ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Review Article - Year2007 - Volume22 - Issue 4

ABSTRACT

Mild blepharoptosis is a deformity characterized by malposition of the upper eyelid 4mm under scleral limb. Can be caused by malfunction of the Müller muscle, and it is diagnosticated by instilling several drops of 10% phenylephrine. This is a review of the studies related to the methods applied in mild blepharoptosis, as well as discussion of its indications and technique of Müller muscleconjunctiva resection. The authors present the experience of the Divisão de Cirurgia Plástica HC-FMUSP with this procedure during the period between 1995 and 2006.

Keywords: Blepharoptosis, surgery. Phenylephrine, diagnostic use. Reconstructive surgical procedures, methods

RESUMO

A ptose palpebral suave constitui deformidade caracterizada por deslocamento da pálpebra superior até 4mm abaixo do limbo escleral. Pode ser decorrente de disfunção do músculo de Müller, diagnosticada pelo teste do colírio de fenilefrina a 10%. Neste trabalho, realizou-se revisão bibliográfica orientada sobre os métodos corretivos da ptose palpebral suave, objetivando apontar o tratamento de escolha para correção dessa deformidade. Mostrou-se também a experiência da Divisão de Cirurgia Plástica do HC da FMUSP com a utilização deste procedimento durante o período de 1995 a 2006.

Palavras-chave: Blefaroptose, cirurgia. Fenilefrina, uso diagnóstico. Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos, métodos


INTRODUÇÃO

A ptose palpebral é um dos capítulos mais complexos na cirurgia órbito-palpebral, devido à riqueza de pormenores da anatomia e fisiologia desta região.

A elevação da pálpebra superior é realizada pela ação de três músculos, sendo o principal o levantador, e secundários, o frontal e o tarsal superior, ou músculo de Müller.

O músculo de Muller é uma estrutura facilmente identificável, de aproximadamente 10mm de comprimento e 15mm de largura. Origina-se junto à aponeurose do músculo levantador estriado, pouco acima do nível do fórnix superior da conjuntiva1,2 (Figura 1).


Figura 1 - Músculo de Müller: a- músculo de Müller; b- músculo levantador; c- ligamento de Whitnall.



A inervação do músculo de Müller provém da cadeia simpática cervical.

Estudos realizados por Bang et al.3 atribuíram ao músculo de Müller duas funções: manter o tônus da pálpebra superior e promover uma elevação adicional à pálpebra em 2mm, em resposta ao estímulo simpático. O objetivo deste artigo é rever a literatura sobre o tratamento cirúrgico da ptose palpebral suave, enfocando a essência de sua etiologia, no caso, a disfunção do músculo de Müller, de forma a poder atuar apenas nessa estrutura muscular deficiente, preservando íntegros os demais elementos anatômicos. Apresenta também a experiência do Grupo de Cirurgia Órbito Palpebral da Divisão de Cirurgia Plástica e Queimaduras do HCFMUSP com a utilização desta técnica no período de 1995 a 2006.


REVISÃO DA LITERATURA

A anatomia do músculo tarsal superior foi descrita pela primeira vez por H. Müller, em 1858, como músculo liso e involuntário. Desde então, o tratamento da blefaroptose ganhou mais uma possibilidade, deixando de ser restrito à atuação sobre o músculo levantador ou métodos indiretos de suspensão. Passou a ser mais específico, atuando diretamente na estrutura alterada e tentando preservar íntegras as estruturas funcionais.

Ao longo da história das cirurgias para correção da blefaroptose, podemos constatar que as técnicas cirúrgicas inicialmente tratavam o músculo levantador, incluindo em sua ressecção o músculo de Müller. Posteriormente, passou a haver uma preocupação em preservá-lo íntegro, a fim de manter sua função e, por meio de alguns estudos, chegou-se a seu tratamento específico, nos casos em que este é o responsável pela ptose palpebral.

