ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Articles - Year2001 - Volume16 - Issue 3

RESUMO

Este trabalho tem o objetivo de ressaltar as vantagens da atuação conjunta do mastologista e do cirurgião plástico, em ato operatório único, para tratamento dos tumores de mama. Os autores apresentam a experiência com 58 pacientes operadas no Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Divina Providência e no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre, durante o período de 1998 a 2001, com retirada do tumor e reconstrução da mama no mesmo procedimento cirúrgico. As pacientes foram acompanhadas clinicamente por 60 dias, no mínimo, e foram avaliados os resultados clínicos, o grau de satisfação com o aspecto físico e o retorno às atividades habituais. São descritas as técnicas de reconstrução da mama selecionadas segundo o tipo de ressecção efetuada pelo mastologista. Os autores concluem que o tratamento cirúrgico oncológico e a reconstrução realizados em intervenção única é um fator importante para uma recuperação rápida, com boa qualidade de vida das pacientes com câncer de mama.

Palavras-chave: Tumores de mama; mastectomia; reconstrução de mama

ABSTRACT

The objective of this study was to emphasize the advantages of mastologists and plastic surgeons working together in a single surgical procedure to treat breast tumors. The authors describe their experience with 58 patients who underwent surgery in the Plastic Surgery Facilities at Hospital Divina Providência and Hospital Moinhos de Vento, both in the city of Porto Alegre, in the state of Rio Grande do Sul, Brazil, between 1998 and 2001. This surgery involved the removal of the tumor and breast reconstruction in a single surgical procedure. Patients were followed up clinically for at least 60 days. Follow-up included evaluation of clinical results, level of satisfaction with the physical aspect, and return to everyday activities. Breast reconstruction techniques have been described, according to the type of resection conducted by the mastologist. Authors have concluded that the combination of surgical oncologic treatment and reconstruction in a single intervention is a key factorfor quick recovery and for providing breast cancer patients with a good quality of life.

Keywords: Breast tumors; mastectomy; breast reconstruction


INTRODUÇÃO

O câncer de mama é diagnosticado em mais de 170.000 mulheres, anualmente, nos Estados Unidos(1). Tanto no Estado do Rio Grande do Sul como em Porto Alegre, o câncer de mama é a principal causa de morte entre as mulheres que morrem de neoplasia maligna. Em 1999, o câncer de mama ocupou o quarto lugar como causa de morte entre as mulheres falecidas em Porto Alegre (Quadro I) (Dados da Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul). Nos últimos três anos (de 1998 a 2001), foram diagnosticados 572 casos de neoplasia maligna de mama em apenas um serviço de patologia, na cidade de Passo Fundo, que atende uma área de 2 milhões de habitantes(2).




Medidas terapêuticas atualizadas têm proporcionado uma expectativa de vida de 5 anos em 80% das pacientes com diagnóstico de câncer invasivo de mama(3). Considerando-se a importância estética das mamas, o efeito mutilante da doença e o desempenho moderno da mulher na sociedade, procuramos desenvolver uma técnica operatória conjunta para retirada do tumor e reconstrução mamária que permita um tratamento oncológico seguro, restitua a auto-estima da paciente e a torne, o mais rapidamente possível, apta a desempenhar suas atividades habituais, podendo apresentar-se dignamente com seu vestuário de costume na sociedade(4) .

A atuação conjunta do mastologista com o cirurgião plástico é proposta pelo mastologista à paciente explicando-se a eficácia terapêutica do procedimento, as vantagens estéticas e a redução dos custos pela realização de um único ato operatório. Também é enfatizada a diminuição da morbidade psíquica obtida com uma cirurgia única e com seus resultados. Esses aspectos têm sido amplamente aceitos pelas pacientes, que, em alguns casos, vislumbram a oportunidade de corrigir plasticamente suas mamas(4,5,6).


MATERIAL E MÉTODO

No período de 1998 a 2001 foram submetidas a mamoplastia oncológica 58 pacientes com carcinoma de mama, pelas equipes de mastologia e cirurgia plástica, em ato operatório único(7), no Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Divina Providência e no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre. O seguimento das pacientes foi de, no mínimo, 60 dias, constando de avaliação clínica e de questionário dirigido à apreciação de aspectos afetivos, auto-estima, morbidade psicológica e readaptação psicossocial. A idade das pacientes variou de 26 a 62 anos, com média de 45 anos.

