INTRODUÇÃO
Por ser uma superfície elevada da face, a pele do nariz é bastante suscetível à
exposição solar e é a área mais atingida pelo câncer de pele não-melanoma (o mais
comum no Brasil)1. As deformidades nasais
adquiridas após ressecção de tumores de pele podem ser de vários tamanhos e
formatos, a depender das características histopatológicas da lesão, do seu tamanho
e
as das margens oncológicas necessárias.
O nariz é coberto por pele, cuja textura varia sobre a superfície nasal e é mais
espessa no terço inferior, tecido subcutâneo e muscular facial apoiados sobre uma
camada de osso e cartilagem que, por fim, é revestida internamente por
mucopericôndrio2. Cada camada que for
ressecada precisa ser reposta, a fim de manter a sustentação nasal, a perviedade das
narinas e o revestimento cutâneo. As subunidades nasais estéticas são atingidas pelo
câncer de pele em frequências diferentes: dorso (41,50%), asa nasal (30,43%), ponta
nasal (24,90%), parede lateral nasal (12,25%) e columela (1,19%)3.
A maioria dos pacientes submetidos à ressecção de tumor de pele nasal considera o
reparo cirúrgico uma etapa fundamental. As opções de reconstrução devem ser
planejadas e discutidas com o paciente. A depender do defeito causado, da idade e
das comorbidades do paciente, de cirurgias nasais anteriores ou de radioterapia na
pele do nariz, a estratégia reconstrutiva poderá ser executada de maneira imediata
ou tardia e em um ou em mais tempos cirúrgicos2.
OBJETIVO
Este trabalho tem por objetivo apresentar 4 casos de pacientes submetidos à ressecção
de tumores de pele nasal com reconstrução e discutir as opções cirúrgicas que foram
utilizadas.
MÉTODO
Este é um estudo retrospectivo e descritivo, do tipo série de casos, que foi
construído por meio de revisões de prontuários. Os casos apresentados são de
pacientes que foram submetidos à ressecção de tumores de pele nasal com reconstrução
do nariz.
RESULTADOS
Caso 1
Paciente do sexo feminino, 55 anos, com lesão ulcerada em pele de asa nasal
esquerda associada a elevação palpável em face mucosa da parede lateral do
nariz. Foi submetida à ressecção ampla do tumor, o qual atingia espessura total
da parede nasal. O estudo histopatológico da peça mostrou tratar-se de um
carcinoma basocelular (CBC) infiltrativo. A fase imediata da reconstrução
baseou-se na recuperação das 3 camadas ressecadas: o forro nasal, que foi obtido
por retalho mucopericondral de septo nasal (Figura 1), a cartilagem, com enxerto de cartilagem de concha auricular e
fixação no retalho mucopericondral; e a pele, para a qual foram associados o
retalho nasogeniano, para a asa; e frontal paramediano, para a parede lateral
(Figura 2). Paciente apresentou boa
vitalidade dos retalhos e boa pega do enxerto, porém queixava-se de sensação de
obstrução da narina esquerda. Para evitar sinéquia, foi inserido fragmento de
sonda de Foley pela narina esquerda. Dois meses após foi realizada a
autonomização dos retalhos e a paciente evoluiu com boa cicatrização e melhora
da sensação de obstrução da narina (Figura 3).
Figura 1 - Caso 1 - Intraoperatório: retalho mucopericondral septal.
Figura 1 - Caso 1 - Intraoperatório: retalho mucopericondral septal.
Figura 2 - Caso 1 - Pós-operatório, fase pré-autonomização. O retalho
paramediano frontal foi utilizado para recobrir a parede lateral e o
retalho nasogeniano para recobrir a asa nasal
Figura 2 - Caso 1 - Pós-operatório, fase pré-autonomização. O retalho
paramediano frontal foi utilizado para recobrir a parede lateral e o
retalho nasogeniano para recobrir a asa nasal
Figura 3 - Caso 1 - Após autonomização dos retalhos. Retalhos bem
vascularizados.