Bowman4 descreveu um método de encurtamento do músculo levantador da pálpebra superior por via conjuntival, técnica esta amplamente divulgada por Blaskovics5. Consistia em fazer a eversão da pálpebra superior, incisão três milímetros abaixo da borda superior do tarso, dissecção da porção central da aponeurose do levantador e excisão de dois a três milímetros do tarso. Após a passagem de três pontos duplos, entre a face anterior do levantador e a conjuntiva, fazia a ressecção do levantador dois a três milímetros acima da sutura. Passava os pontos pelo tarso e exteriorizava pela pálpebra, no nível do sulco palpebral, com pontos captonados. Como não fazia uma sutura da aponeurose do levantador diretamente no tarso, havia alguns casos de hipocorreção ou recidiva por deiscência. Essa deficiência foi observada por Agatston6, que passou a fazer uma sutura da borda ressecada do músculo levantador na borda remanescente do tarso, com material inabsorvível (seda).

Fasanella e Servat7 modificaram a técnica cirúrgica descrita por Blaskovics5 para correção de ptose palpebral leve a moderada, com função regular ou boa do músculo levantador. As indicações para esse procedimento são: ptose congênita leve (1 a 2mm) com função do levantador de menos que 10mm; síndrome de Horner; casos tratados por outros procedimentos com hipocorreção; ptose adquirida responsiva ao teste da fenilefrina a 10%. Para determinar se o músculo de Müller contribui para a ptose, é feito o teste da fenilefrina a 10% colocada no fundo de saco inferior. A elevação satisfatória da pálpebra após 10 minutos indica a hipersensibilidade do músculo de Müller e caracteriza a causa da ptose. Espera-se, pois, que, pela ressecção do músculo tarsal, obtenha-se o mesmo resultado. A técnica consiste em everter a pálpebra superior, apreender um segmento contendo 3mm superiores do tarso, mais 3mm craniais com conjuntiva, músculo de Müller e aponeurose do músculo levantador e ressecá-los, suturando as bordas. Descrevem quatro casos operados sem relatos de complicações. A expectativa de correção da ptose é de um milímetro para cada milímetro ressecado. Pacientes com função menor que a normal podem requerer 1,5mm por milímetro de correção, até o máximo de 4mm de ressecção de tarso (Figuras 2 a 5).


Figura 2 - Eversão da pálpebra superior e pinçamento de segmento contendo 3mm superiores de tarso, 3mm craniais de conjuntiva, músculo de Müller e aponeurose do levantador.


Figura 3 - Sutura das bordas de forma contínua.


Figura 4 - Corte esquemático mostrando o trajeto da sutura.


Figura 5 - Sutura de tração através da pele, músculo orbicular e porção central do tarso acima da margem palpebral.


Beard8 publicou sua experiência com a técnica de Fasanella-Servat, apresentando uma pequena modificação: exteriorização dos fios de sutura onde eram anodados e deixados sob a pele, a fim de evitar o toque corneano. Observou que, durante a eversão da pálpebra, a aponeurose se retrai e os tecidos incluídos na pinça seriam conjuntiva (tarsal e palpebral), tarso e inserção do músculo de Müller. Caso a ressecção de 3mm de conjuntiva e músculo de Müller não justificasse a elevação da pálpebra, a eficácia do procedimento ainda se daria pela ressecção do tarso.

Putterman9 demonstrou esta teoria de que, na técnica de Fasanella e Servat, o músculo levantador não ficava incluído na ressecção, conforme originalmente descrito, mas apenas o tarso, a conjuntiva e o músculo de Muller, portanto, a correção da ptose era decorrente do encurtamento de 3mm do músculo de Müller, por ressecção, e de 6mm, por avanço do músculo de Müller sobre a área do músculo de Müller ressecado, mais os 3mm do tarso removido, além de um considerável avanço de 1,5mm na sutura Müller-tarso.

Crawford10 publicou o reparo da blefaroptose pela técnica de Fasanella e Servat, mantendo seus princípios originais, apenas com uma pequena modificação, onde exteriorizava a sutura através da pele, a fim de evitar a escarificação da córnea.

