INTRODUÇÃO
Os tumores de parede torácicas são relativamente inusitados, representando 1 a 2%
de
todas as neoplasias e cerca de 5% das neoplasias torácicas. Os tumores primários da
parede torácica são raros e incluem um grande grupo de neoplasias que podem surgir
não apenas de ossos ou cartilagens da parede torácica, mas também de tecido
subcutâneo associado de músculos e vasos sanguíneos1.
Os tumores malignos primários da parede torácica correspondem a menos de 1% de todas
as neoplasias e incluem grande variedade de lesões ósseas e de tecidos moles. Os
condrossarcomas representam 20% dos tumores primários da parede torácica, sendo que
80% têm origem nas costelas e 20% no esterno. A ocorrência na parede torácica é
rara, representando 8% de todos os sarcomas1.
O tratamento de escolha é a ressecção com margens ampliadas e, quando ocorre a
invasão de estruturas profundas, a toracectomia é indicada2, 3, 4.
Este estudo teve como objetivo descrever a apresentação clínica, método de
planejamento pré-operatório e cirurgia e manejo perioperatório de um condrossarcoma
esternal gigante. A esternectomia para tratamento de tumor maligno resulta em
grandes defeitos no arcabouço ósseo e tecidos moles, causando deformidade e
movimento paradoxal da parede torácica e tornando a reconstrução torácica muito
importante5. A reconstrução do arcabouço
ósseo é realizada com materiais de síntese proporcionando estabilidade e é seguida
pela reconstrução de partes moles com retalhos bem vascularizados musculares,
musculocutâneos ou locais ao acaso5, 6, 7,
8, 9, 10, 11.
RELATO DE CASO
Masculino, 53 anos, natural e procedente de Fortaleza (CE), internado no serviço de
cirurgia torácica do Hospital de Messejana, em 2021. Há seis meses apresentou
abaulamento em esterno (Figura 1) com dor local
leve e aumento progressivo da lesão. Evoluiu no último mês com dispneia aos grandes
esforços. Relatou perda de peso em torno de 10Kg nos últimos seis meses.
Figura 1 - Apresentação inicial do paciente.
Figura 1 - Apresentação inicial do paciente.
No exame físico, encontrava-se em bom estado geral, anictérico, acianótico, afebril,
eucárdico e eupneico. A ausculta, pulmonar e cardíaca, era normal, e a palpação
abdominal, inocente. De exames complementares, a tomografia de tórax (Figura 2) evidenciou formação expansiva e septada
comprometendo a parede torácica e com envolvimento importante do corpo esternal, com
focos de osteólise, medindo 15,3 × 13,8cm, insinuando-se para região intratorácica
e
determinando rechaçamento posterior importante do coração, sem sinais de invasão
pericárdica.
Figura 2 - Tomografia da lesão tumoral com invasão de mediastino em
pré-operatório.
Figura 2 - Tomografia da lesão tumoral com invasão de mediastino em
pré-operatório.
Fez cintilografia óssea, que demonstrou irregularidade difusa na captação do fármaco
no corpo do esterno. O ecocardiograma demonstrou massa mediastinal comprimindo
cavidades cardíacas direitas, derrame pericárdico leve e a fração de ejeção de 70%.
Foi realizada uma biópsia incisional da lesão, cujo exame anatomopatológico revelou
neoplasia cartilaginosa de baixo grau, sugestiva de osteocondroma, não sendo
possível distinguir completamente de condrossarcoma grau 1.
O paciente foi submetido a cirurgia, com ressecção completa do tumor (Figura 3) por esternectomia parcial em bloco com
cartilagens do 3º ao 10º arcos costais, e com preservação do manúbrio (Figura 4). A reconstrução da parede torácica foi
feita com tela dupla de polipropileno (Figura 5) e retalhos dos peitorais bilateralmente como descrito por Starzynski para
correção de grandes defeitos na parede torácica, com advento do serviço de cirurgia
plástica do hospital de referência. O diagnóstico histopatológico final foi de
condrossarcoma grau II, com margem microscopicamente comprometida.
