinusopatias são frequentemente observadas1,2.


REFERÊNCIAS

1. Rohrich RJ. Advances in craniomaxillofacial fracture management. Philadelphia: W.B. Saunders; 1992. p. 167-93.

2. Cruz GAO. Fraturas do terço superior da face. In: Barros JJ, Manganello-Souza LC, eds. Traumatismo buco-maxilo-facial. 2ª ed. São Paulo: Roca; 2000. p. 319-31.

3. Violani GP. Comparação com a literatura dos resultados imediatos e tardios de manutenção e recidiva da redução de fraturas nasais recentes em adultos utilizando atendimento e tratamento cirúrgico padronizado [monografia]. Curitiba: Curso de Especialização de Cirurgia Plástica e Reparadora, Universidade Federal do Paraná; 2011.

4. Molina F, Ortiz-Monasterio F. Rinoplastia. Buenos Aires: Médica Panamericana; 1997. p. 10.

5. Manson PN, Clifford CM, Su CT, Iliff NT, Morgan R. Mechanisms of global support and posttraumatic enophthalmos: I. the anatomy of the ligament sling and its relation to intramuscular cone orbital fat. Plast Reconstr Surg. 1986;77(2):193-202.

6. Sturla F, Abnsi D, Buquet J. Anatomical and mechanical considerations of craniofacial fractures: an experimental study. Plast Reconstr Surg. 1980;66(6):815-20.

7. Testu L, Jacob D. Aparato de la vision. In: Tratado de Anatomia Topográfica. Barcelona: Salvat Editores; 1956. p. 395-495.

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9. Janis JE. Essentials of plastic surgery: a UT Southwestern Medical Center handbook. St. Louis: Quality Medical; 2007. p. 228-9.

10. Marão HF, Gulinelli JL, Pereira CC, Carvalho AC, Faria PE, Magro Filho O. Use of titanium mesh for reconstruction of extensive defects in fronto-orbito-ethmoidal fracture. J Craniofac Surg. 2010;21(3):748-50.

11. Leão Júnior H, Orgaes FAFS, Fozati DJM, Gonella HA. Reconstruções orbitárias pós-traumáticas com utilização de retalhos osteofasciais de fáscia temporoparietal e enxerto ósseo. Rev Bras Cir Plást. 2008;23(3):229-33.

12. Papadopoulos H, Salib NK. Management of naso-orbital-ethmoidal fractures. Oral Maxillofac Surg Clin North Am. 2009;21(2):221-5.

13. Motta MM. Análise epidemiológica das fraturas faciais em um hospital secundário. Rev Bras Cir Plást. 2009;24(2):162-9.










1. Cirurgião plástico, membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), chefe do Serviço de Cirurgia Craniomaxilofacial do Hospital Universitário Cajuru da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR, Brasil
2. Residente de Cirurgia Plástica do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC/UFPR), Curitiba, PR, Brasil
3. Acadêmica da Faculdade de Medicina da Universidade de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP, Brasil
4. Cirurgiã plástica, membro titular da SBCP, professora adjunta do Serviço de Cirurgia Plástica do HC/UFPR, Curitiba, PR, Brasil
5. Cirurgião plástico, membro titular da SBCP, chefe do Serviço de Cirurgia Plástica do HC/UFPR, Curitiba, PR, Brasil

Correspondência para:
Ivan Maluf Junior
Av. Silva Jardim, 2.833 - Água Verde
Curitiba, PR, Brasil - CEP 80240-040
E-mail: ivanmalufjr@yahoo.com.br

Artigo submetido pelo SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBCP.
Artigo recebido: 23/1/2013
Artigo aceito: 20/4/2013

Trabalho realizado no Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil.

 

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