Fox11 também chegou à mesma conclusão que Putterman por meio de estudo histológico, onde, nos fragmentos de tarso, conjuntiva e músculo de Müller ressecados pela técnica de Fasanella e Servat, não havia presença da aponeurose do levantador. Passou, então, a executar a técnica para o tratamento de ptose suave, de 3 a 4mm, de várias etiologias, desde que a função do levantador fosse de, no mínimo, 10mm.

Putterman e Urist1 propuseram a conjuntivo-müllerectomia no tratamento da ptose palpebral suave, tanto congênita quanto adquirida, em pacientes que elevaram o nível da pálpebra a uma altura esteticamente aceitável, após instilação de colírio de fenilefrina a 10% no fundo de saco conjuntival. O objetivo dos autores era duplicar o efeito da fenilefrina no músculo de Müller e corrigir permanentemente a blefaroptose pela ressecção de 8mm do músculo de Müller e conjuntiva.

Obtiveram resultados satisfatórios em 27 das 28 pálpebras operadas em 25 pacientes. Os autores encontraram uma diferença de apenas 0,5mm ou menos entre a elevação da pálpebra superior em resposta ao teste da fenilefrina comparado ao resultado final do pós-operatório em todos os pacientes submetidos à cirurgia. O resultado indicou que uma ressecção de 8mm de conjuntiva e músculo de Müller seria satisfatória na maioria dos casos. Entretanto, preconizaram ressecção de 9mm se o teste da fenilefrina demonstrar uma resposta inferior à altura desejada, ou de 7mm nos casos cuja resposta ao teste for maior que a desejada (Figuras 5 a 9).


Figura 6 - Pinçamento incluindo conjuntiva e músculo de Müller, acima da placa tarsal.


Figura 7 - Ressecção de conjuntiva e músculo de Muller.


Figura 8 - Sutura entre conjuntiva e músculo de Müller, exteriorizada pela pele por pequena incisão temporal.


Figura 9 - Aspecto final da cirurgia.


Werb12 publicou um procedimento modificado para tratamento de ptose em que fazia a ressecção de todo o músculo de Müller e, caso a altura da pálpebra não fosse a ideal, prosseguia com a ressecção de parte do levantador. Apesar dos bons resultados para vários tipos de ptose, a ressecção do músculo de Müller era desnecessária, quando o defeito se situava na aponeurose.

Collin at al.13, em um estudo experimental realizado em macacos, provaram que o músculo de Müller não era denervado após a ressecção do músculo levantador, e que a inserção da aponeurose e do músculo de Müller contribuem ambos com a elevação da pálpebra.

Weinstein e Buerger14 descreveram uma pequena modificação da técnica de Putterman e Urist: uma sutura incluindo conjuntiva e músculo de Müller 4mm acima da borda do tarso, com a finalidade de tracioná-la, separando essas estruturas da aponeurose do levantador, e facilitando a colocação da pinça para a ressecção.

Beard2 usou a mesma técnica descrita por Putterman e Urist para o tratamento da ptose na síndrome de Horner com bons resultados.

Putterman e Fett15 publicaram sua experiência de 10 anos de estudo do músculo de Müller no tratamento da blefaroptose. Com relação ao procedimento descrito em 1975, por Putterman e Urist, ampliou-se em 0,5mm a menor e a maior extensão da ressecção de 7 a 9mm de conjuntiva e músculo de Müller. Nesse estudo de 10 anos, 90% das pálpebras com ptose adquirida e 100% daquelas com ptose congênita foram elevadas 1,5mm no pós-operatório. Somente 2 das 232 pálpebras operadas necessitaram de cirurgia adicional.

Guyuron e Daves16 descreveram sua experiência em 43 pálpebras operadas num período de 4 anos com o procedimento de Putterman modificado, evidenciando bons resultados.