Figura 3 - Caso 1 - Após autonomização dos retalhos. Retalhos bem
vascularizados.
Caso 2
Paciente do sexo feminino, 75 anos com lesão ulcerada em dorso nasal. Submetida à
ressecção da lesão, cujo defeito abrangeu área de dorso e de parede lateral
esquerda do nariz. Em primeiro tempo, foi rotacionado retalho frontal
paramediano para fechamento do defeito nasal. Paciente evoluiu com boa
cicatrização e retalho bem vascularizado. Dois meses após foi realizada a
autonomização do retalho e refinamento dos bordos da ferida. Paciente permaneceu
em acompanhamento ambulatorial, com cicatrização satisfatória (Figura 4).
Figura 4 - Caso 2 - 20 dias após a autonomização do retalho frontal
paramediano. Observe a semelhança entre a pele do retalho e a pele
nasal.
Figura 4 - Caso 2 - 20 dias após a autonomização do retalho frontal
paramediano. Observe a semelhança entre a pele do retalho e a pele
nasal.
Caso 3
Paciente do sexo feminino, 50 anos, com lesão nodular em pele de ponta nasal,
sugestiva de CBC. Ressecado tumor de pele nasal com margens de 4mm e enviado
para congelação. Após ampliação de margem profunda, foi confeccionado retalho
bilobulado para cobertura do defeito. Paciente evoluiu com boa cicatrização
(Figura 5).
Figura 5 - Caso 3 - Após ressecção da lesão. Desenho do retalho bilobulado
antes da rotação.
Figura 5 - Caso 3 - Após ressecção da lesão. Desenho do retalho bilobulado
antes da rotação.
Caso 4
Paciente do sexo feminino, 66 anos, com tumor de pele em canto lateral de asa
nasal esquerda. Submetida à ressecção da lesão, com margens, e sutura primária.
Para simetrização, foi realizada alectomia direita, proporcional ao defeito
causado à esquerda. Estudo histopatológico da lesão revelou CBC micronodular.
Paciente evoluiu com boa cicatrização e simetria satisfatória de asas nasais
(Figura 6).
Figura 6 - Caso 4 - 2 meses pós-operatórios. Asas nasais
simetrizadas.
Figura 6 - Caso 4 - 2 meses pós-operatórios. Asas nasais
simetrizadas.
DISCUSSÃO
O forro nasal pode ser reconstituído com retalho mucopericondral. Os retalhos septais
são bem aplicados para defeitos maiores, pois podem ser dobrados lateralmente para
revestir o vestíbulo inferior e a margem alar2. O tipo septal ipsilateral com base anterior (utilizado no Caso 1) é
fundamentado no vaso labial superior esquerdo e oclui a narina temporariamente, até
a sua autonomização. Ele deve incluir o pericôndrio para que seja mantida a nutrição
da camada mucosa.
As cartilagens alares são responsáveis pela manutenção da forma e da função do terço
inferior do nariz4, pois estruturam a narina e
impedem seu colabamento durante a inspiração. O enxerto de cartilagem auricular pode
ser obtido de diversas maneiras, e é importante que o mesmo mantenha uma concavidade
para baixo, seguindo-se o contorno da asa nasal.
O retalho nasogeniano em dois estágios pode fornecer pele em excesso no sulco
nasogeniano para reconstruir a asa, não sendo bem indicado para ponta ou dorso. Este
retalho deve ser curto, bem como seu ângulo de rotação, e deve ser levantado
mantendo-se uma base proximal de gordura subcutânea profunda que é perfundida por
perfurantes das artérias facial e angular. Em caso de restar pele de asa nasal após
a ressecção da lesão, é preferível que esta também seja substituída por pele do
retalho, reconstituindo-se a subunidade estética em bloco2.