As pacientes foram submetidas à intervenção bilateral com o objetivo de se obter simetria mamária harmônica, buscando-se o melhor resultado estético(9). No mesmo momento em que era realizada, pela equipe de mastologia, a ressecção do tumor, a mama contralateral era reduzida de volume pela equipe de cirurgia plástica e o tecido retirado da mama sadia era encaminhado para estudo anatomopatológico (Fig. 1a).


Fig. la - As duas equipes atuam no mesmo ato cirúrgico.



Com a paciente em decúbito dorsal, sem elevação do dorso, a via de acesso utilizada foi a incisão elíptica periareolar(7) e outra elipse infra-areolar, tendo como base um triângulo isósceles (Fig. 1b) - esta técnica tem sido utilizada há 10 anos no serviço e foi sistematizada por um dos autores(1). A mama doente era, então, reconstruída de acordo com o tecido mamário remanescente, após o resultado do anatomopa-tológico. A montagem das mamas foi efetuada com mononylon 2,0.


Fig. 1b - Desenho na pele da paciente, usado de rotina como via de acesso e montagem.



Foram utilizados retalhos locais ou pedículo inferior(8,10)(Fig. 1c). Este último era fixado na pele preservada pelo mastologista para fazer um pólo superior ou fixado na aponeurose do grande peitoral com o objetivo de se obter maior projeção ou preencher áreas que foram ressecadas. A sutura da pele foi efetuada com monocryl 4,0 ou 5,0. Em uma paciente a cicatriz foi periareolar, nas demais periareolar com extensão vertical e horizontal de 1 a 3 cm (Fig. 1d). Quando houve necessidade de esvaziamento axilar foi instalado dreno de sucção por 5 dias ou até a quantidade do líquido drenado não ultrapassar 20 ml em duas horas.


Fig. 1c - Deslocamenro da base glandular para o mastologista ressecar o tumor.


Fig. 1d - Cicatriz cirúrgica final.



Os 58 pacientes tratados foram classificados em 4 grupos de acordo com a quantidade de tecido ressecado na mama doente, o tipo de lesão anatomopatológica e a técnica efetuada (Tabela I). O Grupo I, com 7 pacientes que apresentavam hiperplasia lobular atípica ou microcalcificações agrupadas, foi submetido a ressecção mínima e reconstrução com retalhos locais. No Grupo II (Figs. 3a - 3c), as pacientes em número de 16 eram portadoras de carcinoma intraductal, carcinoma ductal invasor, carcinoma medular in situ ou carcinoma medular invasor(11). Neste Grupo a ressecção foi menor que 1/5 do volume da mama e a reconstrução foi efetuada com retalhos locais ou pedículo inferior (Fig. 3d - 3f). No Grupo III (Figs. 4a - 4c), foram agrupados 50% dos casos estudados e a patologia era a mesma do Grupo II. Nestas pacientes a ressecção foi maior que 1/5 do volume mamário e a reconstrução foi feita com retalhos locais, pedículo inferior e prótese (Figs. 4d - 4f). Foram agrupadas 6 pacientes como casos especiais no Grupo IV (Figs. 5a - 5c). Nessas, o diagnóstico anatomopatológico somente foi confirmado durante o transoperatório e, havendo necessidade de ampliação da ressecção, era decidida no momento a técnica de reconstrução, utilizando-se retalhos fora de rotina (Figs. 5d - 5f).




Figs. 2a-2c - Pré-operatório: 26 anos com carcinoma in situ de 1 cm na mama direita.


Figs. 2d-2f - Paciente da figura 2, com 6 meses de pós-operatório. Tecido ressecado entre redução e setorectomia: 300g mama D, e 300g mama E (ressecção menor que 1/5 do volume mamário - Grupo I).


Figs. 3a-3c - Pré-operatório: 41 anos, com carcinoma in situ de 2,10 cm na mama E.


Figs. 3d-3f - Paciente da figura 3, com 1 mês de pós-operatório. Tecido ressecado com a setorectomia: 160g mama E e 180g mama D (ressecção menor que 1/5 do volume mamário - Grupo II).


Figs. 4a-4c - Pré-operatório: 40 anos, com carcinoma ductal invasor na mama e ressecção de 2/3 da glândula esquerda e de fibroadenoma de 2 cm na mama direita.


Figs. 4d-4f - Paciente da figura 4, com 3 meses de pós-operatório. Utilizando prótese de 180 cc na mama direita, com redução da pele periareolar. Na mama esguerda, prótese de 235 cc, retalho local para o pólo superior com redução de pele periareolar(ressecção maior gue 1/5 do volume mamário - Grupo III).


Figs. 5a - Pré-operatório: 43 anos, com carcinoma ductal invasivo na mama esquerda.