Glatt et al.17 publicaram um trabalho com uma inferência interessante que se refere à verdadeira causa de elevação da pálpebra após o encurtamento do músculo de Müller: a conjuntivo-müllerectomia poderia agir indiretamente no avanço da aponeurose do levantador sobre o tarso. É também concebível que o procedimento funcione pelo encurtamento da lamela posterior da pálpebra superior. A razão de a pálpebra superior elevar-se após aplicação tópica de fenilefrina seria resposta ao encurtamento do músculo de Müller pela metade, da mesma forma que ocorre com seu encurtamento na conjuntivo-müllerectomia.


TÉCNICA CIRÚRGICA

O modelo atual é utilizado no Grupo de Cirurgia Órbito-palpebral da Divisão de Cirurgia Plástica do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, desde 1990.

Para a anestesia local, emprega-se lidocaína a 2%, com adrenalina a 1:200 000, exceto em crianças, para as quais a preferência é pela anestesia geral.

Faz-se uma sutura de tração com fio de nylon monofilamentar 5.0, envolvendo pele, músculo orbicular e tarso 2mm acima da margem palpebral superior em sua porção central (Figura 10).


Figura 10 - Sutura de tração com fio de nylon monofilamentar 5.0 envolvendo pele, músculo orbicular e tarso.



Eversão da pálpebra superior com retrator de Desmarres e exposição da conjuntiva palpebral, do bordo superior do tarso ao fórnice superior, auxiliado pela tração cranial do fio passado anteriormente (Figura 11).


Figura 11 - Eversão da pálpebra superior com exposição da conjuntiva palpebral e projeção do tarso: a- bordo caudal do tarso; b- bordo cranial do tarso.



Com a pálpebra evertida, injeta-se o anestésico local sob o músculo de Muller (Figura 12).


Figura 12 - Pinçamento da conjuntiva e músculo de Muller.



Como o pinçamento resulta numa dobra músculo-conjuntival, a quantidade programada a ser ressecada deverá ser calculada pela metade daquelas medidas para cada face da prega obtida no segmento entre o bordo tarsal e o fórnice superior (Figuras 13 e 14).


Figura 13 - Medida da quantidade programada a ser ressecada.



Figura 14 - Pinçamento da conjuntiva e músculo de Müller marcando o local a ser ressecado.



A pele da pálpebra superior é então tracionada numa direção, enquanto as pinças são puxadas simultaneamente na direção oposta (Figura 15).


Figura 15 - Manobra de tração da pele para evitar pinçamento inadequado do músculo levantador.



Excisão da prega de conjuntiva e músculo de Müller (Figura 16).


Figura 16 - Secção de conjuntiva e músculo de Müller entre a linha de sutura e as pinças.



Passa-se um fio de nylon monofilamentar 5.0 através da pele, placa tarsal e conjuntiva a 4mm do bordo palpebral no lado temporal. O retrator de Desmarres e o fio de tração evertem novamente a pálpebra. A sutura é passada continuamente em direção nasal; os pontos devem ser aparados aproximadamente 2mm do bordo tarsal, músculo de Müller e conjuntiva. Ao atingir o final da sutura na região nasal, o fio é exteriorizado novamente para a pele a uma distância de aproximadamente 14mm do local de entrada (Figura 17).


Figura 17 - Sutura envolvendo conjuntiva e músculo de Müller com fio de nylon monofilamentar 5.0 exteriorizada pela pele.



Retiram-se as pinças de Halstead ao mesmo tempo em que se traciona o fio de sutura, mantendo as estruturas unidas. Retira-se o retrator de Desmarres reposicionando a pálpebra. Os fios de sutura são anodados e cortados (Figura 18).


Figura 18 - Aspecto final da cirurgia, com os fios anodados.



Faz-se um ponto de proteção de Frost com nylon monofilamentar 4.0, passando na porção central da pálpebra inferior e fixando-o acima do supercílio com fitas adesivas, mantendo-o por 24 horas (Figura 19).