Por ser semelhante a pele nasal, a pele da testa constitui uma boa área doadora para
tais fins, podendo ser transposta por vários tipos de pedículos. A região frontal
é
perfundida por vasos supraorbitários, supratrocleares, temporais superficiais,
infraorbitais, dorso nasais e ramos das artérias faciais5. O retalho frontal paramediano pode ser confeccionado com base
em um pedículo supratroclear2 e é uma opção
bastante utilizada para reconstrução nasal. Esse retalho é desenhado da sobrancelha
até a linha de implantação capilar, podendo ser alongado, caso necessário,
angulando-se o seu maior eixo lateralmente.
Os vasos supratrocleares emergem cranialmente ao longo da altura da testa, de uma
camada mais profunda sobre o periósteo até uma profundidade quase subdérmica na
pele, próxima à implantação do couro cabeludo5. Em pacientes não fumantes, o retalho frontal paramediano pode ser
levantado incluindo-se as camadas por onde os vasos emergem, sendo mais espesso
próximo à base e mais delgado distalmente2.
Sua ponta deve conter a menor quantidade possível de folículos pilosos do couro
cabeludo e, quando necessário incluir pele dessa área, os pelos poderão ser
removidos posteriormente por depilação.
O retalho bilobado é uma boa escolha para fechamento de defeitos pequenos (até 1,5cm)
em zonas de pele espessa, como de ponta e asa. Ele é confeccionado a partir da pele
móvel do dorso ou paredes laterais e não deve ter um ângulo de rotação superior a
50
graus para cada lóbulo. Esse retalho deve ser deve ser levantado acima do
pericôndrio, incluindo pele, gordura e músculo nasal. O defeito causado pelo
primeiro lóbulo é fechado de forma primária2.
Um dos princípios da reconstrução nasal estética é utilizar o contralateral como
guia. Para tumores de pele na extremidade lateral de uma das asas nasais, a
alectomia é utilizada como forma de ressecar a lesão, buscando-se a simetria por
associação com alectomia contralateral.
CONCLUSÃO
A reconstrução nasal constitui uma etapa importante do tratamento do câncer de pele
do nariz. Os princípios estéticos e de funcionalidade devem ser sempre considerados
no planejamento cirúrgico. É imprescindível que o cirurgião plástico conheça bem
cada estratégia para que escolha a melhor opção para a reconstrução.
REFERÊNCIAS
1. Ceratti TA, Casado Neto AS, Vittorazzi A, Barros MEPM, Farina Junior
JA. Enxerto composto auricular na reconstrução da asa nasal. Rev Bras Cir Plást.
2012;27(4):640-3. DOI:
https://doi.org/10.1590/S1983-51752012000400030
2. Thorne CH, Chung KC, Gosain AK, Gurtner GC, Mehrara BJ, Rubin JP,
Spear SL. Grabb and Smith’s Cirurgia Plástica. Tradução: Nelson Gomes de
Oliveira, Edianez Chimello, Sandra Mallman, et al. 7ª ed. Rio de Janeiro (RJ):
Thieme Revinter Publicações; 2018.
3. Souza Filho MV, Kobig RN, Barros PB, Dibe MJA, Leal PRA.
Reconstrução nasal: análise de 253 casos realizados no Instituto Nacional de
Câncer. Rev Bras Cancerol. 2002;48(2):239-45.
4. Oliveira MF, Pereira MD, Ferreira LM. Reconstrução total da
cartilagem alar utilizando enxerto de cartilagem auricular em bloco após
ressecção tumoral. Rev Bras Cir Plást. 2010;25(3):26.
5. Costa MJM. Versatilidade do retalho médio-frontal nas reconstruções
faciais. Rev Bras Cir Plást. 2016;31(4):474-80.
1. Universidade Federal do Ceará, Benfica,
Fortaleza, CE, Brasil.
2. Hospital Universitário Walter Cantídio, Rodolfo
Teófilo, Fortaleza, CE, Brasil.
Endereço Autor: Mikaelle Paiva dos Santos Souzam,
Rua Ministro Joaquim Bastos, 231, Fátima, Fortaleza, CE, Brasil. CEP:
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