Figura 3 - Lesão tumoral ressecada, aspecto ao encaminhamento para
histopatológico.
Figura 3 - Lesão tumoral ressecada, aspecto ao encaminhamento para
histopatológico.
Figura 4 - Imagem intraoperatória após retirada de massa tumoral evidenciando
mediastino exposto.
Figura 4 - Imagem intraoperatória após retirada de massa tumoral evidenciando
mediastino exposto.
Figura 5 - Tela de Marlex utilizada como forma de proteção adicional ao
mediastino.
Figura 5 - Tela de Marlex utilizada como forma de proteção adicional ao
mediastino.
O paciente fez quimio e radioterapia adjuvante e evoluiu sem sinais de recidiva de
tumor até o 9o mês pós-cirurgia, quanto fez uma tomografia
computadorizada de tórax que mostrou apenas achados compatíveis com manipulação
cirúrgica, espessamento do tecido subcutâneo e retração de pele. Ressalta-se, no
caso, a reconstrução da parede torácica sem o uso de cimento ósseo ou próteses
metálicas, com bom resultado oncológico, estético e funcional (Figura 5). No entanto, sabe-se que os condrossarcomas ósseos
primários, neoplasias de cartilagem hialina, costumam apresentar uma progressão
lenta e alta recidiva, sobretudo, quando as margens de ressecção cirúrgica não são
adequadas com, pelo menos, quatro centímetros em todos os lados.
DISCUSSÃO
Os condrossarcomas representam aproximadamente 30% das neoplasias ósseas malignas
primárias, sendo a mais frequente a da parede torácica anterior. Esse tumor ocorre
mais comumente entre a terceira e quarta décadas de vida, sendo relativamente
incomum em pessoas com menos de 20 anos. O sexo masculino é mais acometido3. Os condrossarcomas são neoplasias lobuladas
que podem crescer a proporções massivas e, consequentemente, podem estender-se
internamente para dentro do espaço pleural ou externamente, invadindo músculo e
tecido adiposo da parede torácica. Microscopicamente, os achados variam de
cartilagem normal até modificações malignas óbvias.
A diferenciação entre condroma e condrossarcoma pode ser extremamente difícil3. Massa palpável no tórax é o sintoma principal
em cerca de 80% dos pacientes com tumor de parede torácica. Destes, 60% apresentam
dor associada2. Insuficiência respiratória e
hemotórax são achados mais raros e estão presentes somente quando os tumores são
muito extensos4.
Exames de imagem podem ser úteis em sugerir a afecção; no entanto, o diagnóstico
definitivo requer correlação entre a histologia e a radiologia. A tomografia
computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM) são bons exames para
caracterizar o tumor e sua extensão. A TC é superior à RM para demonstrar
calcificações, enquanto a RM é o exame de escolha para avaliar a extensão do tumor
e
suas relações com estruturas adjacentes4.
Os condrossarcomas de parede torácica tipicamente crescem de forma lenta e recidivam
localmente. Se não forem tratados, ocorrerão metástases tardias. O completo controle
da neoplasia primária é o principal determinante da sobrevida. O objetivo da
primeira cirurgia deve ser uma ressecção ampla o suficiente para prevenir
recorrência local. Isso significa obter uma margem de 4cm em todos os lados. Esta
conduta resulta na cura de aproximadamente todos os pacientes, resultando em
sobrevida em 10 anos de 97%3.
Alguns autores propõem que, por ser o diagnóstico histológico pré-operatório difícil,
ressecção ampla deve ser feita em todos os casos de neoplasia da parede
torácica5. Reconstrução de defeitos no
arcabouço torácico costais e com preservação do manúbrio. O paciente apresentou no
intraoperatório o seguinte defeito no gradil costal (Figura 4). A reconstrução da parede torácica foi feita com tela dupla de
polipropileno (Figura 5).