Figura 19 - Sutura de Frost.



A sutura é removida após duas semanas. Normalmente, a pálpebra chega à altura normal após um período de 4 a 14 dias de pós-operatório.

De 1995 a 2006, na Divisão de Cirurgia Plástica e Queimaduras do HC da FMUSP, foram operados 18 pacientes, sendo 14 pacientes do sexo feminino e 4, do masculino, em idade que variou de 14 a 58 anos (média de 31,8 anos), sendo 12 casos de ptose unilateral e 6 casos de ptose bilateral. Doze (66,6%) casos foram tratados por conjuntivo-mullerectomia isolada e 6 (33,3%) por associação à blefaroplastia.

Os resultados foram avaliados de acordo com o seguinte critério:
-Unilateral: conforme a simetria com o lado contralateral;
-Bilateral: posicionamento palpebral superior adequado.

Em 16 (88,8%) casos, o resultado foi considerado bom e, em 2(11,1%), regular. Alguns desses casos são apresentados nas Figuras 20 a 26.


Figura 20 - Ptose palpebral suave à esquerda: (A) pré-operatório, (B) pós-operatório de 7 dias.


Figura 21 - Ptose palpebral suave à esquerda: (A) pré-operatório, (B) pós-operatório de 1 ano.


Figura 22 - Ptose palpebral suave à direita: (A) pré-operatório, (B) pós-operatório de 1 ano.


Figura 23 - Ptose palpebral suave à direita: (A) pré-operatório supraversão, (B) pós-operatório de 1 ano supraversão.


Figura 24 - Ptose palpebral suave com prótese ocular à direita: (A) pré-operatório, (B) pós-operatório de 18 meses.


Figura 25 - Ptose palpebral suave com prótese ocular à esquerda: (A) pré-operatório, (B) pós-operatório de 1 ano.


Figura 26 - Ptose palpebral suave bilateral: (A) pré-operatório, (B) pós-operatório de 1 ano.



DISCUSSÃO

A técnica apresentada a seguir é baseada naquela originalmente descrita por Putterman e Urist, em 1975, revista por Putterman e Fett, em 1986, com mínimas modificações no tipo de fio de sutura utilizado e na extensão do músculo de Müller a ser ressecado de acordo com a resposta ao teste da fenilefrina18.

A vantagem da técnica de Putterman e Urist sobre a técnica de Fasanella e Servat é manter o tarso intacto, pois sua remoção pode provocar instabilidade da pálpebra.

A remoção de glândulas secretoras no procedimento de Fasanella e Servat também poderia ser responsável pela produção de ceratite seca.

No procedimento de Putterman e Urist, a sutura é realizada 3 a 4mm acima do bordo tarsal superior, ao contrário da técnica de Fasanella e Servat, que é realizada no tarso, o que diminui a possibilidade de ocorrência de abrasão na córnea. Isso diminui também o edema pós-operatório, geralmente encurtando o tempo de recuperação.

No teste da fenilefrina para recrutar os pacientes candidatos ao procedimento, as pálpebras superiores, na posição primária do olhar, são avaliadas em relação tanto à altura do limbo quanto ao reflexo corneano produzido pela luz (MRD). A medida da largura da fenda palpebral não é precisa para determinar a necessidade de elevação da pálpebra superior, uma vez que o estímulo químico no músculo de Müller pela fenilefrina ocorre tanto na pálpebra superior quanto na inferior, causando também retração da pálpebra inferior.

A fenilefrina apresenta as seguintes contra-indicações: hipertensão arterial, cardiopatias, câmara anterior rasa e glaucoma.

Jones19 questionou se a excisão de 7 a 9mm de conjuntiva palpebral normal nesse procedimento não poderia provocar a síndrome do olho seco. David J. Apple havia, entretanto, revisado os fragmentos ressecados em todos os casos e estudado o número de glândulas da conjuntiva excisadas, concluindo que a conjuntiva estava relativamente livre de elementos glandulares.

