INTRODUÇÃO
O tromboembolismo venoso (TEV) pode ser apontado como um dos principais motivos de
preocupação no pós-operatório das intervenções em cirurgia plástica. É definido pela
trombose venosa profunda e pela embolia pulmonar (TEP), sendo esta última a
principal causa de óbito em pacientes hospitalizados1. Tal preocupação se deve ao fato de que os eventos tromboembólicos
estão associados a altas taxas de morbidade e mortalidade, afetando cerca de 200.000
americanos por ano2, além de sua apresentação
muitas vezes oligo ou assintomática, o que pode levar a diagnósticos tardios,
justificando tais índices.
Considerando a relevância do tromboembolismo, há ainda uma importante escassez de
estudos a respeito da correlação entre os eventos tromboembólicos e a rinoplastia,
o
que torna a decisão em se recomendar a profilaxia, dificultosa2. Nesse sentido, periodicamente, o American College of Chest
Physicians (ACCP) estabelece recomendações para a profilaxia do TEV, aplicáveis a
quaisquer especialidades médicas, conhecidas como Escore de Caprini, que leva em
consideração os fatores de risco e, a partir dele, estratifica o risco3.
RELATO DO CASO
Trata-se de paciente masculino, 36 anos, que procurou avaliação em clínica privada
com queixa de obstrução nasal e giba em dorso nasal. Apresentava-se hígido, sem
relato de doenças prévias ou histórico familiar para doenças hematológicas ou
tromboembolismo. Submetido a rinosseptoplastia aberta sob anestesia geral, sem
intercorrências, com duração de quatro horas. Recebeu alta no primeiro dia de
pós-operatório, em conduta habitual para o procedimento. No sexto dia de
pós-operatório, compareceu ao Pronto Atendimento referindo dor abdominal em
hipocôndrio direito, relacionado à febre não termometrada e discreta dor
ventilatório-dependente em transição toracoabdominal à direita. Negava dispneia ou
palpitações. Houve ainda relato de náuseas e vômitos. Ao exame físico, apresentava
bom estado geral, corado, anictérico, hidratado, com frequência cardíaca de 77 bpm,
saturando 99% em ar ambiente, com pressão arterial de 120×80 mmHg, abdome normotenso
e indolor, ausculta pulmonar com murmúrio fisiológico universalmente audível, sem
ruídos adventícios. Membros inferiores mantinham boa perfusão, panturrilhas livres,
sem sinais clínicos de empastamento. Mediante a queixa apresentada, levantou-se a
suspeita de tromboembolismo pulmonar (TEP), diante da qual, se iniciou propedêutica
complementar laboratorial e de imagem, nas quais foram obtidos os seguintes achados:
leucócitos: 13.600 (VR: 3,5 a 10,5×103/mm3), proteína C
reativa 143 (VR: menor que 6) e D-dímero 2.858,86 nanog/mL (VR: 68 a 494 nanog/mL).
À angiotomografia de tórax se obteve estudo positivo para tromboembolismo pulmonar
com provável área de infarto pulmonar em segmento basal posterior do lobo inferior,
já em ultrassonografia (USG) com Doppler dos membros inferiores não apresentou
evidências compatíveis com trombose venosa profunda, bem como ao ecocardiograma
transtorácico, no qual não se observaram alterações. O paciente foi internado para
propedêutica complementar e controle clínico-cirúrgico.
O paciente recebeu alta no 3º dia de internação, mediante anticoagulação com
rivaroxabana e melhora parcial dos sintomas, estável hemodinamicamente. Foi
realizada investigação posterior de trombofilia com hematologista (fator V Leiden,
antitrombina III, proteína S, anticoagulante lúpico e cardiolipina) obtendo todos
os
resultados negativos. Fez uso de anticoagulante por dois meses, sendo suspenso após
novos exames para trombofilia negativos.
Figura 1 - Pré e pós-operatório imediato.
Figura 1 - Pré e pós-operatório imediato.
DISCUSSÃO
O relato clínico exemplifica um caso de tromboembolismo pulmonar em um paciente jovem
e sem fatores de risco conhecidos, submetido ao procedimento de rinoplastia, que
evoluiu com tromboembolismo pulmonar no pós-operatório. O TEP é uma evolução
amplamente temida em situações pós-operatórias, mas pouco esperada em casos como o
descrito, ao se levar em consideração o protocolo mais recente adotado pela American
College of Chest Physicians, de 2009, e validado no estudo de Bahl4. De acordo com este protocolo, é possível
estabelecer o risco em se evoluir com TEV mediante as comorbidades apresentadas pelo
paciente, o que constitui o Escore de Caprini, diante do qual se estabelecem as
bases para a tromboprofilaxia pós-operatória3.
Há uma escassez na iteratura de trabalhos que correlacionem o tromboembolismo como
desfecho de uma rinoplastia. Moubayed foi pioneiro nesse sentido, e nessa correlação
obteve o risco de 0,0% de TEV em pacientes submetidos à rinoplastia estética ou
funcional. Assim, concluiu, em razão do baixo risco ao Escore de Caprini, a
dispensabilidade de outras formas de profilaxia, senão a já citada, embora tenha
realizado também a quimioprofilaxia para os casos avaliados, por ser parte do
protocolo do seu serviço2. No caso aqui
relatado, o paciente esteve exposto a um único fator de risco: o tempo cirúrgico
superior a 45 minutos, de maneira que, respaldado pelo Escore de Caprini, seria
possível classificá-lo como “baixo risco”, no escore de 1-2 fatores, com 1,5% de
risco sem quimioprofilaxia, ao que estaria indicada apenas a profilaxia mecânica com
o uso de botas pneumáticas.
CONCLUSÃO
Mediante o caso descrito, e reportando à literatura médica, é possível concluir que
o
TEP não é uma complicação esperada em rinoplastia estética eletiva em pacientes de
baixo risco, segundo o Escore de Caprini, embora seja uma complicação temida.
Trata-se de uma possível exceção, o que, a princípio, não agregaria risco suficiente
a esses pacientes, em contraste ao uso inadvertido de quimioprofilaxia e a
recomendação para o uso de profilaxia mecânica nesse grupo de pacientes.
REFERÊNCIAS
1. Paiva RA, Chadraouij J, Machado BB, Amorim NFG, Fischdick H,
Pitanguy I. Protocolo de prevenção de tromboembolismo venoso no Instituto Ivo
Pitanguy: eficácia e segurança em 1.351 pacientes. Revista Brasileira de
Cirurgia Plástica. 2013;28(1): 3-9.
2. Moubayed SP, Akdagli S, Most SP. Incidence of Venous Thromboembolism
in Rhinoplasty. Aesthetic Surgery Journal. 2017; 37(3):34-5
3. Venturi ML, Davison SP, Caprini JA. Prevention of Venous
Thromboembolism in the Plastic Surgery Patient: Current Guidelines and
Recommendations. Aesthetic Surgery Journal. 2009; 29(5):421-31.
4. Bahl V, Hu HM, Henke PK, Wakefield TW, Campbell DA, Caprini JA. A
Validation Study of a Retrospective Venous Thromboembolism Risk Scoring Method.
Annals of Surgery. 2010;251(2):344-50.
1. Fundação Hospitalar Getúlio Vargas, Rio Grande
do Sul, RS, Brazil.
2. Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG,
Brasil.
3. Faculdade de Medicina do Vale do
Aço.
Endereço Autor: Viktor Monte Alto
Rezende Rua Platina, 56/702, Prado, Belo Horizonte, MG, Brasil CEP
30411-092 E-mail viktormontealto@gmail.com