Figs. 5b - Paciente da figura 5a, com 6 meses de pós-operatório. Setorectomia com ressecção de pele no pólo superior e utilização de retalho pedículo inferior em ilha para o pólo superior da mama no lade esquerdo. Observa-se a mimitização com a pele adjacente. Redução de mais ou menos 280g mama E, em conjunto com a setorectomia mama D, para simetrização, conferindo mais ou menos igual volume para ambas (Grupo IV - casos especiais).



O estudo anatomopatológico revelou que 92% das pacientes apresentavam carcinoma ductal invasor e 5% carcinoma lobular invasor e 3% dos tumores eram carcinoma in situ.

Todas as pacientes concordaram, após explicação, em realizar os dois procedimentos em ato operatório único e foram alertadas da necessidade do acompanhamento clínico.

O tratamento adjuvante com radioterapia foi aplicado a todas as pacientes(4). Nas portadoras de neoplasia invasiva procedeu-se à pesquisa de gânglio sentinela ou o esvaziamento axilar e as pacientes receberam quimioterápicos.


RESULTADOS

Nenhuma paciente sofreu de complicação grave durante o seguimento. Uma do Grupo I apresentou serona que drenou espontaneamente, sem prejuízo do resultado. O tempo médio de hospitalização foi de 24 horas. Não se observaram diferenças na evolução clínica dos quatro grupos. As pacientes do Grupo IV, formando "casos especiais", apresentaram maior dificuldade no planejamento técnico, pois a conduta era determinada durante o ato cirúrgico face às dúvidas no diagnóstico anatomopatológico. Nesses casos foram utilizados retalhos considerados fora de rotina.

O efeito estético foi julgado satisfatório face a evidência de preservação da simetria mamária em todas as pacientes e a inexistência de defeitos cicatriciais apreciáveis. A avaliação subjetiva, obtida pelas respostas das pacientes ao questionário utilizado durante o acompanhamento pós-operatório, mostrou que 80% delas sentiam preservada sua identidade feminina e 70% das pacientes expressaram diminuição da morbidade psicológica, caracterizada pela expectativa de sobrevivência e diminuição da ansiedade. A readaptação psicossocial, ou seja, o retorno às atividades habituais, foi detectada em 70% das pacientes tratadas.


DISCUSSÃO

A sistematização para o tratamento do câncer de mama, no presente trabalho, difere da tradicional em que a ressecção do tumor e a reconstrução do órgão são efetuadas em duas etapas. Este trabalho propõe que, atuando em conjunto, o mastologista e o cirurgião plástico executem os tratamentos oncológico e estético num mesmo ato. A redução da mama sadia, efetuada ao mesmo tempo que a ressecção do tecido tumoral, permite melhor dimensionamento do volume mamário a ser considerado como definitivo, de maneira simétrica. Além disso, a possibilidade de rastrear células malignas na mama considerada normal representa um grande benefício prognóstico para as pacientes.

Ficou demonstrado nessa experiência com 58 pacientes que os resultados estéticos obtidos não sofreram influência do tipo de tumor nem da quantidade de tecido ressecado pelo mastologista. É de se esperar que a realização dos tratamentos oncológico e estético em um único ato operatório determine redução de custos, diminuição do risco anestésico e menor angústia para as pacientes(12,13).

Com o objetivo de minimizar os efeitos deletérios no comportamento psicossocial, diminuir a sensação de mutilação ou controlar o pânico, que acompanham pacientes com doenças malignas, a sistematização aqui descrita mostrou-se eficaz na melhora da qualidade de vida dos grupos tratados com câncer de mama.


CONCLUSÃO

A participação conjunta do mastologista e do cirurgião plástico mostrou-se benéfica, do ponto de vista estético, nos 58 casos estudados. O pouco tempo de seguimento clínico não é suficiente para verificar os benefícios terapêuticos sobre o tumor. Vantagens estéticas foram observadas em todas as pacientes, e a grande maioria delas sentiu-se confortável com os resultados obtidos. A realização de um único ato operatório é um fator econômico considerável, além de reduzir à metade o trauma cirúrgico.


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I. Responsável pelo Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Divina Providência de Porto Alegre, Membro Titular de Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
II. Membro Especialista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
III. Professor da Cadeira de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Endereço para correspondência:
Miriam Luisa Pedron
R. Dr. Barbosa Gonçalves, 660
Porto Alegre - RS - 91330-320
Fone: (51) 3328-7933
e-mail: mlpedron@terra.com.br

 

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