Quando se discutem as complicações das cirurgias para a correção de ptose palpebral, de um modo geral, alguns aspectos costumam ser comuns, tais como hipocorreção, alteração do sulco palpebral, hipercorreção, lagoftalmo, entalhe na pálpebra, lesão corneana, ectrópio, entrópio, recidiva, granulomas, prolapso conjuntival, perda dos cílios, hemorragia e infecção, dentre outros.

Pelo fato da conjuntivo-müllerectomia ser um procedimento de resultados relativamente previsíveis, quando corretamente executado, já é esperado que a correção atinja níveis semelhantes aos observados no teste do colírio de fenilefrina a 10%. Essa técnica é indicada no tratamento da ptose palpebral suave, em que normalmente se pretende elevar a altura palpebral em até 2mm. Nesses casos, tanto a hipo quanto a hipercorreção são complicações pouco freqüentes. Além do mais, ao se fazer a ressecção da conjuntiva e músculo de Müller, só se consegue corrigir defeitos relativos à falha na ação dessa musculatura lisa, que é responsável pela elevação da pálpebra superior em até 2mm, não havendo, portanto, como fazer uma correção maior. Não ocorre alteração do sulco palpebral superior, pois não há dissecção do músculo levantador nem na pele da pálpebra superior.

Também não ocorre a complicação do entalhe produzido na pálpebra superior, pois o procedimento preserva o tarso íntegro, não sendo utilizado nem mesmo como ponto de sutura, uma vez que esta é feita entre a conjuntiva e o músculo de Müller 3 a 4mm acima do bordo superior do tarso.

Isso justifica também os baixos índices de lesões corneanas. Entretanto, nos primeiros dias de pós-operatório, pode haver uma pequena exposição corneana por má oclusão devido ao edema. Isso deve ser evitado com o curativo de Frost, nas primeiras 24 horas de pós-operatório, nos casos de cirurgia unilateral e, nos primeiros dias, com colírios lubrificantes durante o dia e pomadas oftálmicas durante a noite.

Ectrópio e entrópio são complicações muito raras na cirurgia de conjuntivo-müllerectomia, por não alterar o vetor na aplicação da força de tração sobre o tarso.

A perda dos cílios é improvável, senão impossível, na conjuntivo-müllerectomia.

Outra complicação possivelmente presente nesta técnica é o prolapso conjuntival; Sendo pequeno, deve apenas ser reposicionado. Se persistir, a conjuntiva pode ser suspensa à sua posição por meio de uma sutura do fórnice através do sulco palpebral. Hemorragia e infecção são entidades raras neste procedimento, e devem ser evitadas como em qualquer ato cirúrgico, sem nenhuma particularidade.

Inferências:

1 . Na ptose palpebral suave, congênita ou adquirida, com resposta de elevação palpebral pela instilação do colírio de fenilefrina, com boa função do levantador, o tratamento de escolha é a conjuntivo-müllerectomia, por oferecer resultado previsível, ser simples e rápido, apresentar baixa morbidade, além de evolução pós-cirúrgica bastante satisfatória.

2. O tarso deve ser preservado íntegro, sempre que possível, para proteção do globo ocular, pela manutenção do arcabouço esquelético da pálpebra e preservação das glândulas de Meibômius, cuja secreção oleosa produzida compõe o filme lacrimal.


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I. Mestre em Cirurgia Plástica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
II. Livre Docente da Disciplina de Cirurgia Plástica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
III. Titular da Disciplina de Cirurgia Plástica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.


Correspondência para:
Dra. Renata Rita Oliveira Fernandes
Rua José de Almeida, 27 - Nova Campinas
Campinas - SP - CEP: 13092-400
Fone/fax: (0xx19) 3255-2717
E-mail: dra.renata@sculpteur.com.br
renata@mpcnet.com.br


Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.

Artigo recebido: 18/06/2007
Artigo aprovado: 30/07/2007

 

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