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Original Article - Year2012 - Volume27 - Issue 1

RESUMO

Neste artigo é apresentado o caso de macroglossia verdadeira em criança de 6 anos de idade, tratada cirurgicamente, com excisão elíptica na linha média da língua e ressecção ampla na ponta da língua em arco gótico. O resultado pós-operatório foi considerado satisfatório, tanto sob o aspecto de volume da língua, que passou a se manter totalmente dentro da boca, como sob o aspecto estético, mantendo a capacidade de gustação normal.

Palavras-chave: Macroglossia/congênito. Macroglossia/cirurgia, Glossectomia. Língua/cirurgia.

ABSTRACT

We describe a case of true macroglossia in a 6-year-old child that was surgically treated with a midline elliptical excision and anterior wedge resection along a Gothic-shaped arch. The postoperative result was considered satisfactory with regard to both the volume of the tongue, which now remains entirely within the mouth, and the aesthetic appearance; the ability to taste has been maintained.

Keywords: Macroglossia/congenital. Macroglossia/surgery, Glossectomy. Tongue/surgery.


INTRODUÇÃO

A macroglossia é uma condição pediátrica pouco comum, causada por grande variedade de etiologias1,2. Pode ser classificada em verdadeira, quando há aumento da língua, e relativa, quando a cavidade oral não é grande o suficiente para abrigar a língua.

Essas condições podem ser congênitas ou adquiridas2. O diagnóstico é feito com base na presença de protrusão lingual em relação aos dentes, abertura labial e postura mantida de boca aberta3.

Myer et al.4 classificam a macroglossia em generalizada e localizada (Tabela 1), com base na extensão do acometimento lingual, podendo ser de causas congênita, inflamatória, traumática e neoplásica5-24.




A língua desempenha muitas funções, dentre elas deglutição, fonação, respiração, desenvolvimento normal do processo alveolar e da estrutura óssea da face.

Assim, a macroglossia causa distúrbios como dificuldade na fala, mastigação, deglutição e obstrução de vias aéreas. Além disso, a protrusão lingual predispõe a trauma lingual, ressecamento da mucosa oral e infecções repetitivas de vias aéreas superiores25.

A avaliação da macroglossia começa com história cuidadosa e exame físico, procurando identificar alguma síndrome não diagnosticada, alterações na respiração, deglutição, fonação e alterações da oclusão dentária.

A conduta terapêutica deve considerar seguimento com observação, correção de alguma condição sistêmica que esteja acarretando as alterações linguais, terapia orofacial e intervenção cirúrgica mais adequada para a alteração lingual, que permita preservação da vascularização e inervação da língua no pós-operatório.

A ressecção cirúrgica é considerada o tratamento mais adequado na faixa etária pediátrica, sendo a glossectomia subtotal em orifício de fechadura uma técnica efetiva nesses casos, permitindo o desenvolvimento normal do organismo, bem como prevenindo complicações dentoalveolares. Essa técnica foi originalmente descrita por Morgan et al.26, tendo como diferencial a redução do tamanho nos três planos do músculo.

O sucesso cirúrgico deve ser avaliado considerando-se desaparecimento de marcas dos dentes nas bordas da língua, posição adequada da língua dentro da cavidade oral, alterações respiratórias, deglutição, fonação, gustação, sensibilidade térmica, dolorosa, epicrítica e protopática, e mobilidade lingual.

Atualmente, prioriza-se o tratamento multidisciplinar, incluindo avaliação ortodôntica, cirúrgica e fonoaudiológica.


RELATO DO CASO

Paciente do sexo feminino, 6 anos de idade, apresentava ao exame físico aumento do comprimento e da largura da língua. A língua apresentava-se em repouso interpondo-se aos dentes, causando interferência na fonação e dificuldade na mastigação. A avaliação do perfil esquelético demonstrou ausência de qualquer alteração compatível com deformidade dentofacial. O diagnóstico foi de macroglossia verdadeira (Figura 1).


Figura 1 - Aspecto pré-operatório.



Sob anestesia geral, foi realizada a glossoplastia conforme a técnica da glossectomia subtotal em orifício de fechadura modificada, com larga ressecção em arco gótico da extremidade da língua (Figuras 2 e 3).


Figura 2 - Planejamento da glossoplastia.


Figura 3 - Glossotomia subtotal em buraco de fechadura, com larga ressecção em arco gótico da extremidade da língua.



A incisão foi realizada utilizando-se uma lâmina de bisturi, e com o eletrocautério foi completada a diérese e realizada a hemostasia. Foi removido, assim, o excesso de tecido muscular da língua (Figuras 4 e 5). Em seguida, foi realizada a rafia dos planos utilizando-se fios absorvíveis Vicryl® (Figura 6).


Figura 4 - Remoção do excesso de tecido lingual.


Figura 5 - Larga ressecção romboide do terço anterior da língua.


Figura 6 - Aproximação dos planos e sutura.



DISCUSSÃO

O tratamento cirúrgico de glossectomia subtotal é indicado, na maioria dos casos, quando há obstrução de via aérea, dificuldade da fala, disfagia e prejuízo estético.

Muitas técnicas cirúrgicas estão descritas para correção da macroglossia verdadeira, as quais podem ser subdivididas em glossectomias a partir da linha mediana e glossectomias periféricas27.

Em 1950, Edgerton28 descreveu uma técnica consistindo em uma excisão ao longo do centro da língua com preservação dos vasos, nervos e papilas gustativas, tendo como resultado o estreitamento da língua sem alteração de comprimento (Figura 7). Em 1965, Kole29 propôs incisão triangular na extremidade da língua, reduzindo o comprimento e a espessura do terço anterior da língua (Figura 8).


Figura 7 - Excisão elíptica no centro da língua, proposta por Edgerton28.


Figura 8 - Incisão triangular na extremidade da língua, proposta por Kole29.



A técnica cirúrgica apresentada neste artigo é uma variante da glossectomia em orifício de fechadura, originalmente descrita por Morgan et al.26, com excisão larga da extremidade distal da língua, proporcionando redução adicional do comprimento da língua.

A realização dessa técnica demonstrou bons resultados no caso apresentado (Figura 9), como em outros descritos na literatura27-30.


Figura 9 - Apresentação anatômica da língua no pós-operatório de 9 meses.



Nos casos de macroglossia por hipertrofia muscular idiopática, como o relatado neste artigo, existe a possibilidade de recorrência31,32, por isso a indicação cirúrgica deve ser individualizada, considerando-se os riscos e possíveis benefícios para o paciente.


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1. Doutor em Cirurgia Plástica, professor adjunto da Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil.
2. Especialista pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, assistente da Clínica de Cirurgia Crânio-Facial do Hospital Infantil Albert Sabin, Fortaleza, CE, Brasil.
3. Acadêmico de Medicina da Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil.

Moacir Cymrot
Rua Bonfim Sobrinho, 316 - ap. 901 - Fátima
Fortaleza, CE, Brasil - CEP 60040-500
E-mail: moacymrot@uol.com.br

Artigo submetido pelo SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBCP.

Artigo recebido: 22/2/2010
Artigo aceito: 6/4/2010

Trabalho realizado na Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil.
* In memoriam.

 

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