INTRODUÇÃO
Os cabelos crescem naturalmente agrupados em um, dois, três e até quatro fios. A esse
grupo dá-se o nome de unidade folicular. Esses folículos compartilham estruturas
menores que também são responsáveis pelo crescimento saudável do pelo, a saber,
glândula sebácea e músculo eretor do pelo. A técnica de transplante capilar FUE
(follicular unit extraction) consiste na extração das unidades
foliculares individualmente por meio do uso de punches – cilindros
ocos que medem entre 0,7 mm e 1 mm de diâmetro. Classicamente, tal técnica necessita
a raspagem completa dos fios para que o punch possa se encaixar
perfeitamente em cada unidade folicular, seguindo a sua direção e angulação para uma
extração de qualidade, que inclui todos os bulbos capilares. A técnica apresenta
diversas vantagens em relação à técnica FUT (folicular unit
transplant), sendo a principal delas o fato de não gerar uma cicatriz
linear no couro cabeludo. No entanto, a maior queixa dos pacientes em relação à
técnica FUE, principalmente pacientes do sexo feminino, é a necessidade da raspagem
dos cabelos. Para abolir tal desconforto, algumas formas diferentes foram propostas
para realizar a extração das unidades sem a raspagem completa.
OBJETIVO
O presente estudo propõe uma sequência evolutiva para treinamento e aperfeiçoamento
do cirurgião na técnica FUE sem raspagem.
MÉTODO
Os pacientes submetidos à cirurgia de transplante capilar FUE na clínica Graf
Guimarães, em Curitiba, PR, entre os anos 2015 e 2019, que não desejavam a raspagem
dos fios foram submetidos à técnica de diversas maneiras, em uma evolução lógica de
aprimoramento. A presença de cabelos compridos na área doadora do transplante
dificulta enormemente a retirada das unidades, pois o cirurgião necessita modificar
diversas vezes o posicionamento dos fios para que eles não atrapalhem o campo
cirúrgico e, consequentemente, a extração. Para manter a qualidade dos enxertos
extraídos é necessário um período de adaptação do cirurgião a esse novo campo
cirúrgico. Os primeiros casos foram submetidos à raspagem parcial da área doadora,
formando pequenas faixas de áreas raspadas de cerca de 0,5 a 1 cm, alternadas com
faixas de cabelos compridos também com cerca de 0,5 a 1 cm, de maneira que, após o
término do procedimento, as áreas de raspagem ficavam invisíveis com os cabelos
soltos (Figuras 1 e 2).
Figura 1 - Área doadora evidenciando as faixas de raspagem dos cabelos, antes da
extração.
Figura 1 - Área doadora evidenciando as faixas de raspagem dos cabelos, antes da
extração.
Figura 2 - Área doadora evidenciando as faixas de raspagem dos cabelos, após a
extração.
Figura 2 - Área doadora evidenciando as faixas de raspagem dos cabelos, após a
extração.
Após a realização dessa técnica, em alguns pacientes, evoluiu-se para a realização
da
raspagem de múltiplas pequenas áreas, com cerca de 0,5 cm de diâmetro entre os
cabelos longos, das quais seria possível a extração de cerca de três a cinco
unidades foliculares de cada área. É necessário o preparo da área doadora com
contagem do número de áreas raspadas, proporcionalmente ao número planejado para
extração (Figuras 3 e 4).
Figura 3 - Pequenas áreas de raspagem espalhadas pela área doadora, antes da
extração.
Figura 3 - Pequenas áreas de raspagem espalhadas pela área doadora, antes da
extração.
Figura 4 - Pequenas áreas de raspagem espalhadas pela área doadora, após a
extração.
Figura 4 - Pequenas áreas de raspagem espalhadas pela área doadora, após a
extração.
Passado o período de adaptação, conforme a necessidade do cirurgião, iniciou-se com
o
preparo da área doadora por meio do corte dos fios individualmente em cada unidade
folicular. Ou seja, cada unidade folicular que seria posteriormente retirada, tinha
seus fios cortados rente à pele, alternando com unidades de fios não cortados. O
preparo da área deve ser realizado no dia anterior, pois demora cerca de uma hora
e
meia, já que são cortadas exatamente as unidades que serão extraídas no dia
seguinte. Recomenda-se o corte de cerca de 30% a mais que o necessário, para que o
cirurgião tenha a possibilidade de escolher as melhores unidades durante a extração
(Figura 5).
Figura 5 - Área doadora evidenciando unidades foliculares cortadas
individualmente.
