INTRODUÇÃO
Os traumas e patologias relacionadas a mão e punho estão entre as principais causas
de afastamento por acidentes de trabalho no Brasil, segundo o Instituto Nacional
de
Segurança Social (INSS)1. O desenvolvimento e aperfeiçoamento de técnicas cirúrgicas
de reconstrução dessa região anatômica é uma busca constante pelos cirurgiões
plásticos e cirurgiões de mão. A cirurgia para cobertura do dorso dos dedos exige
um
retalho com boa durabilidade, cor e contorno adequados, para que haja uma cobertura
satisfatória da lesão2. O retalho adipofascial é uma boa alternativa, já que fornece
espessura adequada, boa elasticidade e mínima deformidade da região doadora, além
da
simplicidade e curta duração do procedimento3.
OBJETIVO
Demonstrar o uso do retalho adipofascial reverso para reconstrução de lesões em
região do dorso da mão e dos dedos.
RELATO DE CASO
Paciente 28 anos, masculino, previamente hígido, com lesão por desenluvamento
traumático de múltiplos dedos da mão esquerda. Sofreu o acidente em ambiente de
trabalho, enquanto manejava uma máquina de pressão automatizada, desenvolvida
para
montagem de calçados. O paciente retirou intencionalmente um dispositivo de
proteção, a fim de executar a tarefa mais rapidamente. Devido a alteração na
máquina, toda pressão que seria imposta apenas sob o sapato, foi também imposta
sob
sua mão, forçando-o a esticá-la, o que resultou em uma completa avulsão da cobertura
cutânea com exposição das falanges do segundo, terceiro e quarto dedos do dorso
da
mão esquerda. A cobertura cutânea foi planejada para restabelecer a superfície
deslizante dos tendões extensores, evitando retalhos volumosos. O retalho
adipofascial reverso foi considerado uma opção antes de um retalho microcirúrgico.
O
retalho para a mão foi planejado com base nas pequenas perfurantes ao nível da
articulação do punho. O procedimento foi realizado sob anestesia regional - bloqueio
do plexo braquial por via transaxilar - com duração total do procedimento de
aproximadamente uma hora, quando o torniquete foi liberado permitindo a circulação
total para a extremidade superior (Figuras 1 a
3).
Figura 1 - Pré-operatório: lesão necrosante dos quirodáctlios.
Figura 1 - Pré-operatório: lesão necrosante dos quirodáctlios.
Figura 2 - Pré-operatório: aspecto após desbridamento.
Figura 2 - Pré-operatório: aspecto após desbridamento.
Figura 3 - Trans-operatório: dissecção dos planos do retalho.
Figura 3 - Trans-operatório: dissecção dos planos do retalho.
RESULTADOS
O paciente evoluiu bem no pós-operatório, sem complicações como deiscência de suturas
ou sofrimento do retalho, mantendo acompanhamento ambulatorial após alta hospitalar.
Apresentou mobilidade completa do membro e dedos após 6 meses de fisioterapia.
DISCUSSÃO
Traumas de mão têm implicações diversas quando comparados a outras regiões do corpo,
já que podem causar grande repercussão na vida do paciente. Lesões graves ocasionam
grande incapacidade funcional que pode limitar, de maneira temporária ou permanente,
o indivíduo nas atividades laborais e até mesmo nas básicas do dia-a-dia, como
alimentar-se ou cuidar da higiene pessoal. O papel do cirurgião plástico e do
especialista em mão é de buscar uma alternativa de tratamento, que possa ser
realizado de maneira prática e com um bom resultado pós-operatório (Figuras 4 e 5). O uso do retalho adipofascial reverso para cobertura de lesões por
desenluvamento das mãos e dos dedos se mostra uma boa opção, desde que o pedículo
dorsal esteja preservado. Foi descrito na literatura que o retalho era baseado
em um
pedículo randômico, porém em estudos realizados por Braga-Silva et al, em
20043, foi demonstrado a existência de dois ramos dorsais constantes,
originados da própria artéria digital palmar sobre as falanges proximal e média.
Esses ramos surgem em locais previsíveis próximos à articulação interfalangiana
proximal (IFP). Também, há simetria dos ramos dorsais das artérias digitais ulnar
e
radial de cada dedo. Também, é importante salientar que devem ser avaliadas e
excluídas lesões ósseas ou tendíneas, para evitar a formação de aderências,
proporcionando funcionalidade adequada ao paciente.
Figura 4 - Pós-operatório: cobertura total das lesões.
Figura 4 - Pós-operatório: cobertura total das lesões.
Figura 5 - Pós-operatório.
Figura 5 - Pós-operatório.
CONCLUSÃO
O retalho adipofascial reverso é uma excelente escolha para reconstrução de lesões
no
dorso da mão e das falanges média e distal dos dedos, uma vez que, possui suprimento
vascular constante e previsível, não demanda microcirurgia, fornece boa adequação
da
zona doadora e resultado funcional satisfatório no pós-operatório.
REFERÊNCIAS
1. Ministério da Fazenda (BR). Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS. Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho. Brasília (DF): MF;
2017.
2. Lee S, Jinsoo K, Dongchul L, Siyoung R, Kyungiin L. Abstract:
fingertip reconstruction with adipofascial island flap. Plast Reconstr Surg Glob
Open. 2016 Sep;4(Suppl 9):205-6. DOI:
https://doi.org/10.1097/01.GOX.0000503168.38546.66
3. Braga-Silva J, et al. The adipofascial turn-over flap for coverage
of the dorsum of the finger: a modified surgical technique. J Hand Surg Am. 2004
Nov;29(6):1038-43. DOI:
https://doi.org/10.1016/j.jhsa.2004.07.007
4. Braga-Silva J, Kuyven CR, Fallopa F, Albertoni W. An anatomical
study of the dorsal cutaneous branches of the digital arteries. J Hand Surg.
2002;27(6):577-9. DOI: https://doi.org/10.1054/jhsb.2002.0830
5. Lai CS, Lin SD, Yang CC, Chou CK. The adipofascial turn-over flap
for complicated dorsal skin defects of the hand and finger. Br J Plast Surg.
1991 Apr;44(3):165-9. PMID: 2025750 DOI:
https://doi.org/10.1016/0007-1226(91)90119-5
6. Lee S, Jinsoo K, Dongchul L, Siyoung R, Kyungjin L. Fingertip
Reconstruction with Adipofascial Island Flap. PSTM Abstract Supplement. Plast
Reconstr Surg Glob Open. 2016 Sep;4(Suppl 9):205-6. DOI:
https://doi.org/10.1097/01.GOX.0000503168.38546.66
1. Hospital São Lucas da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Jardim Botânico, Porto Alegre,
RS, Brasil.
Endereço Autor: Paulo Eduardo Macedo Caruso, Av.
Ipiranga, 6690 - Jardim Botânico, Porto Alegre, RS, Brasil. CEP
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