A reconstrução foi definida com o serviço de cirurgia plástica do Hospital de
Messejana, onde foram postuladas as opções terapêuticas a seguir pelo algoritmo
proposto pelo serviço no que se refere à reconstrução do arcabouço torácico:
1) Para reconstrução da parede torácica realizamos retalho muscular associado à
enxertia de pele (músculo peitoral maior); 2) Retalhos miocutâneos: transverso do
músculo reto abdominal (TRAM) 3) Vertical do músculo reto abdominal (VRAM); 4)
Associação de TRAM com VRAM; 5) Músculo grande dorsal; 6) Retalhos fasciocutâneos
da
região e retalhos dos peitorais bilateralmente como descrito por Starzynski para
correção de grandes defeitos na parede torácica com advento do serviço de cirurgia
plástica do hospital de referência; 7) Retalhos livres.
Devido ao grau de comprometimento vascular da ressecção cirúrgica, em que foi
necessária a interrupção do fluxo sanguíneo bilateral das artérias mamárias
internas, não se conseguia um arco de rotação com o músculo grande dorsal. Foi
sugerido o retalho fasciocutâneo proposto por Starzynski (RASP-
Rotation-advancemement split pectoralis), retalho
musculocutâneo baseado no musculo peitoral maior (tipo 5 Mates-Nahai), sendo
realizada a ligadura bilateral dos pedículos dominantes (toracoacromial) e utilizado
o retalho em cambalhota baseado na sua vascularização com pedículos acessórios
intercostais para cobertura do defeito arcabouço torácico ao nível esternal (externo
ausente e sua topografia coberta com tela polipropileno).
A cobertura do defeito cutâneo foi baseada no retalho fasciocutâneo amplo de
deslizamento. Foi realizado ancoramento do retalho fasciocutâneo com pontos de
adesão descritos por Baroudi (Figura 6) e o
paciente evoluiu com discreta epidermólise na parte a jusante ao suprimento
sanguíneo bilateral (bordas do retalho na região central), que foi tratada de
maneira conservadora, sendo obtida excelente evolução (Figura 7).
Figura 6 - Aspecto final após reconstrução com tela de Marlex mais retalhos
musculares e retalhos cutâneos ancorados por pontos de Baroudi.
Figura 6 - Aspecto final após reconstrução com tela de Marlex mais retalhos
musculares e retalhos cutâneos ancorados por pontos de Baroudi.
Figura 7 - Aspecto final após procedimento cirúrgico.
Figura 7 - Aspecto final após procedimento cirúrgico.
O diagnóstico histopatológico final foi de condrossarcoma grau II, com margem
microscopicamente comprometida. O paciente fez quimio e radioterapia adjuvante e
evoluiu sem sinais de recidiva de tumor até o 9º mês pós-cirurgia, quando fez uma
tomografia computadorizada de tórax que mostrou apenas achados compatíveis com
manipulação cirúrgica, espessamento do tecido subcutâneo.
CONCLUSÃO
Mediante a apresentação progressiva do caso quando procurou o serviço de cirurgia
torácica de Messejana, Fortaleza-CE, foi realizada propedêutica necessária para
estadiar a lesão tumoral conforme os preceitos da literatura existente A evolução
do
paciente foi satisfatória e obtivemos um resultado de sobrevida com qualidade de
vida importante, conforme literatura internacional consultada. Foi possível devolver
o paciente as suas atividades domiciliares com acompanhamento estipulado para
detecção de possíveis recidivas tumorais por meio de exames de imagens em datas
predeterminadas.
O resultado obtido, bem como a proposta cirúrgica diante do quadro clínico
apresentado pela paciente, corresponde a um desafio diante do tamanho da lesão,
necessidade de margens livres e topografia da lesão, porém logrado êxito mediante
às
adversidades.
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10.1097/00006534-199610000-00008
1. Hospital de Messejana, Fortaleza, CE,
Brasil
Autor correspondente: José Dalvo Maia
Neto Avenida Pintor Antonio Bandeira, 1500, ap 1001, Vicente Pizon,
Fortaleza, CE, Brasil, CEP: 60182-292, E-mail:
dalvomaia@hotmail.com
Artigo submetido: 16/10/2023.
Artigo aceito: 30/04/2024.
Conflitos de interesse: não há.
Instituição: Hospital de Messejana, Fortaleza, CE, Brasil.