Figura 5 - Área doadora evidenciando unidades foliculares cortadas
individualmente.
Por último, atinge-se o nível mais alto de dificuldade, em que as unidades
foliculares que serão extraídas não são cortadas ou raspadas, mas sim retiradas com
seus fios longos. Tal técnica exige aparelhos e punches específicos, que se encaixam
nos fios longos sem que seja necessário cortá-los (Figura 6).
Figura 6 - Punches modificados para extração de unidades foliculares com fio
longo.
Figura 6 - Punches modificados para extração de unidades foliculares com fio
longo.
RESULTADOS
Todos os pacientes submetidos à técnica FUE sem raspagem ficaram satisfeitos com o
resultado pós-operatório imediato, que possibilitou um retorno mais rápido às suas
atividades e também muito mais discreto e natural.
Como a técnica possui uma curva de aprendizado mais lenta e, por ser mais trabalhosa
que a tradicional, é também mais demorada de ser realizada. Dessa forma, é
necessário inicialmente escolher casos menores, nos quais será necessária uma
quantidade menor de unidades foliculares. Organizando-se dessa maneira, foi possível
ao cirurgião um aprimoramento na técnica de maneira natural.
DISCUSSÃO
A técnica de extração por unidade folicular FUE foi inicialmente descrita em 2002,
por Rasmann e cols.1 Desde então, a cirurgia
vem sendo aprimorada ao longo dos anos2-4, mediante o
aperfeiçoamento de novos punches, e de aparelhos extratores, de
modo a manter a integridade e qualidade da unidade pilosa. Após a técnica FUE se
consolidar como uma boa forma de tratamento da calvície, e passar a ser indicada
também para megassessões, alguns cirurgiões iniciaram a busca para solucionar o
problema da raspagem dos cabelos5-7.
A evolução dos aparelhos e punches permitiu, então, um passo além: a
possibilidade de retirar as unidades foliculares individualmente sem cortar os fios.
A vantagem dessa última técnica sobre as outras é que não há necessidade de preparo
da área doadora. No entanto, ela possui uma curva de aprendizado muito mais lenta,
para que o cirurgião seja capaz de identificar com perfeição a direção e angulação
da unidade, já que com o fio longo, uma mudança na direção dos fios pode dar uma
falsa impressão da direção da unidade folicular abaixo da pele.
CONCLUSÃO
A técnica FUE sem raspagem dos fios apresenta uma demanda cada vez maior entre os
pacientes e, dessa forma, é muito interessante que o cirurgião de calvície esteja
preparado para realizá-la. Por meio de treinamento incansável, é possível realizá-la
em evolução constante, com resultados cada vez melhores e um pós-operatório muito
mais aceitável para o paciente.
REFERÊNCIAS
1. Rassman WR, Bernstein RM, McClellan R, Jones R, Worton E,
Uyttendaele H. Follicular unit extraction: minimally invasive surgery for hair
transplantation. Dermatol Surg. 2002; 28:720-8. DOI: https://doi.org/10.1097/00042728-200208000-00014
2. Harris JA. New methodology and instrumentation for follicular unit
extraction: lower follicle transaction and expanded patient candidacy. Dermatol
Surg. 2006; 32:56-62. DOI: https://doi.org/10.1097/00042728-200601000-00009
3. Onda M, Igawa HH, Inoue K, Tanino R. Novel technique of follicular
unit hair transplantation with a powered punching device. Dermatol Surg. 2008;
34:1683-8.
4. Harris JA. Follicular unit extraction: the SAFE System. Hair
Transplant Forum Internat. 2004; 14:157-63.
5. Park JH. Direct non-shaven FUE technique. Hair Transplant Forum Int.
2014; 24:103-4.
6. Park JH. Re: state-of-the-art FUE: non-shaven technique. Hair
Transplant Forum Int. 2015; 25:82-3.
7. Cole JP. State of the art FUE: advanced non-shaven technique. Hair
Transplant Forum Int. 2015; 25:166-9.
1. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica,
Paraná, PR, Brasil.
2. Clínica Graf Guimarães, Curitiba, PR,
Brasil.
3. Associação Brasileira de Cirurgia da
Restauração Capilar, Curitiba, PR, Brasil.
4. Sociedade Brasileira de Dermatologia, São
Paulo, SP, Brasil.
Endereço Autor: Veruska Moscatto de Biagi Av
Senador Souza Naves, 1025, Alto da XV, Curitiba, PR, Brasil CEP 80050-152E-mail:
vebiagi@hotmail.com